30
Nov07
O lamento das Sextas - A las malas lengoas estas figas
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LEGENDA
1 – A LAS MALAS LENGOAS ESTAS FIGAS
2 – Caretas
3 – Imagem de Santa Maria Maior a padroeira de Chaves
4 – Um pouco de luz
5 – Pedra da região
O lamento de hoje era para ser outro, mas calhou este, e também calha bem.
Então o lamento de hoje vai para as más-línguas de Chaves.
Chaves, por muito que se esforce, é provinciana e não passa de uma aldeia cheia de aldeãos. Uma aldeia grande, é certo, mas que comunga todo o ser das aldeias mais profundas da montanha. Toda a gente conhece toda a gente, é uma terra de comadres e compadres, vizinhos do lado, de cima ou de baixo, de primos carnais ou afastados e, também tem os seus senhores, os seus doutores, o padre, o presidente, os pobres e netos dos nobres…
Claro que como aldeia que é (grande é certo) tem as suas virtudes, muitas até. Tem ainda uma boa qualidade de vida em termos de pacatez, ou stress, vive-se a calma dos dias, tanto que uma bicha de três carros, já é uma grande bicha…mas não é de bichas que quero hoje falar. Hoje quero mesmo é falar da nossa aldeia mental e também da nossa aldeia física, provinciana, entalada entre o mais profundo de Trás-os-Montes e o mais profundo a Galiza, que é a mesma coisa.
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Só um meio lamento antes ainda de chegar ao segundo lamento - Porque é que com tanta festa que se inventa por aí não se inventa e dedica uma em homenagem à Padroeira de Chaves, a nossa Santa Maria Maior!?
Pois o lamento de hoje é feito de dois lamentos, o primeiro, o lamento das más línguas e o segundo, o lamento de como a nossa qualidade de vida nos sai tão cara.
Quanto à má língua, já todos sabemos que se por desgraça caímos nas bocas do povo, estamos desgraçados, podemos ir directamente prá cama, sem passar mesmo pela fama. A cidade é feita de um certo landainismo (com todo o respeito a quem dá o nome ao termo), mas se o landainismo puro, era mesmo puro, o que hoje se pratica já não é assim. É landainismo, de mal dizer, este sim puro, mas que disfarça interesses, ou pior que isso, invejas, ou seja, reflecte a pobreza da nossa aldeia, quer a pobreza intelectual, quer a pobreza, ela mesma pobreza. Não admira que tantos filhos desta terra partam por esse Portugal fora, e por esse mundo adentro, à procura de alguma civilização. Claro que como em tudo há algumas excepções, que como sempre (infelizmente) são poucas.
Quem por cá vive, já sabe daquilo que esta aldeia gasta, e embora a esquina do Lopes já tivesse sido desactivada, ainda são conhecidos os locais de “tertúlias” de mal dizer. Esquinas de quiosques, frentes de cafés ou santas casas da praça maior, de tudo serve para quem gosta e vive do diz-que-diz. Lamentamos, é certo, mas só caí no “landainismo” quem quer, pois sempre há o opção de partir ou, se ficar, de virar a esquisito, indisposto, antipático ou então, a responder indiferente (com um sorriso nos lábios) aos cumprimentos e vénia, ignorando o adivinhado que fica entre linhas, que é como quem diz, entre dentes.
Mais uma vez recorro aos nossos antepassados flavienses e que deixaram para todo o sempre o registos de: “AS LAS MALAS LENGOAS ESTAS FIGAS”, já então, ao que parece, Chaves sofria dos males da má-língua. Pois, com ou sem figas, estou em acreditar que as nossas novas gerações, os nossos filhos, são temperados com outra tempera, desde que a vida os deixe viver as suas vidas!
Para as más línguas também eu deixo as minhas figas, mesmo que não acredite no gesto.
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Então estou chegado ao segundo lamento e este, é um lamento de interioridade e de provincianismo político, económico e real.
Já entrei noite dentro, madrugada, o termómetro exterior já entrou nos graus negativos. Vivemos em Trás-os-Montes, temos frio e um pouco de calor, sai caro, Vivemos distantes do mar, do cinema, do teatro, da cultura. Não temos universidades para formar os nossos filhos, nem hospital para tratar as nossas maleitas mais graves e os horizontes deste vale, mesmo para sonhadores, limitam-se a ficar entalados entre as montanhas e até o sonho, só é possível sonhando-o….mas somos iguais ao resto deste nosso Portugal. Pagamos os mesmos impostos, recebemos os mesmos (ou até menores) vencimentos, temos menos oferta e mais despesas. Despesas para aquecer o frio, despesas para formar os nossos filhos, despesas para termos saúde e até despesas para, com sanidade física e mental, sobrevivermos no vale. Com tanta despesa, somos pobres. Temos deveres iguais ao Portugal dos grandes centros e do litoral, mas não os mesmos direitos, deste Portugal que se quer e diz democrático, mas que é diferente.
Eis o meu segundo lamento, que vai direitinho para a nossa diferença, que não nos é reconhecida e também para os que daqui partiram e têm responsabilidades na vida deste país, que é desigual.
E para terminar ainda há um terceiro lamento, o lamento de uma opção pessoal mas que é colectiva: Hoje estou em greve e lamento-o, não só por estar em greve, mas lamento mais ainda pelos colegas que estão solidários, mas que os custos da interioridade não lhes permite os luxos da despesa de uma greve. Estou em greve pelo simples facto de não ser desculpa para as más governações da nossa geração rasca de políticos e tal como o Queirós, também eu não nasci rico nem tenho cunhas e por isso, sou trabalhador, que admite ter grandes políticos que não são grande coisa… mas aqui (valendo-me mais uma vez das bocas futebolísticas) nós somos burros e, a culpa também é nossa.
E hoje não me lamento mais, embora amanhã vá até uma aldeia, que sofre dos mesmos males em relação à cidade, que nós vivemos em relação a Portugal, ou seja, duplamente “culpados”. Afinal havia outro lamento.
Até amanhã, por aí, numa das nossas aldeias.