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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

31
Jul11

Treze Contos do Mundo que Acabou - Vida de Cão


 

 

Conto IV

(1ª Parte)


Vida de cão

 

          As terras pequenas, quando a história dos povos escolhe um dos seus filhos para herói nacional, assumem vaidosas a condição de berço que a divina providência quis abençoar e não mais toleram que a toponímia e a cartografia ignorem o tempo e o lugar onde a feliz conjunção astral se revelou.

 

           Bem ao invés, a aldeia de Valcovo, onde o cavalo do Apóstolo nunca perdeu ferraduras, suporta resignada o estigma de ter parido um regicida. E é tal o ar contrito e acabrunhado, de penitente na noite de Endoenças, exalado no calvário dos dias, que não voltou Deus a permitir que ali acontecesse coisa alguma que agravasse as contas que haverá de prestar no juízo final .


          As raras crianças, inevitáveis frutos dos impulsos carnais dos adultos, mal justificam a escola com que a República agradecida os quis reabilitar. Ao todo, e contando já com as que das aldeias vizinhas ali cumprem a obrigação da escolaridade, pouco passam da dúzia, matriculadas nas quatro classes.


           Quando o dois cavalos surgiu a arfar desengonçado no cimo do povo, os rapazes pararam as correrias e vieram juntar-se às três raparigas, no vão do muro onde antes fora o portão da escola, ensaiando uma saudação acanhada:


          - Bom dia, senhor professor!


          - Quem é que vos disse que eu sou o professor?


Os sorrisos, entre surpresos e envergonhados, esconderam-se uns atrás dos outros, deixando apenas passo à convicta serenidade de uns pézitos descalços, as mãos encafuadas nos bolsos das calças que, por certo, já tinham vestido um irmão maior:


          - O senhor veio no carro e parou à beira da escola, é porque é o professor.


          Esta lógica, de alto lá com ela, saída de uma cabecita russa, com dois lampiões de ranho acesos no nariz enfarruscado, acabava de mandar às urtigas o ar intrigante com que cuidara surpreendê-los.


          - Tens toda a razão, eu sou o vosso professor. E tu, como te chamas? Quantos anos tens?


          - Ando em seis. Sou Fernando.


          - Eu é que tenho a chave da escola! - avançou a Adelaide, reassumindo o protagonismo que lhe era devido pelos seus doze anos,  justificados por várias repetências.


          - Antes de entrarmos, gostava que vocês me mostrassem a aldeia, o sítio das vossas casas, a capela e tudo o mais que vocês entenderem, pode ser?


          O acanhamento depressa deu lugar à iniciativa orgulhosa de cada um conduzir o grupo conforme a rua e a proximidade da sua casa. Nunca, em tantos anos, a Dona Carminda saíra da escola para conhecer o povo ou as casas onde eles faziam vida. A tabuada, os ditados e as cópias, que ela usava como armas de arremesso contra o analfabetismo congénito, com a mesma força e pontaria com que eles jogavam pedradas às cabras tresmalhadas, e a palmatória dos sete olhos com que lhes forçava as portas estreitas do entendimento, faziam de todas e cada uma das manhãs um pesadelo que só alguns poucos superavam com aproveitamento. E quando o sistema esgotava de vez a obsessão de os desemburrar, voltavam livres às fragas e aos ouriços dos castanheiros. Toda a vida assim fora. Agora, esta de começar o primeiro dia de aulas a laurear pelas ruas do povo sem, nem ao menos, ter posto o rabo nos bancos das carteiras ou os olhos na ardósia empoeirada, trazia água no bico...


          A meio da manhã já cada um ocupava o lugar que o professor os deixara escolher, classes e saberes fora de consideração, e a todos foi distribuída uma folha lisa e um lápis para desenharem o que lhes viesse à ideia. Ainda assim sobejavam carteiras, as mais desengonçadas e sujas, com tantos anos de uso como o velho edifício da escola. O Fernando sentou-se sozinho ao fundo, usando o lápis como se, em toda a vida, não tivesse feito outra coisa. O Gilberto sarandava pela sala, numa irrequietude que contrastava com o silêncio e compostura dos demais, e, o muito que conseguiu do lápis foi esmagar-lhe o bico afiado e rasgar com ele a folha em tiras. Já no primeiro diagnóstico da oralidade tinha dado mostras de domínio da linguagem muito abaixo do normal para a idade. Eram mais os guinchos onomatopaicos que as palavras inteligíveis, e, quando os outros se riam de troça, respondia com olhares agressivos, como bicho eriçado à defesa.

          Começava assim o segundo ano de exercício do jovem mestre-escola, com as estratégias pedagógicas aprendidas no curso do Magistério Primário ainda frescas, a exigir o confronto voluntarioso e obstinado com a realidade. Acreditava estar ali por vocação e, depois do primeiro contacto com aquelas crianças e com o lugar onde vegetavam, começou a sentir que não tardaria a apaixonar-se pela missão. Mal acabou de recolher os desenhos, onde as mãos já domadas dos mais velhos tinham tentado representar invariavelmente o sol, as nuvens, uma casa de chaminé fumegante e dois pássaros de asa aberta riscando o azul do céu, separou os quatro trabalhos dos iniciados, incrédulo com o que via. O pouco que restava da folha do Gilberto, outras duas atravessadas por riscos negros do lápis que não obedece ainda à vontade da mão e, na última folha, a traço seguro e equilibradas proporções, um quadro descritivo da aldeia, com as suas ruas e casas, o tanque, a capela, o cemitério e, em destaque e pormenor, a máquina que o Presidente da Câmara tinha mandado para que desse um jeito na estrada antes das eleições. No resto da manhã não conseguiu deixar de passar os olhos, vezes sem conta, ora pelo Fernando com o ar sereno e autosuficiente que a farpela, pouco menos que andrajosa, persistia em contradizer, ora pelo desenho dele, mais atribuível a um pintor naif na madurez da produção do que a uma criança rota e descalça no primeiro dia de escola. Decididamente, não era possível!


          - Fernando, o que fazem os teus pais?


          - O meu pai e os meus irmãos andam com as ovelhas e a minha mãe está em casa.


          - Oh senhor professor, o pai dele é o coveiro, e a mãe deixou-o, que ele é muito bêbado e dava-lhe mau viver...-  apressou-se a rectificar a Adelaide.


          - E as irmãs estão ambas par Espanha, na vida... -  já agora, por que não contar a história toda como ela era, arriscou o Joaquim.

          - Quem é que te ensinou a desenhar, Fernando?


          - Não foi ninguém. A mim deu-me para fazer assim.


          Naquele instante, o professor Silveira tomou a decisão inconfessável de dedicar àquela criança o melhor da sua atenção, sem no entanto lhe ensinar o que quer que fosse. Havia dentro daquele pequeno ser uma semente que precisava apenas de ser acarinhada para produzir frutos de sabor insuspeitado. Guardaria para si o segredo, não fosse o diabo tecê-las, e aparecer-lhe por ali o inspector a chamá-lo à responsabilidade quanto à assumida negação do sagrado ofício pedagógico.


          As manhãs brumosas de Outubro fluíam entre a agitação motivada dos miúdos e a insatisfação constante do professor, as pantomimas zoomórficas do Gilberto e as surpreendentes respostas do Fernando. Passados os Santos e o Dia dos Fiéis, a primeira geada de Novembro veio colocar um problema a que a aritmética não dava solução -  era preciso aquecer a sala, para que todos pudessem suportar as horas de inactividade física com o mínimo de aconchego, e o frio não tomasse conta daqueles corpitos mal agasalhados. O fogão de ferro ao canto da parede, com o seu tubo negro do chupão a vazar o tecto, aparentava nunca ter visto lume. Pelo menos a Adelaide garantia que, nos seis invernos que passara sentada ao lado dele, nunca de lá saíra calor que lhe desengaranhasse as mãos. Mas, para tudo há uma primeira vez, e certamente a novidade haveria de reforçar ainda mais a motivação pela escola.


(continua)

30
Jul11

Crónicas Ocasionais - A videira e o Castanheiro de Soutelinho


 

 

 

 

“A VIDEIRA  e  o CASTANHEIRO de SOUTELINHO”

 

 

Era uma vez um peregrino de saudades, que aproveitou um dia longo de Verão para rumar a uma Normandia de fronteira.

Madrugou.


E logo foi o primeiro - primeirinho a pôr o pé no campo de concentração , “livre – e - democrático”, de romeiros,  lá no Largo do Anjo.


Não sabemos se do Gabriel, Miguel ou Rafael! Mas isso é lá com o “nazireu de empreitada” e presidente municipal.


Os «Caminhos de Santiago” foram substituídos pelas «Rotas do Contrabando”, e estas pelas alcatroadas estradinholas municipais.


A pé já quase ninguém anda   -  a não ser ao cair da noite, nas «caminhadas da moda» contra o “clesterol” e a favor da «perdida de peso”   -  não que a gordura é para manter!


Assim, num machimbombo velho e cansado, retornado das picadas do CONGO, onde transportava Pigmeus, lá foram os ferv(o)erosos caminheiros, mais parecidos com um “ pelotão de Caçadores 10” ou mesmo até com uma Brigada de Assalto dos “Dragões de Chaves”, pois iam equipados com disparadores automáticos a lembrar bazucas ou morteiros de 60mm.


Apesar de especializado em morteiros pesados de 160 mm, o Romeiro de Alcácer levava apenas uma fisga de meio furco.


Chegados ao S. CAETANO, este, em vez de abençoar os peregrinos com água benta …ou uma(s)  pinga(s), da(s) boa(s), lá  planalto do COUTO, asperge-os com uma cacimbada!

 

 


Por isso uma célebre “Corneta de S. Caetano”, com história contada no Blogue “Valdanta”, soou constipado-desafinada ao “Merino” que mandou o “Neto da Tia São” para o Garcia!


À procura do sol de «inferno», rumou-se até ao «Meco» 198 – noves fora nada  -  lá no cimo do Poβo de SOUTELINHO DA RAIA,  onde todos fizeram as vezes de «gajeiro de nau Catrineta»… e donde só alguns desceram para “proβar”  o «gajeiro “ que empurrou umas rodelas de linguiça e de salpicão numa secreta adega com (antigamente) porta de entrada de … Guardas-Fiscais, do lado de cá, e de «Carabineros», do lado de lá.

 


Conduzido à Fonte medieval, em recuperação, nasceu-nos a esperança de encontrar por entre os montículos de terra e cascalho alguma flauta doce, que a distracção dos arqueólogos tivesse consentido esquecida.


Não a encontrámos.


Mas um sopro de vento, leve, levezinho, fez-nos voltar o olhar lá para o fundo de uma cortinha que começava logo ali, naquele muro de pedra onde terminava a rua.


Atraído pela arte e deslumbrado com a Natureza.


Perante nós, um frondoso castanheiro. Imponente. Com uma folhagem de um verde pujante. E tingido por madeixas amarelo - prateadas da sua flor.


Ao nosso lado, uma Videirinha elegante, viçosa, estendeu uma gavinha insinuante e fluorescente, e guardou para a posteridade o último testemunho de um jardim natural, outrora passeado por druidas, em cânticos de louvor a Druantia, a Arduinna e a Ailinn.


O sol abriu.


E uma onda de luminosa alegria transportou os peregrinos até ao cimo de CASTELÕES, lá, à SENHORA do ENGARANHO.

 

 

Romeiro de Alcácer

29
Jul11

Discursos Sobre a Cidade - Por António Sousa e Silva


 

O MAIS DO MESMO

 

I


Nunca fui apoiante indefectível de José Sócrates, como socialista. Aprecio-lhe algumas qualidades. Não votei nele para secretário-geral do PS e não o considerava o primeiro-ministro para o meu país.


Por isso, após a sua eleição, fiquei afastado da vida política activa nas estruturas de base onde milito.


Tenho por norma ser frontal e não carreirista. O PS engalanou no canto da sereia do ator. Os mais competentes, infelizmente revelando-se verdadeiros oportunistas, viveram à sombra do “trabalho sujo” dos outros, recebendo “encomendas” e “prebendas”.


Não foi para mim grande deceção a derrocada do dia 5 de Junho. Não foi só a derrota de José Sócrates, foi a de um certo PS, que se consolidou nestes últimos anos. Que se revelou igual ao PPD/PSD. Em muitos aspetos, retintamente iguais.


O que assistimos no dia 5 de Junho foi à derrota de um partido que deixou na gaveta da história os pergaminhos dos valores que o consolidaram como um grande partido da esquerda portuguesa e europeia; que não acompanhou a mudança radical em que a sociedade atual  está transformando a vida de todos nós, e incapaz de apresentar e construir um projecto de futuro que galvanize os portugueses para uma nova gesta, face a uma nova sociedade, totalmente transformada.


O PS de José Sócrates geriu mal o presente e não apresentou nenhuma visão de e para o futuro. Ficou-se somente nas mundividências problemáticas do curto prazo.


Diz a comunicação social que José Sócrates meteu “licença sabática” e vai para Paris frequentar aulas de filosofia política. Um dos professores é o seu amigo Daniel Innerarity. Pena é que não o tivesse lido e assimilado antes. Talvez alguns amargos de boca teria evitado, poupando-nos de vivermos, cada vez mais, numa sociedade bloqueada, como a em que vivemos. Enfim, mas tudo tem o seu tempo, não é?


E o que temos pela frente?


Inquestionavelmente, austeridade. E mais austeridade… não se sabe até quando. Paga pelos sempre mesmos! Imposta por um governo de direita. Que nos diz vir-nos salvar dos desvarios da esquerda. Com o beneplácito de uma esquerda radical, troglodita, bloqueadora, e não raras vezes assassina, incapaz de contribuir para a construção de uma esquerda moderna. Esquerda esta, assistente pacífica de um certo neoliberalismo que nos governa, vivendo de quezílias internas e apegada a valores velhos de um passado sem retorno e pouco à-vontade com as mudanças essenciais de uma sociedade hipercomplexa.


E que PS temos?


O mesmo de sempre, nestes últimos anos. Muito provavelmente para pior.


No poder e na oposição temos dois amigos: Passos Coelho e António Seguro. Nados e criados nas hostes dos aparelhos dos dois maiores partidos portugueses. Partidos estes que têm vivido à sombra do aparelho do estado, entendido quer como administração central, quer como autarquias, quer como empresas públicas, quer como institutos, quer como fundações e quejandos. instituições sustentadas, pacificamente, por todos nós, convencidos que desta total chinfrineira, a que globalmente chamamos estado que nos governa, que, individualmente, algum proveito retiramos. Esquecendo-nos que quem paga são sempre os mesmos, como está à vista!


Porque quer Passos Coelho quer José Seguro são iguais, retintamente idênticos. O que os diferencia é a retórica, o discurso. A praxis é a mesma.


O estado é um imenso polvo, com enormes ramificações nas empresas monopolistas que nos exploram, comandado pela partidocracia do bloco central. Que envolve e comprime a sociedade civil, retirando-lhe o seu normal e adequado protagonismo. Que asfixia o indivíduo. Um estado castrador da autonomia e obstaculizador da emergência de um verdadeiro espaço público, onde se possa exercitar a cidadania.


A eleição do secretário-geral do PS  foi um momento perdido na discussão e procura do que seja hoje uma verdadeira esquerda, face a uma sociedade cada vez mais complexa, exigindo um novo modelo de ação e de participação política.


Francisco Assis, no início da campanha, prometia algum dinamismo. Cedo, porém, ficou refém da história, do seu passado recente, não encontrando forças para o saber gerir e melhor explicar as suas ideias.


Aquilo que os militantes socialistas votaram nos dias 22 e 23 de Julho passado foi num novo impasse.

 

II

 

O PS de Chaves votou maioritariamente Francisco Assis.


Era espectável que assim fosse. Não fosse a presidente da estrutura da concelhia uma amiga do peito de Assis. E os anos que teve de Assembleia, no convívio com os seus pares, já lhe ensinaram o suficiente em termos de como controlar o aparelho.


Gostaria, porém, de ter visto uma eleição mais participada, e não um clima amorfo, sem esperança e com pouca alegria. Nestas eleições faltou futuro, uma certa visão do futuro. Que é suposto os partidos terem e incentivarem nos seus militantes, galvanizando-os para o trabalho político que há pela frente. Porque nunca, como nos tempos que correm, precisamos da política. Também da política. Porque é ela que dá sentido e vida às sociedades em que vivemos.


É por isso que sou muito cético em relação ao nosso próximo futuro, em termos de poder autárquico.


E não é só pelos constrangimentos de ordem financeira que, é bem certo, nos condiciona enormemente. Mais por três ordens de razões.


A primeira, é que o atual modelo de gestão autárquica se esgotou. E não se teve coragem de, há mais tempo, o alterar. A gestão territorial tendo como base apenas os municípios e a administração central não se coaduna com a sociedade em que hoje em dia vivemos. Porque demasiada centralizadora e hierárquica, por um lado; e excessivamente caciquista e despesista, por outro. Que nos levou à desertificação do interior e a um excessivo e desordenado povoamento do litoral, exibindo assimetrias demasiado flagrantes para um país tão pequeno como o nosso.


A segunda, decorrendo da primeira, e depois de mais de três décadas deste poder autárquico, urgia que se tivesse repensado num novo modelo de gestão territorial, mais consentâneo com a realidade que hoje temos. Nada disso foi feito! Perdemos, infelizmente, a oportunidade da regionalização. Porque os intelectuais do poder central lisboeta e alguns renegados de última hora do PS, aproveitando o exacerbamento dos bairrismos locais, achavam, propagandeando, que era excessivamente dispendiosa; que iríamos engordar mais o estado com despesas. Enquanto aqueles “pseudogurus” enchiam, e continuam a encher, seus bolsos, escandalosamente, como presidentes e administradores, de empresas públicas, institutos, fundações, e que mais alcavalas. Não houve coragem de reestruturar a administração pública, acabando com a lógica do funcionamento político partidário assente nos municípios e nos círculos distritais para as campanhas e atos eleitorais. E vêem-me agora com a não nomeação de governadores civis! Estes novos senhores insultam a nossa inteligência, bolas!...


A terceira ordem de razões tem a ver com o perfil dos candidatos que se perfilam para a próxima Câmara de Chaves. Urge que quer Paula Barros, pelo PS, quer Cabeleira, pelo PPD/PSD, se mostrem. Que nos apresentem as equipas com quem pretendem trabalhar. Que visão têm para o futuro da nossa terra. Que programa e projetos para o efetivo desenvolvimento do município. Que digam qual o papel de Chaves no contexto territorial onde se insere e como trabalhá-lo. Urge que quer uma quer outro mostrem, apesar da mesma idade, de pertencerem à mesma geração e da idêntica experiência política, onde são diferentes (para além de uma ser mulher e outro homem). Que o munícipe eleitor sinta onde está o candidato da direita e a candidata da esquerda. Que o eleitor munícipe veja onde estão as verdadeiras opções. Opções que façam sentido. Enfim, que façam vir ao de cima verdadeiras escolhas e não tão só a pose do ator ou atriz. Ou seja, em que somente valha o valor do fulanismo…

 

 

António de Sousa e Silva

28
Jul11

O Homem sem Memória (60) - Por João Madureira


 

Texto de João Madureira

Blog terçOLHO 

Ficção

 

60 – Ele apareceu. Ela não. Nunca se sentiu tão triste. Foi para o seminário e escreveu-lhe uma carta que intitulou como Primeira Epistola de José à Sua Namorada. Rezava assim: Esperei-te mesmo antes de te esperar. Esperei toda a noite que amanhecesse. Esperei toda a manhã que chegasse a hora do almoço. Depois esperei pela hora da saída dos estudantes do Liceu. O tempo não passava como era habitual. E, decorridos os dez minutos que se demora a chegar ao jardim, desesperei. Esperei mais um pouco. Esperei outro. E outro ainda. E tu não apareceste. Apenas alguns pares de namorados sorridentes, de olhos brilhantes, a chilrear como pássaros ao sol, com as mãos saltitantes e com as bocas sequiosas, é que se passeavam na minha frente numa felicidade que me magoou até à alma. Pareciam querubins. Mas tu não chegavas. Tu, definitivamente, não chegaste. Desesperei mais um pouco e como, irremediavelmente, não apareceste, voltei para o seminário. Não consegui jantar. Os padres vieram ter comigo ao quarto e perguntaram-me se estava doente. Disse-lhes que não. O que era mentira. O que eu sentia era doentio. Só podia ser. Não está bem de saúde quem sua porque pensa numa mulher, ou quem chora porque não ouviu a sua voz, ou quem se desespera porque falhou um encontro. Não se encontra no seu perfeito juízo quem faz juras de amor a Cristo na cruz pensando exclusivamente na namorada. Não se encontra nada bem quem pensa vender a sua alma a Lúcifer em troca de conquistar a mulher cobiçada. Poucas vezes me senti tão mal. Nem depois da operação às amígdalas. Perguntaram-me os pinguins do seminário se tinha, por alguma razão especial, iniciado algum jejum espiritual. Disse-lhes que sim. E não menti. Se na noite anterior tinha adormecido como um santo, nesta dormi como um demónio agitado. Não sonhei contigo. Sonhei com a tua ausência. Eu, que ainda não tinha conseguido incorporar-te na minha consciência, comecei a sofrer a tua ausência. E isso é como estar doente antes de o estar. Eu, que ainda mal comecei a adorar o teu sorriso rápido e claro, a estimar o teu olhar doce e sincero, a amar o teu andar decidido e perplexo, o teu corpo esguio e bem esculpido, desabei em cima da minha credulidade. O amor não é um fogacho. Eu é que sou para aqui um parvo que se apaixona logo ao primeiro olhar. Uma rapariga como tu, para mim, é uma deusa. Mas eu para ti devo ser algo como um foguete numa festa de Verão. Sinto que não te toquei o coração. Eu sou para aqui um parvo a quem deves ter concedido alguma da tua amizade. Mas eu, para que saibas, não consigo ter amigos, quanto mais amigas. É estranho que nunca me tenha sentido tão só na vida. Eu que sou um solitário. Não consigo ler, não consigo comer, não consigo falar. Rezo. Mas não a Deus. Rezo para ti. Rezo porque tenho pena de mim próprio. Rezo como uma beata para que não me deixes. Tu que ainda mal chegaste à minha vida. Rezo para que o tempo passe rápido. Rezo para que apareças. Rezo para que sejas o meu milagre de Fátima. O amor entre dois seres humanos é uma coisa quase demoníaca. É uma febre de posse terrível. Penso nos teus olhos e quero-os só para mim. Quero-os fixos nos meus. Sem se poderem desviar para mais ninguém. Penso nos teus lábios e remordo-me de ciúme só de pensar que possam ter beijado algum outro rapaz.  Eles que nem tocaram nos meus. Penso nas tuas mãos e assemelho-as às da Virgem Maria que se encontra no altar da capela do seminário: alvas, frágeis, doces. Sofro porque não te tenho. Penso no teu corpo e ardo de desejo. E sofro. Sofro porque penso na possibilidade de que outro, que não eu, o possa possuir. Sofro porque não te tenho. Sofro porque te espero. Sofro porque te desejo. Sofro porque não te vejo. Sofro porque mal te conheço. Sofro porque sofrer tanto depois de um encontro com uma rapariga que mal se conhece é tão estúpido que dá pena. Sei que outros da minha condição, por amarem tanto como eu, flagelaram a sua carne com severidade. Eu não consigo. Sou capaz de morrer à fome por um ideal. Mas bater em mim próprio não consigo. Essa talvez seja uma outra forma de prazer. Perverso por certo, mas prazer. No fundo, o prazer é uma outra forma de dor. Por isso é que gememos quando atingimos o orgasmo. E quanto mais prazer temos mais gememos. É uma dor ao contrário. Antes de me sentar para escrever esta carta joguei xadrez com um colega que se tem revelado um quase amigo. E digo quase porque eu não consigo ser verdadeiramente amigo de ninguém. Bebi quase uma garrafa de vinho do porto. Perdi a partida de xadrez mas ganhei coragem para te escrever o que acabei de escrever. Peço desculpa pela sinceridade. Mas o meu compromisso com a verdade é para mim sagrado. Amo-te. Não há outra maneira de dizer aquilo que sinto. Mas sou pessoa para te dizer que a palavra não encerra em si tudo aquilo que experimento. Além de me parecer um pouco estúpida. 

 

61 – Sábado de manhã, quando o dia começava a resplandecer, quando os pássaros prolongavam os seus voos, quando as flores começavam a brincar com a luz do sol e com as cores do arco-íris, José ...

 

(continua)

27
Jul11

Palavras colhidas do vento... por Mário Esteves


 

Isto de computadores tem os seus “quês”, como os “Vila Real”, finos doutores de couro e sovela, com estabelecimento próprio no cimo da rua Direita, diziam acerca da sua nobre arte de fazer, remendar, pôr solas em toda a qualidade de calçado.

 

Razão tinha, também, o senhor Albino, oficial do registo civil, a reforma escancarada, ameaçar o conservador, que se lhe mandasse trocar a sua amantíssima cara-metade, a vetusta, mas olorosa e resplandecente Remington, por uma eléctrica, metia logo os papéis de aposentadoria.

 

Como o senhor Ribeiro, à beira do despacho de passagem à reserva, solicitou o mesmo destino para a sua fiel auxiliar, uma máquina de escrever, modelo a perder-se nas poeirentas estantes do arquivo da administração pública, de teclas tão gastas, cujo trabalhar sereno e cadenciado, era a nota dissonante e agradável na repartição.

 

 

E por inteira justiça e dedicação, ainda pedia para ela, que o seu retiro do serviço merecesse honras de publicação no boletim oficial.

 

Ou o amigo VVV, de idade indefinida como a máquina que tinha a seu serviço, mas tão sua amiga, que se amparavam de tal forma, que ao aproximar dos seus dedos, as teclas pareciam bater sozinhas no papel selado.

 

Ao contrário do vizinho da frente, que batia nas teclas como maço no linho. Um caso de violência no trabalho, que a imponente estátua no átrio do palácio de justiça, tinha artes de não ver, tão ensimesmado estava na oratória.

 

Não sei se os computadores merecerão amores tão correspondidos e leais.

 

Confesso que o meu, tecnologia “made in China”, parece ter vida própria, algumas vezes escreve o que não escrevo e já chegou ao topete de recusar-se a fazer o que pretendo…

 

Desconheço se é falta de destreza minha, coisas de iniciado ou então maquiavélica conspiração.

 

Muito “um país, dois sistemas”, muitas reverências ao estado democrático e aos direitos humanos, mas quando desaprovo em surdina as prisões arbitrárias ou a indigna exploração do trabalho infantil, notícias vindas nalgum jornal, é certo e sabido que se recusa a trabalhar por causa duma enigmática virose…

 

 

Há meses substituíram parte das lajes centrais do pavimento da rua Direita, muitas das quais e em alguns sítios, estavam partidas. O mesmo ocorre na rua do Poço, sensivelmente há tanto tempo, como antes na rua Direita, parecendo-me que naquela, mais que partidas estão esmigalhadas.

 

Não se compreende como numa foram reparadas e noutra ignoradas.

 

Parece haver diferentes classes de ruas, como antes nas carruagens do desaparecido comboio da linha do Corgo.

 

Primeira classe: cadeiras com estofos de veludo e cortinas a condizerem. Segunda classe: estofos em pele de napa grosseira e cortinas em algodão de cor ocre. Terceira classe: bancos corridos de ripas envernizadas e cortinas de tecido ou plástico de cor indecifrável.

 

Lembra o que contam de uma picaresca personagem da cidade, muito propalada pelos enredos jocosos nos quais se via envolvido.

 

Alguns aconteceram na realidade e outros a si atribuídos, de invenção anónima e popular.

 

Que existiu posso afiançar, pois conheci um descendente, que costumava abancar no comércio Paulo, roupa de cavalheiro, senhora e criança, na rua de Santo António, pouco antes do almoço, na pilhéria, últimas do futebol e politica, gastronomia vária de dentro e fora portas.

 

Vamos ao conto, que o tempo urge e o Fernando impacienta-se.

 

Uma alta individualidade do Estado visitaria Chaves e foi deliberado pela edilidade constituir uma comissão para preparar a recepção.

 

Nessa comissão o nosso protagonista ficou a cargo das ornamentações e iluminação das principais ruas da cidade.

 

 

A data da visita aproximava-se e se as ruas estavam na maior parte engalanadas, a única que tinha luminárias, era a rua dos Gatos, então paraninfo da prostituição da urbe.

 

Os colegas da comissão reuniram de urgência, preocupados pela falta da iluminação das ruas e perante o que consideravam mais uma toleima do seu homónimo.

 

“ O homem ensandeceste de vez! Então, Sua Excelência está quase a chegar e as ruas mais importantes estão às escuras; a única que tem iluminação é a rua dos Gatos, logo a rua que não devia ter…!” - Exclamaram, quase em uníssono.

 

“ Quem tem pressa compra um burro, tranquilizai-vos, tudo estará pronto quando chegar Sua Excelência.” - Intentou deitar água fria na fervura dos parceiros.

 

“ Mas, que ideia foi a tua de iluminares a rua dos Gatos?” - Protestaram .

 

 Um deles, tão arrogante como irado, atirou:

 

- “ A rua dos Gatos …! Além de néscio é insolente, que dirá Sua Excelência?”

 

A reunião estava a descambar para um altercado, de tal modo que as vozes exaltadas já se faziam escutar na rua, quando se ouviu no meio do clamor:

 

-“ Vós falais bem, mas esquecestes uma coisa. E se à noite, Sua Excelência quiser ir às p…!”

 

Mário Esteves

26
Jul11

Pedra de Toque - A Polémica


 

 

A POLÉMICA

 

Gosto da polémica.

 

Quando emito opiniões com as quais os meus amigos discordam, discuto-as com muito afinco.

 

Sempre me entusiasmaram os grandes debates, com que vultos da literatura, da religião e até da política, arrebataram leitores na imprensa ou em públicas tertúlias.

 

Na minha longa vida profissional, o litígio, sempre com respeito pelo contraditório, foi uma constante que me espicaçou a argúcia e motivou reflexão.

 

A polémica é pois, para mim, um prazer.

 

E quando, por vezes, “o calor da luta” tolda a lucidez, vem ao de cima a tolerância que conduz, na falta de consensos, à desejada paz e compreensão.

 

Muitos amigos de longa data que me conhecem bem e têm a gentileza de ler esta Pedra de Toque, já me incitaram a escrever textos defendendo as minhas posições, as minhas ideias, nomeadamente sobre política local, nacional e até internacional, temas que seriamente me interessam.

 

Não o faço, contudo, pelo fundamentalismo e fanatismo político que depois se esconde no anonimato de muitos comentários.

 

 

A iliteracia, a ignorância quase sempre aliada ao sectarismo e à estupidez, tantas vezes veiculados através do insulto, incomodam-me, magoam-me e fazem-me perder a paciência.

 

Por isso, vou continuar a polemizar, sim, mas tão só com aqueles com quem tenho afinidades culturais, com aqueles com quem posso aprender apesar das opiniões díspares.

 

Esta Pedra vai continuar, no entanto, a bulir reavivando a memória tão esquecida da nossa milenária cidade, com estórias de figuras da minha terra que certamente não constarão dos compêndios, mas que são ou foram homens e mulheres de carne e osso, que mereceram estima pela sua generosidade, pela sua inteligência, pela sua simplicidade.

 

Também manterei notícias deste nosso Reino Maravilhoso e verterei, de quando em vez, assomos despretensiosamente poéticos que me saem dos sonhos e da alma.

 

Voltando à polémica.

 

Com elevação, condescendência, discutirei sempre nos moldes do costume.

           

Até porque, acredito que

 

Da discussão nasce quase sempre a luz.

 

 António Roque

 

26
Jul11

Verdade ou Consequência?


 

Verdade ou consequência!? – ou será antes o jogo do “Descubra as diferenças”!? Seja qual for…não gosto de jogar, gosto mais de implodir com o Photoshop os erros do passado, só lamento mesmo é não ter o seu poder na realidade...

 

 

Graças a Deus, ou melhor, ao flaviense e Mestre Nadir Afonso, à sua Fundação e a Siza Vieira, as coisas podem melhorar. Já sei que não têm o poder da implosão, mas pelo menos têm o poder da tapar mamarrachos. As obras já começaram, mas o melhor é estar caladinho e não deitar foguetes antes da festa, pois para já apenas estão a fazer levantar poeira…

 


25
Jul11

Quem conta um ponto... Por João Madureira


 

Diálogos perspicazes com final pouco feliz

 

Um pouco por desfastio intelectual, passei cerca de três minutos a contar ao R. uma história que me tinham contado acerca da compreensão humana – aliada a um instinto quase animal do labor político –, de Salvador Allende. Situação que chegou a suscitar sentimentos contraditórios nada fáceis de resolver pelos seus correligionários e pelas forças da ordem. Sendo já presidente, um homem desfilou à sua frente numa manifestação levando um cartaz insólito: “Este é um Governo de merda, mas é o meu Governo.” Allende levantou-se, aplaudiu-o e desceu para lhe apertar a mão.

 

R., após uns longos minutos de mutismo reflexivo, virou-se para mim e pronunciou: “A minha avó sempre me disse para desconfiar dos homens que contam boas histórias.”

 

O L., claramente irónico, soletrou várias vezes a palavra maravilha e, por fim, suspirou: “Depois de te ouvir falar estou para aqui todo arrepiado. O que por aí vai de hipocrisia e ilusão. Valha-me Nossa Senhora”, rematou ele que é um ateu não praticante.

 

Ao que o F. aduziu: “Tenho saudades dos tempos em que não dizias nada para teres sempre razão.”

 

“O silêncio dos humanos não é a ausência de fala, é, antes, o dizermos tudo sem articularmos uma só palavra, por muito singela que seja”, retorqui o L.

 

“Porra”, disse eu, “deslumbraste-me. Poucas vezes te ouvi falar tão bem. Fiquei mesmo cheio de inveja da tua eloquência.”

 

O R., armado em bom, ripostou: “Eu tenho muito medo da inveja. Pois a inveja é a mãe de todos os vícios.”

 

“Tu por vezes assustas-me um pouco com a tua lógica”, disse eu. E continuei: “É a vida. E na vida ninguém está para ficar. Aqui só se está de passagem.”

 

“Na vida e no Governo”, lembrou muito bem o R. A seguir tentou armar-se em apoiante crítico do novo governo e soletrou a modinho: “Coitado do Pedro Passos Coelho, quando pensava que, com as medidas de austeridade, tinha ganho a manteiga para pôr no pão, faltou-lhe o pão… E o alho que agora está muito na moda.”

 

“O homem embandeirou em arco com o vitória nas eleições legislativas, mas agora anda caladinho que nem um rato, pois descobriu que a crise internacional era mesmo verdadeira”, lembrou lucidamente o F.

 

Então, de repente, saiu-me esta brilhante metáfora, que de certeza li em algum lado: “Não se sobe às árvores pelos ramos”. Bem, confesso, esta minha tirada deixou-os boquiabertos. 

 

Depois de mais uns momentos de silêncio expectante e reflexivo, o L. resolveu elogiar-me com a sua fina ironia: “Talvez seja a experiência da escrita quem te confere essa grande dimensão de visionário de província. E o facto de estares comprometido com o sistema que tanto criticas é que te permite uma ironia interessante.”

 

Eu que sou homem que não me deixo calar com duas tretas, mesmo que sejam verdadeiras, o que não era, manifestamente o caso, elevei o tom do discurso: “Ignatus, o célebre personagem do romance Uma Conspiração de Estúpidos escreveu, numa carta que pretendia servir como pagamento de uma viagem de táxi, o seguinte: «O universo, é claro, baseia-se no princípio do círculo dentro de outro círculo. De momento encontro-me num círculo interior. É evidente que também pode haver círculos mais pequenos no interior deste círculo.» Apesar da excelente visão do mundo, o motorista obrigou-o a pagar a viagem em dinheiro. Esta é a dura realidade da vida dos autênticos escritores e pensadores.

 

“Tu”, disse eu virando-me para o L. “és o típico homem justo numa sociedade injusta.” Ao que ele retorquiu: “Era a ti quem as irmãs adoravam porque costumavas ganhar todos os santinhos por saber o catecismo.”

 

Então resolvi ser mesmo maroto. “Pelo menos não me deixo transformar num idiota que só gosta de televisão, de carros novos e de comida congelada. Nem ando no psiquiatra. A psiquiatria é pior do que o comunismo, lava-nos o cérebro. E eu não quero ser um robô. Eu sou um homem simples.”

 

Reconheço que fui indelicado, porque o L. anda a ansiolíticos por causa de uma depressão. Mas estava mesmo a pedi-las. E, por vezes, o pensamento é bem mais rápido do que as conveniências. Além disso, o que está dito, dito está. Mas, mesmo assim, fiquei com pena do L., pois naquele momento era a imagem de um guerreiro vencido, sem guerra e sem tropas. Como escreveu Mia Couto acerca do barbeiro Arcanjo Mistura, naquele momento eu próprio fiz o papel de cegocêntrico. E por isso me penitencio.  

 

João Madureira

 

24
Jul11

Treze Contos do Mundo que Acabou


 

 

 

Conto III

Um macho de cem moedas

 

 

          - Do céu te venha o remédio! - sentenciava agoirenta a Ermelinda Landainas, sabedora do génio estuporado do Avelino.

 

           - Não cuides que te livras assim da santa obrigação, que quem boa cama fizer, nela se há-de deitar. Bem, a verdade tem um caminho, se ela não se tem posto a jeito, nada disto tinha sucedido. Parecia que andava levantada à cainça, de roda de ti como traça de roda da candeia, e quando a cabeça não presta é o corpo quem nas paga. Mas agora mais te vale ires ter com o pai, às boas, antes que o saiba por outros e dê cabo dos dois. Olha que ele não é bom de assoar! Eu lá botarei uma mão no que puder.

 

          Bem sabia o Ramiro que não adiantava chorar. O que estava feito, feito estava, e quanto mais cedo levasse a rapariga ao altar mais depressa calava as bocas do mundo. Assim o Avelino estivesse pelos ajustes.

 

          Até aí, bem lhe tinha corrido, que as moças casadoiras no povo, mesmo sabendo que ele não era coelho de um toco só, pelavam-se por um belisco ou um apalpão. Ainda que muito barafustassem ou se fizessem rogadas, certo é que coravam de gozo sempre que ele lhes roubava um beijo, à conta de as ajudar a erguer o cântaro da água ou o braçado da ferranha. Para mais, um moço destes, gerigoto e afeito ao trabalho, com bens ao luar, não era partido que se enjeitasse.

 

          E não foi coisa que não pesasse na decisão do Avelino. Como assim, mais cedo ou mais tarde a rapariga tinha de lhe sair porta fora, e se havia de ser atrás das falas mansas de algum lapantim sem eira nem beira, antes com este que não se enojava de botar a mão a qualquer serviço da lavoura, e o pai trazia vacas ao ganho e pessoal à jeira o ano todo.

 

          - Isto de terem posto o carro adiante dos bois é que se escusava bem... Se a mãe, que Deus tenha, fosse viva sumia-se com a vergonha! Eu bem sei o que eles precisavam, ambos...  

 

Esse engulho não lho tragavam os gorgomilos, ainda que a Ermelinda, com firmados créditos de alcoviteira, tentasse dourar a pílula:

 

          - Deixa lá, homem, que serviço feito não mete pressa! Andais com a boda para a frente enquanto a barriga lhe não sai, e alma até Almeida. O que se quer é que a Senhora do Ó lhe dê uma boa hora e o crianço venha a nascer escorreito. O tempo é um poço sem fundo, tudo esquece...

 

 

          Dali em diante, a Adélia quedava-se mais por casa, na lida da cozinha e a acomodar a fazenda, não dando ensejo a que as outras tivessem ocasião de puxar pelo fio à meada, que penas que não são vistas não são lembradas, e bem sentia que dos olhos de algumas a inveja faiscava como chispas à boca do fole. Por vezes até os dentes se lhe riam, sozinha de volta dos potes, só de pensar no que correram e fizeram, com rezas e cartas deitadas pela Marquinhas da vila, e afinal só ela tinha levado a água ao moinho. Guardado está o bocado para quem o há-de comer... O Ramiro é que passou a dançar consoante a música. Se cruzava com alguém na rua ou entrava na taberna, cara alegre e coração ao largo. Se os caminhos eram os da noite, olho vivo e pé ligeiro, mão no bolso a apertar o ferro, percatado de algum mau encontro e a angústia sempre a roê-lo por dentro. Em que trabalhos se havia de ter metido, raios partam a sorte! Para mais, dizia-se à boca cheia que o Jacinto das Carvalhas, dado ao desprezo pela rapariga, e sabedor do rumo que as coisas levavam, tinha jurado a pés juntos que, se ela não era para ele, também não havia de adoçar a boca a mais nenhum, e que sabia muito bem o que tinha a fazer. Que esperassem, não perdiam pela demora!

 

          - Se ele te provocar, tu não te encolhas, que aqui no povo saímos todos por ti! - gritava-lhe o Sendim, mortinho que andava por ter ocasião de ajustar umas contas velhas com os das Carvalhas.

 

          - Cautela que o gajo morde pela calada! Com um corpo daqueles e, o mais das vezes, é à falsa fé que as prega.

 

Não se esquecia o Firmino da estadulhada que lhe moeu as costelas, e que nem tempo teve de ver os olhos do salafrário, tal era a confusão de gente e de paus de roda do boi, quando venceu o deles na chega de Bridães.

 

          -Sossegai, que se vier à lã pode ser que saia tosquiado, e não há-de ser preciso meter mais ninguém ao barulho. De homem para homem não vai força de boi!

 

          Os dias sucediam-se ligeiros e o padre Luciano deu-se pressa a tratar dos papéis, não viesse o escândalo a ser maior que a barriga da Adélia. Corridos os banhos, estava a boda aprazada para o último domingo do mês, tempo bastante para o Avelino encomendar o vinho e os cordeiros e marcar a vez no forno do povo, onde a Ermelinda ficou de os assar com batatinhas novas. O vestido branco também não tardou a passar a última prova, com as pregas bastantes para acolher discretamente o ventre que começava a empinar. A Zefa costureira poucos tinha feito em toda a vida, mas quem faz um cesto faz um cento, se lhe derem verga e tempo.

 

          - Oh tia Zefa, acha que avulta muito?

 

          - Não, sossega que o caso é bom de remediar, com estas preguinhas que lhe botei...E que avultasse?! Cuidas que és a primeira?

 

          - Não, mas é por via do falatório, já bem basta o que é, e o senhor padre Luciano, coitado, foi o que mais me recomendou, que arranjasse de maneira a não o fazer passar mais vergonhas...

 

          - É um santo homem, não fiques em cuidados por causa dele. Aos anos que tem, bem pode saber já como é a vida. Agora, às invejosas, deixa que falem, que a algumas ainda lhes há-de rebentar a língua na boca! E olha, não é por me gabar, mas há bem anos que aqui no povo não entra noiva tão bem trajada na igreja!

 

          O fumo cheiroso do forno enrolava-se devagar nas brumas sensuais daquela manhã de princípio de outono. Quem passava, por obrigação a caminho dos lameiros, com as crias a embalar a pachorra no compasso dos chocalhos, sorvia com avidez o aroma dos assados e só lhe lembrava que seriam já os do casamento da Adélia. Era domingo, e não fora a azáfama das mulheres de roda da casa do Avelino, parecia que o povo todo se recatava por detrás de uns silêncios cautelosos, por certo à espera de poder esgrilar o passo da noiva para a igreja, sem que ela desse conta dos murmúrios à boca pequena. Daí a nada o sino chamava para a missa e as ruas animaram-se em resposta.

 

 

          No adro, os rapazes puxavam umas fumaças, entre chistes e larachas que mais atiçavam o tremedoiro do Ramiro. A ansiedade não o deixara pregar olho toda a noite e o vinho emborcado de véspera, no adeus às borgas de solteiro, ainda agora lhe baldeava no estômago, a pontos de os olhos se esbugalharem na ardência dos vapores da ressaca.

 

          - Que tal te puseste, todo embonecrado, parece que vais à madrinha, oh Ramiro!

 

          - Deixa, que quebrar uma perna há-de ser pior! Põe outra cara, e não te aflijas que se não fores homem de dar conta do recado logo à noite, estamos aqui nós, temos de ser uns para os outros!...

 

          - Vá, a ver se tendes tento na língua! Botai cá mais um cigarro que já me estranha a demora da Adélia...

 

          - Se calha arrependeu-se! Vais ver que ainda não é desta que te deixas atrapar!...

 

          A Adélia subia a rua com passos inseguros, empelouricada a custo nos sapatinhos brancos, a fralda do vestido a arrastar pelo chão, as bochechas ruborizadas da vergonha mal disfarçada e a vista pregada nas costas do pai, que seguia à frente cuidando que tapava o sol com a peneira, crendo que encobria o que já todos tinham visto. De súbito o silêncio tenso da manhã rasgou-se de alto a baixo como se o tivesse fendido um raio:

 

          - Oh tio Avelino, cuidava vossemecê que tinha aí um macho de cem moedas, afinal acabou por lhe borrar nas barbas! Tivesse ela vergonha, cobria era a cara, que a barriga não paga a pena, já está bem empertigada! À porta da taberna, de copo na mão e os olhos raiados de ódio, o Jacinto acabava de deitar da boca para fora palavras que, bem sabia, não tinham retorno, como os zagalotes à boca dos canos de uma Sarrasqueta. Que mais dava?! Era um homem perdido. Mal entrara a porta para dentro a pedir bagaço ao tendeiro, com desculpas de ainda não ter matabichado, todos viram que já trazia um grão na asa e as intenções não seriam as melhores.

 

          - Oh Jacinto, tu vê lá no que te vens meter...Aqui dentro não quero estrilhos!

 

          - Tio Ivo, bote lá o bagaço e não se meta adonde não é chamado, que é melhor para todos! O que tem que ser tem muita força, e no inferno ainda há lugares de vago...

 

          Cá fora, depressa se juntou um magote de gente, mas ninguém se chegou à frente. Porém, ao Avelino, foi como quem o cegou com sal. Engalfinhou-se nele e rebolaram ambos nas lajes da rua. Só então acorreram uns quantos a desapartá-los. Da cara de um e de outro já o sangue escorria quente e pastoso. Parecia impossível, um homem daquela idade e a força que ainda tinha!

 

          - Anda lá grande filho da puta, que a tua sorte é eu hoje não trazer comigo com que te pôr as tripas ao sol!

 

          - Descuide, que este não torna a faltar-lhe ao respeito, nem a si nem a mais ninguém!

 

Era a voz ainda ofegante do Ramiro que, em menos de um ai, tinha corrido desaustinado a defender o que lhe pertencia. O arcaboiço do Jacinto cambaleou, já sem acção, até encontrar o repouso inerte no chão. Do peito largo e robusto saía agora um fiozinho de sangue a assinalar o lugar onde a bala tinha posto um ponto final naquele desassossego.

 

           A Adélia, com o coração mais apertado que um punho, não se conteve e desatou num berreiro patético:

 

          - Ai, o que vai ser de mim e do meu filhinho?! Deus tenha misericórdia!

 

          - Pára de berrar, rapariga, que sem pai é que ele não fica! Quero que todos fiquem cientes que não vai nascer zorro, que o pai sou eu! O casamento é que tem de ficar para depois. Em podendo, mando notícias. Até sempre!...

 

          E desandou, antes que alguém fosse dar parte à Guarda Republicana.  

23
Jul11

Galego-Português, Português antigo e Português/Galego actuais


 

 “As imagens também nos falam, dizem-nos coisas, contam-nos estórias e história. Esta sugere-me e leva-me por aí fora, desperta sentimentos, contos  de amor e ódio e tantas outras coisas, mas agora, fico-me por aqui. Mais logo virá a mesma imagem com as palavras que em mim despertou. Para já apenas esta imagem e, já a seguir, os Pecados e Picardias de Isabel Seixas.”

 

Foi assim que terminei o penúltimo post e, como não sou político e ainda cumpro as minhas promessas, aqui estou com o post prometido, que sei desde já, que será apoiado por uns, incompreendido por outros e contestado por muitos, mas a mim pouco me interessa o que fiquem a pensar deste post, pois é o que eu penso e sou teimoso, e sou flaviense, e sou um português do Norte ou um Galego-Português - que vem a ser a mesma coisa e, quem não pensar assim, paciência, pode abandonar a carruagem ou então, ponham-me fora dela, que a mim, já disse – tanto me faz e depois, lá diz o povo que mais vale só… e o povo sabe sempre o que diz,  e o povo tem sempre razão, e eu sou do povo.

 

Então aqui fica a imagem que despertou esta prosa e toda a que se segue:

 

 

 

 

As guerras entre vizinhos sempre existiram. Quer sejam daquelas mesmo a sério, com pancada, mortes e tiros ou das outras mais suaves, simples picardias, arrufos e troca de galhardetes. São, todas elas, guerras de território, de domínio, de interesses, de influência, de castas e famílias ou simplesmente de estar. São, ao fim e ao cabo, o lado animalesco da civilização humana de marcar e possuir territórios, tal como o nosso cão vai marcando os muros e as esquinas das nossas casas com o seu chichi… Tudo isto, para dizer que há por aí muita boa gente a quem é comum ouvir dizer que não gosta de espanhóis, precisamente, e quase apenas, por serem vizinhos, onde o argumento das guerras e invasões e divisões do passado servem e chegam para justificar o seu sentimento e, felizmente que só conhecem a história mais recente, senão, não gostariam de meio mundo e abominariam toda a Europa à qual pertencemos, pois segundo reza a história conhecida, desde os celtas, aos romanos, aos bárbaros, mouros e mais recentemente os franceses com as suas invasões, vierem aqui meter o bedelho metendo-se com quem cá estava. E quem é que estava cá? – Curiosamente, também reza a história que somos feitos de um pouco de todos os que nos invadiram, pois a raça portuguesa nem sequer existe, não tem certificado de origem, não tem pedigree… mas não entristeçamos nem se ponham praí a ouvir ou cantar fados, pois para nosso contentamento poucos serão os povos neste planeta que se possam honrar da sua genuinidade de raça, e depois,  sempre temos a nossa cultura e ia dizer também  a língua, mas essa, felizmente,  já não é só nossa.

 

Cambedo - (Dizem os mais velhos que o prédio da foto era traçado a meio pela fronteira entre Portugal e Espanha)

 

 

Pois foi a imagem inicial que me levou até estas palavras de introdução mas também às seguintes.

 

Observando bem a imagem, o céu é azul é uniforme, as montanhas estendem-se sem interrupção no horizonte mais distante e, mais perto do observador, alguma montanha com ou sem floresta. Um pouco menos perceptível, mais ou menos confundidas com a paisagem, estão 11 aldeias com pessoas dentro que respiram o mesmo ar, são iluminadas pelo mesmo sol, olham o mesmo azul céu, servem-se e bebem das mesmas fontes e falam a mesma língua. Mas por entre estas aldeias há uma linha imaginária, guiada aqui e ali por marcos de pedra  que dividem duas nacionalidades. De um lado espanhóis embora sejam galegos e do outro portugueses que não são galegos nem espanhóis e cuja diferença é tanta entre portugueses (do Norte) e galegos, que a primeira aldeia que se vê na fotografia, em tempos não muito distantes (até 1864), era dividida a meio pela tal linha de fronteira que separava famílias de um mesmo povo com a mesma língua de origem – o Galego-Português ou Português Antigo que inicialmente era falado em toda a Galiza actual, todo o Norte de Portugal (excepção para o Mirandês) e parte da zona centro de Portugal com limite geográfico conhecido na Ria de Aveiro, e assim foi até que evoluiu para o Galego actual na Galiza e para o Português actual em Portugal, mas ambas não muito diferentes do Português Antigo, tanto, que há estudiosos da língua que dizem hoje em dia que, tal como é chamado o Português de Portugal e o Português do Brasil, também deveríamos chamar ao Galego,  o Português da Galiza.

 

(Apenas um pedaço de granito ao alto separa Galegos e Portugueses)

 

Mas toda esta discussão do galego ser português da Galiza, curiosamente é discutida na Galiza e os Portugueses pouco ou nada sabem dessa discussão e se sabem, pouco lhe ligam. De facto na Galiza a discussão está lançada quer a nível de academias quer a nível político e partidário. Assim,  se o Galego (língua) fosse grafado seguindo o Acordo Ortográfico adoptado pela Academia Galega da Língua Portuguesa, que tem adeptos em grupos e partidos políticos nacionalistas galegos, onde até a União Europeia acabou por aceitar o galego como oralmente sendo português nas intervenções de alguns ex-eurodeputados galegos, dizia eu que a ser aceite esse Galego, pouco diferença faria do actual Português. No entanto, a Real Academia Galega apoiada pelos partidos políticos espanhóis como o PSOE e o PP, já defendem outro Galego, o que actualmente é oficial na administração galega, este já com influências do castelhano e com algumas diferenças em relação ao Português actual e ao outro Galego defendido que é quase Português.

 

(Soutelinho da Raia em tempos foi uma aldeia promíscua dividida a meio pela fronteira)

 

Mas nem há como uma exemplo para melhor se entender. Tenhamos o início do “Pai nosso” como exemplo:

 

Em Português: Pai Nosso que estais no Céu, santificado seja o Vosso nome, venha a nós o Vosso reino, seja feita a Vossa vontade, assim na Terra como no céu.

 

Em Galego grafado de acordo com a Academia Galega da Língua Portuguesa: Nosso Pai que estás no Céu, santificado seja o Teu nome, venha a nós o Teu reino e seja feita a Tua vontade aqui na terra como nos Céus.

 

 Em Galego oficial segundo a Real Academia Galega: Noso Pai que estás no ceo, santificado sexa o teu nome, veña a nós o teu reino e fágase a tua vontade aqui na terra coma no ceo.

 

Já agora, para terminar e comparar, veja-se o que é grafado em Espanhol: Padre nuestro que estás en los cielos, santificado sea tu Nombre, venga a nosotros tu reino y hágase tu voluntad en la tierra como en el cielo.

 

Tirem daqui as Vossas conclusões que eu sobre o assunto não digo mais nada e se calha, aqueles que não gostam dos espanhóis, até tem as suas razões. Mas eu não quero falar de espanhóis, mas antes, isso sim,  de galegos e da sua língua.

 

(ainda hoje Soutelinho da Raia termina onde termina Portugal)

 

Por questão de três meses ou quatro que não nasci a uns metros da fronteira  entre Portugal e a Galiza, mais propriamente na fronteira entre Vila Verde da Raia e Feces de Abajo, talvez por isso, tenha um sentimento de irmandade para com o povo galego que, mesmo sendo espanhol, é mais português que a grande maioria do povo que habita Portugal, principalmente o do Sul. Os galegos, tal como nós transmontanos e Norte de Portugal, somos os descendentes do  povo do Norte que durante séculos resistiu e os mouros não conseguiram conquistar. Pena que as guerrinhas de território, interesses, castas e famílias não soubessem, quisessem  ou conseguissem manter a hegemonia  que reinou contra mouros e outros povos invasores e depois  partissem por esta península ibérica adentro repartindo-a em lotes, pena também que muito antes a Galaécia não tivesse resistido às invasões bárbaras. No entanto, resta-nos a consolação n(d)essa mesma Galaécia ter nascido e sobrevivido o Galego-Português.

 

E termino dizendo que tal como o Português da Galiza deveria ser considerado Língua Portuguesa, também eu me sinto um Português descendente da Gallaecia romana.

 

(Também Lamadarcos até 1864 estava dividida a meio pela fronteira)

 

Tudo isto por uma imagem inicial do Cambedo da Raia que acabou por trazer aqui outras imagens dos povos promíscuos de igual condição, antes do Tratado de Lisboa de 1864, data em que o Couto Misto foi cedido a Espanha ou à Galiza em troca de metade das povoações de Soutelinho da Raia, Cambedo da Raia e Lamadarcos. Sobre isto ( Couto Misto ) já escrevi em tempos no Blog Cambedo Maquis tudo que sabia e tinha a contar.

 

Ainda sobre a primeira foto que despertou esta prosa de galegos-portugueses e o seu romance, a primeira imagem que me sugere é a de Juan, natural de uma aldeia galega (Casas dos Montes) a escassos metros de onde a foto foi tomada e que no dia 20 de Dezembro de 1946 subiu esta encosta mais próxima, entalado entre Salazar e Franco, para de novo a descer e ser assassinado a uma centena de metros do Cambedo. Um herói, um mártir, um Juan do povo Galego-Português que apenas queria sobreviver a uma guerra civil e que ao lado de um senhor da guerrilha, o Demétrio,  teve o azar de pernoitar na noite de 19 para 20 de Dezembro na povoação do Cambedo. Já uma vez o disse e volto a dizê-lo, a par do flaviense Francisco Pizarro que as castas flavienses teimam em ignorar, trocando o seu ser flaviense, coragem e bravura  por um não flaviense que cobardemente virou costas ao povo de Chaves quando os franceses nos invadiam pela segunda vez, tenho o Juan como um mártir e o Demétrio como um senhor que combateram pela vida, justiça e liberdade. Eles são os meus heróis do passado que defenderei sempre enquanto os meus dedos tiverem forças para teclar.

 

Tudo isto por uma imagem.

 

 

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