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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

24
Mai17

Cartas a Madame de Bovery


cartas-madame

 

Minha cara Madame de Bovery (3)

 

Sabe que também eu me faço essa pergunta e que, à semelhança da senhora, também para ela não encontro resposta?!

 

Podemos ao longo da nossa vida repeti-la em pensamento as vezes que quisermos ou precisarmos, mas duvido, com algum grau de certeza, que alguma vez qualquer uma de nós lhe saiba responder! O mais que nos é possível, com alguma probabilidade de acertarmos, é tecermos conjecturas à cerca disso. Ora isto não é quase nada para quem procura certezas absolutas ou verdades universais, ainda que saibamos que nem uma nem outra existam, ainda assim procuramos, por causa daquela impaciência interior de que um dia falámos, lembra-se, sem com isso tirar conclusão alguma?!

 

Veja como são as coisas, ainda não disse nada e já escrevi dois parágrafos, mas a senhora terá certamente lido qualquer coisa nisso, nem que seja ter visto parte do espelho dos seus pensamentos!

 

Concordo consigo, o Comendador assustou-se! É talvez esta a única coisa aceite por ambas, mas desconhecemos os motivos que a isso o levaram. Talvez seja diferente, ou não, a ideia que a esse respeito as duas fazemos!

 

O Comendador sentiu-se engolido, amordaçado e com isso, ou ao mesmo tempo, as coisas fugiram do seu controlo. O primeiro passo para ser dominado estava criado e ele teve consciência disso. Temos aqui dois cenários, talvez mais, mas simplifiquemos em dois que já nem assim a coisa é simples! Se a questão fosse racional, argumentativa, lógica ou de inteligência, o Comendador estava como peixe na água. Sabia equacionar, identificar e resolver as incógnitas em ordem a x, a y e a z, integrar o resultado, determinar as parcelas do somatório de dados e deduzir com relativa facilidade a fórmula de cálculo, estabelecendo o factor comum, a ordem da sucessão e os termos intermédios! O Comendador sabia que nunca nos são dados claramente todos! Derivar e exponenciar já não era o seu forte, era demasiado consciente para isso!

 

De qualquer forma, a questão não era esta. A questão era puramente de ordem emotiva, isto é, se nela estivessem contidos valores morais, éticas pessoais e/ou profissionais, nada havia à face da terra que o tornasse incapaz de lidar com isso, por mais amplo que o problema fosse. Mas no caso em causa, o sentimental, o Comendador não tinha nem treino nem ensinamento nenhum e acabou por se sentir como peixe fora de água, a asfixiar!

 

Chegado aqui, a lutar pela sobrevivência mais que pela vida, que passa neste concreto caso a ser secundária, o que é que qualquer um de nós faz?

 

Vale tudo, até arrancar olhos! Quem diz olhos diz coração, qualquer coisa que nos faça ver ao longe e ao perto e ao tirarmos os olhos dos outros, isto o Comendador não sabia, tiramos também os nossos!

 

Minha cara Madame de Bovery, o Comendador cegou!

 

Acha por acaso que foi por acaso, que antes da sua partida o Comendador deu uma fortuna por aquele Labrador Retriever, preto, treinado durante dois anos?

 

Perdoe-me se lhe digo coisas que já sabe, mas continuo com esta ideia peregrina de achar que as descobertas partilhadas trazem para casa mais troféus que quando vividas isoladas.

 

Posso estar completamente enganada, mas não reparou no facto do Comendador, desde que se mudou para Londres, fazer todas as descrições dos factos de forma sensorial, como se tivesse adquirido uma sensibilidade paranormal que não lhe era de todo própria? Repare na linguagem que ele passou a utilizar, que não é de facto dele característica: “senti” em vez de “vi”, “apercebi-me” em vez de “observei”, “pressenti” em vez de “presenciei”! Não me diga que isto lhe é familiar! O Comendador tinha e punha enorme reticências em tudo o que não era observação empírica! Lembra-se das enormes discussões em que eu validava tudo pelo sentimento e ele, depois de me ouvir calmamente, perguntava: “mas viu?” E eu dizia com os olhos não e era aqui que ele encolhia os ombros como se aquilo que eu tivesse dito contivesse de verdade, nada.

 

Eu contestava, argumentava, sabe a senhora como eu sou nestes casos, se me sinto dona da verdade vou ao limite e afirmava: há várias formas de ver! Ao que ele sempre contestava: “há só uma e duvidosa, dependente de quem vê, mais do que o que vê!”

 

A senhora acha que ele mudou ou que só cegou?

 

Da sua, sempre amiga,

Maria Francisca

 

 

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