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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

02
Fev18

Discursos Sobre a Cidade


SOUZA

 

CASAL

- DA RESIGNAÇÃO AO PROTESTO -

 

 

Não pretendemos substituir o autor deste blogue na sua rubrica sobre o levantamento e reportagem das aldeias do Barroso, aqui, no caso presente, do Baixo Barroso (Boticas).

 

Mas o episódio/conversa a que assistimos no dia 20 de janeiro passado, no intervalo que fizemos quando saímos da «Mesinha de São Sebastião», em Vila Grande, Couto de Dornelas, concelho de Boticas, para nos dirigirmos e contactarmos com duas aldeias do Baixo Barroso, não nos deixou indiferente e, por isso, não resistimos de aqui a abordar e, a seu respeito, tecermos, ou fazermos, uma pequena reflexão sobre o que somos e o Portugal em que vivemos.

 

Já vem sendo hábito, todos os anos, nos dirigirmos, como que em romagem, no dia de São Sebastião, a Vila Grande, Couto de Dornelas.

 

Como noutro local dizíamos, hoje, por bem dizer, não sabemos bem porque o fazemos. Se antes, era a curiosidade de assistir a uma tradição comunitária barrosã secular; hoje, provavelmente, será a força do hábito, transformado agora em tradição.  O ser humano tem destas coisas que, aparentemente, não são bem compreensíveis… Mas não vale a pena tentar ir ao fundo das mesmas. Deve haver alguma razão, até bem fácil e à vista, que as explique. Simplesmente, numa sociedade cada vez mais turbulenta, complexa e, quiçá, invisível, nem sequer a vemos!

 

Estávamos a dizer que, este ano, uma vez mais, no dia 20 de janeiro, rumamos a Vila Grande/Couto de Dornelas.

 

Nestas nossas deambulações pelo Barroso, Fernando DC Ribeiro é o guia que não pode faltar e que tudo planeia… Pena que, por razões imponderáveis, o amigo Berto Ferreira não nos tenha podido acompanhar. Seria, sim, um trio perfeito! Em tempos, eramos quatro inseparáveis mosqueteiros. A loucura do tempo por que passamos e a sua voragem deixou um deles pelo caminho, na floresta densa, obscura e errática que é a vida!...

 

Caramba! E porque estamos para aqui com esta conversa? Deve ser já da idade, com o seu chorrilho de memórias a atraiçoar-nos.

 

Prossigamos e vamos ao ponto que hoje nos trouxe aqui.

 

Dizíamos que estávamos, no dia 20 de janeiro passado, em Vila Grande/Couto de Dornelas, no cumprimento e vivência de mais uma tradição. E, este ano, ao contrário de muitos outros anos, no dia 20 de janeiro passado, nem parecia que estávamos no inverno e no Barroso. Mosqueteiros irrequietos, tiradas as fotos da praxe, atestando o cabal cumprimento da tradição, pegámos na viatura e fomos visitar duas aldeias relativamente próximas de Vila Grande.

 

Como dizíamos no início, não pretendemos substituir o autor deste blogue no seu documentar e fazer reportagem de todas as aldeias barrosãs. Mas o Fernando que nos perdoe! Não resistimos a falar desta – CASAL.

 

Ao longe, quando nos aproximávamos, a sua silhueta aparenta-se a um pequeno presépio.

 

Figura 01.jpg

 

Obviamente, sem a exuberância de Piódão, mas, por isso mesmo, na sua modéstia e singeleza, verdadeiramente autêntica, encurralada que está entre montes e protegida por um deles – o Soalheiro, donde brota a água límpida e fresca

 

Figura 02.jpg

 

que faz emprenhar a pequena veiga que lhe fica a seus pés.

 

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Embalado o carro para ultrapassarmos a rampa que nos levaria à aldeia, fomos recebidos pelo ladrar de quatro cães,

 

Figura 04.jpg

 

que só se calaram com a aproximação do seu dono.

 

Fernando Ribeiro foi-nos informando que esta aldeia não tinha muita gente. Infelizmente, como muitas outras que, nas nossas constantes deslocações por terras do Alto Tâmega e Barroso, fomos encontrando.

 

O que mais nos impactou – neste lugar que tem tudo para ser um refúgio edílico – foi o enorme vazio que sentimos. O total abandono destas terras. A ruina de velhas casas

 

Figura 05.jpg

 

e de velhos espigueiros.

 

Figura 06.jpg

 

Só o ruído das águas a passarem no pequeno riacho nos “acordaram” do silêncio profundo em que este lugar está mergulhado.

 

CASAL não é certamente uma aldeia fantasma como outras que já vimos por este nosso Portugal Interior fora. Mas anda lá perto…

 

Tiradas umas quantas fotos, no início desta pequena aldeia, descemos uma pequena e íngreme calçada,

 

Figura 07.jpg

 

que foi dar ao lugar que, talvez, inapropriadamente, lhe poderíamos apelar do Eirô do sítio, acompanhados pelo único anfitrião do lugar – o senhor Manuel Fortuna.

 

Figura 08.jpg

 

Em circunstâncias como esta, nossa intenção é criar clima de empatia, junto destas gentes, suscetível de se abrirem e de nos contarem a história da aldeia e a dos seus habitantes. Nesta tarefa fomos coadjuvados por dois amigos, vindos da Área Metropolitana do Porto, e que, para o efeito, nos acompanharam.

 

Mas o senhor Manuel Fortuna, octogenário, pouco tinha para nos contar. É, juntamente com sua mulher, o único casal em CASAL. Tiveram seis filhos – três rapazes e três raparigas. Todos se foram à procura de melhor qualidade de vida, por esse mundo fora. Quando interrogado sobre o facto de, no verão, a aldeia ficar com mais gente, a sua resposta foi pronta:

- “Olhe que não! Apenas uma ou outra visita de um filho ou filha. Nada mais. Já não resta mais ninguém. Só nós! Que nos encostamos uma ao outro”.

 

Uma circunstância nos chamou a atenção. Neste fim do mundo havia cobertura de telemóvel. Melhor que em Chaves, em que algumas aldeias da Montanha nem um único “risco”! O nosso amigo António T. recebeu uma chamada da esposa a perguntar-lhe pelas chaves do seu carro. Botando aos mãos aos bolsos, apercebeu-se que as trazia consigo. E, assim, lá teve a senhora que se desenrascar de outro jeito.

 

E mais uma pergunta sacramental impunha que fosse feita:

- “E se, com esta idade, se têm algum problema de saúde, como é?”.

A resposta foi pronta:

- “Chamamos a ambulância! A minha Rosalina, aqui há uns tempos, teve um AVC (Acidente Vascular Cerebral). A ambulância apenas demorou a cá chegar uma hora!”.

 

Eram horas de regresso a Vila Grande. Antes de partirmos este simples e encantador casal, com muito gosto, deixou-se posar para cada um de nós.

 

Repassando a vista pelas fotos tiradas, damo-nos conta que o olhar, quer de um,

 

Figura 09.jpg

 

quer de outro

 

Figura 10.jpg

 

Elemento do casal, positivamente, não se concentrava na nossa objetiva. Seus olhos estão mirando o infinito, algures, onde, possivelmente, os amores do amor das suas vidas estão – os seus filhos.

 

Mas não largam o terrunho. Aqui querem morrer!

 

No regresso a Vila Grande, por duas ou três vezes, Fernando DC Ribeiro repetia:

- “Apenas demorou uma hora a cá chegar!”.

 

Bem nos apercebemos da razão do recalcar esta frase.

 

E dizíamos para nós mesmo:

- “Que paciência; que resignação. Já não tinha que morrer. Uma hora!”.

 

E, numa espécie de transmissão de pensamento, Fernando dizia-nos:

- “Um caso desta natureza, na capital do reino, seria objeto de enorme protesto. De abertura de primeira página dos jornais das diferentes televisões. Aqui, neste fim do mundo, não se passa nada!”.

 

Na verdade, assim é.

 

Que Portugal tão díspar aquele em que vivemos!

 

Alguém acredita que as tragédias por que passámos no último verão e outono serão suficientes para despertar em nós uma consciência do ser português, entendendo o Portugal que deveríamos ser como verdadeiramente único, uno, solidário e idêntico?

 

Será que o «Portugal 2030» – Documento de reflexão lançado pelo governo a contar na elaboração da Estratégia de Portugal no horizonte 2020-2030, contando com os Fundos Comunitários, de uma Europa sem rumo, pouco solidária e com um futuro incerto – assenta em bases suficientemente credíveis para crermos num Portugal outro, tão diferente daquele que hoje presenciamos e vivemos?

 

Será que o objetivo proposto de “Reforçar a convergência dos territórios de baixa intensidade, potenciando a exploração sustentável dos recursos endógenos e diversificação da base económica” é suficiente para nos tirar do atoleiro a que chegámos e estamos?

 

Será que o Quadro que abaixo se apresenta

 

QUADRO - Sustentabilidade e coesão na baixa densi

(Fonte:- http://www.portugal2030.pt/wp-content/uploads/2017/10/FUTURO_PC_Portugal2030_rev20170918_vpm_VF.pdf)

 

contém em si as virtualidades para o virar de página por todos nós tão desejada?

 

Não são Documentos e Reflexões, por mais bonitas que pareçam e por mais bem feitinhas que estejam, que promoverão qualquer mudança!

 

Nem, tão pouco, acreditamos no novo pacote que está aí sobre a descentralização, assente num modelo base que, no passado, teve as suas virtualidades e deu os seus frutos, mas que, hoje, está completamente fora do contexto, face à nova sociedade em que vivemos!

 

A escala do desenvolvimento é fundamental. O Município é uma realidade muito pequena, demasiado redutora e efetivamente pouco profícua para os territórios de baixa intensidade como os nossos!!!

 

Mutatis mutandis, Chaves (cidade) e os municípios que compõem a CIM – Alto Tâmega (Comunidade Intermunicipal do Alto Tâmega), têm de ter uma postura outra perante o desenvolvimento dos seus territórios.

 

Para que seu papel seja profícuo e decisivo no desenvolvimento deste pedaço de território que nos é dado viver, é necessário que se assumam todos como um interpar, sabendo efetivamente cooperar (e não competir somente) com os demais na tarefa difícil, mas ingente, de nos desenvolvermos efetivamente.

 

Fala-se que Chaves é a capital do Alto Tâmega (e Barroso).

 

Querer ser capital não é ter o mando!

 

Ser capital é ter cabeças pensantes – da diáspora; do país, que estão fora do território onde nasceram, muitos deles levados pelo canto da sereia, esquecendo-se positivamente do berço; do seu interior, os que cá vivem – para, em conjunto, e sem hegemonias, dar uma volta a tudo isto. Mesmo contra um país altamente burocrático e centralizador.

 

Para o efeito, é preciso ter coragem, vontade, determinação.

 

Teremos?

 

Que interesse há em apregoarmos, aos quatro ventos, que somos durienses, transmontanos e barrosões, se nada queremos e fazemos no e para o berço que nos viu nascer?

 

De que nos vale ser Rei, se não temos coroa?!...

 

Olhamos muitas vezes para as nossas terras que, cada um de nós, posta nas redes sociais.

 

Basta de nostalgia!


Orgulho é que se precisa!

 

Trabalhemos para o mesmo fim. E protestemos, combatendo esta ancestral resignação de sermos os eternos coitadinhos!!!...

 

Obrigado tio Manuel Fortuna e tia Rosalina por nos tornardes mais consciente da realidade que pisamos e somos….

 

António de Souza e Silva

 

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