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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

04
Abr17

Chaves D'Aurora


1600-chavesdaurora

 

 

  1. SONHO DE VERÃO.

 

Eis então que Aurora, à altura em que se ouvia tocar o passo dobrado “Querido Portugal”, com um arranjo da Banda e, como sempre, de excelente harmonia, olhou casualmente para um grupo de rapazes que riam de algo, de alguém ou de alguns e percebeu, dentre eles, o jovem morador da casa em frente à sua, na Estrada do Raio X. Sentiu-se mergulhar em agitados pesadelos como se, naquela noite de sonhos de verão, algum Puck brincalhão do senhor Shakespeare, foragido de Stratford-on-Avon, no tempo e no espaço, viesse exortá-la para o Amor.

 

Como que a um sexto sentido, Hernando lhe devolveu o olhar. Trazia aos lábios um sorriso zombeteiro, com uma aura de luz em volta de si, que parecia fazê-lo se elevar aos céus, o que muito perturbou a sensitiva pastorinha de Chaves, que não conseguia desviar os olhos de tão bela quão profana aparição. De repente, porém, a entrecortar esse cruzamento de olhares, passou a correr entre eles uma pequena malta de putos esfarrapados, em feroz perseguição a uma pobre velha, senhora de manifesta perturbação mental. Enquanto alguns senhores repreendiam os rapazolas, alguns outros atiçavam os trocistas a continuarem com esses gestos de tamanha impiedade.

 

Ao cessar a balbúrdia, logo todos se dispersaram, com a mesma rapidez da curiosidade saciada. A malta, porém, afastara do campo de visão de Aurora o jovem Hernando e seus camaradinhas. No lugar onde há pouco estiveram, não havia mais nenhum belo rapaz de lenço ao pescoço, olhos de lince e riso debochado.

 

Entrementes, João Reis falava aos seus, em tom baixo, mas indignado, que o único problema daquele Jardim era a falta de policiamento. Nos dias em que as bandas tocavam, o jardim era livre para todos. Não se podia, portanto, conforme explicava o Papá, impedir a entrada de qualquer zé-dos-anzóis que, por uma condição social menos favorecida, estivesse com um fato surrado, sem gravata e tamancos nos pés. Com isso, no entanto, permitia-se também a entrada de mendigos, com o seu esmoler importuno; bêbados, a liberarem gestos obscenos e palavras de baixo calão; maltas de miúdos a correrem por aquele passeio público, andrajosos e quase nus, como se acabassem de sair das páginas de uma obra de Charles Dickens.

 

Para um quadro completo de Pieter Bruegel, havia também os doidos. Chaves, como qualquer outra vila ou cidade, também tinha os seus próprios loucos, a perambularem maltrapilhos pelas ruas: a Don´Ana, o Bisca Velha, o Furriel, a Rosa Tirana, o João da Manta, o Mata-a-velha (esse, além de louco e mendigo, era ladrão)... A garotada miúda e alguns rapazotes os perseguiam e arreliavam, sem que a Polícia nada fizesse para impedir. Sobre o facto ocorrido naquela noite de julho, alguém escreveria uma nota no próximo número do jornal “O Flaviense”: “Essa prática selvagem, inconveniente e desumana de irritar os coitados, transforma em furiosos e tresloucados a esses doidos que, não fora a falta de respeito do rapazio, não passariam de pobres malucos inofensivos”.

 

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