Izei, Chaves e Portugal
Quando acordo pela manhã a primeira coisa que faço é abrir a porta da varanda do meu quarto e lançar um olhar sobre a Serra do Brunheiro, pois ela é o barómetro dos meus dias. Mas não é só um olhar lançado para conhecer o teor dos dias, é também um olhar que se lança sobre a nossa interioridade e ruralidade, em suma sobre a nossa identidade.
Há dias alguém me dizia que Chaves tinha de se afirmar como um concelho urbano que é. Não contestei porque nessa afirmação há alguma verdade, mesmo sabendo que é a maior mentira e disparate que ouvi sobre o nosso concelho. Sozinho, porque no contexto onde se afirmou o disparate estava só. Fiquei fora de mim, virado do avesso remoendo a facilidade com que se promove a mentira com alguns argumentos verdadeiros, pois muito parecido, ou mesmo outra forma de mentir, até com mais profundidade, é promover algumas verdades deixando esquecidas outras, tão ou mais importantes, que as verdades que se promovem e, infelizmente, a história e as nossas vidas estão cheias destes acontecimentos, tudo em nome de interesses do poder, criando falsas esperança e ilusão na inocência de quem acredita e quer acreditar ou indiferença naqueles que já desistiram de acreditar.
É o sistema… que por muito que tentasse transformar os 3 efes do passado nos 3 dês da democracia, acabou por ter de regresso aos 3 efes e reforçados, quer no Fado como Património Imaterial da Humanidade, quer no Futebol com Cristianos Ronaldos, Mourinhos e Eusébios no pedestal ou no Panteão, e Fátima como um empreendimento de sucesso. E ei-los de novo , embora camuflado, a evocar o quinto império, o sebastianismo e Camões .
Pois por mim, teimosinho que sou, continuo a ter orgulho no meu concelho rural, no meu ser transmontano, no nosso Miguel Torga, nos caminhos por onde ando tal como José Régio, quando alguns olhos doces me dizem “Vem por aqui”, eu nunca vou por ali e também não sei por onde vou, nem sei para onde vou — sei que não vou por aí!. Um pouco como Fernão Mendes Pinto, deixem-me com as minhas peregrinações… Entretanto por Chaves cidade urbana, na ausência de uma festa de verão, o folclore está nas ruas à volta da ressurreição dos povos de há dois mil anos atrás, do tempo de Aquae Flaviae do Império Romano, aquela cujos restos jazem por baixo da urbe medieval.