Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

04
Jul20

Granjinha - Chaves - Portugal

Aldeias de Chaves - Vídeo


1600-granjinha (372)-video

 

GRANJINHA

 

Continuando a cumprir a nossa falta para com as aldeias que, aquando dos seus posts neste blog, não tiveram o resumo fotográfico em vídeo, trazemos hoje aqui esse resumo para a aldeia de Granjinha.

 

1600-granjinha (224)-video

 

Granjinha que por motivos profissionais já conhecia desde meados dos anos oitenta, mas que só passados 20 anos é que verdadeiramente descobri, uma agradável descoberta, por sinal.

 

1600-granjinha (16)-1-video

 

Esta de primeiro conhecer e só mais tarde descobrir, pode parecer estranho, mas não o é. Acontece que em meados dos anos oitenta ainda olhava o mundo com outros olhos e passava-me ao lado muita coisa importante à qual não dava o devido valor. E se há valores, saberes e até outros sabores, é nas nossas aldeias, no nosso mundo rural, que com o tempo, me fui dando conta que muito do meu saber e formação como homem, o tinha adquirido, precisamente, no mundo rural e não na cidade ou até mesmo na escola. Ainda hoje, quando vou a uma aldeia pela primeira vez, aprendo sempre qualquer coisa, principalmente com os mais velhos, mesmo que seja analfabeto.

 

granjinha (206)-video

 

Mas também o nosso olhar vai evoluindo com o tempo, sobretudo, há uma preocupação acrescida com os pormenores. Com o tempo, também se aprende a ver para além da aparência, também se aprende a selecionar aquilo que se olha, e do ponto de vista estético, também se consegue ver a beleza das coisas onde a beleza aparentemente não existe. Foi assim, já com este espírito, que vinte anos depois de conhecer a Granjinha a descobri.

 

1600-granjinha (321)-video

 

Mas hoje estamos aqui por causa do vídeo que a Granjinha não teve nas anteriores abordagens, mas com algum tempo e espaço, para deixar aqui mais algumas imagens e alguns temas. Um deles, que penso que nunca abordei, tem a ver com o topónimo GANJINHA, com (J), pois há quem o agrafe com (G), um deles, um colaborador deste blog quase desde que o blog existe, o Luís da Granginha que sempre grafou a aldeia com (G), e vai ser às palavras dele que vamos recorrer para abordar o assunto, palavras que roubámos au um blog amigo, o blog  Granjinha/Cando de autoria de A.Cruz.

 

1600-granjinha (15)-video

 

Aqui fica então uma breve mas suficiente explicação para o topónimo e um bocadinho de história sobre a Granjinha, ou se preferirem, Granginha:

 

GRANJINHA

 

O topónimo "Granjinha, ou GranGinha" provém do vocábulo "Grangia", que por sua vez, teve origem em Grange, de origem franco-francesa.

 

Foi introduzido pelos Monges Cistercienses, séc.XII.

 

Porém, a fundação desta ALDEIA é muito anterior.

 

Alguns vestígios encontrados (e surripiados) nos meados do século passado (e os imensos que permanecem «escondidos») indicam a sua origem Celta, - a sua ocupação romana, visigótica e mourisca - o que não é nada de estranhar, pois os Celtas o Noroeste da Península ocuparam durante séculos.

 

Os primeiros cristãos e Monges, que dela fizeram mosteiro e coutada, apagaram-lhe o nome e alteraram, de acordo com as suas conveniências, o tempo pré-existente, assim com o fizeram com a Cruz, outros símbolos e cultos.

 

 "Lá, ainda se ama a Natureza, se respeita o respeito, se recorda com saudade, se sofre com resignação, e se vive com a amor.

 

E os que nela morrem têm direito ao céu!"

Luís da Granjinha

de "A Minha Aldeia" – 2008

 

O original deste texto pode ser visto aqui: https://granjinha_cando.blogs.sapo.pt/5072.html

 

1600-granjinha (38)-video

 

E agora sim, vamos passas ao vídeo com todas as imagens da aldeia de Granjinha, imagens que foram publicadas até hoje neste blog. Espero que gostem e para rever aquilo que foi dito sobre a Granjinha ao longo do tempo de existência deste blog, a seguir ao vídeo, ficam links para esses posts.

 

Aqui fica:

 

Post do blog Chaves dedicados à aldeia de Granjinha:

 

https://chaves.blogs.sapo.pt/ganjinha-chaves-portugal-1626616

https://chaves.blogs.sapo.pt/ganjinha-chaves-portugal-1182015

https://chaves.blogs.sapo.pt/cha-de-urze-com-flores-de-torga-77-1218679

https://chaves.blogs.sapo.pt/969929.html

https://chaves.blogs.sapo.pt/541608.html

https://chaves.blogs.sapo.pt/424559.html

https://chaves.blogs.sapo.pt/391288.html

https://chaves.blogs.sapo.pt/385837.html

https://chaves.blogs.sapo.pt/243407.html

https://chaves.blogs.sapo.pt/27872.html

https://chaves.blogs.sapo.pt/ocasionais-1913520

 

E quanto a aldeias de Chaves, despedimo-nos até à próxima quarta-feira em que teremos aqui a aldeia de Izei.

 

 

 

19
Mai15

Ocasionais - Era o que mais me faltava!...


ocasionais

 

ERA O QUE MAIS ME FALTAVA!...

 

Recebi uma carta [não, não é de condução, de caçador ... ou de chamada], bem, tenho de ser mais claro, não foi e-mail ou sms, como se chama agora a correspondência que veio substituir telegramas, telexes, faxes, postais, cartas, o “Código Morse” e o “Código Navajo”.

 

O Inverno está a empurrar com força a Primavera para o Verão.

 

Já há muita gente com férias marcadas e pronta a partir para elas.

 

Tinha recomendado a um casal amigo que fossem conhecer a NOSSA TERRA, CHAVES.

 

Surgiu-lhes a oportunidade e, ala morena, lá foram pela CREP-A41 até encontrarem o Casino de VALDANTA, segunda pista para saberem entrar na cidade.

 

Só quando sentiram o vento de Espanha é que deram conta do sinal de “Chaves”.

 

“OS de CURALHA” já não são o que eram doutro tempo.

 

Deixaram que lhe roubassem o comboio e a Estação.

 

Consentem nos maus tratos ao “CASTRO”.

 

Perderam o gosto na marginal do Tâmega até à cidade   - “a Estrada de Braga”.

 

Parecem mais envergonhados da sua linda terra que os presidentes de Câmara que tem havido desde o aparecimento da Auto-Estrada   -   nesta não existe uma placa a indicar «SAÍDA» para CURALHA nem para CHAVES! Parece quererem empontar os viajantes para Boticas e Carvalhelhos, como se CURALHA ficasse “no cu de Judas” ou entrada em CHAVES, pela “FONTE NOVA” fosse uma vergonha!

 

Realmente, os meus amigos, depois de Vidago, nunca mais encontraram «seta» para a cidade.

 

Assustaram-se na rotunda, julgando que a avenida para o Casino é que era o portão de entrada.

 

Deram meia volta e lá viraram pela ruela que os levou à porta do “Quartel”.

 

Rolaram por uma avenida com o chão coberto de folhas e pararam em frente aos portões de um cemitério, a pensar se seria para a frente, para o lado ou para trás que deveriam ir.

 

Estranharam ainda não ter encontrado um polícia, fosse ele de ronda, de trânsito ou de folga.

 

Desceram os vidros da janela do carro e perguntaram, a uma senhora que lhes pareceu simpática, onde ficavam as CALDAS.

 

Na ponte do Ribelas, em Santo Amaro, apeteceu-lhes mesmo parar: o casario e os quintais, de um lado e doutro da ponte mostraram-se-lhe sugestivos.

 

Na rotunda pareceu-lhes mais acertado seguir para a esquerda.

 

Junto ao Posto de Abastecimento perguntaram a um automobilista que ia entrar no carro estacionado onde ficava o Hotel de Chaves e onde podiam desougar-se dos “Pastéis de Chaves”, que um amigo lhes recomendou para o pequeno-almoço do meio da manhã e a que ele chama pomposamente «a hora do pingo».

 

- Logo à frente encontrarão uma esplanada, mesmo em frente à Farmácia. Os pastéis aí são quentinhos e bons. O Hotel é logo na grande rotunda, à frente,   - informou

 

O casal meu amigo entrou no “Carbela”. E, seguindo a minha recomendação, pediu um pastel (não disseram «de Chaves» de propósito, para ver a reacção da servente, perdão, da «auxiliar-técnica-de-engenharia-de-restauração-e-concomitantemente-afins-e-correlativos».

1600-1 002

Só que as “Meninas de Chaves” são «guichas». E, com a meia de leite para ela e o café para ele, trouxeram dois “Pastéis de Chaves” douradinhos e quentinhos. Mas, topando que eram visita noviça (mas não «nabiça», ó marotões!), a “Menina de Chaves” avisou para terem cuidado porque por dentro estavam muito quentes.

 

Eles. Os do parzinho meu amigo, já iam avisados. Mas a “Menina de Chaves” salvou-os do se terem esquecido.

 

A minha amiga e o meu amigo, levantando um pouco a sobrancelha a esquerda, ela, a direita, ele, olharam um para o outro, como a querem avisar-se para se porem finos.

 

Confessaram-me que os Pastéis (de Chaves) lhes meteram logo muita cobiça.

 

Trincaram.

 

Provaram.

 

Beberam um gole de café e de café-com-leite.

 

Trincaram.

 

Comeram.

 

E entre duas dentadas, enquanto de derretiam de prazer com a massa e a carne (de vitela) picada, acenaram para uma das “Meninas de Chaves” e pediram mais dois “Pastéis”.

 

Fizeram não ter dado conta, mas bem viram que as «Meninas de Chaves», ali estavam para os atender (bem, a moda é: «em que posso ajudar», porque pronunciar um «posso ajudar» transmite ao ego um ar de «poderosidade» (poder e superioridade) que não contém o «atender».

 

Garantido o alojamento, no Hotel, pediram à recepcionista a indicação do “Leonel”. Iam almoçar um «pernil fumado», por recomendação, disseram.

 

No Campo da Roda ficaram de barriga cheia e contentes.

 

No meu roteiro, mandei-os subir até ao Miradouro de S. Lourenço.

 

O dia estava bonito. Aí chegados, tiveram de inventar uma «táctica» (um método) de se “consolar com o que os seus olhos viam”, disseram-me.

1600-13578

Olharam tudo à sua volta depressa, logo à primeira vez. Depois outra vez, mais devagar. Depois, ainda outra vez, mais devagarinho. Então combinaram dividir todo aquele horizonte em fatias. Nem deram conta do tempo passar. Queriam ir merendar mais uns “Pastéis de Chaves” e estava mais na hora do desejo e do apetite do que na hora da tarde. Mas ainda tinham de ir à “Ribeira de Sampaio” ver o destino que estão a dar à ponte e às margens do ribeiro.

 

Colhido o desgosto e desencanto com o desprezo dado àquele encanto, voltaram à estrada, e meteram pelo estradão do “Castelo”, em busca do «Cruzeirinho» das Eiras.

 

Já lhes crescia água na boca, só de se lembrarem dos Pastéis.

 

Voltaram em direcção à cidade. Procuraram o “Catonho Tonho”. Estacionaram e saíram para entrar noa “Loja do Bom Paladar”. Conforme lhes recomendei, perguntaram pela “Alice da Granginha” (era para causar «suspense»).

 

Aí, pegaram no telemóvel, ligaram-me e ralharam comigo, ameaçando que «tens de dizer à Luisinha para trazer remédios para o «colesterol» e o «emagrecimento»!).

 

Iam aos Pastéis e ficaram perdidos com a doçaria!

 

Não tiveram outro remédio senão alternar “Pastéis de Chaves” com os bolos da Alice da Granginha, acusaram-me!

 

Refastelados, foram para o Hotel, preparar-se para o jantar e a noite.

 

Tinham de descobrir o carreiro que dá para o adro de Santo Amaro, o sítio onde se faz uma boa, que não a última, ceia - O “Aprígio”!

 

E nessa primeira noite lá foram até ao Casino.

 

Bem dormidos, e com sonhos de fazer inveja a serafins e querubins, disseram-me, passaram pelas CALDAS, beberam um copo daquela água bem-fadada.

1600-(33147)

Decoraram o sítio do “João Padeiro”, contornaram a Muralha e, vá lá, conseguiram lugar para o carro, no “Largo do Anjo”.

 

Procuraram a portinha dos “Prazeres na Loja”.

 

O cheirinho a Pastéis fresquinhos e quentinhos (que bem lhes fica este contraste!) logo orientou os meus amigos para o nº 14.

 

A “Suzy” recebeu-os com aquele lindo sorriso das retintas “Meninas de Chaves”.

 

- “Estamos aqui mandados…”

 

D.Helena do Jorge, da Abobeleira, juntou o seu sorriso de “Menina retinta de Chaves” ao da “Suzy” e atalhou-os:

 

- “Já sei quem são e ao que vêm. A encomenda do fumeiro está prontinha”.

 

A “Suzy”, ao ouvir isto, foi logo buscar dois “Pastéis de Chaves”. Par «prorβarem», disse.

 

Pois! «Proβar”!

 

Lá se vai a dieta, o colesterol e a elegância!

 

Meteu-nos numa boa, o Luís! - disseram um para o outro.

 

Virando-se para a Lena (D. Helena) do Jorge, da Abobeleira, o meu amigo (para admirar, mais guloso que a cara-metade), disse:

 

- Este foi apenas uma amostra. Faça o favor de me trazer outro, que é para provar.

 

Perdida de riso, (e que lindo o tem!), a “Suzy” trouxe mais dois “Pastéis de Chaves”.

 

-Ai a nossa vida! – exclamou a minha amiga cara-metade do meu amigo.

 

E o almoço?!

 

Vou segredar-vos: Eu já tinha telefonado para VILELA do TÂMEGA, à sucessora da D. Helena, a D. Maria do Céu, para ter preparado um «Arroz de Cabidela», para almoço destes meus amigos. Pior (melhor) ainda: recomendei-lhe para sobremesa uma (Uma! Duas ou três!) das suas compotas!

 

Imaginai!...

 

Almoçados, de VILELA foram fazer uma sesta no Hotel.

 

A meio da tarde, já tanto a Alice da Granginha, do “Bom Paladar”, como a Lena, dos “Prazeres na Loja”, lhes haviam falado da Freguesia de VALDANTA   -   da Barragem Romana d’Abobeleira, de “Outeiro Machado” e da CAPELA da GRANGINHA   -   meteram-se pelos Aregos acima e chegaram à Abobeleira. Com alguma perícia, deram com o monumento dos romanos. Em Valdanta, tiram um retrato ao “Forno do Povo”, junto à estrada, e seguiram as indicações que a minha afilhada Alice lhes deu para acertarem com “OUTEIRO MACHADO”.

 

Espreitaram a “Barragem”, atravessaram o CANDO e chegados ao “Largo do Carvalho”, na GRANGINHA, perguntaram ao XICO, da Srª Prazeres, onde ficava a CAPELA da GRANGINHA.

 

A zeladora mostrou-lhes aquela relíquia histórica e monumental.

1600-granjinha (8)

Claro que tiveram de entrar na casa da D. Nídia (bem, da Nídia, minha amiga e comadre - somos ambos padrinhos da Alice que indicou o “OUTEIRO MACHADO”).

 

E os que tiveram a sorte de visitar a GRANGINHA já sabem o que acontece naquela casa: - Uma boa merenda (almoço ou ceia) e… uma boa pinga.

 

O sol já estava pra lá da Serra d’Ardãos e o casal turista desceu pela «Barje» (Várzea).

 

Antes da chegada ao Hotel ainda pararam para olhar a “Azenha do Agapito”.

 

Aperaltaram-se para o Jantar e noitada, e foram comer ao “Faustino”.

 

Provaram uma linguiça assada, petiscaram um arroz de tomate e comeram um prato de orelha.

 

Na sobremesa, ela ficou-se pelo «Toucinho do céu», e ele, pelo “leite–creme”.

 

O meu amigo, disse-me, rematou com uma (não vale mentir: DUAS) «Geropiga”!

 

Desceram, a pé, Stº António, foram até meio da Ponte Romana, voltaram, meteram pela Rua do Tabulado, em direcção às CALDAS.

 

Havia por ali animação. Antes da «deita», frequentaram três dos Bares.

 

O Hotel ficava a dois passos. Amanhã era novo dia.

 

E remataram a missiva (palavrinha que se usava «intigamente» para significar «carta») com a promessa de me contarem as aventuras dos dias seguintes, no próximo correio.

 

- “É pra não te fazermos mais «imbeija», como dizeis aqui por CHAVES, ou julgas que não estamos a aprender?!” – terminava.

 

Uma carta destas!

 

E mandei eu estes dois marmanjos à NOSSA TERRA!

 

Era o que mais me faltava!....

M., 16 de Maio de 2015

Luís da Granginha

 

 

29
Abr15

Chá de Urze com Flores de Torga - 77


1600-torga

 

Granjinha, Chaves, 7 de Setembro de 1986

 

Uma capelinha visigótica arruinada perdida entre ramadas, com um original pórtico ornado de figuras zoomórficas que são desafios em pedra à imaginação. No telhado, uma airosa cruz vazada parece querer levantar voo. E dentro, por detrás do tosco altar de talha que durante séculos a escondeu, a mais bonita ara romana que se pode ver. É assim. O nosso génio criador, por mais que se exceda, acaba sempre nisto: num pungente testemunho de que só a incompreensão e o abandono esperam no futuro as obras de qualquer presente.

Miguel Torga, in Diário XIV

 

1600-granjinha (178)

 

 

 

14
Fev15

Granjinha - Chaves - Portugal


1600-granjinha (262)

Ao longo do tempo, ou se preferirem, com a idade, vamos fazendo descobertas que em tempos nos passavam ao lado. Estavam lá mas era como se não estivessem, aconteciam mas era como se não acontecessem. As casas, os pormenores das casas, as ruas, os lugares, um relvado, o arvoredo, o cantar de um rouxinol, o murmúrio de um rigueiro[i], eu sei lá… um ror de coisas que existiam e até poderiam ter a sua importância, e tinham, não por elas em si, mas pelo que elas guardavam ou elas nos pudessem proporcionar às nossas vidas e vivências. As casas, por exemplo, não eram importantes por serem grandes, por estarem bem localizadas, por terem materiais nobres na sua construção, em suma, não eram importantes pela sua arquitetura ou pelo seu valor monetário. As casas eram importantes pelo que tinham dentro e pelo que dentro delas acontecia. Eram importantes aquelas onde tinha amigos para brincar, aquelas onde havia uma rapariga que me fazia acelerar as pulsações, aquelas onde eu recolhia para comer, dormir ou encontrar consolo para uma dor de barriga. O mesmo ia acontecendo com os lugares, as ruas e tudo o resto por onde debitávamos os nossos passos e o nosso estar.

1600-granjinha (68)

 Claro que as referências que deixo atrás são referências ao tempo de criança e adolescente em que as horas do relógio apenas existiam para serem vividas, de preferência bem vividas, em vez de marcar e controlar o tempo das nossas vidas. Claro que tenho saudades desse tempo, principalmente das inocências desses tempos e do tempo não ter tempo, mas também com o tempo fui aprendendo a ter outros gostos e a descobrir a estética das coisas e até das pessoas, isto, claro, quando a têm. Foi outra coisa que também descobri, com o tempo.

1600-granjinha (264)

Tudo isto vem a respeito da Granjinha que já descobri no tempo de ser grande, e por isso a surpresa ter sido maior, grande também, pois nunca até aí tinha imaginado que a dois passos do centro da cidade poderia existir um lugar assim. Já a descobri meia despida de pessoas e assim pude reparar melhor no seu conjunto e nos seus pormenores, no agradável que foi descer a sua rua principal e sentir a sua frescura num dia quente de verão, a surpresa que foi ter descoberto a pequena capela românica e a surpresa de, com o tempo, descobrir as pessoas que lá descobri.

1600-granjinha (316)

E já que tanto hoje se falou do tempo e dos tempos do tempo, também começa a ser tempo de ir por lá com tempo para descobrir mais meia dúzia de olhares que o tempo me ensinou a descobrir. Então, até um destes dias.

 

[i] Há dias alguém me fez lembrar que lá para os lados onde nascemos era assim que chamávamos aos riachos ou ribeiras. Aliás o termo já não é novo aqui no blog, pois Herculano Pombo aquando deixava por aqui o léxico-glossário transmontano, definia assim o rigueiro: «pequeno rio “Eu te batizo neste rigueiro, para que tenhas olho vivo e pé ligeiro”»

 

 

 

21
Set13

Granjinha, sempre!


 

Se no meu tempo de criança e primeira adolescência eu debitava todas as horas livres do dia à veiga de Chaves e às faldas do Brunheiro, pois havia o tempo de escola e de missa aos domingos que me obrigavam a ir até à escola do Caneiro ou até à porta da Igreja da Madalena, quando não calhava ser no Jardim Público, e só muito raramente atravessava a ponte romana, e sempre para ir à procura da cura de uma gripe ao consultório do Dr. Alcino no Arrabalde. Já no tempo de rapaz mais espigadote, mas ainda adolescente,  em que as raparigas tinham mais atrativos que a veiga, dedicava as horas livres do dia ao Liceu (fosse para estudar ou não), ao Jardim das Freiras e à Rua de Stº António. De resto, só às vezes a ladeira da Brecha ou da Trindade para desaguar no centro comercial da Rua Direita para ir comprar protetores ou novas capas para as botas à alentejana, e claro, também o Tabolado …




Só já em adulto dos vinte e poucos anos comecei a ver que para além da veiga, do brunheiro, do Liceu, do Jardim das Freiras, da Rua de Stº António, das Ladeiras, da Rua Direita e do Tabolado, havia mais cidade, mas sobretudo havia muita e interessante vida que ia para além da cidade e da veiga de Chaves, que se ia escondendo ou abrigando por entre montanhas. Lugares e aldeias que lhes conhecia os nomes e até gente, colegas e amigos de lá, algumas que até já lá tinha ido aos arraiais e festas da(o) santa(o) padroeira(o), mas ia sempre com olhos de festa que para além da musica no coreto, o foguete no ar, as meninas a bailar e o cabrito na casa de um(a) amigo(a), mais nada viam.




Pois hoje que estou em maré de confissões, confesso que houve dois lugares, pequenas aldeias que me despertaram para a beleza do mundo rural e de todo esse mundo que vai além da cidade e da veiga. Um desses lugares foi a Ribeira de Sampaio que infelizmente hoje é uma triste memória da Ribeira que então conheci. A outra aldeia foi a Ganjinha quando uma vez (inícios dos anos 80) fui lá a pedido do saudoso Firmino Aires fotografar a capela da Granjinha. Lembro ser uma tarde de Verão, quente, muito quente, quando de repente a entrada da Granjinha me oferece um oásis de sombra, frescura, calmaria e beleza, tudo ali entalado num estreita entrada de muros altos cobertos de heras, onde apetecia ficar e nunca mais sair, mesmo com o convite de seguir rua abaixo e descobrir o que havia para lá da curva… e ainda bem que aceitámos o convite de continuar para a descoberta, e que descoberta! – um tesouro feito de pequenos tesouros,  daqueles que apetece guardar só para nós,  bem longe da vista dos olhares impuros e violadores que levassem aquele lugar à tentação do pecado de desfazer tudo o que ali existia.



A partir daqueles dois momentos (Ribeira de Sampaio e Granjinha) tudo começou a ser diferente e um a um, ou, uma a uma – lugar ou aldeia – começaram a ser rotas e destinos dos meus passos de descoberta, mas com olhos de ver, sem festas, bandas nos coretos e foguetes no ar. E felizmente fiz agradáveis descobertas, mas a Granjinha, por ser a primeira e por ainda hoje continuar quase como a conheci, apenas com um ou outro pequeno pecado e também a sofrer da doença do despovoamento e do esquecimento, continua a ter um lugar especial no coração, no cantinho das descobertas, não só pelo lugar, mas mais tarde também pelas pessoas, pois seria injusto se não referisse aqui a descoberta da família Petim Cruz (guardiões do lugar) e do Luís da Granjinha (O trovador da terra e das gentes), que tão bem a canta, defende e eleva.




E hoje fico-me por aqui, pois não quero esgotar a prosa e as imagens de um lugar onde quero regressar sempre, mas também para relembrar que aqui a um passo de cidade tão nobre, continua esquecida, principalmente no que toca ao tesouro da Capela Românica, uma das mais antigas e bela da região, para não falar do tesouro romano que por lá continua enterrado.



26
Ago11

Discursos Sobre a Cidade - Por Tupamaro


 

 

 

“MEMÓRIAS  da  GRANGINHA”

 

 

 

Mal o sol se levanta por trás do Castelo de Monforte logo o brilho dos seus olhos alumia e aquece a varanda da casa da Tia Maria do Campo.

 

Do lado desta a quem o sol deixa o último olhar antes de adormecer, a Amélia da Tia Maria do Campo pedala com firmeza na sua máquina de costura Singer, alinhando com toda a habilidade e presteza o tecido por onde a costura tem de ser feita.

 

A Laurinda chegou ofegante. Cuidar das galinhas, dos coelhos e dos recos fê-la atrasar um bocado. Mas já estava ali para pespontar as saias que a Amélia iria rematar e entregar a tempo e horas às clientes.

 

A Tia Aurora cumpre o ritual diário de dar de comer às pitas e passa meia hora a berrar com elas como se estas fossem culpadas dos bicos-de-papagaio que a trazem sempre atanazada.

 

A Tia Quinhas ralha com os burros, ainda refastelados dentro do palheiro da eira, prometendo-lhes um arraial de porrada logo que o Tio António Guarda volte do serviço.

 

A Elisa, com a desculpa de ir à «Pipa» buscar um cântaro de água, demora-se debaixo da figueira da eira a espreitar para o Alto do Cando a ver se vê a sombra do Jurel.

 

A resmungar com a sachola que leva ao ombro, o Tio Zé Lita desengonça-se, a caminho da «Lama».

 


Na curva da Casa Nova já se dá conta da chegada do Aníbal do Treno, pelo chiar do carro puxado por um burreco e pelos responsos que dá à mulher, desde que saiu das Casas-

-dos-Montes.

 

A Teresa do João Carteiro chama pela Hermínia, que só pensa na brincadeira, lá no CAMPO, em vez de entreter as irmãs mais novas.

 

O sr. Pinho, depois de beber umas goladas boas da água da «Pipa», senta-se ao fundo das escadas da casa da Tia São enquanto o seu enorme rebanho de cabras rapa as paredes. Com aquele jeito especial de pastor, assobia e chama umas cabritas. Muge-lhes o leite e dá para o Luisinho da Tia São uma caneca cheia.

 

 

A Tia Luísa Chardas solta a burra no pátio, carrega um braçado de lenha para acender o lume e vem sentar-se à porta, no cimo das escaleiras, guardada da rua pelo muro de pedra que até lhe serve de varanda, donde pode ver toda a gente que vai ou que vem do tanque, da fonte, da “Sobreira” ou do “Valcoelho”.

 

Pela fresca das tardinhas de Verão, deixando a cidade, atravessa a “Fonte Nova”, escala o “Monte da Forca”, ganha alento na travessia do “Pedrete”, sobe a ladeira das “Carvalhas” e vem tecer louvores à «Pipa» o sr.  José Valtelhas.

 

Deixava-nos espantado o apreço que este “senhor da cidade” manifestava pela NOSSA ALDEIA!

 

Estamos em crer que a sua inseparável bengala lhe servia de carruagem de luxo a fazê-lo chegar ao rincão do seu conforto.

 

A Tia Olinda prega os sermões diários   -   matutinos, vespertinos e «humorinos»   -   ao Lelo e ao João,  sempre que vai para o “Val’ da Cabra”, para a «vinha» ou à Fonte, ou quando de lá chega.

 

 

 

A Alice do Treno passa o dia a recomendar à Judite para ter cuidado com o sol, e ao Luís para não sair do quinteiro.

 

O Mário e o Júlio desafiam o Luís da Tia São para correr uma «Volta a Portugal em Bicicleta» ou ir a uma “corrida de grilos”.

 

Pegam nuns arames e constroem um guiador; atam-lhe dois frasquitos, cheios com água da «Pipa»; correm CAMPO acima, passam pela Sobreira, atalham pelo monte e pelo giestal do Picholeto, vencem o prémio da montanha no “Alto do Cando”, descem em louca velocidade até ao “Carvalho” e sprintam doidamente até à «Pipa», onde cortam a meta, a sede e o cansaço bebendo grandes goladas de água fresquinha e levezinha.

 

Para a “corrida dos grilos”, tradição deixada pelos romanos quando por aqui andaram (claro que estes faziam corridas com quadrigas, mas quem não tem cavalos corre com grilos!), iam às caixas de costura da mãe Teresa, os dois irmãos; à da prima Jesus, o Luís da Tia São. Desenfiavam as agulhas e rapinavam um dos “carrinhos de linha número 30. Rebuscavam todas as tocas de grilos que houvesse no CAMPO. Com as agulhetas de pinheiro esquiçavam  os cavalos, quer dizer, os grilos, para os apanhar à saída da toca. Se teimassem em não sair, aplicavam-lhes a dose certa de uma mijoca, que era remédio santo!

 

 

Dos calondros faziam os carros de bois, quase parecidinhos com os “carros de corridas” romanos. 

 

Pelo pescoço ou pelas patas, desde que se lhes desse um nó, lá se prendiam as «quadrigas» de seis ou sete (ou os que calhassem) grilos.

 

Riscos, de partida e de chegada, feitos na terra poeirenta do caminho de carro de bois, do CAMPO, contava-se até três e …

 

Ah! Grilos de um raio!

 

A agulheta de pinheiro transformava-se logo no açougue (látego) do Ben Hur e de Messala,  incitando os grilos a correr a galope.

 

O Mário, o Júlio e o Luís da Tia São, imitando o Charlton Heston … ou o Tio António Guarda, bem gritavam e berravam  com a «griliga».

 

Mas qual quê!

 

Os marmanjos só sabiam dar saltos e mais saltos. A torto e a direito. Prà frente e pra trás.

 

Ensarilhavam as linhas. E, às vezes, libertavam-se delas. 

 

Os carros tombavam. Soltavam-se-lhes as rodas. Partiam-se-lhes os cabeçalhos. Os eixos esfrangalhavam-se-lhes.

 

Os artísticos pedaços de calondro desfaziam-se em mil pedaços!

 

A Teresa do João Carteiro e a Avó do Luís da Tia São chamavam-nos para a ceia.

 

Eles não ouviam.

 

 

A Avó do Luís e a Teresa do João Carteiro gritavam para o neto e para os filhos irem comer.

 

O entusiasmo da corrida tornara-os moucos e tirara-lhes a fome!

 

Então, só quando viam uma vergasta no ar é que aqueles “gabiruns” desatavam a correr para casa.

 

Uns cascudos da mãe e uns “azoutes” carinhosos da Avó eram as coroas de louro com que aqueles três “galferros” saíam premiados.

 

Depois, chegado o luar de Agosto, as famílias punham-se à porta de casa a apanhar o fresco, em plácidas conversas.

 

Eram lindos os dias e as noites da MINHA GRANGINHA NATAL!

 

Tupamaro

29
Mai11

Freguesia de Valdanta - Chaves - Portugal


 

E enquanto não cai mais uma carta do Zé na caixa do correio, o que está previsto acontecer ao meio-dia em ponto, vamos até aqui ao lado, a uma freguesia rural ainda, mas que já entra pela cidade adentro.

 

 

Freguesia de Valdanta, com uma passagem pelo Cando, pela Arte Sacra do Românica da Granjinha e por Valdanta.

 

 

Valdanta recolhida dos olhares desprevenidos de quem apenas passa na estrada. Centro Histórico de Valdanta, sim, porque as aldeias também têm o seu centro histórico. Ainda ontem estivemos num, hoje é o de Valdanta, onde se adivinha, que antigamente este largo era o seu coração.

 

23
Jul10

Discursos Sobre a Cidade - Chaves de Sacristia - Por Tupamaro


 

.

 

“CHAVES  de  SACRISTIA”

 

 

Cidade de Chaves.


VILA que, já sendo Cidade, ainda assim a ouvia tratada pelos «antigos» da “MINHA ALDEIA”, pois vinham  dos últimos anos do século XIX e dos primeiros anos do século XX.


A «VILA», ou a «CIDADE» exercia um fascínio sobre as crianças lá do PoBo.


Do «Alto», do alto do CAMPO, ou da nossa varanda víamos bem “toda a cidade”.


Caída a noite, a nossa Aldeia e as nossas casas eram alumiadas pela luz das candeias, das lareiras; ou pela Lua, quando o céu deixava, ou pelos fachucos de palha; ou, ainda, pelos relâmpagos.


Caída a noite, a cidade ficava, salpicada de estrelas, a brilhar.


A «recta de Outeiro Juzão» era um dos nossos pontos de mira. Era a avenida de liberdade dos nossos sonhos quando “fôssemos grande”.


O automóvel ainda era uma raridade. E todo e qualquer «chòfere» que passasse na “Recta de Outeir’juzão” fazia roncar bem o seu carro, como a querer dizer a toda a gente do CAMPO DA RODA ………e da GRANGINHA que «Ele» ia ali. Para nós era sempre o carro do RAMBÓIA!

 

E imaginávamo-nos  quando «formos grande»,  a guiar um carro na Recta de Outeir’juzão e «fugir» mais depressa e a «roncar» com mais força do que o Rambóia!...


Vir à Cidade, pela mão dos primos  ou da Avó, era um dia de festa. Éramos vestido que nem um príncipe!


E, no Verão, a promessa de uma ida à Vila era garantia certa, para a família,  que aceitávamos dormir a sesta sem rabujar.


E havia sempre quem acompanhasse essa «saída» até às CARVALHAS.


Desciamos para o “Pedrete “ a dar saltos quase maiores do que os dos coelhos, por ali abundantes, assustados com o nosso contentamento.


Chegado à fronteira do «Treiladrão», entrávamos no território do “Monte da Forca”.


Era a vez de nós tomarmos a vez aos coelhos, e só à chegada à “Fonte Nova” é que conseguíamos sacudir o susto que o «……..ladrão» e o «………forca» nos tinham causado.


E, aqui, no Apeadeiro da Fonte Nova, começava, para nós, A CIDADE.


A D. Lucindinha recebia-nos com alegria e mimos. Demorávamo-nos aí mais um pouco se o comboio estivesse para chegar.


A D. Lucindinha vestia uma bata e pegava atempadamente numa bandeirola, ora verde, ora vermelha, enrolada num trocho redondo.


Cumprimentos cumpridos, guloseima «afinfada», descíamos por um caminho que nos fazia passar em frente à Pensão Reina. Atravessávamos o pontão do Ribelas e subíamos ao Postigo.


Aí, entrava-se nas ruas mais estreitas da Cidade, que mais estreitas nos pareciam com as pessoas que saíam à rua para nos ver e saudar. E a nossa sorte continuava porque um rebuçadito , uma amêndoa ou uma bolacha também apareciam, para nosso gosto.


Em duas ou três casas, para onde a Avó levava um raminho de salsa, uma tigela de marmelada e meia dúzia de ovos, demorávamos mais tempo. E, entre as conversas da Avó com as «pessoas amigas, da cidade», além de carinhosas palavras, calhavam-nos sempre um Pastel de Chaves, um «doce de champanhe», rebuçados e, às vezes, uma moeda luzidia de dois (2) tostões.


Pela fresquinha do fim do dia era o regresso.


A Avó fazia o «compasso» das visitas com tempo e horas para ficar cumprido «a modos que» chegássemos a casa a tempo e horas de tratar da ceia.


Na Fonte Nova , a paragem habitual para uns restos de conversa entre a D. Lucindinha e a Avó.


Devagar, lá se ia subindo o Monte da Forca. E devagar ia a Avó fazendo as recomendações e os louvores ao NETO da GRANGINHA.


A travessia do Pedrete dava para recuperar as energias gastas na subida do Monte da Forca e ganhar mais algumas para subir até às “Carvalhas”, passar pela “Casa Nova”, até se descansar no “Largo do Carvalho”, onde se contavam algumas das novidades, trazidas da Cidade, à Tia Aurora da Abobeleira, e  à Tia Maria do Campo, e se entregava o maço de cigarros ao sr. Petim.


Chegado a casa, demorávamos a escutar ou a entender o que nos diziam. Trazíamos connosco, cá dentro no pensamento e no coração, bolsos, sacos e seiras cheiinhos de fantasias, de interrogações e de certezas para quando fôssemos «grande».


A Cidade parecia-nos uma sacristia do céu.


E CHAVES, a maior terra do mundo e arredores.


O NETO DA GRANGINHA, ora avô, diz, por aqui, «ausente» porque se deve amar “A NOSSA TERRA”!


Oh! TERRA LINDA, ó TERRA AMADA!!!



Tupamaro

 


28
Nov09

A teimosia da pedra - Chaves Rural, Portugal


 

.

 

A teimosa da pedra vai-se mantendo de pé. Habituada que está à sua idade milenar, cairá só, e quando, nada tiver para a sustentar. Teimosamente continuará na função que lhe destinaram, de pedra sobre pedra, construir um abrigo, uma casa, um lar. Teimosa, deixa-se invadir por musgos e verdetes. Alheia a tudo e a todos diz teimosamente presente e, só a fúria da natureza que a pariu, terá força, um dia, para a tombar. Mas isso, será um dia…

.

 

.

Aqui e ali, um pouco por todo o lado, mas sobretudo na montanha de onde quase sempre sai, quase sempre fica. Teimosa, estática, adormecida. Nem o bater das portas e janelas abandonadas, entregues a si próprias, num vai e vem constante se o vento sopra, terá força para a acordar e teimosamente, continuará adormecida. Com adorno ou sem adorno, continuará a ostentar a sua presença.

.

 

.

Mas nem toda a pedra tem a mesma condição e, embora teimosamente seja a mesma, a algumas destinaram-lhe a nobreza dos templos. Assumida a arte da cantaria, da mestria dos relevos, deixa a natureza milenar para assumir a beleza secular dos tempos e dos templos que, embora carregados de fé, outrora dos Deuses, hoje de um Deus só, nem sempre têm a salvação garantida e, embora teimosamente lá, no sítio da sua condição, nem sempre tem a condição do sítio.

 

Há no entanto finais felizes e, o homem que corta, talha e ergue a pedra, às vezes, talvez num arremesso de alguma dignidade, lembra-se da nobreza e da dignidade que as pedras da fé devem ter.

20
Set09

Granjinha, Chaves, vista por Torga - Portugal


 

.

 

Granjinha, Chaves, 7 de Setembro de 1986

 

Uma capelinha visigótica arruinada perdida entre ramadas, com um original pórtico ornado de figuras zoomórficas que são desafios em pedra à imaginação. No telhado, uma airosa cruz vazada parece querer levantar voo. E dentro, por detrás do tosco altar de talha que durante séculos a escondeu, a mais bonita ara romana que se pode ver. É assim. O nosso génio criador, por mais que se exceda, acaba sempre nisto: num pungente testemunho de que só a incompreensão e o abandono esperam no futuro as obras de qualquer presente.

 

Miguel Torga, Diário XIV

 

 

.

 

 

Sobre mim

foto do autor

320-meokanal 895607.jpg

Pesquisar

Sigam-me

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

 

 

19-anos(34848)-1600

Links

As minhas páginas e blogs

  •  
  • FOTOGRAFIA

  •  
  • Flavienses Ilustres

  •  
  • Animação Sociocultural

  •  
  • Cidade de Chaves

  •  
  • De interesse

  •  
  • GALEGOS

  •  
  • Imprensa

  •  
  • Aldeias de Barroso

  •  
  • Páginas e Blogs

    A

    B

    C

    D

    E

    F

    G

    H

    I

    J

    L

    M

    N

    O

    P

    Q

    R

    S

    T

    U

    V

    X

    Z

    capa-livro-p-blog blog-logo

    Comentários recentes

    FB