Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

08
Jan12

Momentos de um sábado a caçar imagens


Pareço regressado aos tempos antigos da caça à fotografia para o blog, ou seja, saía de casa com a intenção de fotografar uma aldeia que tinha em mente e acabava sempre por fotografar outras. Deve ser assim como ir à caça do coelho e trazer perdizes, digo eu que não sou caçador.

 

 

Pois a primeira ideia era sair de Chaves e ir mais uma vez até terras de S. Vicente da Raia, mas como as tardes ainda são pequenas e as terras de  S.Vicente não ficam propriamente aqui ao lado, decidi-me por terras mais próximas. O Planalto do Brunheiro serve sempre para uns cliques, além disso há em mim um certo prazer em fazer frente ao frio. É certo que dói, mas não me vence. Também sempre fui um bocadinho teimoso.

 

Hora de ponta entre Adães e Santa Leocádia

 

Pois lá fui eu pela famosa EN 314 acima. No Peto de Lagarelhos temos sempre outra decisão a tomar, ou continuamos a subir, ou descemos para o vale de Loivos. Mas ia mesmo decidido a subir até às terras das estórias do Gil Santos. Em France, um presépio chamou a minha atenção. Fiz o registo mas quase nem parei. Ia com ganas de continuar a subir e finalmente cheguei à primeira croa da Serra. Ali mesmo onde Carregal decidiu ficar e lançar olhares para o Brunheiro e para a Padrela (claro que falo das serras). Repeti por lá umas voltas, fiz novos registos, não muitos, pois a aldeia também é pequena e ainda dei dois dedos de conversa com uma senhora cujo rosto quase não se via, protegido que estava dos ares da serra com um lenço de lã a cobrir-lhe toda a cabeça. Em tom de provocação ainda perguntei pela gente da terra. – Há poucos, só quase velhos e todos doentes, ainda agora venho de ver um… disse-me. E verdade seja dita, nos 15 ou 20 minutos que andei por lá, só vi mais duas pessoas no amanho de uma horta por trás da Capela. Já não há gente para fazer mais estórias para o Gil nos contar.

 

 

Já que ali estava, toca até Fornelos. É só descer da croa do monte, descer um bocadinho e subir até outra croa que se transforma em planalto. Tudo pela EN 314. Bem, em Fornelos bem tento sacar mais umas fotos, e saco sempre, mas ando sempre à volta sem conseguir o que quero. Desta vez até entrei no concelho de Valpaços sem me aperceber mas cheirou-me logo que aquilo já não eram terras de Chaves. Nem parei. Não que tenha alguma coisa contra o concelho de Valpaços, antes pelo contrário, mas foi só por uma questão de território. E foi a pisar sempre a fronteira que atravessei a 314 e fui até Vale do Galo. Nesta, idem Fornelos. Para além das fotos que tenho em arquivo, da aldeia propriamente dita, não consigo sacar mais nenhuma. Mas na envolvente, aí já a cantiga é outra e há sempre motivos que encantam. Olhem só para a foto que a seguir vos deixo se não parece mesmo uma alameda de um parque de cidade em pleno outono e sem bancos como o Jardim Público. Mas não é, pois esta alameda é às portas de Vale do Galo e é de um souto que se trata.

 

 

Os dias são pequenos e as tardes, então, quando se vai a dar conta já a noite está a bater à porta. Descida apressada para Santa Ovaia com intenção de apanhar novamente a 314 no Carregal, mas ao passar a ribeira o murmúrio das águas convidaram-me a parar, e parei. Também nunca resisto a estes momentos de pura poesia onde tudo é puro e simples. A água é cristalina, o ar é frio mas absorve-se com odores de perfume e os sons são sinfonias. Não sei se os conseguem ver na primeira foto de hoje. Demorei mais do que tinha previsto, pois o aproveitei para fazer e testar uns registos que há muito tinha em mente. Mas não foi tudo, pois chegado a Adães lembrei-me de passar pelo seu miolo e veio-me à lembrança a luz doirada a iluminar a Igreja Românica de Santa Leocádia (terceira foto de hoje). Não podia perder esse momento, mas com jeito, conseguiria ainda o por do sol visto na descida do Carregal para France. Claro que o atraso ia sendo fatal para poder ver ainda a magia do por do sol por entre um avolumado mar de montanhas que lá de cima se avistam. Nas croas dos montes o sol estava naquele momento mágico de pedir um clique fotográfico, mas o raio da 314 não nos deixa encostar em nenhum desses miradouros naturais e havia que descer à pressa até Lagarelhos, pois dali as vistas também encantam, mas tarde de mais, o sol já estava por trás da última serra. Só havia mais uma oportunidade – a de subir o Brunheiro, pois antes mesmo de se chegar a Santiago do Monte, há por lá um sítio já meu conhecido destas contemplações da despedida do sol, e ontem, os tons do céu estavam imperdíveis.

 

 

Como podem ver pela foto que atrás vos deixo, cheguei mesmo na hora H para conseguir os segundos mágicos em que o sol se deixa ver pela última vez, já meio comido pela última serra. Após este momento apenas me restava descer novamente ao vale com espírito de missão cumprida e esperar pelo nevoeiro que vem sempre com a noite, mas desse, hoje não tenho registos.

 

Até logo, ao meio dia, com o nosso Léxico-Glossário.  

 

 

 

 

07
Jan12

Crónicas Ocasionais - Moco de Pavo


 

“Hoje, ao ouvir Lopes Graça – “Acordai” – resolvi-me a mandar-lhe o último comentário alargado, feito acerca do texto  «A Memória e a Mentira», do João Madureira.”

 

 

MOCO DE PAVO”

(A memória e a mentira)


Caro autor, por mais que se envergonhe esse «pavãozeco de Castelões» nada se adianta.


Tal amostra de politicastra, qual políticoneiro de silicone residual e curioso modelo de sem-vergonha, depois de ter conseguido violar todos os valores culturais e sociais, conseguiu sublimar o seu complexo de inferioridade e de ridicularia com a falsidade e imposturice com que se fez aceite numa família política que ideologicamente nem é carne nem é peixe.


Sentiu-se salvo, safo, da sua pungente mediocridade quando conseguiu protecção e abrigo junto de outros maltrapilhos políticos, alguns com menos dose de miséria moral e cultural que a sua.


Conseguiu virar o bico ao prego da sorte da sua vida. E isso dá-lhe segurança e distanciamento perante aqueles que lhe descobrem a careca.


Costuma dizer-se que a verdade é como o azeite. Mas quando uma população descobre o engano que suportou de gente ronhosa e sem vergonha, tantas vezes se não chega a tempo de emendar o erro!


Hoje no desempenho da atividade política exige-se verdade e memória.”,atribui ao pavãozeco.


Vê?! Apanha-se mais depressa um mentiroso que um cocho!


É que essa figura sinistra da vida pública Flaviense está condenada à «damnatio memomriae» dos Flavienses e Transmontanos.


Fala, esse papagaio engasgado, fala de memória!


Saberá ele que grande parte da memória implica o Pensamento?


Todo o acto de recordar exige ter-se sido bem sucedido na aquisição, armazenamento e recuperação de conhecimento - é preciso ter-se aprendido.


Ora esse pavãozeco não aprendeu Humanidades.


Nas suas circunvoluções cerebrais não constam nem foram codificados dignos traçados mnésicos.


Testem-no. E logo darão conta que não tem capacidade de Reconhecimento!


Desprovido de memória, para gentalha dessa só existe o AGORA.


Cheia de pesporrência, é vazia de Consciência essa ave pernambucana. Nem conta dá do seu triste e miserável desempenho das tarefas em que deveria assumir a defesa e protecção dos seus conterrâneos e representados.

Esse pindérico politiqueiro confunde memória com associação casual e oportuna deste ou daquele meio ou processo para atingir os seus próprios e egoístas fins.


Pobre de Conhecimento - que não de «sabiciche porcalhota» ( arranjou uns «conhecimentozitos», sim, senhor! ) - não tem competência para o Pensamento.


As suas representações mentais afunilam-se somente na sua imagem de pavão.


Vai-lhe valendo a inoperância, a fragilidade e as fraquezas das forças políticas locais adversárias. Estas, eivadas dos mesmos vícios de atitude política, resignam-se a um raro e envergonhado, por vezes ridículo, foguetório de bacoco palavreado, mais para sacudirem e apanharem umas míseras migalhitas da mesa do adversário do que para lhes causarem qualquer susto, quanto mais derrubá-lo.


Uns e outros - uns, por acção, outros, por inacção - em nome do que é digno e merecedor para a NOSSA TERRA, o que estão a merecer é uma execução………………….. «em efígie».


A «exigit sinceras devotionis affectus» tem de ser adaptada e aplicada a essa gentalha, ora perniciosa, ora desleixada, no cumprimento dos seus deveres e obrigações de FLAVIENSES e, ou, seus representantes, mesmo que trampolineiramente eleitos.


“Hoje no desempenho da atividade política exige-se verdade e memória” é caso para se dizer a esse demagogo, ‘inda pra mais se ele vier aqui meter o bico":


- eis aqui mais um dos seus «mocos de pavo», seu idiota!


Tupamaro

 


07
Jan12

Pecados e Picardias - Por Isabel Seixas


 

Do  Luar

 

Nessa noite fizeram dele refúgio, do luar

Encostados como náufragos sem esperança

Militaram um cansaço cansado de acamar

Perderam-se nos corpos como luz em lança

 

Traíram os  valores e princípios na entrega

Último  desejo de quem morre em guerra

Consciência plena de quem não se faz

Capturam o momento em que sentem paz

 

Retiram do luar o brilho ténue , inocente

Num abraço livre,  tão perene de carente

Sabem do luar , os  segredos indizíveis

 

Já se sente a dor de augúrios previsíveis

Pecam como amam  e do luar sedentos

Num ardor maldito indiferente aos tempos

 

Isabel  Seixas

 


07
Jan12

Duas aldeias, Três fotografias


Mais logo, ao meio-dia, teremos por aqui mais “Pecados e Picardias” de Isabel Seixas, mas enquanto não chegam, há tempo ainda para três fotografias com uma voltinha por duas aldeias.

 

Esta primeira foto é de Moreiras em dia de chuva e de inverno, ou seja, um dia dos nossos atuais dias.

 


 

Não sei se já deram conta, mas da minha parte já estou a tentar escrever com o novo acordo ortográfico. Quanto aos restantes colaboradores do blog, eles lá entenderão como querem escrever, pois este blog é democrático e cada um escreve como lhe dá na gana.

 

Mas passemos à segunda fotografia que também é do pormenor de frio numa aldeia das nossas, mais propriamente de Carvela a reproduzir um fenómeno que costuma acontecer por lá, nas terras altas do Brunheiro e que acontece sempre quando as temperaturas são negativas (nesta foto o termómetro do meu carro marcava -10ºC) e o ar (geralmente nevoeiro) sobe do vale de Chaves. Se repararem bem na foto, os troncos e ramos da árvore só tem gelo num dos lados, ou seja no sentido da deslocação do ar. Este fenómeno, embora frio, cria momentos interessantíssimos e autênticas esculturas em gelo. Vale a pela ver, mas bem, muito bem agasalhado. Agora imaginem o que é viver em Carvela, ou Maços ou Santiago do Monte (aldeias vizinhas onde o fenómeno também acontece). É por estas e por outras que a nossa interioridade também dói e que eu costumo dizer que deveríamos ter um subsídio para o frio, mas não, aliás a nossa interioridade de montanha acaba de ser premiada com mais um aumento no gasóleo de aquecimento e no gás natural com o abrupto aumento de IVA. E depois ainda se admiram que as nossas aldeias esteja despovoadas e algumas à beira do fim. Já começo mesmo a acreditar que eles não nos querem cá e querem mesmo fazer disto uma coutada reservada para os dias de caça dos senhores de Lisboa, onde pela certa o IVA será à taxa de 6%. PQOP. Mas quem sabe se de tanto nos gozarem, em vez deles virem para cá à caça, não vamos nós para Lisboa à caça do coelho. É que por aqui, acredito que a fome já começa a apertar, já nem falo do frio, que a esse já estamos habituados, não é!? Pois é, mas dói na mesma.

 

 

E para terminar,  mais uma foto, que embora pudesse ser de um telhado qualquer perto de si, não é. Este telhado, e suponho que também a personagem que o decora, também é de Carvela, num fim de tarde muito tarde quase de noite.

 

 

E por agora é tudo. Não esqueça que ainda vamos ter “Pecados e Picardias” e para amanhã, continuamos com mais momentos das nossas aldeias e com a continuação do abecedário no léxico-glossário cá da terrinha de autoria de Herculano Pombo.

 

Da minha parte, até amanhã.  

 

 

06
Jan12

Discursos Sobre a Cidade - Por António de Sousa e Silva


 

ACORDAI!...


I


Deambulando pela casa, em plena fase de convalescença de uma doença esquisita, que me diagnosticaram, dou comigo pondo ordem nas estantes de livros que já há muito não lhes punha os “olhos em cima”. Por entre as obras dos sociólogos Anthony Giddens, Francesco Alberoni  e do filósofo Daniel Innerarity, caiu-me aos pés um pequeno opúsculo intitulado «O pessimismo nacional (ou de como os portugueses procuram soluções de esperança em tempo de crise social)».


Trata-se de uma publicação de 1908, reeditada em 2008, por ocasião dos cem anos da sua publicação e, sinceramente, não faço a mínima ideia de quando e porquê a comprei.


O que é certo é que o título, só por si, e agora, foi suficiente para o ler de uma assentada.


Manuel Laranjeira, o autor deste opúsculo, depois de fazer um diagnóstico do Portugal dos finais de novecentos, imprime a este escrito uma mensagem de confiança num Portugal que queria diferente.


Contudo, e o mais irónico, é que este autor, meses depois de escrever esta obra, em carta dirigida a Miguel Unamuno, a 28 de Outubro de 1908, confessava-lhe: “Há meses ainda, quando Portugal atravessava os dias terríveis da ditadura de Franco, eu cria que íamos ressurgir. Hoje, porém, há uma tranquilidade podre que me assusta deveras. Não falta mesmo por aí quem diga que isto não é já um povo, mas sim – o cadáver de um povo. Em Portugal chegou-se a este princípio de filosofia desesperada – o suicídio é um recurso nobre, é uma espécie de redenção moral. Neste malfadado país, tudo o que é nobre suicida-se; tudo o que é canalha triunfa”.



Manuel Laranjeira, tal como Antero, Camilo e Soares dos Reis acabou por resolver o “mal-estar colectivo” com a sua tragédia individual.

 

E porque falar deste texto neste escrito que agora vos dirijo?

 

Pelo valor do mesmo, pois, um século depois da sua publicação, a sua contemporaneidade continua actual e pertinente.

 

Os factos aí apontados prevalecem, com matizes embora diferentes e não tão carregados, no Portugal de hoje, ou seja: uma população deficientemente instruída e, por isso, passiva e pouco desperta para as questões da cidadania, incapaz de “resolver a questão social e interessar-se pelas ideias de justiça; uma minoria intelectual, num país “onde o pensamento representa um capital negativo” e “onde a inteligência é um capital inútil” – porque apenas reina a mentalidade do “chico espertismo” -  e que não consegue despertar o sentido colectivo do povo e da nação, educando e mobilizando o povo; uma classe dirigente que é uma “polilha parasitária”, que transforma a nossa vida política, económica e moral, numa série lastimosa de actos de egoísmo individual, impondo-se despoticamente ao egoísmo colectivo, ao interesse da nação, subjugando-o; dirigentes políticos que não conseguem interpretar os sinais da sociedade, verdadeiros “parasitas messiânicos” que rapidamente sucumbem e desfraldam as esperanças neles depositadas.

 

Uma sociedade tricéfala, em que “uns têm deficiência educativa; outros têm demasia educativa e outros têm corrupção educativa”.

 

Um Portugal sem sinergia, coesão cívica, com prevalência do interesse  individual ou de grupo sobre o nacional.

 

 Um Portugal em que vestimos à moderna, mas continuamos a pensar à antiga.

 

 

Por isso, não é de  admirar que, em tais circunstâncias, o pessimismo tome conta de todos nós. E, quando reagimos, apenas apontamos culpa à vida, ou então, esperamos que alguma intervenção divina nos salve.

 

Mas não. Só nós, como colectivo, é que nos podemos salvar. Não terceiros, quer venham de dentro ou de fora. Para isso, é preciso despertar, acordar. Desta letargia em que nos encontramos. Dando valor ao esforço e ao trabalho. Acabando com a disparidade entre o esforço despendido e a produtividade. Todos. Mesmo. Mesmo todos!

 

A inversão de tal estado de coisas é possível e obrigatória, ainda que tal seja necessário um forte espírito mobilizador, acompanhado de um profundo esforço e uma inabalável tenacidade. Os tempos de crise servem também para isso. Para nos por à prova. Exercitando verdadeiramente a cidadania, pondo à prova a nossa capacidade empreendedora e o verdadeiro sentido de justiça, pondo termo ao “triunfo da canalha”.

 

 

II

 

No último dia de 2011, dou comigo a passar os olhos por um artigo de opinião de São José Almeida, no Jornal «O Público». A páginas tantas a autora diz: “No plano da revolução, o ano de 2011 foi o ano 1. Está em marcha uma revolução imposta pelo poder político e accionada pelo Governo PSD em coligação com o CDS, um executivo de maioria absoluta, legitimado por eleições democráticas, em que estes dois partidos beneficiaram daquilo que se chama o voto de protesto, a única forma eleitoral que os cidadãos têm para mostrar o seu desagrado pelo desempenho do Governo anterior, liderado pelo PS de José Sócrates. E o paradoxo não deixa de se afirmar nesta solução. Os eleitores votam em protesto com um modelo de governação influenciada por opções neoliberais, que responsabilizamos pela perda da sua qualidade de vida, mas acabam a eleger uma maioria que assume frontalmente a sua orientação neoliberal”.

 

Mais adiante esta autora afirma que 2011 foi, assim, “o ano em que o Governo lançou as bases da revolução que quer operar e de que a mensagem de Natal do Primeiro-Ministro foi mais um momento. O objectivo assumido é cristalino e passa pela desestruturação do que é a herança da Revolução do 25 de Abril e o modelo de organização social baseado no Estado-Providência que tem como paradigma a redistribuição da riqueza, orientada por critérios de política social e de igualdade de tratamento pelo Estado. Isto para construir uma sociedade baseada na utopia do fim do Estado e no regresso do Estado Assistencialista. E em que o centro da acção política deixa de ser o bem-estar de todas as pessoas, de acordo com princípios de igualdade de tratamento, passando a um novo paradigma em que a regra é a liberdade de mercado, a lógica da gestão privada e a defesa dos interesses privados dos detentores dos grandes grupos económicos multinacionais, da banca ao petróleo, da indústria de guerra à farmacêutica”.

 

 

Permitam-me um desabafo pessoal. O meu afastamento em relação ao PS, em termos de militância activa, teve a ver exactamente com duas questões. A primeira é que o PS deixou-se ir na deriva neoliberal, apostando, e muito mal, num homem (José Sócrates) que não só não era messiânico como tão pouco um verdadeiro líder político. José Sócrates foi um engodo que o PS engoliu. Qual canto de sereia. Um produto perfeito do nosso mundo globalizado e que os media (nas mãos dos grandes possidentes financeiros) projectaram enquanto lhes conveio. Foi, efectivamente, um actor diligente e aplicado. Com boa representação. Nada mais do que isso. A segunda questão tem a ver com a(s) esquerda(s), seu posicionamento na sociedade pós-moderna, globalizada e respectivo(s) projecto(s) de futuro. Quando apregoava, localmente, que o PS deveria ter uma outra postura na sociedade, aceitando, nomeadamente, e integrando (os seus militantes) movimentos sociais diversos, minha voz foi pouco ouvida. A democracia faz-se com os partidos. Mas não se esgota neles. Pelo contrário. A democracia constrói-se na medida em que os partidos dêem o palco ao cidadão. A todo o cidadão. Para que se manifeste. Para que participe. Para que use a sua cidadania. Viver-se apenas à sombra do militante é abrir caminho a processos de corrupção e ao “triunfo da canalha”. E, quando o militante, ou qualquer cidadão, exerce qualquer cargo, fá-lo, deve fazê-lo, com verdadeiro espírito de serviço público e não de seita.

 

A questão com que o cidadão português – e porventura todo o cidadão europeu – se depara, face a este galopar do capital financeiro internacional e do modelo neoliberal que este senhor dos Troca Passos nos está levando, é a seguinte: se as saídas da crise terão um sentido regressivo ou progressivo, contra ou a favor das pessoas e se evoluiremos por formas de organização social mais autoritárias ou mais democraticamente participadas.

 

Positivamente, estou pela segunda. Mas há, pois, que acordar.

 

 E, tal como Umberto Eco diz na sua obra Construir o inimigo (e outros escritos ocasionais), há que construir, e ver onde está o nosso inimigo como colectivo, povo, nação, para melhor definirmos a nossa identidade, o nosso sistema de valores, por forma a sabermos identifica-los e, no seu confronto, nos possamos mobilizar como povo que se orgulha da sua longa, vasta e rica história, e que jamais se deixa definhar. Mostrando à Europa que não somos “aqueles coitadinhos” que não sabem cuidar deles, mas um povo que contribuiu decisivamente para dar a esta (Europa) a identidade que esta mesma (Europa) se orgulha em apregoar. Tendo peito e força suficientes para dizer a quantas senhoras Merkel ou senhores Sarkozy, tal como Cícero dizia no seu discurso contra Catilina – as célebres Catilinárias -:

 

«quosque tandem, Catilina, abutere patienta nostra?»

(até quando, Catilina, abusarás da nossa paciência?).

 

Aqui a esquerda democrática, e o PS, em especial, tem uma palavra decisiva. Mas, para isso, tem de regressar ao verdadeiro espirito das suas origens.

 

 

III

 

2 de Janeiro de 2012. Dou comigo a ler um delicioso artigo, de João Madureira, sob o título «A memória e a mentira», publicado no seu blog TerçOLHO.

 

 Pois… diria também. A coerência… De que tanto falta na política. Como aliás na vida. Porque, numa sociedade que usa tão profusamente o registo, é mais fácil apanhar um mentiroso que um coxo.

 

Gostei particularmente de constatar dois aspectos.

 

O primeiro, que João Madureira, como cidadão livre, independentemente da sua filiação partidária, se assume como potencial candidato à próxima Câmara Municipal de Chaves. E não podia escolher palavras mais bonitas e apropriadas como aquelas que proferiu: “Chaves necessita muito mais do que quem ambicione geri-la como capataz. Chaves reclama quem a desenvolva, quem lhe restitua a alma. Chaves reclama quem a ame”.

 

O segundo, que mais do que fulanizar uma campanha, a atenção do cidadão e dos candidatos vai, deve ir para o projecto, para o futuro. Por isso, e muito bem, como intelectual e homem da cultura de que se reclama, apresenta já os tópicos que, na sua opinião, devem presidir ao debate, a saber: o definhamento e morte do coração da cidade nas Freiras; a descaracterização do Jardim Público; o abandono da terra por parte da nossa população jovem; o desaparecimento da agricultura; o definhamento das tradições; a actividade cultural; as estruturas de apoio à indústria; o ensino superior em Chaves; a agonia do comércio local.

 

 

É certo que se trata apenas de uma primeira elencagem. Mas, creio, suficiente para nos despertar, nos acordar e, consequentemente, mobilizar, a todos, para a pré-campanha que se avizinha, que está já aí no terreno, e para as tarefas do nosso quotidiano. Aqui, onde a vida nos acontece e que, por isso mesmo, o desenvolvimento deve ser feito.

 

Acta est fabula.

 

António de Souza e Silva

 

P(ost) S(criptum) – Queria deixar aqui uma questão ao presuntivo candidato João Madureira. Mas gostaria que não a entendesse como provocatória. Apenas uma simples pergunta. Durante esta quadra do Natal, Ano Novo e Reis, passei por diversas localidades. Em todas elas observei o ar austero, franciscano mesmo, como se apresentavam, nestes tempos de crise e austeridade, os seus respectivos centros e centros históricos. Chaves, em conversas com alguns amigos de cá e de fora, foi uma das cidades que mais caprichou no engalanar das suas ruas do centro histórico, nesta quadra. Face a este facto, e no contexto de crise em que vivemos, será apropriado referir que o comércio local de Chaves está em agonia?

 

PARA VER E OUVIR O VÍDEO, POR FAVOR DESLIGUE O RÁDIO NA BARRA LATERAL ESQUERDA DESTE BLOG.

 

 

 


 

 

Música – Fernando Lopes Graça;  Letra – José Gomes Ferreira

 

 

Acordai


Acordai,

Homens que dormis

A embalar a dor

dos silêncios vis!

Vinde, no clamor

Das almas viris,

Arrancar a flor

Que dorme na raiz!

Acordai,

Raios e tufões

Que dormis no ar

E nas multidões!

Vinde incendiar

De astros e canções

As pedras e o mar,

O mundo e os corações!

 

Acordai!

Acendei,

De almas e de sóis

Este mar sem cais,

Nem luz de faróis!

 

E acordai, depois

Das lutas finais,

Os nossos heróis

Que dormem nos covais

Acordai!

 

 

 

05
Jan12

O Homem sem Memória (83) - Por João Madureira


 

Texto de João Madureira

Blog terçOLHO 

Ficção

 

83 – E o António, depois de muito cabecear, desesperar e toleimar contra os códigos dos testes de código, conseguiu obter a tão almejada carta de condução. Um presunto, dois contos de reis e uma que outra palavrinha dada pelo Jeremias da Dona Augusta aos homens certos, foram argumentos suficientes para que os anjos bons descessem sobre a sala de exame e soprassem ao ouvido do António as respostas adequadas. Mas se no código teve auxílio, na condução safou-se sozinho. A não ser assim, lá tinha ido o pé-de-meia para o catano e o sonho de ter um carro para o maneta.


Agradecido, o Roberto Carlos do Bairro Operário cantou gratuitamente na festa da comunhão solene do filho primogénito da Dona Augusta. Diz quem assistiu que teve uma das melhores actuações da sua breve carreira, sensibilizando enormemente todos os convidados e influenciando decisivamente o nascimento do segundo rebento da Dona Augusta e do seu fervente esposo e efectivo, mas não único, galanteador.


Com a carta no bolso, e algum dinheiro no banco, o António deu luz verde ao pai para tentar apalavrar um carro em segunda mão, mas em bom estado. No entanto, com o dinheiro que ambos juntaram, somente conseguiram comprar um NSU branco, em terceira mão e em estado crítico. E se a chapa revelava sinais evidentes de acidente aparatoso seguido de um agressivo trabalho do bate-chapas, o motor gaguejava, soluçava e aquecia como uma panela de pressão. Apesar de velho e cansado, o calhambeque do António pai e do António filho conseguia prestar os serviços mínimos sem grandes sobressaltos.


Como ambos e dois trabalhavam na cidade, conduziam à vez o automóvel e, também à vez, metiam gasolina que pagavam dos respectivos bolsos. Durante o primeiro mês, tudo correu às mil maravilhas. Mas como as geadas de Janeiro em Névoa eram medonhas, pela manhã o carro recusava-se pegar a trabalhar porque as velas não davam chispa, a bateria descarregava-se com uma regularidade estranha e a água congelava no radiador. Ou seja, logo de manhã, à vez, toda a família, e alguns amigos, eram requeridos para empurrarem a viatura rua abaixo, até o motor arrancar. Algumas vezes, houve mesmo necessidade de empurrar o NSU do bairro até às portas da cidade. E quando ele finalmente pegava, o caminho a percorrer até ao trabalho era tão exíguo que quase sempre a rapaziada se perguntava para que raio é que servia o chaço. Está claro que o filho António, ou Toninho, no doce linguajar da sua mãe, mais o António pai ficavam fulos com os apartes, mas não produziam qualquer comentário. Desde logo porque podiam perder a amizade e pôr em perigo a disponibilidade dos familiares e amigos que gentilmente faziam o favor de empurrar o carro, mas também porque consideravam que um automóvel, mais do que um meio de transporte, constituía uma forma de afirmação social. Além disso, a inveja matou Caim.


Tanto o pai António como o António filho, ou Toninho, eram tão baixos que houve necessidade da mulher do primeiro, e mãe extremosa do segundo, confeccionar uma almofada para ambos e dois poderem chegar ao volante, meter as mudanças e carregar com os pés na embraiagem e no travão, sem perderem de vista a estrada.


Entretanto o Toninho continuou a sua carreira de cantor romântico à capela, animando bailes, baptizados, casamentos e outras festividades da mesma índole. A osmose entre o artista e o seu dedicado público continuou a desenvolver-se de forma entusiástica. E essa relação manteve-se durante algum tempo, o suficiente para o António pai vender o NSU e comprar um Taunus azul, que, mesmo tão maltratado de chapa como o anterior, tinha um motor bem mais fiável.


Além de servir para ambos irem para o emprego sem serem empurrados, o Taunus passou a servir para o António, ou Toninho, se deslocar para as casas, ou localidades, que contratavam os seus serviços de cantor.


Mas o pai António, também ele com uma quota no carro, mesmo que mais pequena do que a do Roberto Carlos do Bairro Operário, passou a exigir a disponibilidade do carro durante alguns dias. Ou seja, a utilização da viatura tinha de ser repartida entre os dois proprietários. No plano teórico a coisa até resultou, só que quando a prática se foi prolongando ao longo do tempo, os interesses individuais principiaram a colidir com o sentido de família. Do desentendimento passou-se mesmo ao confronto. Verbal, claro. E aquilo tornou-se tão sério que quando chegava a vez de um conduzir o carro, o outro ia a pé ou de bicicleta. Pai e filho deixaram mesmo de se falar. E isso afectou de forma particular a mãe do António que, por outro lado, também era esposa do António pai.


Por esta altura já o António filho, Toninho ou o Nelson Ned nevoense, vivia numa pequena casa, que era apenas um quarto com uma porta e uma janela, quatro paredes e um telhado, construída a uma distância de apenas três metros da casa dos pais, mas que lhe dava alguma independência. Foi aí que passou a ensaiar o seu repertório.


Invariavelmente, sempre que o senhor António saía com o carro, aparecia em casa tarde e a más horas, bêbado e confuso. Quando batia à porta era certo e sabido que ela se encontrava fechada e com a chave enfiada na fechadura do lado de dentro. Punha-se então a berrar como o Fred dos The Flintstones, só que a putativa Wilma fazia-se de mouca. Com a bebedeira, o Fred do Bairro Operário, depois de muito vociferar, cansava-se e adormecia. Apenas lá pela manhãzinha é que a extremosa mãe do Toninho, e incomodada esposa do pai António, se decidia a abrir a porta. Só então, o homem, estremunhado, entrava em casa para mata-bichar e abalar para o trabalho.


Mas toda a paciência tem limites. E a paciência de uma mulher despeitada e abandonada pelo marido, que a trocava pela bebida e pelo carro, atingiu o seu limite na noite de Santos.


Nessa noite, o pai do António levou o carro, porque era a sua vez. Mas não o conseguiu trazer para casa, pois mal se segurava de pé. Foi carregado para casa escorado por dois amigos que o encontraram a ressonar de bêbado junto a uma pista de carrinhos de choque. Deitaram-no nas escadas da sua casa, bateram à porta e puseram-se a chamar pela patroa. Ela, surpreendida pelas vozes estranhas, pôs-se à escuta e, quando se inteirou do sucedido, abriu a porta e agradeceu a generosidade dos amigos do seu incorrigível marido.


Mal eles desapareceram do círculo de luz do poste de electricidade da última casa, foi buscar um pedaço de mangueira, habitualmente usado para amansar os filhos, arrastou o seu António até ao cimo das escadas e deu-lhe um enxerto de porrada bem dado. O António pai, de borracho que estava, nem deu acordo.


Um pouco antes da hora da visita ao cemitério, em memória dos fiéis defuntos, quando a esposa do pai António, e extremosa mãe do putativo Roberto Carlos do Bairro Operário, foi avisar o marido que estava na hora de levantar, o homem, como se tivesse acordado de um pesadelo, comentou para a mulher: “Porra, Alice, dói-me o corpo todo. Parece que levei um enxerto de porrada.” A mulher nem chus nem mus.


Na hora do almoço, quando o António filho, Toninho, ou o Nelson Ned nevoense, lembrou que era a sua vez de levar o carro, o pai António assanhou-se todo e, gemendo de dor e desconsolo, avisou: “Hoje o carro volta a ser meu. Tenho de levar uns familiares à aldeia.” Ao que o filho retorquiu: “O pai está a abusar. A sua quota de utilização neste mês já foi ultrapassada. Agora toca-me a mim.” Mas o pai, argumentando que o era e que um filho deve obediência ao progenitor, praguejou, insinuou aptidões, maltratou, inclusive, o cão, a dona e amaldiçoou o filho, chamando-lhe paneleiro, rabeta, anão, pobretanas, judeu, cantor de meia tigela, cigano, preto, galego, pobre, pelintra, filho de um cão tinhoso e… nesse momento, o filho foi-se caras a ele e pregou-lhe tal murro nas ventas que o pôs KO. A mãe, chorando tanto como a mãe de Cristo quando pregaram o seu filho predilecto na cruz, pegou num pedregulho, foi-se caras ao carro e acertou-lhe em cheio doze vezes, tantas quantas as tribos de Israel, os filhos de Jacó e os apóstolos.


À noite, enquanto a família dormia, ou fazia que dormia, o António filho, regou a carcaça do Taunus com gasolina, chegou-lhe um fósforo e desapareceu na noite para nunca mais.  

 

 

84 – Após o desaparecimento do António, a música romântica passou a ser vista ...

 

(Continua)

04
Jan12

Palavras colhidas do vento... por Mário Esteves


 

Embora me tenha afastado um pouco da imprensa regional, de quando em vez lá respigo uma ou outra notícia de meu agrado ou de mágoa pelo que acontece no concelho ou num plano mais vasto, em Trás-os-Montes.


Li, ainda no ano que findou, que a Assembleia Municipal de Chaves tinha aprovado várias moções por unanimidade:


- A continuidade dos benefícios fiscais às empresas do interior do país em sede de IRC; à permanência do pólo em Chaves da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro; à isenção do pagamento de taxas de portagem na A-24, aos residentes e empresas do distrito de Vila Real, atendendo aos “indicadores sócio económicos” serem inferiores à média nacional e a falta de alternativas; à manutenção da comarca de Chaves, no âmbito da nova organização judiciária e “à consolidação e reforço das suas competências”; à criação da Unidade Local de Saúde (USL) do Alto Tâmega e à conservação da “urgência médico-cirúrgica”do Hospital de Chaves e à melhoria de qualidade dos serviços por ele prestados; à criação da Comunidade Intermunicipal (CIM) do Alto Tâmega.


Não importa de quem partiu a iniciativa ou apresentou a proposta, interessa serem questões cruciais para o concelho e que revertem para uma melhor qualidade de vida de seus habitantes.


Sei, que o resultado destas moções será prejudicado pela situação económico-financeira do país, e possivelmente como outras, não terão eco no governo. No entanto é um sinal positivo, que as secções locais dos partidos políticos estão a dar, ao aproximar-se dos anseios da população, sob pena de caírem no descrédito, cada vez mais progressivo e preocupante.


Impõe-se uma maior e efectiva influência dessas secções nos centros de decisão desses partidos. 


Em Chaves, a unidade perante interesses locais fulcrais e prementes já peca por tardia.


A não ser que estas deliberações sejam “sol de pouca dura”!


Como acontecia na minha meteórica passagem pela Assembleia Municipal de Chaves.


Na qual, os grupos parlamentares minoritários apresentavam propostas semelhantes àquelas que ora foram deliberadas, com o mesmos objectivos, e que a representação partidária maioritária reprovava, para minutos depois apresentar uma de idêntico teor que era aprovada com os votos dos correligionários.


O meu tio Alberto, pouco depois do 25 de Abril, foi eleito como membro da Junta de Freguesia de Chaves.


Após tomar posse, nas reuniões seguintes, as discussões partidárias assumiam tamanho relevo, que prejudicavam a actividade daquele órgão, pelo que, às tantas, esse meu tio farto das questiúnculas que se eternizavam e um pouco de acordo com a formação militar que recebera no Regimento de Cavalaria, designada ainda pelos “Dragões de Chaves”, a que pertenceu até à sua desmobilização, foi obrigado a intervir e irritado perguntou aos seus pares:


- “ Mas, afinal, não somos todos de Chaves?”


E como prosseguissem aquelas teimas partidárias, levantou-se e nunca mais lá pôs os pés!


E não se pense que esta falta de solidariedade apenas ocorre na política.

 

Umas das primeiras equipas, senão a primeira, do Clube Atlético Flaviense

Em cima da direita para a esquerda , o meu tio Alberto é o segundo ao lado do Zé Bandeira.

Em baixo no mesmo sentido, o quarto é o meu falecido pai, acompanhado do lado esq. pelo Flávio.

Direitos de Imagem Reservados.


Quando estava no Ginásio Clube de Chaves, a equipa de seniores de voleibol numa jornada da Taça de Portugal, defrontava o Leixões, então crónico campeão nacional, no pavilhão gimnodesportivo, logo após um jogo do Desportivo no Estádio Municipal.


Assisti à primeira parte e depois dirigi-me à cabine sonora do Estádio, que ficava na bancada central e pedi para anunciarem o jogo do Ginásio.


Perante a minha estupefacção, recusaram!


Também, na minha passagem pela Associação Desportiva Flaviense, apesar da colaboração na cedência de jovens jogadores para os escalões de formação do Desportivo, os conflitos eram permanentes.


A Associação era designada pejorativamente como o Bairro ou Bairro dos Índios, sendo estas as expressões mais suaves.


De tal modo que no Notícias de Chaves, um cronista desportivo chegou a acusar os jogadores seniores do Bairro Operário, do roubo das redes das balizas do Estádio Municipal, após um jogo nele disputado para a Taça da Associação de Futebol de Vila Real., e que motivou a uma resposta de repúdio no mesmo jornal, assinada pelo Solicitador Madureira, como gosta de ser chamado, que na realidade foi por mim escrita.


Recordo, que concluía, pedindo desculpa pelo facto de existirmos como Associação e pelo Bairro Operário situar-se em Chaves…


Na maior parte, esta falta de solidariedade ou unidade tem como causa, questões pessoais ou rivalidades nocivas aos interesses comuns dos flavienses e do concelho.

 

Manuel Esteves - Direitos de Imagem Reservados


O meu avô paterno, tendo saído dos Bombeiros Voluntários Flavienses, e não importa agora indicar os motivos dessa saída, pelo tempo decorrido e o respeito que me merecem os descendentes das pessoas que a motivaram, foi fundador da Associação dos Bombeiros de Salvação Pública, seu primeiro presidente e comandante do corpo de bombeiros.


Numa das tentativas para a fusão das duas associações, foi proposto que todo o corpo de bombeiros dos “de cima”* fosse integrado nos “de baixo”*, respeitando-se a graduação, à excepção do meu avó, que era excluído.

Apresentada aquela proposta à assembleia-geral dos Bombeiros de Salvação Pública, foi recusada por unanimidade não só pelos sócios como por todos os membros do corpo de bombeiros.


Frequentemente recorro a factos de familiares, que poderá ser excessivo, mas não o faço com intuitos de hagiografia.


E quem pensar o contrário repondo do mesmo modo que um ilustre flaviense, que, participando numa récita no desaparecido Teatro da Rua do Correio Velho, depois sede dos “Canários”, como se esquecesse duma deixa começou a titubear, provocando uma pateada geral.


Zangado, virou-se para o público e exclamou:


-“ Ora, metei o cu cá drento!”


Ou seja, por analogia, ousem meter-se neste humilde ofício de escrevinhador…


 

** Expressões populares usadas na identificação das duas associações.

 


 

Tomei conhecimento que a Direcção dos Bombeiros Voluntários Flavienses, pediu a demissão colectiva e estão com uma Comissão Administrativa. Faço sinceros votos para que regressem em pouco tempo à normalidade estatutária e superem as dificuldades que presentemente têm, que não devem ser muito diferentes às que quase todas as associações de bombeiros voluntários são confrontadas hoje em dia.

 

04
Jan12

Barragens do Tâmega - Todos se compram, todos se vendem e todos perdemos


 

Enquanto que nos Estados Unidos se estão a demolir centenas de barragens pelos impactos negativos que têm causado ao longo da sua existência, por cá, avança-se com a construção de novas barragens, mesmo contra todos os pareceres negativos de impacto ambiental, e sociocultural e económico das populações afectadas.

 

E o que é que os autarcas das áreas afectadas directa ou indirectamente dizem e fazem?

 

Dizem que sim a tudo. Que sim, que as barragens só tem impactos negativos. Que sim, que se construam desde que nos compensem, ou seja, baixam as calças e dizem – Já que “tem de ser”, pelo menos dai cá algum, ou seja ainda, seguem a velha máxima de “Se não podes vencê-los, junta-te a eles”

 

É quase caso para adaptar a Lei de Lavoisier e dizer “ Todos se compram, todos se vendem e todos perdemos”, principalmente perde-se património natural, cultural e social que vem demonstrar bem quem é que são os poderosos e as ratazanas que vivem das suas migalhas.

 

Só estou curioso em saber se a Iberdrola vai pagar em Euros ou Iuans (moeda chinesa).

 

Está assim anunciada e certa a morte do Rio Tâmega!

 

A notícia que a seguir transcrevo foi publicada no Diário Atual e é da responsabilidade da Jornalista Sandra Pereira, eu apenas sublinhei e passei a vermelho algumas passagens:

 

Autarcas aguardam aprovação do Plano de Acção para compensar prejuízos da “cascata” do Alto Tâmega
 

Resultado das compensações e contrapartidas pela construção das barragens do Alto Tâmega, Daivões e Gouvães, a região do Alto Tâmega poderá beneficiar de um forte investimento em obras, com a Iberdrola a financiar mais de 100 intervenções, num total de cerca de 47 milhões de euros. Os autarcas já apresentaram uma extensa lista de reivindicações à empresa hidroeléctrica, encontrando-se já em fase final de negociações, e esperam resposta positiva até Março. Com mais área inundável, Vila Pouca de Aguiar e Ribeira de Pena serão os concelhos mais beneficiados.

 

Unidos na Associação de Municípios do Alto Tâmega (AMAT), os autarcas da região apresentaram recentemente um Plano de Acção para Compensação Socioeconómica e Cultural à Iberdrola, através da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR Norte), de modo a compensar os impactos negativos da construção das barragens do Alto Tâmega, Daivões e Gouvães no rio Tâmega.

Os beneficiários das contrapartidas financeiras locais – 50% do montante total distribuído em proporção da área inundável – serão os quatro concelhos directamente afectados pelo complexo hidroeléctrico lançado em 2007 no Programa Nacional de Barragens: Vila Pouca de Aguiar, Ribeira de Pena, Boticas e Chaves. Já Valpaços e Montalegre, que não terão área inundável, serão abrangidos pelas compensações regionais (restantes 50%). No total, a empresa espanhola adjudicada para a concessão da “cascata” do Alto Tâmega irá desembolsar cerca de 47 milhões de euros em obras para a região, que irão sustentar investimentos na ordem de 160 milhões de euros.

Enquanto presidente da AMAT, o autarca de Ribeira de Pena, Agostinho Pinto, aguarda uma contraproposta da Iberdrola ao Plano de Acção elaborado pelos municípios do Alto Tâmega, com a colaboração da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD). “Fez-se um trabalho exaustivo, elaborámos um plano, baseado na Declaração de Impacte Ambiental, que consideramos justo e agora tudo depende da aceitação da Iberdrola”, avançou Agostinho Pinto, que acredita que o consenso com a empresa será obtido até Março. Caso o acordo seja selado, o Plano de Acção começará imediatamente a ser executado com a criação de uma Agência de Desenvolvimento Regional.


Plano de compensações surge após mais de um ano de difíceis negociações

Após mais de um ano de difíceis negociações e divergências entre municípios e empresa, o presidente da Câmara de Vila Pouca de Aguiar, Domingos Dias, que lidera o concelho que será mais afectado pelas barragens, afirmou ao jornal “A Voz de Trás-os-Montes” que “a Iberdrola concorda” com o Plano de Acção e que este “tem todas as condições para ser aprovado pelo Governo”. Antes disso, o Estado terá de acordar com as empresas hidroeléctricas a revisão do sistema de tarifário eléctrico e do mecanismo de “garantia de potência”, que até à data destinava avultadas ajudas públicas às empresas para assegurar um determinado volume de electricidade. Esta revisão de tarifas foi imposta pela Troika e o Governo espera ver o processo concluído no início do próximo ano.De resto, os municípios afectados pela construção das três barragens do Alto Tâmega também exigem compensações de 2,5% sobre o total de energia produzida, uma “renda” idêntica à paga pelos parques eólicos, mas não existe para já legislação nesse sentido para os empreendimentos hidroeléctricos, apesar de ter sido solicitada ao Governo pelos autarcas do Alto Tâmega. Mesmo assim, fruto das negociações da Associação Nacional de Municípios Portugueses com o Governo, as “rendas” das áreas inundáveis deverão aumentar devido a um novo acordo que deverá ser alcançado em Janeiro.

Além disso, a derrama (sobrecarga fiscal sobre o lucro) deverá passar a ser paga nos concelhos onde a energia é produzida. Por último, a empresa de geração e distribuição de energia eléctrica terá ainda de assumir as reposições, ou seja, repor todas as estradas e habitações destruídas com as obras, bem como pagar as devidas indemnizações à população afectada. Para os autarcas do Alto Tâmega, as reivindicações de contrapartidas financeiras são legítimas, tendo em conta que a Iberdrola pagou ao Estado um prémio de concessão cerca de 320 milhões de euros pela exploração das barragens durante 65 anos.


BOTICAS: Município reivindica investimento de 8 milhões de euros em obras

No site da autarquia, o executivo de Boticas avançou que “aguarda ver o Plano de Acção para Compensação Socioeconómica e Cultural aprovado, com vista à promoção da coesão social e de justos equilíbrios no desenvolvimento da região”. Nesse plano, o concelho botiquense reivindica uma compensação de cerca de 4 milhões de euros, sendo os projectos considerados pela autarquia o reforço dos meios de socorro e protecção civil dos Bombeiros Voluntários de Boticas; Centro de Artes Nadir Afonso e respectivo parque de estacionamento; Rede de unidades museológicas – Complexo Mineiro Antigo do Vale Superior do Rio Terva e Ecomuseu do Barroso; Parque Boticas – Natureza e Biodiversidade; Regeneração Urbana da Estância Termal de Carvalhelhos; Reabilitação dos aglomerados da zona afectada; Protocolo Fundação Nadir Afonso; Residência assistida e Requalificação da Santa Casa da Misericórdia de Boticas.

Já no que respeita às comparticipações, os projectos integrados são a Beneficiação/ Rectificação da ex-EN103 entre a EN312 (Boticas-Sapiãos) e o Limite do Concelho; as parcerias para a Regeneração Urbana – “Boticas Viva – Regeneração do Núcleo Antigo”; a Beneficiação de Edifícios Municipais; a Beneficiação da Rede Viária Municipal, Fase II e III e, por último, a Unidade de Cuidados Continuados. Ao nível destes projectos a Iberdrola terá de disponibilizar um montante adicional de cerca de 4 milhões de euros ao concelho de Boticas. À excepção das acções da inteira responsabilidade da Iberdrola, a maioria dos investimentos são alvo de financiamento pelo QREN.


CHAVES: Investimento de cerca de 3,5 milhões de euros para aplicar na zona de Vidago

No concelho de Chaves, o montante reivindicado à Iberdrola ronda os 3,5 milhões de euros, que vão permitir sustentar obras co-financiadas por fundos comunitários no valor de 15 milhões de euros. Este montante será quase totalmente aplicado na zona mais afectada pela “cascata” do Alto Tâmega: Vidago. No concelho flaviense, o menos afectado dos quatro, serão inundados cerca de 45 hectares, ou seja, 5% da área total inundável, que afectará sobretudo a freguesia de Arcossó e em pequena escala Anelhe e Vilarinho das Paranheiras.

O principal investimento das compensações da Iberdrola será, por isso, feito na zona de Vidago e freguesias afectadas, garantiu o presidente da Câmara de Chaves, João Batista. Caso o Plano seja aprovado, Arcossó será contemplada com a ligação rodoviária ao limite do concelho de Vila Pouca de Aguiar, regadios e outras acções de apoio às populações desalojadas, no sentido de criar condições para o desenvolvimento de actividades. Em Vidago, a Iberdrola irá comparticipar com cerca de 2 milhões de euros a intervenção no Balneário e no espaço envolvente da Aquanatture, um projecto num total de 7 milhões de euros. A restante verba irá financiar a ligação da sede de concelho de Boticas à A24, já que abrange freguesias flavienses, e outras pequenas intervenções nas localidades. Sobrará ainda uma parte para o Museu das Termas Romanas e a Fundação Nadir Afonso, na cidade de Chaves.
“Esse montante vai potenciar inúmeras obras”, funcionando como um “alívio para as finanças municipais”, considerou João Batista, acrescentando que, mesmo sem a Iberdrola, a autarquia irá avançar com as obras a expensas próprias, já que estão praticamente todas aprovadas. Para o autarca, este plano “prova a capacidade de governanção comum no Alto Tâmega”, uma vez que “não trazendo as barragens benefícios directos para as nossas populações, mas para o país, entendemos que o Governo e o país devem ser solidários connosco”.


MONTALEGRE: “As barragens vão penalizar muito a nossa região e juntamo-nos para arranjar uma solução equilibrada”

No concelho de Montalegre, que não terá área inundada pela “cascata” do Alto Tâmega, a verba que advirá das compensações regionais da Iberdrola serão aplicadas em algumas obras em curso, como o Centro Escolar de Montalegre, a beneficiação do Castelo de Montalegre, a construção da Unidade de Cuidados Continuados e a beneficiação do pólo museológico das Minas da Boralha, uma obra no total de 1 milhão e 750 mil euros com financiamento do PROVER, que já está em curso.

Beneficiadas serão também a rede viária interna e a nova estrada de ligação a Chaves e à A24, que já foi lançada a concurso e, no entender do presidente da Câmara de Montalegre, é a intervenção “mais importante para a actividade económica do concelho”. Afirmando que a comparticipação da Iberdrola vai permitir um “sério investimento” na região “a custo zero” para as câmaras, Fernando Rodrigues espera que o acordo com a Iberdrola seja rapidamente assumido “para que a região possa desenvolver actividade económica e criação de emprego para qualificar o território”.

De resto, o autarca concluiu que “na AMAT, funcionamos com um espírito de coesão que não existe em lado nenhum. […] As barragens vão penalizar muito a nossa região e juntamo-nos para arranjar uma solução equilibrada”, após “muito trabalho conjunto” e graças à capacidade financeira da EHATB – Empreendimentos Hidroeléctricos do Alto Tâmega e Barroso.


RIBEIRA DE PENA: Compensações e contrapartidas da Iberdrola “vão pôr as economias dos concelhos a funcionar”

Sendo o segundo concelho do Alto Tâmega que terá mais área inundada (mais de 30%), a seguir a Vila Pouca de Aguiar, o presidente da Câmara de Ribeira de Pena, Agostinho Pinto, acredita que, apesar dos “contra e impactos ambientais”, as compensações e contrapartidas da Iberdrola “vão pôr as economias dos concelhos a funcionar”. Na lista de reivindicações de Ribeira de Pena, estão projectos de infra-estruturas candidatos ao QREN, instalações de saneamento básico, novas acessibilidades, reabilitação urbana e realojamentos. “Apostamos nas candidaturas ao QREN para promover o dinamismo económico e a criação de emprego no concelho, sendo que o Governo compromete-se a apoiá-las e a Iberdrola a financiar a parte nacional”, explicou.

“A Declaração de Impacte Ambiental previa essa compensação. Não pedimos nada a que não temos direito”, argumentou Agostinho Pinto, que acredita que o acordo com a Iberdrola será obtido até Março do próximo ano. O Estudo de Impacte Ambiental atira para mais de 70 as habitações em área inundável no concelho ribeirapenense, sendo que grande parte das casas e terrenos agrícolas da aldeia de Viela (entre 13 e 15 habitações) poderá ficar totalmente submersa pela barragem de Daivões. Em Santo Aleixo, Manscos, Friúme, Ribeira de Baixo ou Balteiro, casas e terrenos agrícolas também vão ficar submersos, além de redes viárias e património. “Este acordo minimiza os impactos negativos. É de máxima justiça”, concluiu o autarca.


VALPAÇOS: Afectado por linhas de muito alta tensão, concelho reivindica compensação de cerca de 5 milhões de euros

Apesar de não sofrer impactos negativos directos decorrentes da construção das barragens, o concelho de Valpaços irá ser atravessado por linhas de muito alta tensão. Junto a Friões, está actualmente em fase de conclusão uma subestação que ocupa 14 hectares de terreno para recolha de energia eléctrica nas barragens do Douro e Alto Tâmega “com um impacto muito significativo em termos ambientais, explicou o presidente da Câmara de Valpaços, Francisco Tavares.

Por isso, o autarca fica satisfeito com a inclusão do município valpacense no plano de compensações, onde inscreveu “projectos enraizados de interesse para o concelho”, como vias de comunicação, arranjos urbanísticos na parte antiga da cidade e melhoramentos de equipamentos públicos, sendo que a aprovação de alguns novos projectos dependerá da “luz verde” da Iberdrola. No Plano de Acção, o concelho valpacense reivindica um total de cerca de 5 milhões de euros em compensações.


VILA POUCA DE AGUIAR: Com mais área inundada, concelho será o mais compensado pela Iberdrola

Abrangido pela barragem de Gouvães, o concelho de Vila Pouca de Aguiar será o mais prejudicado pela construção do empreendimento hidroeléctrico do Alto Tâmega, prevendo-se mesmo a inundação completa dos terrenos agrícolas de várias localidades no Alvão e ainda perda de património arqueológico de valor no concelho. Será também, por isso, o mais compensado pela Iberdrola, sendo que, segundo o jornal “A Voz de Trás-os-Montes”, a lista de reivindicações aguiarense colocada no Plano de Acção abrange a construção do Lar de Idosos, subsídios para transporte escolar, construção de centros de desenvolvimento turístico, nomeadamente campos de iniciação ao golfe e parques de campismo, bem como a conclusão da rede de saneamento do concelho. Contactado pela Voz de Chaves, o município de Vila Pouca de Aguiar considerou prematuro avançar mais detalhes do Plano de Acção antes da sua aprovação.

 


03
Jan12

Pedra de Toque - O Olhar


 

 

O OLHAR

 

Se não eras tu, era alguém com os teus olhos.

 

Verdes, fundos, mas mais baços, mais tristes...

 

Outrora eram brilhantes e sorriam a cada esgar.

 

Ruborizavam quando no jardim atapetado de Outono te murmurava que contigo encantaria todas as noites e que sem ti o futuro seria breu.

 

Passaram cinquenta longos anos.

 

No bulício da rua na grande cidade, revi o teu olhar sedutor, envolvo em pequenas rugas que vincavam tua pele sedosa.

 

O teu semblante e o teu corpo não exalavam a frescura que ainda consegui respirar na momentânea  viagem pela memória que me levou ao passado.

 

O tempo é inexorável. Cruel, muitas vezes.

 

Porque impiedosamente degrada, enruga, definha.

 

Para nos salvarmos é importante resguardar a memória, perscrutar a beleza que permanece por dentro.

 

Nem que seja através dos silêncios.

 

Nem que seja através do olhar.

 

 

António Roque

 

02
Jan12

...


Para lêr acompanhada da música do vídeo,
por favor desligue o som do rádio (cotonete) na barra lateral esquerda.

Acordai!


“Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raiz

 

Neste novo ano que começa, o meu pensamento gira à volta destes versos do poeta José Gomes Ferreira, que ao som da música do genial compositor e homem que foi Fernando Lopes-Graça, é como um chamamento. Dá vontade de levantar, procurar outro rumo, percorrer um caminho diferente, encontrar outros sentidos. Acordar apenas. O mundo pode ser aqui mesmo.

 

Quando palavreados, receios e tempos velozes entopem e acomodam a mente, é bom acordar. Acordar apenas. Lá fora, há ideias, há movimento, há voluntários, há reaccionários, há solidários. Cofres vazios – e talvez o fim do mundo – não justificam um país esvaziado dos seus valores e cultura. Regressaram tempos de demagogias perigosas e de vendedores de ilusões, mas haverá quem acorde para recusar discursos paternalistas, moralismos hipócritas, sentidos patrióticos ridículos e nacionalismos baratos. Vive-se um clima de medo, veiculado diariamente pelo “Poder”, seja ele qual for, com a ajuda oportunista (e desesperada) dos meios de comunicação social, mas haverá quem acorde para os humanismos a alimentar com sorrisos nos lábios. Neste mundo globalizado, só é parvo quem quer.

 

“Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações”


Após a revolução de Abril, muitos emigrantes portugueses da geração de 60 acreditaram que o país iria finalmente acordar de uma profunda apneia salazarista e arriscaram regressar com as famílias à terra natal, convictos que agora sim, Portugal seria um lugar de futuro. Lá fora, sacrificaram pequenos e grandes prazeres da vida para juntar uns trocos, experienciaram novas formas de trabalhar e viver em sociedade, e chegaram com vontade de construir uma vida feliz num país que caminhava para a prosperidade. Resistiram até hoje, mas que ninguém lhes pergunte agora como vêem o seu país ou arrisca-se a ser fulminado por uma dolorosa mágoa. São histórias contadas pela desilusão de quem se viu incompreendido e desvalorizado pela sua própria gente. Por vezes, regressa-lhes a vontade de “dar o salto”, mas os tempos mudaram.

 

“Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!”


Os tempos mudaram. Vencida a salazarista, o país mergulhou na apneia mercantilista. Hoje calam-se as vozes dos que ficam a assumir as suas culpas – e às vezes as dos outros – e as dos idealistas e pragmáticos que querem salvar o barco do naufrágio, para voltar-se a infligir o estigma das “vagas” de emigrantes, que deixarão um país deserto e sem cérebro. E desde quando emigrar foi problema ou vergonha? É essa a marca mais visível do espírito empreendedor e aventureiro português desde o século XV, e é essa qualidade que nos admiram e invejam no mundo. Temos cerca de metade da nossa população espalhada pelo mundo e há sempre rasto da nossa passagem. Somos globais, somos “inteiros”, diria Pessoa.

 

 Fotografia de Sandra Pereira

 

Quando uma idosa emprega os últimos cêntimos da parca reforma para comprar medicamentos e não garante ao estômago o almoço dos domingos, quando uma mulher trabalhadora aproveita um simples “bom dia” na rua para começar a contar que o desgraçado do salário já não lhe chega para estudar o filho, quando um recém-licenciado a transbordar de “inovação” é travado por burocracias, interesses instalados e mentes tacanhas sem visão nem ousadia, quando um jovem em busca de valorização profissional envia meses a fio centenas de currículos sem resposta para não se ver obrigado a resignar-se à precariedade… é preciso acordar. Sem olhar para o lado, para não cair na tentação de voltar a adormecer. E o mundo pode ser em qualquer lugar. Ou aqui mesmo.

 

Podemos ser globais e “inteiros” aqui mesmo. Recuperar o associativismo perdido, pensar no colectivo (que dá muito lucro ao individual), cultivar o bem-estar social e o mérito, reciclar velhos hábitos e vícios… aqui mesmo. Ou simplesmente ser solidário, diria o Zé Mário. Acordar apenas. Lá fora, há ideias, há movimento, há voluntários, há reaccionários, há solidários… há riqueza.

 

Fé e esperança nunca faltaram na vida dos Portugueses. É isso que merecem ouvir políticos e comunicação social que abusam tanto da Santa Paciência como das palavras “crise” e “austeridade”. Fomos educados a olhar para o Céu, mas agora exige-se que olhemos para a Terra. Aqui mesmo ou em qualquer lugar. Portugal foi e será sempre o porto de partida, de chegada e de abrigo. Em 2011, o antigo herói da Resistência francesa Stéphane Hessel acordou muito mundo com o seu grito “Indignai-vos!”. Tanto que gerou um movimento a nível mundial. E em 2012? Aqui mesmo ou em qualquer lugar, “Associai-vos!”.

 

Sandra Pereira

Sobre mim

foto do autor

320-meokanal 895607.jpg

Pesquisar

Sigam-me

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

 

 

20-anos(60378)

Links

As minhas páginas e blogs

  •  
  • FOTOGRAFIA

  •  
  • Flavienses Ilustres

  •  
  • Animação Sociocultural

  •  
  • Cidade de Chaves

  •  
  • De interesse

  •  
  • GALEGOS

  •  
  • Imprensa

  •  
  • Aldeias de Barroso

  •  
  • Páginas e Blogs

    A

    B

    C

    D

    E

    F

    G

    H

    I

    J

    L

    M

    N

    O

    P

    Q

    R

    S

    T

    U

    V

    X

    Z

    capa-livro-p-blog blog-logo

    Comentários recentes

    • cid simoes

      Imaginação numa tarde de inverno; boa crónica.Saúd...

    • cid simoes

      Como aferir o que é "um país culto e civilizado" J...

    • Anónimo

      Caros, O que leio na legenda da foto é " Entrada d...

    • Fer.Ribeiro

      Também para mim foi um prazer ter-te encontrado ne...

    • Antonio

      Foi um prazer encontrar-te e poder, depois de muit...

    FB