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A Tralha
"O único risco na vida é não correr riscos". Onde é que ouvira esta frase feita? Que importa, pensou. “Este”, assumiu, "fala como um homem que sonha e realiza". Sim. “Um homem pode evitar morrer lentamente”, concluiu.
Estava na hora de reunir a tralha. Reflectiu sobre o que podia deixar e o que não podia deixar de levar. Mandou um olhar rápido ao stand de compotas que ele próprio tinha montado. Que ideia genial! Que pequena, mas que bela conquista! Durante uns tempos, tinha adocicado o quotidiano das pessoas. E o seu.
Estava na hora de reunir a tralha. Ia sentir falta do colorido das compotas, da variedade dos seus sabores, da suave envoltura daqueles cheiros. Tinha sido o seu risco mais recente, o seu feito. Não se arrependia, não era tempo perdido, mas estava na hora de pensar como um homem que sonha e realiza. Uma vez mais.
Perpignan, França, Agosto 2007 - Fotografia de Sandra Pereira
Estava na hora de reunir a tralha. Não estava triste. Só um pouco nostálgico. Já sentira muitas vezes o aperto do coração. Sim. As compotas marcaram-lhe a vida e elas lhe apontaram a ideia de ir sempre continuando a adocicar futuros, e quem lhe dera acordar todas as manhãs da sua vida entre açúcar e tachos! Reconfortou-se. O destino continuava a apontar para a delícia.
Estava na hora de reunir a tralha. Claro. “Um homem pode evitar morrer lentamente”, concluiu.
Sandra Pereira