Chá de Urze com Flores de Torga - 27
Os Poemas Ibéricos – 2ª Parte
A segunda parte de Poemas Ibéricos – História Trágico-Marítima – conta as aventuras do povo ibérico nos tempos das grandes navegações.
Sagres faz referência à Escola que tanto contribuiu com avanços científicos à humanidade; A Largada, é um claro diálogo com o episódio do Velho do Restelo de Os Lusíadas.
Em todos os poemas da História Trágico-Marítima se faz a alusão a essa mesma “tragédia” das navegações e do mar como uma espécie de paixão, de tentação, de amor-ódio.
Nesta mesma parte ainda temos os poemas A Espera, O Regresso, O Achado, Tormenta e Mar, que tem no seu último quarteto um certo tom profético e sedutor.
No poema “Regresso”, Torga faz dialogar a dor de uma mãe que fica em terra a chorar, com o poema “Nau Catrineta” de Almeida Garrett (cantado por um cego). Veja-se como o poema de Garrett dialoga com a Mãe, que Torga junta num só poema (a itálico a “Nau Catrineta” de Garrett, o conjunto é “O Regresso” de Torga:
Lá vem a Nau Catrineta
Que tem muito que contar!
Ouvide agora, senhores,
Uma história de pasmar.
A Mãe correu à varanda,
Bem longe de imaginar
Que o alarde desejado
Vinha dum cego a cantar:
Passava mais de ano e dia
Que iam na volta do mar,
Já não tinham que comer,
Já não tinham que manjar.
A Mãe abriu num soluço
O coração a sangrar,
Porque a sola era tão rija
Que a não podiam tragar…
(…)
Deitaram sortes à ventura
Qual se havia de matar;
(…)
( A Mãe tinha pão na arca
E não lho podia dar!)
Logo foi cair a sorte…
(…)
(Que sorte tão singular!)
O gajeiro olhava, olhava,
Mas só via céu e mar
- Um céu distante vazio,
E um largo e vazio mar
!
- "Alvíssaras, capitão…
(…)
E o vento a enrodilhar
A voz do homem da gávea
Na do ceguinho a cantar!
A minha alma é só de Deus;
O corpo dou eu ao mar..."
(…)
A Mãe, que nada podia,
Já só podia rezar…
Deu um estouro o demónio,
Acalmaram vento e mar.
(…)
E quando o cego acabou
Estava em terra a varar.
Torga termina esta parte dos Poemas Ibéricos com o poema “Mar” onde a tal paixão, amor e ódio, estão bem patentes, terminando com este quarteto:
“Mar!
Quando terá fim o sofrimento!
E quando deixará de nos tentar
O teu encantamento!”