O Barroso aqui tão perto...
Quinhas? Tu Fechaste as Galinhas?
Estreia tão auspiciosa valeu ao P.e Cosme a nomeação para cura de Paspalhó, uma das paróquias mais pobres da diocese. Terra pobre, residência pobre. Apenas cozinha e sobrado, ligdos por uma varanda.
P.e Cosme instalou-se como pode e admitiu para governanta uma rapariga nova, forte e ingénua.
Fatal como o destino, oito dias depois, P.e Cosme e a governanta estavam, como se costuma dizer, de cama e pucarinho.
O escândalo chegou aos ouvidos do bispo, que subiu a paspalhó disposto a reconduzir a ovelha tresmalhada ao aprisco do Bom Pastor.
Ao vê-lo, P.e Cosme caiu das estrelas.
- Vossa Eminência Reverendíssima por aqui?
- Chiu!, Não façais alarido, P.e Cosme. Vou a Santiago de Compustela incógnito e não quero que a imprensa me descubra. Por isso, escolhi estas veredas. Dais-me guarida, por esta noite?
- Entrai, Eminência, entrai!
P.e Cosme introduziu o bispo na cozinha e correu ao sobrado a esconder uma das almofadas que enfeitavam a cama do casal. Depois chamou uma vizinha, cozinheira reformada dum hotel de Braga, para ajudar a fazer a ceia.
Enquanto ceavam, P.e Cosme foi adiantando que, atendendo ao desconforto da residência, onde, até, por desgraça, havia só um leito, uma vez que a criada ia dormir com a vizinha (e aqui o P.e Cosme, à surrelfa, empiscou um olhito cúmplice à cozinheira reformada), Sua Eminência iria dormir a casa do morgado, a quem já mandar aviso, e cujo solar dispunha de aposentos dignos de Sua Reverendíssima.
Mas o bispo cortou-lhe a vazada. Que não, senhor. Que dormiriam juntos. Que aproveitariam parte da noite para praticarem sobre os mandamentos da Santa Madre Igreja.
Finda a ceia, a governanta acompanhou a vizinha, e cura e prelado foram para a cama. Já reclinados no leito, diz o bispo:
- P.e Cosme, agora que ninguém nos ouve, a sós perante Deus, quero que me diga o que há de verdade acerca duns rumores que por aí correm a seu respeito.
- Que rumores, Eminência?
- De mancebia com a governanta.
- Oh! Eminência, que grande calúnia! Como Vossa Reverendíssima pode testemunhar, nesta pobre casa só há um leito e a governanta vai todas as noites dormir com a vizinha.
- Então é mentira?
- Juro, por Deus, que me há-de julgar!
O bispo bateu-lhe paternalmente nas costas.
- Acredito, meu filho! Ainda bem que é mentira. Vamos então dormir.
Apagaram a candeia e estenderam-se, um ao lado do outro.
Dali por um bocado, P.e Cosme, meio tolo do sono, espeta uma palmada no cu do bispo e exclama:
- Quinhas? Tu fechaste as galinhas?
Bento da Cruz, in Histórias da Vermelhinha