Quem conta um ponto...
200 - Pérolas e diamantes: inversões
Vai bom o tempo para banqueiros e para cães de fila.
Não sei por que carga de água me lembrei de Yeats, mas as suas palavras soaram-me estranhas: “É a instrução no sobrenatural que nos salva das más companhias.”
Assim fosse e muito boa alma não tinha penado o caminho da desilusão.
Acreditei em tempos que Portugal era uma boa metáfora. Mas, sei-o agora, as metáforas também cansam.
O homem é o único animal que conta histórias, a única criatura que conta histórias a si própria para tentar compreender que espécie de animal é.
Foi também Yeats que escreveu: O intelecto do homem é forçado a escolher / A perfeição da vida ou do trabalho.
Porque a vida perfeita não existe para pessoas como eu, apenas me restou, e resta, virar-me para o trabalho.
Por causa das coisas, e para lembrar aos videirinhos da política local, evoco o artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos do Homem: “Todo o individuo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e de procurar receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideais por qualquer meio de expressão.”
John Kennedy disse o mesmo em apenas quatro palavras: “A liberdade é indivisível.”
Há muita gente por aí que pensa que por pintar as asas de preto passa de repente a ser melro. Mas não, apenas fazem lembrar aquela gaivota que aparecia na televisão, durante a Guerra do Golfo, que, besuntada de petróleo, perdeu a capacidade de voar.
Boa gente cedeu ao medo, apelidando-o de respeito. Mas não é. É mesmo medo. O respeito é outra coisa bem mais nobre e simples.
Eu, por causa das coisas, inspiro-me em Edmund Burke: “Quem luta contra nós fortalece os nossos nervos e aguça as nossas capacidades. O nosso antagonista é quem mais nos ajuda.”
Ou seja, apenas os fracos e os autoritários viram as costas aos adversários e chamam-lhes nomes e, por vezes, pretendem fazer-lhes mal.
No mundo da política, muitos fazem que argumentam com base nos princípios. Mas à porta fechada, nas salas onde se tomam verdadeiramente as decisões, os princípios caem logo à primeira contrariedade.
José Saramago disse: “Dentro de nós há uma coisa que não tem nome; essa coisa somos nós.”
Salman Rushdie escreveu que “o espírito criativo é frequentemente tratado como inimigo pelos poderosos ou pelos mesquinhos potentados que não gostam do nosso poder de construir imagens do mundo que são contrárias, ou põem em causa, os seus mais simples e menos confessos pontos de vista.”
Charlie Chaplin bem nos avisou: A vida vista de perto é uma tragédia, mas vista de longe é uma comédia.
Tanto na autarquia como no país, os ilusionistas do costume, dizem-nos que a realidade pode esperar para o dia seguinte. Eu não sei é se isso ainda é possível.
João Madureira