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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

31
Jan17

Chaves D'Aurora


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  1. FRADE MAROTO.

 

Logo no pequeno vestíbulo de entrada da residência de Adelaide, entre dois cachepôs de prata com plantas ornamentais, a ladear um cabideiro de metal e mármore, onde as visitas depositavam os chapéus-de-chuva nos dias de aguaceiro, morava um sorridente frade de apenas meio metro de altura. Com acentuada tonsura e poucos cabelos em volta da cabeça, sua batina fora confecionada com um pano rústico, bem franciscano. Tinha um olhar maroto, mas trazia sempre as mãos juntas, em prece. Algumas beatas que por ali passavam, por miopia ou catarata, pensavam que fosse um santo e se benziam. Outras até oravam contritas, em silêncio.

 

Quando via tais devoções, Adelaide escondia o riso a quantas pudesse. Recusava, porém, com veemência, a oferta de qualquer uma dessas piedosas senhoras que, ao ver a batina tão rota e puída do santo, viesse lhe oferecer um novo hábito – Tirar a roupa do frade… Tinha lá sua graça! Ai que se me revira a vista de tanto rir! – dizia a Luís Miguel.

 

Só eles dois e mais alguns sabiam, realmente, que esses frades de madeira ou cerâmica, obras de artesãos vendidas em várias aldeias de Portugal e de dimensões variadas, conforme o gosto do freguês, escondem algo por baixo da batina que faria chocar as beatas, míopes ou não: uma inconveniente terceira perna, a descer até aos joelhos do castíssimo santo.

 

Mais ainda haveriam de se arrepiar as devotas, com sua moral abalada e a se tornarem confusas e confundidas se, a um simples dispositivo, vissem o fradinho erguer para o alto, de entre as fendas sem botões da batina, a parte disforme do sagrado tripé.

 

 

  1. ATRIZ DRAMÁTICA.

 

Era sempre muito requisitada como atriz, especialmente nos papéis cómicos, para as peças que os amadores locais encenavam no Cineteatro Flávia. Nestas, muitas vezes e sempre, ela tanto fazia rir a plateia, como enlouquecia o apontador das falas. Daí resultar que, toda vez que pedia e até mesmo suplicava para interpretar cenas dramáticas, os companheiros de Teatro entreolhavam-se e diziam a si mesmos – Não!!! – porque, invariavelmente, Adelaide também fazia rir o público nos momentos de maior dramaticidade.

 

Em uma das apresentações de “As desgraças de uma condessa”, ao contorcer-se no palco entre esgares de dor e os estertores da morte, ficou bastante indignada. Da plateia aos camarotes, alguns estúpidos e mal educados espetadores (na verdade, a maioria) e alguns dos atores em cena (quase todos) que, segundo ela, eram todos uns tontos, contorciam-se a rir, não se sabe (não o sabia ela) a que propósito!

 

Certa vez, Adelaide convidou João Reis e Flor a irem vê-la atuar no Cineteatro Flávia. Reis agradeceu, mas disse que não gostava de ir ao teatro, mormente porque, como bem lhe informavam os jornais, o público habitual chegava a abusos e desmandos que irritavam qualquer pessoa séria e bem-educada. Ocorria na Vila uma exata reprodução do que dizia Almeida Garrett, em “Frei Luís de Sousa”: “Representavam tudo no velho theatro e quem mais representava, às vezes, era a platéia. Graçolas para os actores, respostas dos visados, um à-vontade inexcedível!... Nos camarotes, as damas constrangiam-se para não rirem e os pais de família, empavezados, achavam de mau espírito os sarcasmos plebeus dos graciosos. Interagiam com a cena.”

 

Adelaide lhe fez ver que, agora, com os praças da Guarda Republicana a atuarem no teatro de Chaves (na plateia, por certo, não no palco), já se estava a notar uma acentuada melhora no comportamento do público. Tentou convencê-lo disso, em vão. Reis se disse informado de ainda haver alguns gaiatos a fazerem de tudo para chamar atenção e, nesse intento, porem-se a dizer inconveniências e praticar grosserias, antes, durante e após as cenas. Acrescentou que, conforme também já estivera a ler nos jornais, realmente péssimo era certo hábito, então vigente – Ora, pois, mas não estais a ver que os donos levam seus cães ao teatro, com essa cainçada toda a deitar pulgas na plateia e nos camarotes?! Acontece que os cães são muito críticos e exigentes e não gostam da música nem do teatro que se está a fazer por cá. Ofendidos em sua erudição canina, latem durante as apresentações.

 

Embora proferido com seriedade por Papá, esse chiste não deixou de fazer rir a Florinda e Adelaide. O brasileiro viu-se envolvido, então, ainda que involuntariamente, em um raro momento de agradável descontração familiar.

 

 

fim-de-post

 

 

 

30
Jan17

Quem conta um ponto...


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326 - Pérolas e diamantes: esquerda, direita, em frente marche (I)

 

Na nota introdutória do seu livro Da Direita à Esquerda, António Araújo coloca a seguinte questão: “Além de estúpido, caçar Pokémons é de esquerda ou de direita?” Provavelmente a pergunta não tem resposta, pois a maior parte das coisas que fazemos na vida não se conseguem enquadrar dentro desta dicotomia.

 

A obra defende que “as práticas, os hábitos e os consumos socioculturais da esquerda e da direita se encontram cada vez mais próximos, obedecendo a uma lógica de espetáculo que tudo absorve e corrompe”.

 

A seu ver, a grande clivagem que persiste encontra-se naquilo que divide elites e não elites, pois a maioria das polémicas que subsistem na esfera pública situam-se, “hoje como ontem, num âmbito elitista, urbano e sofisticado. O povo mantém-se sensatamente afastado dessas quezílias”.

 

Do que conseguiu apurar, a grande diferença continua a persistir, à esquerda, no seu apego a uma noção de conflito, ao passo que a direita prefere uma abordagem mais consensual e de compromisso com a realidade. No entanto, observa-se que, atualmente, esse padrão está em vias de mudança, “sendo ainda cedo para avançar prognósticos, sobretudo num tempo tão incerto e volátil”.

 

Em Portugal, depois do 25 de Abril, existiram alguns traços distintivos que não me foram estranhos e que rememorei durante a leitura do livro.

 

Em 1986, Diogo Freitas do Amaral, trouxe para a ribalta alguns traços distintivos do seu (da direita, claro está, pois o homem já virou à esquerda há alguns anos) cariz classista. Na sua campanha presidencial popularizou a moda dos sobretudos verdes de loden, de inspiração austríaca e protagonizou uma batalha eleitoral à americana, de grande espetacularidade, que incluiu até chapéus de palhinha… feitos de plástico. 

 

Nos tempos de Cavaco Silva, a direita começou a exibir os seus Rolls-Royce pelas avenidas de Lisboa, a divertir-se no Bananas e a recuperar os solares e as casas de família, graças aos fundos europeus vocacionados para o denominado turismo rural, o agroturismo e o turismo de habitação.

 

Apareceu então o arquiteto Tomás Taveira, impondo a sua visão pós-moderna, muito peculiar, reinventando a tradição, ao reunir vários arquétipos ancestrais da portugalidade: a guitarra portuguesa no edifício-sede do Banco Nacional Ultramarino (1989) e as famigeradas Torres das Amoreiras (1985), que pretendiam evocar os elmos de guerreiros medievais, relembrando castelos de reis e princesas.

 

Nos anos 80 surgiram na cena musical os Heróis do Mar, numa onda de revivalismo que, mais tarde, havia de desembocar no projeto Madredeus, ou nos Sétima Legião, onde pontuavam nomes como Rui Pregal da Cunha, Pedro Ayres Magalhães, Carlos Maria Trindade e Rodrigo Leão.

 

O autor das letras das canções dos Madredeus era Francisco Ribeiro Menezes, que integrava as vozes do coro. Mais tarde enveredou pela carreira diplomática, chegando a exercer funções como chefe de gabinete do primeiro-ministro Pedro Passos Coelho.

 

As voltas que o mundo dá.

 

À esquerda, aparece Rui Veloso e Carlos Tê com o álbum Ar de Rock, rompendo, talvez sem querer, por completo, com a tradição baladeira e de cantautores dos anos 60 e do imediato pós-25 de Abril.

 

À direita, emerge o Miguel Esteves Cardoso, o famoso MEC, exibindo ao mundo português adereços rétro: o simbólico papillon no colarinho da camisa, óculos redondos, uma língua irrequieta sempre pronta a lamber os beiços secos e um Volkswagen carocha preto. Afirmava-se na altura monárquico e estudioso, para não dizer fã, da Saudade, do Sebastianismo e do Integralismo Lusitano.

 

Ou seja, a década de 80 foi marcada por uma espécie de neorromantismo muito pop, ou um neoconservadorismo muito kitsh, que, sendo diferentes na génese, convergiam na redescoberta e na hipervalorização do mundo rural de classe, com os seus solares e casas de família, e na arquitetura com materiais naturais.  

 

Mais tarde, o revivalismo conservador foi apanhado por uma ideia histriónica de recuperação de gosto duvidoso, denominado entre nós como português suave, baseado em condomínios privados apelidados de villas (mas com dois ll, para evitar confusões com a pequena burguesia de província), e atividades como o hipismo, a caça, as touradas e o turismo de habitação.

 

Passados 10 anos, dois após a fundação d’O Independente aparece a revista Kapa.

 

Tenho de reconhecer que foram os grandes responsáveis pelo meu desvio de direita.

 

Eu pecador me confesso.

João Madureira

 

 

30
Jan17

De regresso à cidade


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A partir de hoje os regressos à cidade de segunda-feira vão ser feitos com uma imagem de arte digital, mas a partir de uma fotografia, também ela digital. Há quem não goste destas alterações, principalmente os puristas da fotografia, mas também há quem goste. Aliás desde que passámos à era da fotografia digital, toda ela é arte digital e essa coisa de ela ser ou não alterada, não passa de uma não discussão, tal como os puristas, pois as  próprias câmaras fotográficas digitais estão preparadas para alterar as imagens ao gosto do utilizador. Mas há mais, também na era da analógica havia muita fotografia que era alterada em laboratório. Seja como for, eu gosto de brincar com as imagens e também há quem goste dos resultados, assim sendo, estamos conversados.

 

 

29
Jan17

Pecados e Picardias


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Anatomia da vida (continuação)

 

Eu tenho a minha Loucura !

E não é pequena, não penses… Mas não me ganhas

 

E dizes isso como se a loucura fosse um direito inalienável, mas é e não é, isso que tu dizes ser loucura é a lucidez defendida na indivisibilidade e na dialética de Hegel,nos direitos humanos mas a nossa loucura colide com a coesão  de condutas uniformes e uniformizadas defendida pelos partidos, que confusão a procura da verdade e das verdades

 

Se fosse hoje terias critérios pra, sei lá… Surto comunista ?Ou CDS de e por assunção com Cristas, se fosse cá em chaves não passavas era de doudo ou maluco ou esgrouviado, e bem te chegava, ai não e nem dizias que ias daqui, e se o médico de família te intersetasse por acaso, ou por preocupação de uma qualquer perdida por apaixonada e burra, levavas com um encaminhamento para consulta de psiquiatria , com sorte esperavas uns três meses e se mantivesses a sintomatologia que é como quem diz fiel a este poema levavas com uma fluoxetina e ias bem, ias ias com sorte e nem tão mal, se te diagnosticassem  na matriz da DSMIV E agora Já V, uma depressãozita, porque se te apanham assim assim a fugir pra um pseudo surto psicótico levavas uma boas boas miligramas de um que eu cá sei… oh põe-te mas é a pau…Pronto podias ter a sorte e bem de me encontrar pelo caminho e em luar de lua cheia a amar-te como o ser poeta mais alto da Florbela, no seu melhor como enfermeira de psiquiatria imbuída do conhecimento do holismo e dos meandros da empatia, a esquecer e a não ser infetada pelo mercenarismo (e talvez engalanada será raiva? Será inveja? Conforto não é certamente, e a justiça social ou cidadania não bate assim)daqueles que se aproveitam das instituições públicas só para angariarem clientela para as suas clinicas privadas, que ganham 40 horas pagas pelos impostos de todos Nós e trabalham 20 e ainda é por favor…

 

Levanto-a,

A tua loucura presumo, é que na cabeça de alguns pode cruzar com a circunstância de ser a tua arma representada pelo teu órgão genital em priapismo corajoso como um canhão explosivo num jogo de batalha naval pum,  Fecundei um óvulo, numa Simone de Beauvoir, ou 

 

como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

 

Pois , resumindo,  segundo a d. Quitéria que me pediu para lhe arranjar uma consulta mais rápido, pois não tem Nem ADSE nem nada que se pareça, há 3 anos à espera, diz-me Ela que está farta de poetas e poemas e que não,não queremoss é fazer nenhum, olhe diz-me ela morda aqui a ver se eu deixo, havias de parir pra saber o que custa a vida, este vómito incoercível que é este teu poema é um engodo nem sequer indica lesão ocupante do espaço, ou tumor cerebral , ou incoerência ,

é de uma beleza livre, e, tão real, dói tanto,mas tanto tanto, como a sede de justiça dos diferentes, , aqueles  que deitaram e deitam e deitarão fora como desiguais,sei do que falo, a quem negam o dia e transformam nas noites escuras de degredo porque sim e porque não… Como a trouxa da Mulher do Trump a quem ele diz vá lá diz umas palavras E Ela diz, palavras saídas da escravidão de flores secas na jarra de enfeite no recanto do pó, a fazer de andarilho ou bengala ou outro qualquer dispositivo de compensação,porque se usa, independentemente da anatomia dos afetos, com base da Lancôme nas bobechas, medida certa, impostas pela moda e um azul cinza, de neve, cruel de belo e seco e frio a desenterrar as múmias das pirâmides do Egipto, envoltas em ligaduras de cambric, que desfiarão em choro oportuno para nos remeter pra canto…Pasmada filha da mãe ,como podes engrenar nisso Sua burra depois de uma mãe coragem qualquer verter sangue em cada obrigação matrimonial obrigada por dignidade indigna, como podes ostentar a escolha da maldade da doença essa anorexia e alexitimia por um individuo que se diz filho de deus e quer javardar os irmãos …

 

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!

 

Pois falas bem, eu também não queria, mas que remédio…

 

Sei por onde vou, não queria, mas é a melhor solução…

 

Sabes José?, Lateja-me nas têmporas a indignação das veias hipertensas com as desigualdades de ver a maioria sofrer para uma restrita maioria engordar de excessos, sabes um amigo dos meus afetos disse-me, já viu que matar o ditador fez a morte de milhões de inocentes e o espalhar das sementes dos ditadores nas várias dimensões ocultas, é, como me dói a Síria e Allepo e, como me doeram as outras…

 

Não vou, mas tenho de ir…

 

Mas invejo-te, ó José Régio como te invejo na genialidade cruel do teu poema, tão atual como o meu sentir…

 

Este teu cântico negro branqueia a minha esperança no ser humano, se acredito , claro que sim, no António Costa

Até mais não poder…

 

Isabel seixas

29
Jan17

O Barroso aqui tão perto...


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Como já bem sendo habitual, aos domingos, damos uma voltinha pelo Barroso, aqui tão perto. Hoje o nosso destino é a aldeia do Cortiço, da freguesia de Cervos,  ou seja, se a nossa também habitual partida for feita a partir de Chaves, é  primeira freguesia do Concelho de Montalegre se o abordarmos pela Estrada Nacional 103.

 

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Para quem gosta mais de abordar o Barroso via Soutelinho da Raia, também por aí se pode chegar ao Cortiço e com itinerário até bem mais interessante, havendo apenas a necessidade de ir com atenção às placas informativas  e tendo em conta que logo em Meixide terá de optar pelo desvio em direção a Pedrário, depois Sarraquinhos, Zebral e logo a seguir terá o Cortiço.

 

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Voltando à Nacional 103, se essa for a opção, não tem nada que enganar, pois chegando ao Barracão, abandona a EN 103, virando à direita.  Mas ficam as coordenadas do local: 41º 46’ 21.00” N  7º 42’ 11.85” O; tal como  fica o também já habitual mapa do concelho de Montalegre com a indicação.

 

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Pois vamos então à aldeia do Cortiço que foi uma das aldeia que me trazia enganado. Esta coisa de andar à descoberta do Barroso já não é de hoje. Já há uns anos que quando tinha um dia livre, às vezes, aproveitava-o para ir por lá à caça de algumas imagens e à descoberta de algumas aldeias. Nessa altura ainda sem o objetivo de as trazer aqui ao blog e portanto sem fazer um levantamento fotográfico mais completo de cada aldeia, ou seja, apenas fotografava aquilo que mais me chamava a atenção e nem sequer me preocupava com o entrar na intimidade das aldeias. Ia de passagem e passava,  ficando apenas com uma ideia breve da aldeia, e confesso, que essa ideia breve não era lá muito abonatória para o Cortiço, pois o que via de passagem, nas primeiras vezes nem sequer me motivou a fazer uma paragem.

 

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E foi com essa ideia breve das anteriores passagens que entrei de novo no Cortiço em dezembro passado, tendo feito a abordagem à aldeia via Sarraquinhos e Zebral tendo como primeira paragem a Senhora de Galegos/Senhora da Natividade e logo aí entendi que tinha o post da aldeia salvo, pois mesmo que na aldeia nada houvesse de interessante dava para compor o post em imagem só com as fotos da Senhora de Galegos, uma pérola no meio da montanha.

 

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Mas lá fomos até ao Cortiço e desta vez com intenção de parar e entrar na intimidade da aldeia. E mal comecei a entrar na sua intimidade comecei a dar-me conta de tão injusto que era o meu breve juízo feito da aldeia, pois o Cortiço é uma daquelas aldeias à qual se pode aplicar a máxima de “ as aparências enganam”, e hoje ao rever as fotografias para selecionar para este post, se dúvidas houvesse, confirmaram bem o tão enganado que eu andava.

 

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De facto a aldeia acabou por me surpreender, não só pelas suas ruas, ruelas e casario,  mas também pela simpatia das pessoas com que tivemos o privilégio de conversar, com tempo para ouvir as suas histórias mas também os seus lamentos, os também habituais lamentos dos resistentes destas aldeias a sofrer da maleita comum do despovoamento e envelhecimento da população, conformados com as partidas dos que partiram destas aldeias que esquecidas, acabaram por ficar despidas de futuro.

 

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E saí do Cortiço sem ver tudo, pelo menos um dos seus ex-libris turísticos – a ponte romana – mas como costumo dizer, convém deixar sempre qualquer coisinha por ver e abordar para nos fazer voltar, embora para ser sincero a razão não foi bem essa, pois aquela que prometia ser uma breve visita, acabou por ser demorada e estava na hora de consolar a barriguinha, para a qual já tínhamos hora e mesa marcada.

 

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Vamos a um pouco da história desta aldeia e daquilo que dela podemos contar. Pois como ex-libris aparece a tal ponte romana que não vimos, a referência a uma fonte antiga, talvez romana diziam-me,  que também não vimos porque a ignorância de alguém a demoliu, e por último o “Santuário” da Srª de Galegos/Srª da Natividade e a sua lenda. Lenda que eu já tinha referido no post de Cervos e que traria aqui quando abordasse de novo o tema, no entanto também ainda não vai ser hoje que fica por cá, pois referências à lenda há muitas, mas lenda nem vê-la escrita ou contada. Pode ser que um dia à procura de outra coisa a encontre ou alguém ma conte.

 

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Referências à Srª de Galegos, felizmente há algumas, embora todas bebam na mesma fonte. Deixo-vos uma delas, que encontrei na WEB  In geira.pt (ref. No final do post) – As fotos são nossas

 

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Senhora da Natividade; Senhora de Galegos

 

Capela; necrópole

Cronologia: Idade Média

Lugar : Senhora da Natividade; Senhora de Galegos 
Freguesia : Serraquinhos 
Concelho : Montalegre 
Código Administrativo : 170629 
Latitude : 535,3 
Longitude : 236,1 
Altitude : 975m 

 

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Acesso : Cerca de 1,4 km para Norte da aldeia de Cortiço. O acesso, não muito fácil, faz-se por um estradão de terra batida, em mau estado, a partir da aldeia de Cortiço. Esta é servida por estrada municipal alcatroada que liga directamente à EN 103. O monumento não está sinalizado. 


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Descrição arqueológica : Cerca de 30 metros para Norte da capela, mal visíveis entre o denso giestal que cobre o terreno, existem três sepulturas escavadas na rocha, antropomórficas, orientadas no sentido E-O sem grande precisão, com cabeça para poente, de acordo com os cânones cristãos. Nos terrenos a Norte e Oeste da capela encontram-se fragmentos de cerâmica comum, identificando-se ainda restos de construções com abundante pedra afeiçoada dispersa. Com base nestes indícios pode propor-se que aqui se localizaria a villa de Gallecos, referenciada nas Inquirições de Afonso III, então ainda pertencente à freguesia de Cervos, com cuja ocupação se deverão relacionar as sepulturas descritas, implantadas nas imediações da capela, e que poderão ser apenas parte de uma necrópole , tipologicamente datável dos séculos X-XIII. Nesta perspectiva poderá aceitar-se que a capela da Senhora da Natividade ou Senhora de Galegos date já dos séculos centrais da Idade Média, servindo nessa época, senão como igreja paroquial, pelo menos como templo local, interpretando aqui no Barroso o modelo de povoamento medieval que no Noroeste peninsular se designa por villa -ecclesia. O monumento apresenta-se razoavelmente conservado. 

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Interpretação : Capela e necrópole medievais. 

Interesse : Embora não possua um significativo valor patrimonial, o interesse deste monumento radica na sua grande importância para a compreensão da ocupação medieval na região do Barroso.

Bibliografia 

Autor : Luis Fontes 

Data Última Actualização : 04-FEV-1998

 

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Quanto a pessoas importantes da aldeia, menciono duas que são mencionadas no livro “Montalegre” de José Dias Baptista, que passo a citar:

“Há criaturas que pelas suas qualidades únicas servem de modelo aos comuns mortais e servem de título às diferentes páginas da História dos povos. Barroso também as tem. Dentre umas boas dezenas sobressaem os que aqui elencamos:

 

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(…)

José dos Santos Dias (séc. XVIII) nasceu em 26-XII-1778 no Cortiço, Cervos, como médico que era foi director clínico das Caldas do Gerês. Recebeu a medalha de prata da Instituição Vacínica. Em 1813 estudou um marco miliário, aparecido em Arcos, no jornal de Coimbra, marco que determinou a desligação histórica da via Prima ao trajecto proposto por Argote e a consequente situação da cidade pré-romana de Caladunum na freguesia de Cervos. Em 1836 escreveu o importante opúsculo “Ensaio Topográfico – Estatístico do Julgado de Montalegre” que é o resumo do manuscritos a “Memória ou descrição física e económica da vila e termo de Montalegre” e deixou inédita a “Memória sobre as Caldas do Gerez”. Morreu em 1846. Balbi teceu-lhe honroso elogio no seu “Essai Statistic,” tomo II.

 

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Padre José Adão dos Santos Álvares (séc. XIX) nasceu no Cortiço, filho do anterior, em 1814. Foi correspondente muito conceituado de vários jornais e revistas do Porto, Braga e Lisboa. Foi pároco de São Vicente da Chã, onde jaz, e arcipreste de Montalegre. Descreveu com realismo os últimos momentos de vida de José Fernandes, o Bagueiro, último condenado à morte em Barroso, que subiu ao cadafalso em 17 de Setembro de 1844.

 

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E que mais dizer sobre a aldeia do Cortiço, talvez mencionar aquilo que se faz por lá, que é o habitual nas aldeias do Barroso, que embora em terras altas, nesta aldeia a rondar os 900m de altitude, vão tendo um pouco de terra mais ou menos fértil,  hoje quase toda destinada a pastagens, o que não é mau de todo dada  a qualidade de carne que essas pastagens proporcionam.

 

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E vai sendo tudo com a certeza que regressaremos à aldeia do Cortiço. Para já ficamos por aqui, mas antes as referências àquilo que consultámos e também às anteriores abordagens aos lugares, aldeias e temas do Barroso.

 

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Bibliografia:

Livro Montalegre, de José Dias Baptista, Edição do Município de Montalegre, 2006

 

Sítios na WEB:

http://www.geira.pt/arqueo/html/sitio108.html

http://arqueologia.patrimoniocultural.pt/index.php?sid=sitios.resultados&subsid=2921316&vt=2921315

 

Anteriores abordagens ao Barroso:

A Água - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-a-agua-1371257

Amial - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-ameal-1484516

Amiar - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-amiar-1395724

Bagulhão - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-bagulhao-1469670

Cepeda - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-cepeda-1406958

Cervos - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-cervos-1473196

Donões - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-donoes-1446125

Fervidelas - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-fervidelas-1429294

Fiães do Rio - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-fiaes-do-1432619

Fírvidas - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-firvidas-1466833

Frades do Rio - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-frades-do-1440288

Gralhas - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-gralhas-1374100

Lapela   - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-lapela-1435209

Meixedo - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-meixedo-1377262

O colorido selvagem da primavera http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-o-colorido-1390557

Olhando para e desde o Larouco - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-olhando-1426886

Padornelos - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-padornelos-1381152

Padroso - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-padroso-1384428

Paio Afonso - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-paio-afonso-1451464

Parafita: http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-parafita-1443308

Paredes - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-paredes-1448799

Pedrário - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-pedrario-1398344

Pomar da Rainha - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-pomar-da-1415405

Ponteira - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-ponteira-1481696

Roteiro para um dia de visita – 1ª paragem - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-roteiro-1104214

Roteiro para um dia de visita – 2ª paragem - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-roteiro-1104590

Roteiro para um dia de visita – 3ª paragem - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-roteiro-1105061

Roteiro para um dia de visita – 4ª paragem - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-roteiro-1105355

Roteiro para um dia de visita – 5ª paragem, ou não! - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-roteiro-1105510

Sendim -  http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-sendim-1387765

Solveira - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-solveira-1364977

Stº André - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-sto-andre-1368302

Tabuadela - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-tabuadela-1424376

Telhado - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-telhado-1403979

Travassos da Chã - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-travassos-1418417

Um olhar sobre o Larouco - http://chaves.blogs.sapo.pt/2016/06/19/

Vilar de Perdizes - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-vilar-de-1360900

Vilar de Perdizes /Padre Fontes - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-vilar-de-1358489

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Vilarinho de Negrões - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-vilarinho-1393643

Xertelo - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-xertelo-1458784

28
Jan17

Abobeleira em três imagens


1600-abobeleira-art (14)

 

E porque hoje é sábado vamos até mais uma das nossas aldeias, mas hoje  iniciando mais uma ronda por todas as aldeias do concelho de Chaves com uma abordagem diferente, com três imagens que ainda não passaram por aqui, três fotografias, sendo uma delas a cores, uma a p&b e outra com tratamento digital, ou arte digital, se preferirem. Aliás a novidade está mesmo nesta última imagem, pois quanto às nossas aldeias passarem por aqui em imagem já há muito que não é novidade.

 

1600-abobeleira (339)

 

Para esta nova ronda, ao contrario das anteriores cujas abordagens que foram feitas aleatoriamente, vamos seguir a ordem alfabética do topónimo da aldeia, daí iniciarmos com a Abobeleira.

 

1600-abobeleira (131)

 

Regras são regras mas há sempre exceções, ou seja, esta nova ronda será ocasionalmente e excecionalmente  interrompida sempre que tal se justificar.  Mas para já não está prevista nenhuma exceção e assim sendo, seguindo a ordem alfabética, a próxima aldeia será Adães.

 

28
Jan17

Ocasionais


ocasionais

 

=Em nome d’…….

 

- A batata, a couve, os grelos;

 o cabrito, o cordeiro, a vitela;

a alheira, o salpicão, a linguiça;

o presunto, a pá, o pernil e a orelheira;

o polbo;

a castanha, o merogo, o melão e a melancia;

 os figos, os pimentos, a sêmea;

o calondro, os chícharros,

a raba,o cabaçote e a azeitona;

os pastéis, o folar;

 as águas minerais e a «pinga»;

 os monumentos e os vestígios históricos;

os artistas e os artesãos;

os Lázaros, “os SANTOS”, o S. Caetano;

a Srª da Livração, as da Saúde;

o Sr. do Monte, a Srª da Guia;

a Srª das Brotas!

 E a franqueza e a hospitalidade dessa gente!

                                                                   =

 

Meus amigos, sempre que por aqui e por mais além dou a «proβar» uma alheira, das ALTURAS; um salpicão, de SEGIREI; uma chouriça, de S. VICENTE; uma fatia de presunto, de CASTELÕES; uma linguiça, de LAMACHÃ; um paloio, de VALDANTA; uma costeleta de vitela, VILARINHO SECO; uma chouriça d’abóbora, do CAMBEDO; uma de sangue, de OUTEIRO SECO; uns «rijões do pingue», de PADORNELOS, umas nozes, de VIDAGO; um gole de Geropiga, da GRANGINHA … ou do “Faustino”; um copo de «branco», de SONIM ou d’ARCOSSÓ; dois de «tinto», de Stª VALHA ou de ÁGUAS FRIAS; um molho de grelos, de SOUTELO; uns espigos, das hortas de VILAR DE PERDIZES; uma fatia de pudim feito com ovos de pita pedrês, de SOUTELINHO da RAIA; um pimento, do CAMBEDO ou de LEBUÇÃO   -   a melhorar uma «sardinhada»; uma garrafa dos «Mortos», de BOTICAS; um magusto, de castanhas de CARRAZEDO de MONTENEGRO; duas lágrimas de azeite de RIO TORTO; um pedacito de um «Trigo de 4 cantos», de FAIÕES; uma fatia de «BÔLA DE LAZA»; uma colherinha de caldo de calondro ou do de chícharros, feitos num pote, numa lareira do CANDO; ou deixo meter o garfo e «proβar» um «Cozido à transmontana», de MORGADE; um “Pastel de Chaves”; ou uma fatia de FOLAR, de PITÕES das JÚNIAS, trazido à Feira do Fumeiro de MONTALEGRE,   -   quer do “João Padeiro”, no POSTIGO, CHAVES; uma folha de couve, da CASTANHEIRA; um pedacito de raba, de Stº ESTÊVÃO, ou um niquito de cabaçote, do CAMPO de CIMA, na Ceia de Natal; uma malga de merogos, colhidos no BRUNHEIRO; uma fatia de melancia, de CURALHA; uma pavia, de VILELA do TÂMEGA; uma fatia de pão centeio, acabadinho de cozer no Forno de TOURÉM ou de MEIXIDE; duas metades de batata, de TRAVANCAS; umas nozes de VIDAGO, uma cebola de PARADA d’AGUIAR; uma truta do COVAS ou do Louredo; uns «milhos» de CERVA ou um cabrito de MACIEIRA; esses meus compinchas, por cada uma destas razões, e por todas e mais algumas, dizem sempre:

 

- CHAVES, a TUA NORMANDIA TAMEGANA é mesmo uma Região «5 estrelas»; e se os teus conterrâneos ainda não deram conta que esse Território foi abençoado pela Natureza então é porque continuam «ceguetas»!

 

Realmente, os flavienses (os Portugueses) preferem viver num mundo de fantasia e num esquecimento cinzento, ameaçado por um passado e presente que os magoa e angustia.

 

Quando se tenta ocultar uma grande verdade, semeia-se a dúvida no coração daqueles que anseiam descobrir o que há por detrás das palavras, das aparências.

 

Teimam em negar o que existe, o que lhes tem estado, e está, a acontecer.

 

Mas ainda há por aí, e por aqui, alguns, poucos, que se recusam a esquecer, a fazer há-de conta de que vai tudo bem no reino flavínio; alguns que não temem lutar contra crenças falsas, nem desistem da luta pela verdade.

 

É difícil lutar contra a mentira de muitos”.

 

É difícil sonhar com um amanhã melhor quando a obscuridade parece imperar em todas as direcções.

 

«Querer esquecer uma verdade inegável é viver sobre uma mentira que nos vai sumindo, é convertermo-nos em nossos próprios verdugos, fazendo com que a nossa consciência apodreça».

 

CHAVES, cidade e Município, daquilo que mais precisa é mostrar-se digna de consideração.

 

E não é com gente desse calibre de «pavão» e «lalões», a administrar o Concelho que o vai conseguir!

 

CHAVES precisa de Investimentos «sérios» e a sério. Tem de saber competir por eles!

 

Os méritos da «Cidade»  -  da Região  -  têm de ser exponenciados, não somados!

 

Estamos entre aqueles que definem a unidade geográfica económica da Economia Global com as REGIÕES.

 

O Estado não tem de ser, necessária e definitivamente, o árbitro de todos os problemas Regionais!

 

CHAVES       ---    e a NORMANDIA TAMEGANA  -   tem de deixar, de vez, de ser uma paróquia da diocese politicastra de VILA REAL, ou do cardinalato político-centrista de Lisboa!

 

A «ligação» a VERIN ainda está muito longe das vantagens e benefícios que pode, e deve, proporcionar a toda REGIÃO.

 

Não é só o mercado doméstico a ter em conta para esse «salto de qualidade e de quantidade» de vida e de investimentos.

 

O «aeroporto do Campo da Roda»… ou o da «Seara» não podem ser pensados como … um bom atractivo-suporte?!

 

CHAVES   -   a REGIÃO  -   não pode ser apenas um bom lugar para negócios: também o deve ser uma CIDADE   -   REGIÃO  -  para trabalhar … e para criar filhos!

 

É tempo, mais que tempo, de CHAVES dar início a um novo ciclo positivo!

 

Prosperidade atrai prosperidade (abyssus abyssum)!

 

Não basta reduzir a pobreza: há que criar Riqueza!

 

Aos homens e as mulheres que aí param ou aportam há que os manter e para essa prosperidade.

 

CHAVES precisa de um governador-administrador  -   de um Presidente de Câmara   -   que tenha a lucidez, a sabedoria, a coragem e a força para promover as suas potencialidades.

 

Os Produtos de CHAVES não podem ser rótulos: têm de ser «MARCAS»!

 

(Os “Pastéis de Chaves” só serão «Pastéis de Chaves” se AÍ em CHAVES forem feitos!

 

… E vós bem sabeis por quê!).

 

Não há que temer nem ter vergonha do orgulho nativo!

 

CHAVES -   a NORMANDIA TAMEGA   -   têm mesmo de encontrar o caminho para o sucesso!

 

As «inbeijas» dos poderes centrais   -   da «Bila» ou de Lisboa  -   que se «lixem»!

 

CHAVES faz parte de TRÁS-OS-MONTES, ou da NUT e de Portugal, sim, senhor!

 

CHAVES -   a NORMANDIA TAMEGA   -   não quer, nem deve, virar as costas às duas capitaizinhas!

 

Os Flavienses, os Normando-Tameganos, também são «especialistas»  -   também são especiais e sabem «especializar-se»!

 

Ó Flavienses! Ó Normando-Tameganos!

 

Ó “OS de Barroso”! Ó “OS da VEIGA” [desde Talariño a Curalha]! Ó “OS da Montanha”! Ó “OS da Ribeira”!

 

Vós sois especialistas em muitas, muitas coisas, catano!

 

Sacudi de vez esses lingrinhas que se vos dizem políticos!

 

CHAVES -   a NORMANDIA TAMEGA   -   é uma REGIÃO singular e atraente!

 

Metei isso na cabeça, amigos!

 

O que vos falta para estardes motivados para o sucesso, pessoal e da NOSSA TERRA?!

 

M., vinte e quatro de Janeiro de 2017

Luís Henrique Fernandes

 

 

27
Jan17

Discursos Sobre a Cidade, por Gil Santos


GIL

 

LÁGRIMAS DE SANGUE

 

Naquela ocasião as palavras vertiam-se-me como água em cesto roto. Por muito que as peasse, remedavam cabras doidas entre penedos e galgueiras. E eu, na ingenuidade das minhas verdes primaveras, permitia-as soltas, selvagens e libertinas.

 

Às segundas já ansiava os domingos. Aguardava-os como o renovo a água da rega. Os dias do senhor eram mágicos. Pela matina assistia à missa, no templo românico de Santa Leocádia. Acordava de madrugada e saía do Carregal aos primeiros acordes do galo. Sapatinho engraxado, calça vincada e camisa alva de terylene. Três quilómetros, à pata, que pouco custavam, pese embora a lama do inverno ou o pó do estio. Ouvir as larachas do padre Luís, era uma desobriga que se impunha, para expurgar os pecados, o mais das vezes veniais, e atestar a alma de fé. A liturgia pouco mais durava do que o concerto de um rouxinol num qualquer silvado. Não estivéssemos afeitos à obrigação, inconsciente, do culto e saíamos de Santa Leocádia menos católicos do que chegáramos!

 

1600-sta-leocadia (327)

 

A igreja matriz, onde ainda se diz a missa, é um respeitável templo do século XII, classificado como monumento nacional desde 1961[1]. Com a fachada principal singela, e sem ornamentos, ostenta um campanário simples, com duas ventanas e respetivos sinos. O maior usa-se para chamar os fiéis à oração e para tocar a sinais. É baloiçado por uma grossa corrente de ferro que com o tempo lavrou fundo canyon na padieira da porta principal. O mais pequeno toca apenas a rebate, no caso de incêndio ou de outras desgraças.

 

O exterior da igreja, rude e sóbrio, é de granito nu, aparelhado e muito musgado. O telhado de duas águas. As paredes laterais, no cimo, são rematadas de um lado e de outro, com temíveis gárgulas, que afugentam os atoleimados e as almas penadas. A parede nascente, contrária à entrada principal, apresenta uma seteira ricamente trabalhada. Para mim, a jóia da coroa! Ao lado direito, encontra-se o cemitério, construído no tempo da reforma dos cabrais. O jazigo da família Morgado, à entrada do lado esquerdo, visitava-se, invariavelmente, para um padre-nosso por alminha de quem lá estava. A igreja é circundada por um adro amplo. Junto à porta lateral, a sul, um sarcófago de pedra encosta-se a à parede servindo de poiso aos homens antes do santo ofício. Uma dezena de degraus, muito gastos pelo uso e pelo tempo, dão acesso ao adro, desde o terreno fronteiro, onde um pelourinho de pedra, muito torto, testemunha a antiguidade do conjunto. Ao interior da igreja o acesso faz-se exclusivamente pela porta lateral do lado esquerdo. Somente em dias de festa, casamentos ou funerais se escancara a principal.

 

1600-sta-leocadia (263).jpg

 

O espaço interior é pesado e misterioso. As paredes, antes caiadas, deixam hoje ver antiquíssimos frescos que um restauro recente deu à luz. O chão, de soalho de castanho, muito gasto, mostra um vasto conjunto de sepulturas e pedras tumulares. A única nave tem teto de madeira e é fechada por um arco triunfal abundantemente lavrado. O altar principal, para lá do arco em ogiva, é de talha dourada, muito simples, em que são protagonistas cachos de uva e os anjos papudos. Para cá do arco os altares secundários. Os do lado esquerdo estão dedicados não me lembro bem a que santinhos. O do lado direito à figura tenebrosa (que Deus Nosso Senhor me perdoe!) do Senhor dos Passos. Esta imagem mexeu sempre muito comigo. De tamanho natural, o Senhor ajoelha-se ao peso do lenho. Veste túnica roxa, atada à cintura por uma grossa corda de sisal. O seu tamanho desusado, a sua expressão de sofrimento e a feridas no rosto, marcaram-me! Nunca o consegui encarar sem que me sentisse agoniado. Hoje mesmo, ainda evito encará-lo! Abaixo da porta lateral, portanto mais longe de Deus, quiçá um castigo pelo pecado original, as mulheres de lenço ou de véu e xaile de merino. Acima os homens. Bancos não havia. Quem se quisesse alapar que levasse um moutcho de casa. Alguns assim faziam. O meu falecido avô, António Moreiras, como carpinteiro que era, não só construiu um, devidamente estofado de serapilheira para si, como para a minha avó um genuflexório que também servia de assento.

 

1600-sta-leocadia (37)

 

E assim se consumiam as manhãs de domingo. Terminavam, invariavelmente, com um lauto almoço de coelho estufado, frango de churrasco, engordado com os saltões das poulas das Padanas, ou com leitão no forno de lenha, quando as recas pariam para lá da capacidade de os vender. No tempo da caça, coelho bravo ou perdiz na brasa, com molho verde!

 

As tardes passava-as em Fornelos nas tropelias da meninice: jogando ao fite, ao rou-rou, fabricando cestinhas com parentes ou ouvindo estórias, quando o tempo não permitia ares livres. Contudo, o que mais me fascinava era a pregação!

 

É desta atividade que vos falo!

 

Desde tenra idade, alguém me topou faculdades oratórias invulgares. Acho que as ganhei ouvindo as pregações. As festas rijas não passavam sem um pregador, como as de hoje sem uma banda! Estes clérigos, sofistas, cobravam gorda maquia, e empanturravam-se, à tripa forra, na mesa das famílias mais abastadas. E eu ficava a ouvi-los, extasiado, o tempo que fosse, contrariando o que seria normal que era andar atrás das canas dos foguetes. Bebia-lhes as palavras, os gestos, bem como as demais ênfases da pregação, com avidez inusitada.

 

O meu sonho era um dia ser pregador!

 

Sonhava subir, devidamente paramentado, a um púlpito e fazer chorar os seixos da calçada como o padre Salgado fazia chorar as velhas beatas. O púlpito, para mim, tinha uma áurea mágica! Quanto mais alto fosse melhor! Mesmo hoje, se visito um templo, procuro sempre o púlpito e imagino-me desde lá puxando pela fé dos crentes. Os púlpitos, há muito abandonados, fascinam-me!

 

(púlpito)

sta-leocadia (33)-discursos1

 

Então, a partir dos meus quatro anos, comecei a não ter papas na língua, nem vergonha na cara! Falando pelos cotovelos, rebuscava, nos recônditos da memória, ainda viçosa, coisas que não lembravam ao diabo! Quando não, inventava, com a mesma facilidade com que o melro inventa as melodias que canta. Daí que, primeiro em família e depois em público, viesse a dar em aspirante a pregador. Não havia festa íntima que não fechasse com uma pregação de natureza religiosa ou profana, mas sempre puxando ao sentimento. A um canto da sala, sobre a cadeira mais alta da casa, relatava a vida de um santo ou de uma santa que a minha avó Carolina me tivesse lido da Cruzada ou do Avé-Maria, ou outro qualquer acontecimento que tivesse escutado na rádio ou tivesse observado em qualquer lugar. Dizem, as más-línguas, que não ficava a dever nada aos melhores pregadores da época, salvo seja!..

 

Em público comecei, lembro-me bem, em Fornelos, teria uns cinco anos. Esta povoação, ínfima, situa-se no limite do concelho de Chaves, confinando com o de Valpaços no Alto da Cruz, a apenas dois quilómetros. Aldeia natal da minha família materna, este lugar da freguesia de Santa Leocádia, juntava sempre muito povo nas tardes de domingo, não sei se por ser atravessado pela estrada nacional 314 que de Chaves conduz a Murça por terras de Montenegro, se pelo vinho da adega do Ti Balele que se escancarava para todos. A verdade é que a partir de dada altura começou a juntar ainda mais povéu, estou que para ouvir o tal aspirante a pregador. O Ti Morgado era o chefe de cerimónia. Quando sobre a parede poente do adro da capela se projetasse a sombra do edifício, fazia-ma subir. Emplouricado naquele púlpito improvisado e olhando a gente desde o céu, destravava as palavras que se evadiam em catadupa. A pregação durava e eu sentia-me o rei de uma festa em os crentes me escutavam com mais atenção do que ao padre Luís na igreja de Santa Leocádia! E eu puxava à lágrima quanto pudesse!

 

1600-fornelos (45)

 

Assim aconteceu durante alguns anos. Raro era o domingo em que não havia sermão. Apenas a borrasca ou a neve do inverno me tiravam daquele púlpito, desde o qual terei subtraído muitas almas ao regaço de belzebú!..

 

Certa ocasião, com sete anos, fui de visita a uns parentes de Almeidinha, um pequeno lugar da vetusta freguesia do Jarmelo, situada para os lados da cidade da Guarda e a caminho de Vilar Formoso.

 

Impõe-se aqui um parêntesis para situar o leitor na história desta freguesia, com referência à obra de Leite de Vasconcelos.

 

«[Jarmelo] tinha honras de Couto com muitos privilégios no tempo do nosso primeiro rei D. Afonso Henriques, que lhe deu foral em Coimbra após o início do seu reinado. D. Manuel deu-lhe de novo foral em Santarém, no dia 1 de Junho de 1510. Em 1755 já estava desabitada, tendo apenas algumas casas, a da câmara e cadeia e mais duas moradias para dois beneficiados, além de três igrejas.

 

Nascera por má sina no Jarmelo, Pero Coelho, que foi gentil-homem da corte de D. Afonso IV - o Bravo, pai de D. Pero. Era filho de Estevão Coelho e de D. Maria Mendes Petite, que foi avó de D. Eleonora d'Álvini, esposa do Santo Condestável. Imensamente ricos, os pais de Pero Coelho deram ao jovem uma educação esmerada.

 

Pois foi justamente para o Jarmelo que Inês de Castro, amada de seu filho D. Pedro, foi desterrada a conselho de Pero Coelho. Ali seria vigiada com rigor. Então D. Pedro em mortal ânsia, não comia não dormia, não parava um momento, e buscava por toda a parte até que descobriu a sua Inês. E com mil cautelas e embustes, às escondidas, foi vê-la de noite, a cavalo, envolto na treva de uma longa capa negra. O corcel levava as ferraduras pregadas às avessas para assim despistar os seus perseguidores. Filou-a e trouxe-a por caminhos calçados de luar, à garupa do seu alazão e foi pousá-la em recônditos paços, no meio de jardins e fontes a cantarolar em tanques de azulejos esmaltados [em Coimbra].

 

Ora, quis a política desse tempo que três fidalgos, um dos quais Pero Coelho, invocando especiais razões de interesse para a grei e para o rei, praticassem o bárbaro assassinato de Inês de Castro na Quinta das Lágrimas em Coimbra, no dia 7 de janeiro de 1355. [Apenas] dois anos depois foram justiçados, bem mais cruelmente, dois dos assassinos. A Pero Coelho foi-lhe arrancado em vida o coração pelo peito. Ao outro foi-lhe arrancado pelas costas.

 

[Em retaliação] Pedro, nesse mesmo ano, ordenou que fosse completamente arrasada a vila do Jarmelo, o que se fez em virtude de nela ter nascido Pero Coelho. Depois da vingança de el-rei D. Pedro, determinou que no Jarmelo não ficasse pedra sobre pedra e que se salgasse o terreno, num gesto decisivo de maldição e extermínio. Excetuou-se porém uma pedra, tosca por sinal, onde os minúsculos pezinhos de Inês pousavam ao montar e desmontar o seu corcel de caça, a [pedra de montar]. Determinou-se que ela vencesse uma tença, de 5 reis por dia, segundo o vulgo à memória “daquela que depois de morta foi rainha”. Foi o próprio D. Pedro que ao visitar pela derradeira vez aquele lugar para ele sagrado e tão saudoso, dissera, num misto de ódio e de tristeza:

 

- Adeus Vila do Jarmelo, adeus pedra de montar, enquanto o mundo for mundo dinheiro hás-de ganhar!

 

E quando mais tarde deixou de se cobrar a tença estipulada, foi essa falta suprida pela caridade amorosa e sentimental da gente humilde das choupanas de colmo, únicas casas que então havia, cavando-se na mesma pedra uma caixa de esmolas, onde os fiéis antes ou depois da missa, iam botar alguns ceitis.

 

Hoje o Jarmelo não é sequer um povoado. Ninguém habita as suas casas totalmente desmoronadas. As muralhas da antiga vila, esfarrapadas e dispersas no cimo da alta colina pedregosa e abrupta, provocam-nos a saudade que é natural sentir-se por um varão ilustre, ao atentarmos nos despojos à maneira de Hamlet.

 

Ali resta apenas a lenda, nuvem vaporosa que sempre fica pairando nos lugares santificados pelas tragédias de amor!»

 

Ines de Castro.jpg

 

Escutei, pela primeira vez, esta trágica história de Inês num dos serões dessa estada, contada pela matriarca da casa. Provocou-me grande curiosidade. Gravei-a nos mais ínfimos pormenores para ocasião oportuna. Estava certo que o próximo sermão não andaria à volta de um tema religioso, mas do drama de Inês de Castro.

 

Assim foi!

 

No domingo que se seguiu, após a missa na igreja paroquial do próprio Jarmelo, o Ti Morgado guindou-me ao descanso mais alto da escadaria da torre sineira que é exterior à igreja de S. Miguel. A gente que deixava a missa juntava-se, curiosa, à volta da torre para ver o que é que um pimpolho de palmo e meio, de calções e suspensórios, teria a dizer lá do alto! Mesmo o prior, já desparamentado e de sotaina, estava curioso para ver onde paravam as modas!

 

Comecei de largo! Papagueei o amor e a tragédia nos seus mais ínfimos pormenores, indo muito para lá do que ouvira. Pintei o quadro o mais negro que pude. E quantas mais lágrimas se soltavam dos olhos piscos das velhinhas, mais me empolgava no relato. Escaquei a louça que pude, mas deixei tudo em pratos limpos! Durou mais de meia hora aquele sermão profano. Terminei-o com o célebre dito de D. Pedro:

 

Adeus Vila do Jarmelo,

adeus pedra de montar,

enquanto o mundo for mundo

dinheiro hás-de ganhar!

 

Arranquei uma ovação mais forte do que a de Tony Carreira ao acabar o Sonho de Menino. Estou que se teria ouvido até na Serra da Estrela!..

 

Senti-me empertigado por ter sido capaz de contar a histórica trágica de Inês de Castro no próprio sítio onde ela teria estado e para as pessoas de lá!

 

− O rapaz tem jeito para pregador! − Diziam as pessoas que não se cansavam de parabenizar a família!

 

Para ultrapassar o estatuto de aspirante e poder ser pregador a sério, mal completei a 4ª classe em 1966, fui para o seminário de Vila Real.

 

Malfadada hora!

 

Dei-me tão mal na imensidão daquele casarão amarelo!

 

Chorei lágrimas de sangue pelos cantos!

 

Lá conheci o padre Max, que faleceu na Cumieira a 2 de abril de 1976. Dele levei muita pancadinha; o padre Minhava, grande músico e compositor, autor da bela marcha de Vila Real que aprendi e ainda hoje canto com nostalgia; o padre Gilberto, santo homem, diretor espiritual; o padre Hélder, responsável pela paróquia de Santa Maria Maior em Chaves; o padre Santos que me obrigava, à força do marmeleiro, a deglutir o intragável latim e tantos outros, que prefiro nem recordar!..

 

Estive lá ano e meio, afastado da minha infância livre!

 

Sim, porque que eu cresci aos ninhos, sentindo o cheiro do feno e da carqueja; aprendendo a assobiar com o melro e o rouxinol; fazendo-me gente à força dos nevões; sentindo o uivo do vento norte cortado por navalhas do sincelo; fabricando os meus próprios brinquedos; insultando o vento suão; fazendo dos dias infinitos escola e das noites estreladas sonhos; vendo parir a reca e a burra e a vaca; botando a cria ao monte e indo cá botá-la; jungindo parelhas de bois galegos e atrelando-os ao arado; sentindo o cheiro do esterco e da terra lavrada; vendo raposas e lobos e texugos; aparelhando cavalos e galopando na poeira dos caminhos; capando grilos e sacrificando saltões e lagartixas; estudando as formigas, os cágados, as abelhas e as vacas loiras; armando pescoceiras e fazendo magustos com fronças húmidas; rasgando calças a subir às cerdeiras; abrindo buracos em penedos para fazer vinho de amoras; sentindo nos pés descalços a força telúrica do Brunheiro; adoecendo e sarando com rezas e mezinhas; chamando as plantas, os animais, os lugares, as pessoas e os caminhos pelos seus nomes próprios; aprendendo palavras que já não se usam e expressões que já não se ouvem; enfim, fazendo os meus benditos sermões!

 

1600-brunheiro (353)

 

Afortunadamente, vá-se lá saber porquê, fui convidado a abandonar o malogrado seminário.

 

Fim de suplício!

 

Naquela casarão ninguém me deu oportunidade de ser pregador!..

 

Foi um desgosto de morte para a minha avó Albertina! Dizia que quando me ordenasse, mandaria matar duas vitelas, encomendaria uma camioneta de arroz e outra de açúcar e convidaria a freguesia inteira de Santa Leocádia para ouvir o meu sermão numa festa no Lameiro Grande!..

 

Nem tudo se perdeu!..

 

A vida, afortunadamente, concedeu-me, em parte, o privilégio de ser pregador. Pois enquanto mo permitam, o meu púlpito continuará a ser o da sala de aula e os fiéis ouvintes os meus pacientes alunos!

 

Gil Santos

 

[1] Decreto nº 44075 publicado em 5 de dezembro, no DR 281/61 série I.

 

 

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