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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

28
Fev17

Chaves D'Aurora


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  1. PRIMO RODRIGO.

 

Além de Adelaide, eram também muito apreciadas, por todos da casa, as visitas do primo Rodrigo, apesar de suas ideias próprias, seu modo diferente de ver a vida, o mundo e as relações sociais. O rapaz, de tez pálida e compleição franzina, com seus óculos de lentes redondas, cabelos um pouco alongados, barba meio rala, mas comprida, com mosca e pera à la Cavaignac, parecia um intelectual do século XIX, não fosse ele nada propenso ao “mal du siècle” dos românticos. Muito ao contrário, era um jovem sempre risonho, de boa parola, a irradiar para todos um quê e um quanto de grande simpatia.

 

Vivia com o pai viúvo a quem, com o seu trabalho em uma tipografia local, ajudava a criar os cinco irmãos menores. Para os Bernardes, seus notórios “defeitos” eram dois: a fama de papa-jantares, sempre a chegar, sem aviso prévio, à hora das refeições alheias, e suas ideias políticas e filosóficas, avaliadas por Reis e Florinda com todos os es e os ex: esquisitas, estrambóticas, esdrúxulas, extravagantes, excêntricas, extemporâneas.

 

Rodrigo dizia-se ateu. Vivia a ler artigos de pensadores como Karl Marx, Friedrich Engels, Rosa Luxemburgo e outros socialistas, ainda que, recentemente, andasse mais propenso a defender os princípios do Anarquismo. Ironizava bastante o texto das Sagradas Escrituras “comerás o pão com o suor do teu rosto”. Dizia que esta máxima a nem todos se aplicava, pois enquanto alguns muitos suavam no trabalho, para o lucro de alguns poucos, em troca de um mísero salário para suas necessidades e as de suas famílias, outros alguns poucos só estavam mesmo a transpirar em festas, banquetes e orgias. Uma transpiração prazerosa, é claro, mas somente possível graças à sofrida exsudação dos alguns muitos.

 

Gostava de desancar a Igreja e a Inquisição e de contar histórias de padres e freiras, com um palavreado cuidadoso, para não corromper os castos ouvidos dos circunstantes, sobretudo os de seus primos miúdos. O que se ouvia em suas narrativas, entretanto, às vezes era tão indecoroso que, perto delas, o crime do Padre Amaro parecia uma história da carochinha.

 

Flor e o marido estavam sempre a polemizar com o sobrinho. Tinham no entanto, para com o rapaz, aquele olhar benevolente de quem considera – Ora, pois, estamos a ver que isso são tolices de um jovem que lê demais, como se deu com o Senhor Dom Quixote – ou a tolerante compreensão

 

– É como papeira ou tosse de coqueluche: dá e passa. – De qualquer forma, esses modos de pensar do rapaz traziam a todos da Quinta um visível desconforto, quando não um forte constrangimento, toda vez que Rodrigo achasse por bem manifestá-los de modo bem radical.

 

Chegavam mesmo a causar desagradáveis incidentes, como a uma tarde de novembro de 1917 quando, conversa vai, conversa vem, o sobrinho reportou-se às notícias que eram a maior atração da época. Ao comentar as aparições em Fátima, Rodrigo logo se pôs a dizer que não entendia patavina, de como essa gentinha toda acreditava naquele disparate, se estava bem claro e notório que todas aquelas visões não ultrapassavam os parcos conhecimentos e vivências daqueles pobres pastorinhos analfabetos, naquele sítio pequeno e afastado do mundo, a aldeia em que viviam.

 

fim-de-post

 

 

27
Fev17

O Barroso aqui tão perto... Zebral


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Vamos lá então até a aldeia barrosã que ontem deveria ter ficado aqui no blog, mas como não deu, fica hoje. Mais uma aldeia do Alto-Barroso, do concelho de Montalegre e que dá pelo nome de Zebral.

 

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Pois sem mais demoras passemos à sua localização. Já sabem que o nosso ponto de partida é sempre de Chaves. Para esta aldeia, tanto faz ir pela estrada municipal via Soutelinho da Raia, como tomar a nacional 103, em direção a Braga.

 

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Para o primeiro itinerário, via Soutelinho da Raia, logo a seguir à primeira aldeia do Concelho de Montalegre, Meixide, devemos tomar a estrada da esquerda e direção a Pedrário e Sarraquinhos. Nesta última abandonamos a estrada em que seguíamos e viramos à esquerda. Está por lá uma placa que indica Zebral que fica quase logo a seguir (2,2 Km).

 

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Se optarmos pela E.N.103, não há nada que enganar, é seguir estrada acima até chegar ao Barracão, aí abandona-se a E.N.103 e vira-se à direita, seguindo a placa de Vidoeiro, passada esta aldeia logo a seguir é Zebral. Do Barracão a Zebral são aproximadamente 4,2 Km.

 

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Claro para quem gosta de conhecer o nosso mundo rural e se quiser ir a Zebral, aproveite e vá deitando um olhinho às aldeias por onde passar, pois todas elas têm o seu encanto e embora muito parecidas, todas são diferentes.

 

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Mas para melhor localização fica de seguida o nosso mapa com a localização de Zebral, mas também ficam aqui as coordenadas da aldeia: 41º 47’ 22,24” N e 7º 41’ 01.24” O, pertence à freguesia de Sarraquinhos, concelho de Montalegre e situa-se entre os 880 e os 960 metros de altitude em pleno Alto-Barroso.

 

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Ainda antes de entrarmos naquilo que descobrimos com as nossas pesquisas, vamos àquilo que registámos aquando da nossa visita à aldeia e às nossas impressões pessoais, mas também àquilo que nos foram contando, pois desta vez tivemos a sorte de um dos nossos companheiros dos cliques fotográficos, aliás habitual nestas nossas visitas ao Barroso, ter sido professor na aldeia.

 

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Claro que fizemos a visita com paragem obrigatória junto ao nº54 da aldeia, uma humilde construção que então servia de escola, com a curiosidade de ter a sorte de existirem Instalações Sanitárias, mas no Nº 63 da aldeia, que embora a distância dos números, ficavam mesmo do outro lado da rua. Contava-nos o nosso amigo Professor que quando lá chegou,  as instalações sanitárias já existiam, mas nunca tinham funcionado e a chave da mesma estava em Montalegre.

 

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Convenhamos que não daria muito jeito que num aperto tivessem de ir a Montalegre buscar a chave, daí que o Professor solicitou por várias vezes à autarquia a “inauguração” das Instalações Sanitárias, até que um dia, um Vereador da Autarquia (hoje Presidente), de chave na mão, apresentou-se em Zebral, para conjuntamente com o Professor fazerem a inauguração das ditas cujas. Esqueci apurar que teria sido o primeiro utente de tão nobre infraestrutura.

 

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Com esta pequena história fica também uma homenagem ao Professor Primário em geral, hoje Professor do 1º Ciclo,  e às condições precárias que encontravam na maioria das aldeias onde tinham de lecionar,  sem materiais de apoio, ao frio ou calor, sem transportes, tendo de calcorrear, muitas das vezes, vários quilómetros a pé para poderem ensinar as crianças e levá-las, pelo menos, a fazer a 4ª classe. Se conseguirem imaginar estas condições tanto para professores como para alunos, comparando-as com as atuais, verão facilmente lhes poderíamos chamar heróis da educação. A homenagem é sincera, principalmente agora depois de conhecer muitas das nossas aldeias do interior e algumas dessas escolas sem o mínimo de condições. A única coisa boa era mesmo haver uma escola e crianças para ensinar, “coisas” que hoje rareiam nas nossas aldeias.  

 

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Pois quanto à aldeia, segundo as minha impressões pessoais, saí de lá com a sensação de existirem três núcleos habitacionais, dois deles mais antigos. O primeiro logo à entrada da aldeia com casario mais senhorial, de casas agrícolas mais ricas, uma delas com capela particular.

 

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Um segundo núcleo, o da aldeia propriamente dita, mais antiga e de construções mais concentradas e próximas da igreja.  Por último um terceiro núcleo no cimo da aldeia, constituído por construções mais recentes.

 

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Quanto ao conjunto, agradou-nos aquilo que vimos, não só a aldeia e o seu casario mas também a envolvente, com terrenos cultivados e ainda alguma gente para os cultivar e pelo que tivemos oportunidade de ver e registar em imagem, pelo menos, por lá, ainda se cultivam batatas e milho.

 

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Também registámos a simpatia das pessoas com quem tivemos oportunidade de conversar, que em Zebral foram conversas um pouco mais prolongadas, pois o antigo Professor da aldeia que nos acompanhava também ia querendo saber por onde andavam os seus alunos.

 

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Quanto às nossas pesquisas, nos sítios do costume, pouco encontrámos, pelo menos que tivessem a ver diretamente com a aldeia. No livro “Montalegre”  de Zebral apenas consta o seu topónimo como pertença à freguesia de Sarraquinhos  e este pequeno apontamento: “Zebral (onde existia uma herdade do irmão do trovador João Baveca)”. Pelo menos deu para ficar a saber quem era o Baveca, e para aqueles que como eu não sabem quem ele era, aqui fica um breve apontamento sobre o trovador que encontrámos num sitio da WEB:

 

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“João Baveca, Trovador ou Jogral medieval, de nacionalidade incerta. Quase nada sabemos sobre este autor, a não ser os dados que podem ser inferidos a partir das suas cantigas. Assim, as referências que nelas faz ao segrel Bernal de Bonaval ou à soldadeira Maria Balteira, bem como as tenções com Pedro Amigo de Sevilha ou Pero d'Ambroa situam-no seguramente em Castela, no segundo terço do século XIII, nas cortes de Fernando III e Afonso X. 
A sua qualidade de jogral parece depreender-se do lugar que ocupa nos cancioneiros, onde está integrado no grupo de jograis galegos, e também da tenção que mantém com Pero d'Ambroa, da qual parece depreender-se que estaria ao serviço de algum trovador. No entanto, como Resende de Oliveira não deixa de referir, o Nobiliário do Conde D. Pedro menciona um Fernão Baveca (30BB5), segundo marido de D. Teresa Peres de Vide, sobrinha do trovador Fernão Fernandes Cogominho (e mesmo talvez por ele aludida numa sua composição), e seus filhos, Fernão e Afonso Baveca. O mesmo Fernão Baveca está igualmente documentado em Barroso, em meados do século XIII. Não sendo impossível que João Baveca pertencesse à mesma família, podendo, nesse caso, ser um cavaleiro português, faltam-nos dados para validar esta hipótese.  (Referências: Oliveira, António Resende de (1994), Depois do espectáculo trovadoresco. A estrutura dos cancioneiros peninsulares e as recolhas dos séculos XIII e XIV, Lisboa, Edições Colibri, p. 358.)"

 

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Quem acompanha o blog já sabe que temos a noia de querer saber a origem das coisas, dos topónimos, por exemplo, e se não conseguimos saber, mandamos uns palpites, às vezes à toa, mas com algum sentido de até poder conter alguma verdade. Por exemplo para Zebral a primeira coisa que nos ocorre é qualquer coisa relacionado com zebras. Esta sem qualquer sentido, pois zebras em zebral só mesmo se pintarem um burro às ricas brancas e pretas. Mas se nos referirmos a Zebra como uma pedra que servia de peso e equivalia a uma arroba, aí já pode fazer algum sentido, mas também não me parece que o topónimo tenha essa origem, tanto mais que este topónimo é mais ou menos comum e até se repete noutras terras e paragens e até há teorias justificadas por entendidos para a sua origem, no geral, ou seja, sem ser para o caso deste Zebral do Barroso. Também chegámos a esta conclusão na WEB, num blog que trata destas coisas e que a seguir transcrevo:

 

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“Com o desenvolver da investigação que vou realizando sobre a toponímia de origem fenícia, cada vez mais me vou apercebendo da grande antiguidade de alguma dela. Já tinha reparado (e escrito) que entre os topónimos de muito grande antiguidade se podiam referir os da família de “zebro” e de “sobro” (por exemplo “zebral” e “sobral”) que têm origem no radical fenício "sbr", que significa "amontoar, fazer um monte". O nome deve ter sido usado em várias situações em que se criava um monte artificial, e não será necessário dizer que existe um número anormalmente grande de mamoas e antas em Portugal que estão em locais conhecidos como "Zebro", "Zebra", "Sobro", “Sobral”, “Zebral”, etc. Concluo daí que estes nomes foram criados na época em que as mamoas foram feitas, ou seja durante o Neolítico e Calcolítico. Por isso o nome se refere ao processo construtivo - "amontoar, fazer montes", e não à forma existente cuja origem se desconhece.”

 

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E é tudo, por hoje, pois no próximo domingo cá estaremos outra vez com mais uma aldeia do Barroso de Montalegre. Restam as referências às nossas consultas bem como deixar os links para as anteriores abordagens às aldeias e temas do Barroso.

 

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Bibliografia

“Montalegre” de José Dias Baptista, edição do Município de Montalegre, 2006

 

WEB

http://cantigas.fcsh.unl.pt/autor.asp?pv=sim&cdaut=62

http://fernando-outroladodahistoria.blogspot.pt/2014/04/zebral-arca-orca-selada-soldo-e-anta.html

 

Links para nteriores abordagens ao Barroso:

A Água - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-a-agua-1371257

Amial - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-ameal-1484516

Amiar - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-amiar-1395724

Bagulhão - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-bagulhao-1469670

Cepeda - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-cepeda-1406958

Cervos - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-cervos-1473196

Cortiço - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-1490249

Corva - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-corva-1499531

Donões - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-donoes-1446125

Fervidelas - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-fervidelas-1429294

Fiães do Rio - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-fiaes-do-1432619

Fírvidas - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-firvidas-1466833

Frades do Rio - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-frades-do-1440288

Gralhas - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-gralhas-1374100

Lapela   - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-lapela-1435209

Meixedo - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-meixedo-1377262

Meixide - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-meixide-1496229

O colorido selvagem da primavera http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-o-colorido-1390557

Olhando para e desde o Larouco - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-olhando-1426886

Padornelos - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-padornelos-1381152

Padroso - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-padroso-1384428

Paio Afonso - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-paio-afonso-1451464

Parafita: http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-parafita-1443308

Paredes - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-paredes-1448799

Pedrário - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-pedrario-1398344

Pomar da Rainha - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-pomar-da-1415405

Ponteira - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-ponteira-1481696

Roteiro para um dia de visita – 1ª paragem - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-roteiro-1104214

Roteiro para um dia de visita – 2ª paragem - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-roteiro-1104590

Roteiro para um dia de visita – 3ª paragem - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-roteiro-1105061

Roteiro para um dia de visita – 4ª paragem - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-roteiro-1105355

Roteiro para um dia de visita – 5ª paragem, ou não! - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-roteiro-1105510

Sendim -  http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-sendim-1387765

Solveira - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-solveira-1364977

Stº André - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-sto-andre-1368302

Tabuadela - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-tabuadela-1424376

Telhado - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-telhado-1403979

Travassos da Chã - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-travassos-1418417

Um olhar sobre o Larouco - http://chaves.blogs.sapo.pt/2016/06/19/

Vilar de Perdizes - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-vilar-de-1360900

Vilar de Perdizes /Padre Fontes - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-vilar-de-1358489

Vilarinho de Negrões - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-vilarinho-1393643

São Ane - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-sao-ane-1461677

São Pedro - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-sao-pedro-1411974

Sendim -  http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-sendim-1387765

Solveira - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-solveira-1364977

Stº André - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-sto-andre-1368302

Vilaça - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-vilaca-1493232

Vilar de Perdizes - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-vilar-de-1360900

Vilar de Perdizes /Padre Fontes - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-vilar-de-1358489

Vilarinho de Negrões - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-vilarinho-1393643

Xertelo - http://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-xertelo-1458784

 

 

27
Fev17

De regresso à cidade


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Vamos lá cumprir as promessas, para já a do “Regresso à Cidade”, embora já tivesse saído dela, mas o que vale é a intenção, e cá está mais uma imagem, como habitualmente às segundas, em arte digital, ou seja, uma maneira diferente de apresentar uma fotografia.

 

A outra promessa, a da aldeia barrosã que ontem deveria ter ficado por aqui, vai demorar mais um pouco, mas ainda é para hoje.

 

 

 

27
Fev17

Quem conta um ponto...


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330 - Pérolas e diamantes: a mão herética do deus António Lobo Antunes

 

Deixem que vos confesse uma coisa: eu aprecio bem mais as entrevistas do que os romances de António Lobo Antunes. Pode parecer uma confissão herética, mas é verdadeira. Ele, na sua imensa modéstia, diz que escreve com a mão de Deus. E que os seus romances (?) são polifónicos. A mim soam-me mais como música estocástica de Iánnis Xenákis. A sua dita polifonia é, por assim dizer, uma dissonância permanente que nos leva quase até ao absurdo e à incompreensão.

 

Talvez por isso, como referiu ao Expresso, não é fácil viver com ele pois parece estar sempre em guerra civil. Não revelou foi contra quem ou a favor de quê.

 

Às vezes pensa, e bem, creio eu, como Verdi, que com os seus 82 anos, quando lhe perguntaram porque não escrevia a sua autobiografia, respondeu: “Já levei 60 anos a maçar as pessoas com a minha música e agora vou maçá-las com a minha escrita?”

 

Além disso considera que todos os livros são autobiográficos. Que vida tão emaranhada deve ter experimentado o senhor. Que coisa sem sentido.

 

Diz que quando escreveu as cartas de guerra à sua namorada “era bonito que se fartava. Agora é um monstro”. Provavelmente, na sua simplicidade introspetiva, um monstro das letras.

 

Conheceu o pugilista Mike Tyson, que considera “inteligente que se farta”, na Public Library de Nova Iorque. O que foi um dos momentos altos da sua vida, pois o nosso eterno candidato ao Nobel é um apaixonado pelo boxe. Quem diria! Até pensou escrever um livro sobre pugilismo.

 

O boxe, para Lobo Antunes, é muito bonito. O seu pai organizava combates entre os seus filhos na casa de banho, com a porta fechada à chave para a mãe não entrar. Eram miúdos.

 

Diz que espera escrever apenas mais dois livros e acabou-se, pois tem “medo de escrever porcarias...  De não ter sentido crítico, pois os escritores que vivem muito tempo começam a fazer porcarias e não percebem”. O que não é, definitivamente, o seu caso. Nem pouco mais ou menos.

 

O nosso estimado romancista foi muito precoce. Segundo diz, e segundo a sua mãe contava, aos dois anos já falava espanhol. Aos 13 anos o seu pai deu-lhe uma segunda edição de “Mort a Crédit”, de Céline, e ficou deslumbrado.

 

Quando o filho disse ao pai que queria ser escritor, ele logo o avisou: “Isso não é boa ideia, estuda, namora. Porque se fores escritor não podes fazer mais nada.”

 

O António não queria ser António, que era o nome do avô, mas sim Sérgio. Ele até gostava muito do avô, mas embirrava com o nome. O avô levava-o aos museus a Itália e dava-lhe “explicações enormíssimas em frente de cada quadro. Depois havia os escarradores.” Ele “só gostava dos escarradores. Queria lá saber dos quadros! Velasquez? Meninas? Queria lá saber”.

 

Diz que acredita em Deus, mas que está sempre zangado com ele. O que não admira, pois continua a estar zangado com o falecido José Saramago. Nunca teve nada contra ele, diz ele. Mas o Saramago tinha-lhe “um pó, uma inveja”. Nunca percebeu porquê.

 

Ele, o Saramago, na opinião do António, “achava-se mesmo um grande escritor”. Ele, o António, que gostaria de se chamar Sérgio, “sempre achou aquilo (os livros do José, especialmente o “Memorial de Convento”) “uma merda”. O Saramago, além de escritor de merda, na opinião do António, possuiu sempre o defeito de ter “mulheres de direita, enquanto se afirmava comunista”. E cita Juan Marsé para arrasar Saramago: “Non es un escritor es um predicador.”

 

Os bons escritores, diz o António, devem ser humildes.

 

Por isso é que Lobo Antunes chegou a fazer um teste de QI e descobriu que tinha 187.

 

A sua mãe costumava dizer: “Não há nada mais estúpido do que um homem inteligente”. Na opinião do seu filho tem toda a razão.

 

Terminamos com um seu desabafo: “A quantidade de coisas estúpidas que fiz ao longo da vida…”

 

João Madureira

26
Fev17

Barroso e regresso à cidade, só amanhã!


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A imagem é do Barroso, de um local próximo da aldeia que hoje deveriamos ter aqui na rubrica de "O Barroso aqui tão perto...", mas não foi possível ter o post pronto a tempo e horas. Assim, fica para amanhã (segunda-feira) à tarde, tal como o habitual regresso à cidade que deveria ser publicado daqui a uns minutos, com uma imagem de arte digital, também só para o fim da tarde de amanhã é que será possível. Fica prometido.

26
Fev17

Pecados e Picardias


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Sabe sra. Enfermeira?

 

SINCERAMENTE

 

Sabe sra. Enfermeira fez-me tanta falta o Sr. Dr. Moya desde que ele adoeceu o meu filho nunca mais teve consulta de neurologia já lá vão quase 2 anos, ele cada vez está pior, e não tenho dinheiro para o levar à consulta no privado, sou de perto/longe de Montalegre. Se todos fossem como Ele, como o sr. Dr. Pintado, o sr. Dr. Manuel Cunha,o sr. Dr. Vitor, as senhoras doutoras essas são quase todas boas…

 

-… ?!!! credo a Sra e o seu marido em quantos médicos andam? Passam aqui a vida… Talvez o presidente da câmara de lá a possa ajudar, olhe que vão decorrer eleições autárquicas…

 

Sabe sra. Enfermeira Desde que o sr. Dr. Tiago Gorgal se foi embora dizem que aqui  não lhe davam o dinheiro que ele queria, que o meu marido não teve mais consulta de urologia já lá vão quase três anos, ele tem tantas dores e eu não o posso ver assim, já o trouxe às urgências mas não lhe fazem nada, podia-me ajudar?...Diz que vem cá um senhor DR. De vila real se lhe pudesse pedir…

 

-…Fale com o sr. Arquiteto Cabeleira ou com o sr. Neves que já o ouvi dizer várias vezes noutras campanhas que ia reduzir as filas de espera nos centros de saúde , quem sabe?...estou cá a pensar, por inerência ou analogia?...Ou agora com os novos candidatos, sim sim, os prováveis  os futuros…Bch, bch, bch,bch(esses, ouvi dizer que são os que mandam)….Eu a esse sr. Dr. Que vem cá o Sr. Dr. Alcino já só lhe posso agradecer a excelência dos cuidados médicos que nos presta aos nossos doentes,(embora verdade seja dita não faz mais que a obrigação também é para isso que nos pagam e Lhe pagam) mas temo que como muitos dos senhores profissionais de saúde  já gastos e cansados e também alguns médicos com espirito de missão,  sem sombra de dúvida, de que este hospital se devia  e pode orgulhar, mas que esmorecem cada vez que vêm colegas de trabalho a ganhar ao mesmo tempo no público e no privado com a nossa conivência, nossa quer dizer ponto e virgula; não a minha, que eu, se fosse tida e achada, obrigava-os a repor o dinheirinho que sonegam ao povo, nas horas que ganham e não trabalham, no público , ladroeira e pouca vergonha,  esses que vão de uma vez por todas para o privado, é que temo que  qualquer dia estes Senhores Profissionais  que cumprem O Verdadeiro Espirito de Centro Hospitalar não aguentem com tantos doentes que vêm e façam como outros e não venham cá…

 

Não sei se conhece alguém próximo do sr. Secretário de estado  da saúde flaviense ,o Sr. agora pelo cargo até em termos de poder verdadeiro  é o Sr.Doutor que mais manda, este senhor é que pode ajudá-la,  eu adoraria, mas apesar de já ser, só sou, enfermeira sabe como é…

 

-?!!!...Mas como se chama esse senhor?

 

-Ah…Desculpe, perdi-me ,o sr. É o sr. Doutor Manuel Delgado, é de cá de Chaves e  até ver, parece que está mesmo preocupado connosco mas já agora, bem bem, mesmo bem, seria se a sra. Conhecesse ou até por interposta pessoa, olhe por exemplo algum sr. padre  que se compadecesse, o sr. 1º Ministro, o Ministro da saúde ou o sr. Presidente da república que é um Senhor muito acessível.

 

-Sabe sra. Enfermeira se a sra.  Me ajudasse… eu até lhe agradecia…

 

Eu é que lhe agradeço,  muito obrigada e não me diga isso por favor, que eu fico muito triste, além de que não tem que me dar nada é que eu levo mesmo mesmo  a mal, eu é que lhe agradeço e muito, o privilégio de poder cuidar de pessoas sãs e genuínas como a sra. olhe que eu já ganho muito bem, ganho uma média de 1700€ limpos, também estudei muito à minha custa que os laboratórios e o estado não patrocinam  a investigação a enfermeiros embora lhe exijam, muito e   muito e diversificado saber,  que eu até achava mais justo que entregassem totalmente a gestão da  estrutura das instituições a quem ganha mais, por exemplo aos médicos , não é?!..., assim  estava melhor, as instituições eram se calhar melhor geridas em termos de cuidados globais, porque se efetivamente o saber deles é maior e melhor porque não?...Porque olhe nem os enfermeiros reconhecem a si próprios o valor do seu próprio trabalho, já viu, desde a supervisão da higienização para evitar infeções, até aos milhares de instrumentos e equipamentos diferenciados  que temos que saber,assim como de medicamentos de múltiplas especialidades e áreas cientificas até ao dar resposta às necessidades dos doentes e dos profissionais e o termos de saber de tudo  e intervir em todos os serviços diferentes e estudar sempre mais e mais e integrar-nos em todos os lados, transforma-nos em o não saber de nada  e a culpa  ainda é sempre nossa, acredite que cansa, enquanto alguns só estudam um Órgão e chega e ainda são os maiores, que fique um sozinho no serviço correspondente aà sua especialidade como assim ser responsável de serviço não custa nada então assim só se paga a um, ó que ganha mais pois claro… Desculpe às vezes canso-me, mas… Louvo o 25 de abril e a minha mãe e um pouco  o meu Eu, já sei até por mim falo, a minha filha como os seus filhos, que, já me tinha dito, não têm esse privilégio de ficar no seu país… pois mas isso não me inibe de dizer o que sinto face a estas desigualdades gritantes.

 

Desculpe, sei que talvez não a tenha ajudado, em desespero de causa e se o seu marido necessitar, quando for à urgência queixe-se antes assim, e assim(mas não diga que fui eu que lhe disse , não que eu me importe … mas … acredite que é melhor não)…Ah lembrei-me  não se esqueça do seu Sr. Presidente da junta, pode ser que ele faça força…

 

Continua…

 

Isabel Seixas in Espólio- Contas do meu Rosário

 

 

25
Fev17

Ocasionais


ocasionais

 

“Precisa de ajuda?!”

 

Antigamente havia lojas, comércios, tabernas, pensões, sapateiros, latoeiros e talhos.

 

Com um salto pelos “Cafés” e «Bares», apareceram os “Shoppings”.

 

Logo a seguir, os “Super” e os «mini» Mercados.

 

Copiando os “shoppings», os novos do «empreendedorismo» deram o nome de “CENTRO COMERCIAL” com ares de diferença arco-irisada ao corredor de lojecas   -   salas-buraco   -   no rés-do-chão de um armário de cimento armado, cheio de gavetões a que chamamos apartamentos.

 

A mania das grandezas, sublimação das fraquezas - ‘pequenezas’ -, levou à construção de “Shoppings” grandalhões e a Hiper-mercados, para diferenciação dos “Super” e «mini-mercados».

 

Entra-se numa dessas lojas  -   seja de roupa ou de calçado; seja de produtos de higiene ou tratamento de belezas; de florista ou de telemóveis; de bijuteria ou de ourivesaria; de serviços municipais ou municipalizados; de papelaria ou de sapateiro-rápido; e, logo, uma serigaita se aproxima de nós e atira, como um petardo: «precisa de ajuda»?

 

Quem diria!

 

O “Café”, o “Salão de Chá”, a “Pastelaria e Pão-Quente” não dão para se fazer uma pausa sossegada ou ter uma conversa amena: a «cultura» indígena, o «empreendedorismo» exigem que, com gente ou vazia, a «CASA» tem de ter a Televisão ligada e com o som, de vozes ou de música, bem alto.

 

Para o empresário/a do “Café”, do “Salão de Chá”, da “Pastelaria e Pão-Quente”, a pedra de toque da sua classe empresarial não está no asseio das mesas, das cadeiras ou do chão; não está na simpatia e solicitude dos «colaboradores» (cuidado, porque agora não há «empregados»; nem sopeiras; nem «empregados –de –mesa ou de balcão)!

 

E «colaboradores» até já vai havendo muito poucos: estão a ser substituídos por «assistentes de …»; «gestores de …»; «agentes técnicos da actividade de ….»!

 

Cuidado! Muito cuidadinho!

 

Agora, nos tempos que correm «os ocupantes dos postos de trabalho» estão aí para tratarem dos «clientes» com duquesa caridade (mal se entra a porta da Loja, disparam-nos a pergunta: «Precisa de ajuda»?). Ou, então, aproximam-se com ares imperiais de imperadores, ou de imperatrizes, como que a exigir o «pedido», trazerem para a mesa o café, o bolo, a cerveja ou o sumo com o aprumo de quem apresenta armas na parada, e com a vontade de saltar «à cronhada» ou aos tiros!

 

Em alguns “Cafés” e “Pastelarias e Pão-Quente”, fica-se com a impressão de que os/as «assistentes-técnicos/as da actividade de Restauração e Similares» quase se engaleiam para ver qual deles/as realiza a operação de “Caixa”, esticando a mão para receberem a «massa», criar a técnica mais lambisgoiada de combinar as moedas para o troco, e tirar o narcisista proveito de ver um, ou outro, e outro pagante à espera de que lhe seja feito o favor de ver aceite o seu pagamento!

 

Não! Que a ocupação de um «posto de trabalho» confere direitos e mais direitos, e uma superior importância, de tal ordem que os «clientes» são seres hierarquicamente inferiores!

 

A toque de caixa, e ao som do Programa favorito da «Gerência» é que os «clientes» modernos têm de andar, ora essa!

 

Saímos para ir às compras e entramos em «centros de caridade»!

 

Os “Shopppings”, os “Centro-Comerciais”; as sapatarias, as parafarmácias; as lojas dos «tèlélés» e as de brinquedos; as livrarias, as perfumarias; as «chocolaterias» e as gelatarias deixaram de ser «estabelecimentos comerciais»: passaram a «Centros de Ajuda ou de Perpétuo Socorro»!

 

É tanta a Caridade que até tresanda!

 

E mesmo nas Repartições Públicas, ou Câmaras Municipais, quando o cidadão expõe o seu assunto e revela alguma hesitação ou incompreensão na resposta que lhe estão a dar, o funcionário, ou funcionária, apressa-se aflitivamente, mas com tom solene e poderoso, a declarar:

 

- “Eu estou aqui para ajudar”!

 

Omessa porra!

 

Isto é uma pândega!

 

Sumiu-se o «O que deseja?»!

 

Agora ninguém está num posto de trabalho para «atender», para «vender», para «receber», para «pagar», para «ser útil», para SERVIR!

 

Toda a gente, no seu posto de trabalho, ali está para «AJUDAR» … a tornar mais leve o nosso porta-moedas ou a emagrecer a nossa Conta bancária!

 

Ou a dar cabo da nossa paciência!

 

 

M., vinte e quatro de Fevereiro de 2017

Luís Henrique Fernandes

 

 

 

25
Fev17

Agrações, Chaves, Portugal


1600-469-art (6)

 

Tal como tinha sido prometido no último sábado, hoje vamos até Agrações, uma das aldeias  pela qual gostamos de passar de vez em quando, talvez por estar arrumadinha lá no alto, talvez por não calhar no itinerário de nada, talvez para contabilizar a resistência.

 

1600-agracoes (393)

 

Seja como for e mesmo não calhando no itinerário de nada, continuará a fazer parte dos meus itinerários para lançar uns olhares e fazer uns registos que, no outono e inverno são únicos e na primavera e verão sempre diferentes.

 

1600-agracoes (525)

 

Registos que ficarão para memória futura como o testemunho de que ali existiu uma aldeia, gente e vida, pois assim será e dela só restará a memória , tudo por um dia ter acreditado que lá em cima, na montanha, no itinerário de nada,  o futuro também era possível …

 

 

24
Fev17

Discursos Sobre a Cidade, por Gil Santos


GIL

 

SAPATINHO DE VERNIZ

 

 

A luz daquele final de tarde de 21 de maio de 1966, coava-se pelas vidraças surradas do salão de estudo do seminário de Vila Real, como pelas claraboias das cozinhas fumadas de um qualquer tugúrio do Brunheiro. Triste e doentia, aquela luz, apesar de tudo, transportava-me, nas minhas viçosas primaveras, para um mundo distante, carregado da nostalgia que me salvava daquele sufoco de gramar um longo período letivo afastado das touças e dos outeiros do Carregal.

 

O meu canto, no Planalto, alumiado pela candeia a petróleo e coberto por telha vã, era um palácio, quando comparado com aquela babilónia, miserável, onde me encarceraram.

 

As janelas imensas de meio arco; os corredores longos, gelados e decorados de azulejos azuis até à minha altura; os cheiros horrendos a cera queimada; a sotaina dos padrecos e a disciplina sólida e irracional, eram degredos que tolhiam a minha alma cândida de ave de arribação. A tristeza, a solidão, a ausência de casa e dos amigos, faziam-me verter lágrimas de sangue e renegar, cada vez com mais veemência, aquela vocação que me talharam!

 

Tirando o recreio, sempre curto, e os passeios pela cidade e arredores de que lembro a Timpeira com saudade, tudo o resto era um martírio, na verdadeira e mais crua acessão da palavra.

 

Lembro ainda outro momento de fuga, constituído pela obrigatoriedade do confesso semanal com o diretor espiritual, o padre Gilberto. Um santo homem que não deveria ter lido todos os livros a que os cânones daquele maldito seminário obrigavam! Tolerante e bom conselheiro, livrava-nos, por algum do tempo, do suplício da sala de estudo. Eu era adepto fervoroso dos confessos, não porque me preocupasse com remissão dos pecados que não tinha, mas para ouvir as palavras sábias e amigas daquele homem, bafo quente na frigidez daquela casa.

 

Vivi dois longos anos de sofrimento naquele forte ocre! Um edifício sóbrio, medonho, na altura o maior da cidade. Um casarão, diziam que com tantas janelas como dias tem o ano e que conseguíamos ver do mais longínquo lugar onde nos levassem os nossos passeios domingueiros.

 

Mas aquele sábado entardeceu com a esperança de um passeio inédito no dia seguinte ao Monte da Forca. Um sítio de que muito ouvira falar, mas que não conhecia. Pensava eu que por lá encontraria, ainda, a mesma forca que, na Idade Média, tiraria a vida aos sacripantas das redondezas! Mesmo o nosso professor de música, o bendito padre Minhava, com quem aprendi a marcha de Vila Real, da sua autoria, e que ainda hoje lembro, falou um dia das estórias de horror que se teriam vivido naquele lugar malvado.

 

Chegava, enfim, o dia de o conhecer.

 

Ao tempo, para se estudar no seminário de Vila Real, penso que seria o mesmo em todos os outros, era necessário recolher um enxoval completo. Todas as peças, desde os lençóis às peúgas, eram marcadas com um número de ordem para que não fossem trocadas pelas lavadeiras. O meu era o 64. Do enxoval fariam parte muitas coisas, porém, a que melhor lembro era o fato preto, a gravata da mesma cor e uns sapatinhos de verniz. Lembro também um par de botas, à medida, que meu pai mandou fazer ao sapateiro Vila Real da Rua Direita. Aquele fato usava-se, somente, nos dias de festa e nos passeios ao exterior. Quando os aspirantes a padrecos percorriam, perfilados, as ruas da cidade, pareciam pinguins e eram motivo de chacota. Como se já não bondassem os flagelos intramuros, de que se destacavam as sabatinas de latim do padre Santos, que me chegaram a pôr as nádegas negras com uma pequena vara de marmeleiro, ainda era preciso que os paisanos lá fora, continuassem a nossa tortura!..

 

Por falar da vida intramuros, permitam-se-me três regos ao enviés:

 

As rotinas diárias eram rígidas e meticulosamente preparadas, duríssimas. Às sete despertava-se, passado meia hora ia-se à missa, depois ao pequeno-almoço e, até ao meio dia, às aulas. Das catorze às dezassete, para a sala de estudo e, depois de meia hora de recreio, ao terço. Às sete e meia era a janta, às oito e meia, as orações da noite e, às nove, dormitório.

 

A mim e a muitos, o que mais custava era suportar aquelas três malditas horas na sala de estudo. A vontade de estudar já não era muita e as matérias como carne gorda, por isso, cada um arranjava a melhor maneira de se safar. Ainda para mais, o salão de estudo era percorrido de lés a lés por um padre vigilante que não parava um segundo.

 

Certa ocasião, não me lembro bem como, arranjei um livro do Patinhas, ainda a preto e branco. Meti-o debaixo da Initia Latina e, quando o padre estivesse longe, eu ia-me deliciando com as estórias do avaro. Às tantas, não sei se pelo entusiasmo da leitura se pelo silêncio dos pés de lã do padre, sem que me apercebesse, aproximou-se por trás. Deu com o livro aos quadradinhos! Levei semelhante cachaço que aterrei, de cabeça, em cima da carteira. Como se não bastasse, fui arrancado do lugar e espancado, sem dó nem piedade, para servir de exemplo. Foi tamanha a surpresa e o pânico, que me soltei por cima e por baixo e tive de ir para a barrela. Estive dois dias na enfermaria, convalescendo!

 

De outra vez, foi no banho. O sábado de manhã era destinado ao chuveiro para lavagem das catotas! No rés-do-chão, junto ao refeitório, havia amplos balneários, com cabines individuais fechadas, que davam para um átrio, percorrido por um vigilante. Naquele sábado, calhou ao padre Benício a missão da vigia. Porém, tinha-lhe constado que alguns seminaristas, pouco amigos da água, não tomariam banho. À entrada da cabine, o padre entregava uma lisca de sabão macaco a cada um que deveria ser devolvido à saída. Alguns, entravam, fechavam a porta, abriam o chuveiro, molhavam a cabeça e nada mais. Ora, eu achava piada àquele sabão, porque depois de o usar para escarolir a cabeça, o cabelo chiava quando percorrido pelos dedos húmidos. Sinal de limpeza no meu ingénuo ponto de vista!

 

Naquele dia, saí da cabine e coloquei a sobra do sabão na caixa que o padre sustentava. O Benício abordou-me:

 

— Ora então é este o menino que não toma banho?!

 

— Tomei, sim, senhor padre – defendi-me, passando os dedos sobre o cabelo.

 

— Vê, senhor padre, o meu cabelo até chia!..

 

Quis lá o presbítero saber daquele argumento que nem conhecia, levei para peras!

 

Falando em recreio, a hora do dia mais esperada, como disse, acontecia por volta das dezassete, coincidindo com a hora da merenda. Esta constava de um pão com um cibo de queijo ou uma fatia de marmelada, que se recolhia à saída de um cesto de vime que pousava sobre um banco. Fazíamos fila e ordeiramente cada um tirava o seu bocado. A controlar estava um padre, para fazer cumprir a regra de que não se olhasse para o cesto para que não fosse possível escolher o carolo maior. A verdade é que a larica era muita e os bocados de tamanho muito diferente.

 

Ora, um certo dia, não sei se por o almoço ter sido a maldita farinha de pau com carapau frito, que eu detestava, ou por outra coisa qualquer, saí para o recreio com uma fome de rato. Quando me aproximei do cesto, não resisti e olhei para catrapiscar o cibo maior.

 

Pois isso!

 

Levei tamanho limpa-queixos que mergulhei em cima do cesto, espalhando o pão pelo chão. Fiquei sem merendar. E, como se não bastasse, fui de castigo rezar o terço para a capela, como se isso enchesse barriga!

 

Mas não se pense que o seminário só tinha coisas más. Havia o hábito de levar os seminaristas a comer ao refeitório dos padres no dia em que faziam anos. Dois dias antes de 21 de maio, tocou-me a mim. Não sei ao certo se a comida seria melhor do que a nossa, sei é que sabia pela vida! E o melhor de tudo é que, independentemente da idade, permitiam que bebêssemos um copo de vinho, não sei se para treinar já para o santo ofício a acontecer anos mais tarde! Naquele dia, lembro-me, apenas, de ter saído do refeitório dos padres com tal carraspana que, no recreio das cinco, nem na bola acertava!

 

Retomemos a lavoura no dia que dá corpo a esta estória.

 

Então, naquele domingo de 22 de maio de 1966, após o almoço, saímos acompanhados de um padre e de um grupo dos mais velhos, em direção ao tal Monte da Forca. De fatinho, gravata e sapatinho de verniz, estaríamos mais preparados para ir a uma qualquer missa na Sé, do que para o meio dos tojos e da carqueja do Monte da Forca!

 

Lá fomos, por veredas e calçadas. Chegamos após hora e meia de caminho.

 

Da forca, que eu esperava encontrar, só mesmo a imaginação, de resto pinheiros bravos e giestas piorneiras.

 

Nada!

 

Não sei o que teria passado pela cabeça do (ir)responsável padreco que nos acompanhava, mas decidiu que haveríamos de descer o monte, ladeiro, a corta-mato, em direção ao Cabril que atravessaríamos numa ponte manhosa para retomarmos o caminho de volta.

 

Assim foi.

 

Lá fomos nós, monte abaixo, uns atrás dos outros. O chão estava estrumado de agulheta seca, autêntico visgo para os sapatos de sola que escorregavam, provocando tombos de meia-noite. O meu fatinho preto, como os da maioria, chegou ao fundo numa rodilha.

 

Depois de algumas peripécias engraçadas, chegamos ao sopé, junto do rio, e deparamo-nos com um obstáculo muito difícil de transpor. Tratava-se de um talude alto, quase a pique, que não se compadecia em ser descido com os tais sapatinhos escorregadios. A estratégia do padre foi a de que nos descalçássemos, atirássemos os sapatos para o caminho, paralelo ao rio, onde um dos mais velhos os apararia. Esse caminho que levava à ponte, era muito estreito e o Cabril, três metros abaixo, corria impetuoso pelas águas primaveris.

 

Tudo correu às mil maravilhas…até à minha vez. Cá em cima, descalcei os meus sapatinhos, nos quais tinha tanto empenho, e atirei o primeiro que foi apanhado com relativa facilidade pelo quintanista Adruzilo. O segundo, não sei se por ser mal atirado, se pelas mãos de cebola do apanhador, caiu ao rio e seguiu na corrente, primeiro à tona e, depois, afundando-se para não mais ser visto.

 

Um sarilho!

 

Dali a Vila Real segui a manquitar com um pé descalço e outro calçado. No meio da cidade, disfarcei no meio dos companheiros. Ninguém deu por nada.

 

Chegado ao seminário, fui diretamente ao gabinete do Reitor Libânio Borges, acompanhado do Prefeito que pelo caminho desfiava as culpas sobre o que dizia ser o meu laxismo.

 

Bem eu o entendi!

 

Paguei a injustiça da irresponsabilidade dos outros com quatro lambefes no focinho!

 

Que raiva!

 

Aos meus pais evitei contar, para não levar mais!..

 

No dia seguinte, levaram-me a uma sapataria e encabaram-me os pés nuns sapatinhos, novinhos do trinque, de verniz, dois números acima para que não deixassem de servir em crescendo!

 

Ainda hoje estou para saber quem os teria pago, se os responsáveis do seminário de Vila Real se os meus pais, com o valor camuflado no recibo das propinas!..

 

Fui expulso do seminário passados dois anos, ainda hoje estou para saber porquê!

 

Bendita a hora!

 

Gil Santos

 

 

23
Fev17

Flavienses por outras terras


Banner Flavienses por outras terras

 

 

Marcelino Melo

 

Nesta crónica do espaço “Flavienses por outras terras” vamos até ao centro do país, mais concretamente até Soure, no distrito de Coimbra, um concelho que tem a particularidade de ser territorialmente descontinuado, pois uma das suas freguesias possui uma pequena parcela da sua área encaixada entre os concelhos de Penela e Ansião.

 

É lá que vamos encontrar o Marcelino Melo.

 

Cabeçalho - Marcelino Melo.png

 

Onde nasceu, concretamente?

Nasci em Chaves, no antigo hospital, ao lado da Igreja Matriz, e vivi sempre na Avenida do Tâmega, antiga Estrada de Outeiro Seco.

 

Nos tempos de estudante, em Chaves, que escolas frequentou?

Frequentei a Escola Primária da Estação, a Escola Preparatória Nadir Afonso (Ciclo), a Escola Secundária Dr. Júlio Martins e a Escola Secundária Fernão de Magalhães.

 

Em que ano e por que motivo saiu de Chaves?

Saí em 1994, para ingressar no Ensino Superior.

 

Em que locais já viveu ou trabalhou?

Já vivi em Coimbra e agora em Soure.

 

Diga-nos duas recordações dos tempos passados em Chaves:

O Grupo Desportivo de Chaves, clube no qual joguei nas camadas jovens e pelo qual continuo completamente “doente”, e o grupo de amigos que criei até sair de Chaves, com 18 anos.

 

Proponha duas sugestões para um turista de visita a Chaves:

As termas, sem dúvida, e também os vestígios romanos, entre os quais o novo Museu em frente ao Palácio da Justiça. Ainda não tive oportunidade de o visitar mas pretendo fazê-lo em breve.

 

 

Estando longe de Chaves, do que é que sente mais saudades?

Da família e dos amigos. Dos jogos do Desportivo.

 

Com que frequência regressa a Chaves?

Até há uns anos atrás, umas 4 ou 5 vezes por ano. Depois do falecimento dos meus pais as visitas têm sido mais espaçadas, infelizmente.

 

Gostaria de voltar para Chaves para viver?

Gostar, gostava! Mas é bastante improvável…

 

 

 

O espaço “Flavienses por outras terras” é feito por todos aqueles que um dia deixaram a sua cidade para prosseguir vida noutras terras, mas que não esqueceram as suas raízes.

 

Se está interessado em apresentar o seu testemunho ou contar a sua história envie um e-mail para flavienses@outlook.pt e será contactado.

 

Rostos até Marcelino.png

 

 

 

 

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