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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

28
Set08

Bobadela de Monforte - Chaves - Portugal


 

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A nossa aldeia de hoje é uma velha conhecida minha, pois no 15 de Agosto, dia de festa na aldeia, tínhamos sempre encontro marcado.

 

Mas ainda antes de entrarmos nossa aldeia de hoje, Bobadela, deixem-me explicar um bocadinho a importância que essa aldeia tinha nessa data.

 

Sou da colheita de 60, uma boa colheita por sinal, os da minha geração e os mais velhos conhecem na perfeição a importância que as festas tinham nos anos 60 e 70 (não falo dos anos anteriores porque não sei como era, mas suponho que fosse idêntico). As gerações mais novas, já não entendem tão bem a importância e tradições que estavam ligadas às festas. Sei-o porque que tenho em casa um adolescente e uma criança além de trabalhar também com gente mais nova que eu, que estão muito longe de saber, embora o tentem imaginem, o que era viver sem água canalizada em casa, sem instalações sanitárias, sem electricidade, sem televisão, sem frigorífico, sem computador e até de uma coisa tão simples como uma máquina de calcular.

 

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Sinto-me um privilegiado por ter assistido a todos esses grandes momentos como o da televisão, mesmo que a preto e branco, com um só canal, a fechar à meia-noite e constantemente interrompida com aquele famoso ecrã negro onde projectavam “Pedimos desculpas por esta interrupção, o programa segue dentro de momentos”, mas antes disso, foi-o a electricidade, que embora eu (porque nasci na cidade) já tivesse nascido com luz, na grande maioria das aldeias ainda não tinha lá chegado.

 

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Tudo isto para chegar ao 15 de Agosto de Bobadela e à sua festa, pois também em termos de divertimentos e lazer, o que havia de mais importante, eram as festas dos bairros e das aldeias, fora isso, as brincadeiras de rua, as futeboladas, os matraquilhos e os sapos das tabernas e para os mais intelectuais, as tertúlias nocturnas dos cafés, e estas, só para os da cidade.

 

A importância das festas era tanta, que nós em adolecentes crescidotes, tínhamos os calendários das festas mais importantes ou daquelas que eram de visita obrigatória, por uma ou outra razão. Festas como a de Vilarelho, de Outeiro Seco, de Valpaços, de Vilarandelo, de Lebução, de Boticas e, para mim, a do Sr. da Piedade de Montalegre, era impensável faltar. Mas havia também as de visita obrigatória porque era terra de amigos, colegas ou até de namoradas e às vezes, tudo junto.

 

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A festa de Bobadela era uma que estava marcada no calendário como visita obrigatória, porque as tais condições todas juntas se reuniam para nós lá irmos, e digo nós, porque a festas nunca se ia sozinho. Em Bobadela tínhamos convite para casa do Tio Jaime, que era pai de uma colega de liceu, amiga e namorada de um amigo, e como na altura os pais das namoradas metiam sempre medo, lá ia-mos indo, uns de acompanhantes e amparo de amigos e outros de namorados. Mas valia sempre a pena, pois festa era festa, sempre boa mesa e bem regada, banda no coreto e foguetes no ar, não podíamos ser mais felizes e havia muita solidariedade e cumplicidades entre a juventude de então. Só a título de curiosidade, o meu amigo “velhote” casou anos mais tarde com a filha do Tio Jaime e hoje, já é sem medos, mas por amizade que sempre que passo por Bobadela paro em casa do Tio Jaime para os cumprimentar.

 

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Mas vamos até Bobadela e deixemos de parte as inevitáveis estórias do passado.

 

Bobadela é ainda uma das terras do grande planalto, fica a 18 Km de Chaves e o acesso é feito a partir da tal Nacional 103. É sede de freguesia à qual pertence ainda o lugar ou aldeia da Bolideira, a tal que tem a famosa pedra da Bolideira, porque além de gigantesca (para pedra) qualquer um de nós a consegue fazer bulir.

 

Bobadela em termos de área do seu território é uma das mais pequenas freguesias do concelho, com apenas 6 km2, mas mesmo assim faz fronteira com as freguesias de Oucidres, Águas Frias, Tronco e Nozelos, esta última já pertença do Concelho de Valpaços.

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Em termos de população também é a freguesia com menos população do concelho com apenas 124 habitantes residentes, mas que, contava ainda com 16 residentes com menos de 20 anos, dos quais 5 tinha menos de 10 anos (Censos 2001). Comparativamente com os Censos de 1981, perdeu 73 habitantes o que em termos percentuais significam 38% da sua população. Mesmo assim, um número invejável para as aldeias que mais sofrem de despovoamento.

 

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Claro que tudo numa escala mais pequena, porque a freguesia e aldeia sempre foi pequena, a aldeia tem os seus emigrantes, os seus abandonos para as cidades e o seu envelhecimento, principalmente no casario mais antigo e abandonado, algum em ruínas. Inevitável, não só por falta de políticas acertadas para as aldeias e para todo o interior, mas também por permissões, facilitismos e complicações de Leis que permitem e não permitem, complicam em termos de heranças ao permitirem que pequenos prédios já por si reduzidos seja divididos por vários (às vezes muitos) herdeiros. Claro que teoricamente são prédios indivisos, mas à nossa boa maneira tudo se vai contornando e se nos prédios rústicos a coisa é fácil e cada um cultiva o seu pedaço, nos prédios urbanos, ou seja nas casas, a coisa já não é tão fácil de dividir nem de abdicar da sua quota-parte ou quinhão e, como é de todos, ninguém investe individualmente e,  como ninguém investe, o casario acaba por deteriorar-se e acabar em ruínas. Além disso, também é mais fácil e barato, além de criarem melhores condições construir de novo do que reconstruir, e assim, repetidamente nas nossas aldeias, vemos periferias e até terrenos agrícolas invadidos por novas construções enquanto que o antigo e tradicional casario está ou caminha para a ruína. Claro que não estou a falar de Bobadela em particular, mas em geral, pois é assim em todas as aldeias – “as casas belhas estão todas esborralhadas ou esbarrondadas” é o que me costumam dizer, mas nem era necessário, pois está à vista de todos.

 

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Bobadela de Monforte, como todas as nossas aldeias é essencialmente agrícola cujas produções são, o centeio, batata, milho, frutas e algum vinho. Embora por lá existam algumas construções recentes e alguns arranjos também recentes, não deixa de ser uma aldeia pitoresca com um núcleo envelhecido de construções tradicionais onde o granito era rei e senhor, no entanto sem casario rico ou solarengo, mas muito interessantes. Bobadela, está situada num ponto alto da região (no grande planalto), na envolvente do Castelo de Monforte, entre matas de soutos e carvalheiras, assente nos visos da serra a dominar toda a encosta até ao fértil vale de Tinhela (concelho de Valpaços).

 

Possui uma interessante igreja matriz, cujo orago é São Pedro.

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Numa das casas da aldeia existem três pedras trabalhadas que datam de 1517. Claro que a origem da aldeia é concerteza muito mais antiga no entanto apenas existem teorias e suposições quanto à sua antiguidade levantada por alguns historiadores locais e que ligam a aldeia a uma suposta ou provável estância castreja da idade do ferro desenvolvida no alto da Cidadonha (ou Cigadonha) onde se diz existir vestígios de fossos e muralhas.

 

Dizem ainda alguns escritos que a nobre família dos Andrades, descendentes de Nuno Freire de Andrade, Mestre da Ordem de Cristo, que veio para Portugal no reinado de D. Pedro de Castela, teve aqui a sua Torre ou Casa Forte. Este castelo e outros congéneres que existem na Galiza e norte de Portugal, poderão remontar aos afastados tempos da reconquista cristã, e aos quais se refere o velho Livro de Linhagens. Este nome de Castelo ou Torre dos Andrades, poderá ter sido atribuído como trofeu de glória, para recordar os feitos do ilustre cavaleiro que, com mais quatro companheiros de armas, foi até Espanha combater os sarracenos, em companhia do conde D. Mendo.

 

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Os Andrades recolhem o apelido da vila de Andrade, situada na Galiza. Esses senhores, cobertos de honrarias, foram donatários da aldeia. Um deles. o conde de Bobadela, em 1733, foi governador e capitão geral do Rio de Janeiro e mais tarde governador de Minas Gerais e de S. Paulo. Criou no Rio de Janeiro a primeira oficina tipográfica, erigiu o aqueduto de Carioca e interveio na construção de outros edifícios públicos". Dessa família descendeu o general Gomes Freire de Andrade, grande lutador e mártir da liberdade. Deduz-se até que Bobadela é uma designação de origem árabe, que poderá derivar de Boabdil, nome do último rei de Granadas, e que seriam eles, os árabes, os seus fundadores. Foi relativamente curta e efémera a estada dos mouros nestas terras, mas é incontestável que deixaram inúmeros sinais da sua passagem sobretudo em termos de topónimos como: Alpande, Alfonge, Amoínhas (Almoinhas), Almorfe, Bóbeda entre tantos outros. Perto do centro urbano, situa se o castro designado por Cidadonha, de edificação pré romana, embora depois tivesse sido romanizado, como se infere dos achados arqueológicos. Castro esse que integrou a vasta rede de fortificações romanas, que se estendem pela orla do extenso planalto, desde as margens do rio Rabaçal até aos vales de Aguiar e margens do rio Corgo. Conta a lenda que nesse castro existem três arcas: uma contém ouro, outra contém prata e a terceira está cheia de peste. Ninguém ousa abri-las porque desconhecem o seu conteúdo e poderiam abrir a da peste e assim desencadear uma mortífera epidemia. Lendas são lendas e história é história, mas nem sempre a história e historiadores estão de acordo, o que nos leva à velha questão de que a história tem sempre duas ou mais versões.

 

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Pois também a respeito dos Andrades desta aldeia, também já li escritos que dizem a terem existido, seria uma simples linhagem desse daquele ramo, ou seja, como diria o velhinho e falecido Dr. Castro – Existir, existiram, mas não tinham importância nenhuma, por isso não se fala mais deles.

 

Por mim deixo por aqui o que dizem os historiadores, sejam eles locais, consagrados ou não e, até sem me importar muito se andaram nas universidades públicas ou não, seguindo sempre o meu lema do que tudo o que dizem pode ser verdade, mas também pode ser mentira.

 

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Um exemplo disso tem a ver com o topónimo desta aldeia, pois como já atrás disse pode ter origem em Boabdil dos Mouros, mas também há os que defendem que a sua origem alude a uma fonte de abóbeda ou fonte coberta.

Brincando com esta última teoria, eu penso mesmo que o topónimo terá origem numa fonte em que quando os ilustres antepassados passavam por ela diziam: - Olha ali uma fonte,  vamos lá “bober-dela”!. É a minha simpática teoria para acrescentar à confusão do topónimo e mais uma valiosa contribuição para a história da aldeia. No entanto a julgar pelo letreiro da fonte, hoje já não é muito recomendável beber daquela água.

Claro que todo o último parágrafo é para esquecer, não vá alguém pensar que estou a dizer isto a sério. O Adiantado da hora dá-me para estas coisas.

 

E assim concluímos mais uma freguesia com post alargado para as suas aldeias, ou seja, é mais uma com direito a mosaico fotográfico que oportunamente passará por aqui.

 

Entretanto amanhã cá estarei com o rescaldo do fim de semana e de regresso à cidade.

 

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