Pedra de Toque - O Jardim Público
O JARDIM PÚBLICO
As noites de verão na cidade de Chaves tinham o seu principal palco no frondoso, florido e verdejante Jardim Público.
Logo que o calor começava a apertar, as pessoas escolhiam-no para saborear a frescura que exala e para aí se deslocavam em momentos de lazer, passeando com a família e amigos.
O verde da relva, as flores dos canteiros, os peixes coloridos da taça, os amieiros chorando para o velho Tâmega, tudo contribuía para a criação de um ambiente simpático, ameno e convidativo.
O Sr. Dias, mais conhecido por Fanhonha, dada a sua fala anasalada, animava as noites, passando discos na sua cabine sonora, divulgando sucessos da época nas vozes apaixonadas de Tristão da Silva, Francisco José, Tony de Matos, entre outros.
Intercaladamente o locutor de serviço, com a pronúncia que muito nos orgulha, lia curiosos anúncios.
Aqui vão dois que a memória ainda reteve à guisa de exemplo.
“Beba Bitafruta, até as bolhas sabem a fruta”
“Lancia, pontualidade inglesa num relógio da Suíça. Se o seu relógio não funciona, lance-o fora e compre um Lancia”.
Vinha depois o disco com música romântica, precedido de dedicatória à menina de vestido branco que passeava na ala central do jardim.
Criava-se uma onda de mistério e os olhares trocavam-se na procura da feliz menina e do pretenso conquistador que pagava um escudo pela dedicatória.
As avós e as mães sentadas nos bancos, com um pequeno xaile sobre os joelhos para proteger da aragem, vigiavam a prol que calcorreava o picadeiro, como então lhe chamávamos.
Os mais miúdos descobriam todos os esconderijos do jardim, brincando, entusiasticamente, ao Bata-Fica e aos Policias e Ladrões.
Quando apertava a sede, a Casa Portuguesa servindo refrigerantes (laranjadas) e outras bebidas, saciava os que a procuravam.
Cerca das onze, o locutor na cabine anunciava o fim da emissão e despedia-se dos ouvintes até à noite seguinte.
Montagem sobre foto original de Dinis Ponteira
Devagar, aos poucos, as pessoas debandavam.
Os que atravessavam a velha Ponte Romana, gozavam o privilégio de escutar o som dos ralos e o coaxar das rãs, que mais pareciam uma saudação para uma noite feliz.
Para nós adolescentes, esperava-nos em casa o descanso e o sono que embalávamos no sorriso enigmático e feliz da menina do vestido branco.
António Roque