Discursos Sobre a Cidade - Por Gil Santos e Lara Alves
NOTA PRÉVIA
A Lara Alves frequenta o 8º ano no antigo Liceu Fernão de Magalhães e escreveu este texto que achei curioso e merecedor de ser publicado nos “Discursos Sobre a Cidade”.
Curioso porque fala, com imaginação, da nossa terra.
Merecedor de publicação como incentivo à escrita, um predicado que vai rareando na juventude dos nossos dias.
Parabéns!
UM ACONTECIMENTO INESPERADO
NO LICEU
Para mim, a escola não é, somente, um local de aprendizagem, é muito mais do que isso. Na minha opinião, a escola é o lugar onde conhecemos os amigos que nos vão acompanhar neste percurso de descobertas que é a vida.
Eu não sou exceção.
No Liceu, conheci duas grandes amigas: a Diana, paciente, meiga e generosa; e a Catarina, alegre, simpática e bondosa. Comigo participarão nesta estória!
Era um dia de chuva quando se deu o inesperado.
Estávamos na sala de aula realizando uns exercícios do caderno de atividades, quando sentimos o chão a tremer e ouvimos gritos. Os meus colegas ficaram apavorados, mas a nossa professora tentou encaminhar a turma para a saída. Enquanto tentávamos, apressadamente, sair do edifício, o telemóvel da Catarina caiu-lhe do bolso e escorregou para debaixo dos cacifos. Eu apercebi-me e tentei recolhê-lo. Porém, quando me agachei e estendi o braço para apanhar o telemóvel, senti uma força misteriosa a puxar-me para dentro de uma fenda que o tremor de terra abrira no chão. A Diana, a Catarina e a professora apercebendo-se da minha aflição agarraram-me pelas pernas. Todavia, a sua força não foi suficiente e acabámos por ser todas engolidas por aquele buraco.
Não se via um palmo à frente do nariz e eu só senti o rabo a aterrar numa plataforma fria e húmida, por onde escorreguei por largo tempo. Não tinha a certeza se viria alguém atrás de mim, dado que não ouvia um único ruído.
Aterrei!
Finalmente tinha chegado ao fim daquele túnel. Levantei-me e, aos apalpões, encontrei o meu telemóvel e liguei a lanterna. Não sabia exatamente onde estava. Soube, no entanto, que não estaria sozinha pois ouvi gritos. Olhei para trás e vi a Diana e a Catarina a aterrarem de cabeça uma em cima da outra. Fui ter com elas para as auxiliar e, mesmo às escuras, atónitas conseguiram pôr-se de pé.
– O que é que aconteceu? Onde estamos? – questionou a Diana com as lágrimas nos olhos.
Eu fui ao pé dela e tentei acalmá-la, enquanto a Catarina, que não estava muito mais calma, andava de um lado para o outro a avaliar o espaço. Entreguei-lhe o telemóvel, ela ficou muito contente e agradeceu-me imenso.
De repente, ouvimos uma voz familiar pronunciando os nossos nomes. Respondemos, pois pensávamos que era a professora.
Era ela de facto!
Tinha os cabelos desgrenhados e tremia de aflição.
– Estão bem, meninas? Vou acender o isqueiro para nos vermos melhor.
– Não é necessário, professora. A Catarina e a Diana podem acender, como eu, as lanternas dos seus telemóveis.
As minhas amigas fizeram o que lhes foi pedido. Conseguimos ver que estávamos dentro de uma enorme rede de tenebrosos túneis.
– Eu já tinha ouvido falar dos túneis por baixo Liceu de Chaves que as freiras do convento utilizavam às escondidas – disse a professora – Mas pensei que era uma lenda!
– O meu pai também já me tinha contado isso e até me tinha garantido que todos os túneis iam dar aos claustros. – Afirmou a Diana.
Durante alguns segundos ficámos paradas a pensar...
Depois de pormos o cérebro a funcionar, eu afiancei:
– Nós estávamos na sala 22 e, quando o telemóvel da Catarina caiu ao chão, já tínhamos passado a porta com a placa 21...
– Por isso, devemos estar por baixo da sala 20... – Interrompeu a Catarina.
– Logo, temos de andar naquela direção – insistindo a Diana gesticulando.
A professora concluiu:
– Bem pensado, meninas! Temos de nos dirigir para norte!
Pegámos nas trouxas, ou seja, nos nossos pertences e seguimos por um túnel estreito que calculámos que nos levasse aos claustros do antigo convento.
Enquanto vivíamos esta aventura, os nossos colegas de turma estavam no Largo das Freiras, naturalmente aflitos.
– Onde é que elas estarão? – Interrogou um.
– Será que estão bem? – Questionava outro.
– Claro que estão bem, elas são fortes! – Assegurava uma outra colega.
– Fortes!? As três juntas nem sequer têm a força de uma carriça – comentou outro rapaz.
– Pergunto-me se tu consegues parar de ser burro por um minuto que seja!?
Bem, voltemos à lavra principal.
– Ó Lara! Tu tens a certeza de que estamos a ir no caminho certo? – Perguntou a Diana.
– Tem calma e segue o meu instinto... – Disse eu.
– Se contarmos com a ajuda do teu instinto estamos bem cosidas! – Revelaram as duas em uníssono!
Rimo-nos todas (até a professora) e continuámos a andar...
Passados alguns minutos, parámos, a aventura fez-nos fome. A sorte foi que eu levava a minha lancheira, a qual leva sempre comida para um regimento, dado que é a minha avó que a prepara!
Após termos enchido a blusa, continuámos e, de repente, o nosso túnel bifurcou-se. Tínhamos outro problema. Eu e a Catarina propusemos lançar uma moeda ao ar e, se saísse cara, escolhíamos o túnel da direita, se saísse coroa, o da esquerda. Porém, a Diana e a professora acharam melhor não confiar na sorte.
– O problema é que não fazemos a mínima ideia de onde estamos. – Afirmou a Diana.
A professora concordou e todas nós ficámos tristes como a noite, por isso, sentámo-nos no chão frio e a Catarina começou a assobiar.
Ninguém compreendeu esta atitude, nem sequer ela mesma. O assobio ecoava nos compridos túneis.
Isto deu-me uma ideia!
Pedi à Catarina que gritasse para dentro de cada um dos túneis e que contássemos o tempo que demorava o eco.
– Já compreendi o que queres fazer. É uma boa ideia! – Exclamou a Diana.
A Catarina afinou a voz e pediu a uma de nós que se preparasse para contar o tempo. A professora voluntariou-se para isso e a Catarina fez o que era necessário.
As medições levaram-nos à conclusão que o túnel da esquerda era mais comprido, pois, no da direita, o eco foi quase instantâneo. Não deveria exceder os 17 metros.
– Excelente trabalho de equipa! Penso que o túnel da direita deve ser um beco sem saída, logo, vamos caminhar com cuidado pelo da esquerda. – Aconselhou a professora.
E nós, já fartas daquela escuridão, pusemo-nos a caminho...
Caminhámos cerca de dez minutos. Após termos atravessado este túnel, fomos encontrar um amplo pátio subterrâneo. Aparentemente, não havia nenhuma saída, porém a Catarina e a Diana encontraram uma porta de madeira não muito grande. Esta porta estava entreaberta, empurrámo-la.
– Deste lado existem umas escadas! – Gritou a Diana – Venham ver!
A professora aproximou-se, examinou o local com a pouca luz que tínhamos e afirmou:
– Eu penso que estas escadas nos conduzirão aos claustros. Mas só há uma maneira de descobrir...
Eu à frente, a seguir a Catarina, depois a Diana e no fim a professora subimos as escadas pé ante pé. No cimo, chegámos a um pequeno cubículo de pedra. Já estava quase a ficar sem esperança, quando olhei para cima e vi uma pequena frincha por onde passava a luz solar. Com toda a minha força, empurrei a pedra que não estava bem fixa e fiquei com a cabeça e com os braços no chão dos claustros da escola.
Uma após outra, saímos daquele buraco e fomos a correr para a porta principal.
Lá fora, estavam os nossos colegas desesperados.
Abraçámo-los.
De seguida, virando-me para as minhas melhores amigas questionei:
– É uma aventura para repetir, não é?
Lara Alves
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