O Barroso aqui tão perto - Chã e São Vicente da Chã
No “Barroso aqui tão perto” de hoje vamos até à Chã, ou melhor, até São Vicente da Chã, ou ambas, penso eu.
A passagem das aldeias do Barroso aqui pelo blog tem-se feito de maneira aleatória, isto porque alguma metodologia teria de seguir para as trazer aqui. Pensei inicialmente fazê-lo por ordem alfabética, mas para isso, na altura em que iniciámos esta rubrica, teríamos de ter o levantamento de todas as aldeias, o que não era o caso. Como sempre gostamos de ser surpreendidos, optámos por sortear a aldeia a estar aqui todos os domingos. Com alguma batota pelo meio, assim foi sendo. Acontece que a Chã calhou-nos em sorteio algumas vezes, mas tivemos de passar à frente e fazer novo sorteio, tudo isto porque desde início tive a dúvida de se a Chã e São Vicente seriam duas aldeias, ou apena uma. Estudando a geografia do local e a proximidade daquilo que eu pensava ser São Vicente e a Chã, a distância entre ambas era tão pouca que me convenci ser apenas uma aldeia.
Pois sendo então uma única aldeia, outra dúvida surgiu. Qual era afinal o topónimo da aldeia? Apenas Chã, apenas São Vicente ou São Vicente da Chã?
Na verdade a Chã é toda uma pequena região que em termos toponímicos, vai aparecendo colada como apelido ao topónimo principal, tal como Travassos da Chã ou Castanheira da Chã, além de a Chã ser a freguesia de uma série de aldeia. Foi talvez por isso, o ser freguesia, que me induziu em erro ou dúvida, pois em princípio, sendo freguesia, seria também aldeia, mas não é obrigatório que assim seja. Aliás no concelho de Chaves acontecem alguns casos idênticos em que a freguesia não é aldeia, como é o caso da freguesia de Stº António de Monforte à qual pertencem as aldeias de Curral de Vacas e Nogueirinhas.
Assim, teremos mesmo de chegar à conclusão que aqui se passa o mesmo, ou seja, o topónimo da nossa aldeia de hoje será São Vicente da Chã, em que a Chã é também freguesia e região. Pois é por aí que vamos hoje, com fotografias de São Vicente da Chã mas aproveitando para falar um pouco de toda a freguesia e desta pequena região dentro do Barroso que dá pelo nome de Chã.
São Vicente da Chã é uma velha conhecida minha que vem do tempo em que aí me apeava da carreira Chaves-Braga para apanhar a ligação para Montalegre. Se bem recordo penso que assim passou a ser a partir de meados dos anos 70, pois antes recordo também que o apeadeiro e ligação a Montalegre se fazia a partir do Barracão para depois seguir via Gralhós.
Mas vamos então à Chã (região e freguesia) para depois ficarmos nos pormenores de São Vicente da Chã.
Ora a Chã, como o seu significado indica:
chã
(latim plana, feminino de planus, -a, -um, plano, liso, uniforme, chato, fácil)- Chão
- plano ou extensão plana de terra.
- planície; planura; chapada; chada
- planalto
E de facto assim é, todas as aldeias que pertencem à freguesia da Chã estão em terras pouco acidentadas, em planalto a rondar a cota dos 900 metros de altitude. Conhecendo a região, penso mesmo que a Chã (região) vai muito além dos limites da freguesia e bem se poderia estender para todo o planalto do Larouco e outras freguesias vizinhas que estão todas em terra de planalto na cota aproximada dos 900m de altitude
Quanto à freguesia da Chã e segundo consta na página oficial do Município de Montalegre, temos o seguinte:
Ainda ostenta evidentes vestígios da sua importância constante nos tempos medievais e clássicos.
Cinco das suas doze povoações receberam a visita da estrada Romana – a XVII do Itinerário de Antonino: Penedones (Santo Aleixo), Travaços, São Vicente, Peireses e Gralhós. Pouco mais jovem que a via Romana é a ara que recentemente se achou em São Vicente – sinal inequívoco de que no outeiro (altarium) onde o cristianismo ergueu o templo românico, séculos antes, os povos que nos antecederam, aí adoravam o seu “Deus Óptimo Máximo”.
O mesmo lugar foi também do interesse dos reis de Portugal que o ofereceram como comenda às freiras de Santa Clara com mais duas freguesias anexas, num total de dezasseis povoações. O actual templo da freguesia é bem digno da mais atenta visita devido à obra patente dos Pintos de Donões, exímios artistas de Barroso.
Outros dados da freguesia:
- Área: 51 km2
- Densidade Populacional: 14.7 hab/km2
- População Presente: 752
- Orago: S. Vicente
- Pontos Turísticos: Igreja Românica e Inscrição votiva a Júpiter (S.Vicente); Ponte Velha (Peireses); Sepulturas Antropomórficas e Ara (Penedones); Via Romana (Gralhós); Cascata de Fírvidasl; Parque de lazer de Penedones.
- Lugares da Freguesia (12): Aldeia Nova, Castanheira, Fírvidas, Gorda, Gralhós, Medeiros, Peireses, Penedones, São Mateus, São Vicente, Torgueda e Travaços da Chã.
Pois aqui nos pontos turísticos, penso que são muito modestos e bem lhe poderiam acrescentar outros tantos, mas há pelo menos mais três pontos turísticos ou de interesse que seria obrigatório mencionar, deixando a paisagem natural de parte. Pois esses três pontos são: a Barragem dos Pisões; a gastronomia (restaurantes); e as duas aldeias dos colonos (Aldeia Nova e S. Mateus), sem esquecer, claro, a arquitetura tradicional transmontana/barrosã das restantes aldeias.
São Vicente da Chã
Ainda antes de entrarmos nos pormenores, fica um conselho ou alerta – Não se deixe levar a crer que São Vicente da Chã é aquilo que vê desde a Estrada Nacional 103 ou da estrada que liga esta a Montalegre, pois não é assim, aí apenas verá o que é mais recente. As suas preciosidades, estão mesmo na e à volta da sua Igreja Românica, mas para isso, terá de sair da estrada nacional, tomar a estrada secundária (M509-1) e 250m à frente, abandonar esta última, virando à esquerda até chegar à Igreja Românica a apenas 150m. Aí sim, temos tudo, a cereja e o bolo.
Quanto à igreja Românica, para mim, é uma das mais interessantes que o Barroso tem, e nem sequer vimos o seu interior. Principalmente o enquadramento, mesmo com a torre sineira separada da igreja a esconder a sua fachada principal, ou será antes, com a torre sineira separada, mas a fazer parte da fachada principal da igreja.
Como dissemos não é só a igreja Românica, mas também o seu enquadramento e casario à sua volta logo seguido da exuberância do verde barrosão, que quando é verde é mesmo verde, cheio de frescura que as terras com água lhe dão. Neste conjunto, mais uma pérola do Barroso, apenas um reparo. Tal como diz o povo, no melhor pano cai a nódoa, e esta lá está, em forma de telhado em fibrocimento na construção mesmo em frente à igreja (15m). Não é por nada, mas destoa do conjunto, no entanto é de fácil reparo e ouro sobre azul, no reparo, era o telhado retomar a sua cobertura original, o colmo, nem que fosse e só para memória futura ou para a história das coberturas de colmo. Claro, eu sei que se trata de uma construção particular e que (talvez) não se possa exigir tal ao seu proprietário, mas aqui, como o interesse até é público e turístico, as pessoas são sensíveis a alterações e o Município, através ou com a Junta de Freguesia, poderiam e deveriam contribuir para a substituição e preservação do espaço envolvente da igreja.
Depois deste pequeno conjunto que não é mais que o centro histórico de São Vicente da Chã, temos a paisagem, com muito verde, sobretudo de lameiros limitados por estremas de arvoredo autóctone, principalmente na baixa que liga à aldeia de Torgueda da Chã. Mais além, já na estrada que liga a Montalegre, outro tipo de cultivo, menos verde. Também nesse trajeto, um monumento religioso chama a atenção de quem passa.
O tal monumento, de construção recente, de um lado, no canteiro relvado, numa placa tem inscrito “Grande Jubileu – Ano 2000” e do outro lado, noutra placa, uma mensagem religiosa: “Mistério da fé para a salvação do mundo! / Glória a vós que morrestes na cruz e agora viveis para sempre. Salvador do mundo, salvai-nos, vinde Senhor Jesus”
Vamos agora ao itinerário para chegar até São Vicente da Chã, como sempre a partir da cidade de Chaves e que não tem nada que enganar, pois fica mesmo junto à Estrada Nacional 102 que liga Chaves a Braga. Por curiosidade o nosso itinerário de hoje é idêntico ao do último fim de semana onde mais uma vez optamos pelas estradas secundárias em vez da estrada nacional, ou seja, via São Caetano/Soutelinho da Raia, Meixide após a aldeia outra pela estrada da esquerda até Serraquinhos, passar ao lado de Viade tomar a direção do Barracão e estramos na EN103 em direção a Braga, logo a seguir temo a Aldeia Nova do Barroso e um pouco mais à frente São Vicente da Chã. Mas fica o nosso mapa para melhor orientação.
Vamos agora ao que dizem os livros e documentos. Iniciando pelo livro “Montalegre”:
“Sinais dos tempos”
Vários outros monumentos da romanização se descobriram e permanecem cá testemunhando a sua origem e finalidade: marcos miliários em (Padrões, Currais, Travaços e Arcos) aras romanas em (Vilar de Perdizes, Pitões e São Vicente da Chã) estelas funerárias (Vila da Ponte/ Friães), o célebre Penedo de Rameseiros (Vilar de Perdizes) e outros.
Padre José Adão dos Santos Álvares (séc. XIX) nasceu no Cortiço, filho do anterior, em 1814. Foi correspondente muito conceituado de vários jornais e revistas do Porto, Braga e Lisboa. Foi pároco de São Vicente da Chã, onde jaz, e arcipreste de Montalegre. Descreveu com realismo os últimos momentos de vida de José Fernandes, o Bagueiro, último condenado à morte em Barroso, que subiu ao cadafalso em 17 de Setembro de 1844.
O vale do Regavão, que bordeja a freguesia pelo sul e nascente, dá passagem à via prima, aqui assinalada por um miliário gigante que depois se transformou na cruz de Leiranque. Não longe desse local houve um pisão – que passou a topónimo da barragem e mais acima a antiquíssima Vila de Mel, provavelmente a primeira “statio” (São Vicente da Chã seria a segunda ) entre as cidades de “Praesidium” e “Caladunum” – “mansiones” da dita via imperial.
Quanto à “Toponímia de Barroso” temos o seguinte:
CHÃ
É um corónimo: nome de uma região!
Chã, como já se disse (veja Cabril) vem do adjectivo latino PLANA > CHÃ, o que implica subentender um substantivo terra ou seara: terra chã!
Quanto a S.Vicente na mesma obra temos:
SÃO VICENTE teve culto remoto. O célebre mártir de Saragoça já gozava honras de templo importante e antiquíssimo na própria cidade de Braga. Diz o ignorado mas interessante sabedor, Almeida Fernandes, em “Cadernos Vianenses” TV (1980) pp.285, que os cultos antigos (como S. Vicente) vieram substituir cultos pagãos.
-1258, «in collatione Sancti Vicencii de Chaa» INQ 1517.
Em S. Vicente da Chã foi encontrada uma ara dedicada ao deus olimpo Júptiter Óptimo Máximo, em 2004, o que vem confirmar o que Almeida Fernandes afirma. São Vicente é o orago da extensa freguesia da Chã que, com suas anexas de Morgade e Negrões, constitui Comenda das Clarissa de Vila do Conde. Também é orago de Contim e de Campos (esta, depois de desmembrada de São Martinho de Ruivães) e foi-o da antiquíssima freguesia extinta que teve o nome de São Vicente d’ O Gêres, junto de Pitões e a que estupidamente vão chamado Juríz.
Na “Toponímia Alegre” incluída na “Toponímia de Barroso”, temos o seguinte:
Chã – São Vicente
Ruim sítio, ruim gente,
Coelheiros de Medeiros,
Ciganos os de Peireses,
Pretinhos de Travaços de Chã,
Cruz-veigas de Gralhós,
Viajantes de Penedones,
Carvoeiros de Castanheira,
Torgueiros de Torgueda,
De Fírvidas são salta-pocinhas e
Arranca-torgos de Codessoso da Chã.
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BIBLIOGRAFIA
BAPTISTA, José Dias, Montalegre. Montalegre: Município de Montalegre, 2006.
BAPTISTA, José Dias, Toponímia de Barroso. Montalegre: Ecomuseu – Associação de Barroso, 2014.
WEBGRAFIA
- "chã", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://dicionario.priberam.org/ch%C3%A3 [consultado em 13-01-2019].
- https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/ch%C3%A3 (Consultado em 13-01-2019)
- https://www.cm-montalegre.pt/pages/451 (Consultado em 13-01-2019)