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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

04
Fev18

O Barroso aqui tão perto - Fafião


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montalegre (549)

 

No Barroso aqui tão próximo, vamos até à aldeia mais distante do nosso ponto de partida, vamos até Fafião, que dependendo do nosso itinerário a partir da cidade de Chaves, pode ficar a 80 ou 90 quilómetros de distância, mas às vezes vale a pena fazer mais 10 quilómetros e, se forem como nós que não gostamos de regressar pelo mesmo caminho, sempre pode tomar um itinerário na ida e outro na vinda. Mas como sempre recomendamos um, e para Fafião recomendo o itinerário via estrada de S.Caetano, com passagem por Montalegre, Paradela, Cabril, Pincães e finalmente Fafião.

 

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E se for até lá, não faça como nós fizemos na primeira vez que agendámos uma visita a esta aldeia, pois agendámos mais meia dúzia de aldeias que fomos vendo pelo caminho e quando lá chegámos já era tarde, estávamos cansados e a pensar mais no regresso a casa do que propriamente em descobrir a aldeia, mesmo assim, demos a nossa voltinha e depressa concluímos que teríamos que ir por lá outra vez, com tempo, muito tempo, ,mesmo que tivéssemos de passar por lá o dia, pois Fafião tem todas as condições para receber quem a visita, para a cativar e demorar a visita, e de verão, até “praia” pode fazer, não tem areal, é certo, mas pela certa que tem um penedo e uma poça de água cristalina à espera de si, e embora esses locais até sejam concorridos, há sempre lugar para mais um. Não experimentámos os penedos nem as poças, mas desfrutámos de umas minis fresquinhas à beira da “praia”. Claro que isto é só para a época de verão, pois de inverno há outros atrativos.

 

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Já entenderam que fomos lá a segunda vez, onde chegámos logo pela manhã, fizemos a devida visita à aldeia, almoçámos lá e fomos fazer a assossega à beira do Rio Toco, que, sem ter a certeza, parece dar também pelo nome de Rio Fafião. Seja ele qual for, foi lá que fizemos a assossega enquanto outros desfrutavam do sol, dos penedos e da tal água cristalina. As cascatas ficaram para depois, em tempo oportuno.

 

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E quando já dávamos a visita por concluída, no regresso pelo outro itinerário pela qual poderíamos ter ido, ou seja, descer à barragem de Salamonde e daí apanhar a EN103 até Chaves, ou então, chegado à Venda Nova, subir às Minas da Borralha, Salto, Boticas e de novo a EN103 até Chaves. Mas ia dizendo que já tínhamos dado a visita por concluída quando somos de novo surpreendidos com o lobo e a paisagem sobre a barragem de Salamonde e mais além. Apeteceu mesmo esperar pela noite para ver o lobo a uivar à lua, mas como ainda não foi desta, lá tivemos que arranjar a coisa no Photoshop… uma pequena mentira construída com verdades.

 

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Embora já tivesse abordado o regresso, só agora é que vamos entrar em Fafião. A caminho de Fafião, veio-me á memória uma estória contada aqui no blog pelo Gil Santos em que falava do 101 de Fafião e do Rio Toco. Recordava a estória, mas não os pormenores. Assim fui ao mapa turístico de Montalegre à procura do Rio Toco e, em Fafião aparecem quatro pontos de interesse assinalados no mapa com os números, 2, 4, 101, e 104. Quando vi os números, disse para com os meus botões, - “queres ver que o 101 de Fafião já virou a ponto de interesse!?” Fui logo ver do que se tratava, mas afinal não era o nosso 101. Não estão a perceber nada do que estou para aqui a dizer, mas já a seguir, quando chegarmos à estória do 101 de Fafião, vós ides perceber. Para já o 101 do mapa refere-se às piscinas naturais no rio Fafião. O 102, esse sim, refere-se ao Toco – cascata, piscinas naturais, lagos, penedos, paisagem do Parque Nacional da Peneda – PNPG, mas também nada tem a ver com a estória do 101 de Fafião. Já agora o nº 2 refere-se ao fojo do lobo de Fafião e o nº 4 ao Ecomuseu do Barroso – Vezeira e a Serra.

 

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Vamos lá então ao 101 de Fafião, à estória. Nem sempre temos a felicidade de ter estórias das aldeias que trazemos aqui, mas com Fafião até essa sorte temos, pois existe pelo menos uma estória que até já passou aqui pelo blog, que é de autoria de um nosso colaborador e escritor, Gil Santos, estória que já há muito está em livro[i] e que até já foi contada numa das rádios nacionais. Claro que temos de a deixar aqui outra vez, mesmo porque se calha muitos de Fafião ainda não a conhecerão, e esta é a estória de um dos seus (pelo meio da estória vamos deixando umas imagens de Fafião que nada têm a ver com a estória, mas como temos muitas imagens, temos que as ir metendo onde calha melhor):

 

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O 101 de fafião

Fernando Calvão, militar de carreira hoje reformado, é pai da mulher que amo há três dezenas de anos. Às refeições domingueiras, mais demoradas, gostava de contar algumas das estórias mais significativas da sua larga experiência pelos quatro cantos do mundo. No início da sua carreira, anos cinquenta, o furriel Calvão cruzou-se, no dezanove de Chaves, com o cabo Santos, meu falecido pai, que cumpria o seu serviço militar obrigatório. Ao cabo Santos cabia a tarefa de quarteleiro, ao furriel o acompanhamento da instrução dos recrutas.

 

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Na altura, era exceção saber ler e escrever. Os analfabetos tinham oportunidade de aprender as primeiras letras na chamada Escola Regimental, entregue, neste quartel, ao alferes Ceroulas. Tendo este que se ausentar por uns tempos, foi o furriel incumbido de dar continuação às suas lições. Eram públicas as dificuldades do soldado 101 para aprender a juntar as letras. O alferes vivia angustiado! O furriel, aproveitando a oportunidade, quis surpreender o oficial com o 101 a ler no seu regresso. A estratégia era simples: utilizando a Cartilha Maternal João de Deus, explicava ao soldado que deveria olhar primeiro para o desenho e só depois para a respetiva palavra. Ensaiou-o, ensaiou-o e parecia tudo aprumado. O alferes regressou. O furriel Calvão acorreu a dar-lhe a novidade:

— Meu alferes, o 101 já sabe ler!

— Não me diga Calvão! Como é que você conseguiu? Chame-o lá.

E lá veio o 101 todo pimpão. Abriu-se o livro e vai de ler. O furriel apontou para a tigela e o 101 leu maurga; apontou para o pato e o 101 leu parreco; apontou para a caixa e o 101 leu caixote. O alferes não aguentou, agarrou-se à barriga e rindo a bandeiras despregadas só parou no empedrado da parada.

 

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Doutra vez, o furriel ministrava instrução de armamento ao pelotão do 101 que se encontrava num terreiro à sua volta. Explicava o funcionamento de uma metralhadora ligeira, cuja manga se apresentava cheia de furos laterais para arrefecimento do cano. O furriel explicava a comutação entre o tiro-a-tiro e o tiro de rajada:

— Quando se quer que a arma dispare tiro-a-tiro, põe-se o comutador nesta posição, quando se pretende que dispare muitos tiros de cada vez, põe-se na outra posição. — Depois continuou, brincando:

— Mas cuidado, porque se eu puser agora o comutador na posição de rajada e disparar, as balas saem todas por estes buracos laterais e vocês morrem todos. O 101, pasmado e, mais do que isso, assustado, gritou:

— Ai rapazes fuginde que o furriel é maluco e fode-nos a todos!

 

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No início dos anos cinquenta o Estado Novo estava na pujança e a palavra de ordem era amealhar. A poupança era quase uma religião! Nesta senda, o equipamento distribuído aos soldados era rigorosamente controlado em termos de duração. Um dos maiores problemas era fazer com que as botas durassem mais de um ano a cada militar. O nosso herói morava em Fafião, aldeia alcandorada nos picos da serra do Gerês e a uma centena de quilómetros de Chaves. Como na altura não havia transportes e o dinheiro escasseava, o 101 saía para fim-de-semana na sexta-feira, a pé, chegava à aldeia à noitinha de sábado, botava um copito, um cibo de boroa e uma racha de bacalhau, dava a volta ao lugar e regressava, nessa mesma noite, à cidade de Chaves. Porém, as botas é que pagavam a fatura de tal distância, daí que o comandante decretasse que todos os que morassem a mais de cinco léguas da cidade estavam proibidos de gozar o fim-de-semana. Foi um desconsolo para o 101, que doravante ficou a conhecer melhor os cantos à cidade.

 

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E muitas e muitas outras estórias, curiosas, eram contadas. E como eu gostava de as ouvir!

Como amante da pesca desportiva à truta e como trabalhei e morei, na segunda metade os anos oitenta, na Vila do Gerês, ia muitas vezes pescar para o rio de Fafião, também conhecido por Toco.

Um dia de abril encontrava-me sobre a ponte da Pigarreira, na altura ainda de pranchas de madeira maciça, cogitando sobre o que faria as trutas estarem de férias naquele dia. Do monte sobranceiro descia um rebanho de cabras acompanhadas pelo pastor de regresso a casa. Ávido de conversa com gente, por passar os dias a conversar com o gado, o pastor parou ao pé de mim. Dei-lhe corda, porque também eu queria conhecer melhor a zona e os seus hábitos. Depois de vários minutos de conversa de circunstância, lá veio a inevitável pergunta:

Antão vocemecê donde é?

— Sou de muito longe, uma terra que certamente não conhece. Sou de Chaves.

Notei um brilhozinho estranho nos olhos daquele homem simples.

 

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Num me diga! Eu fiz lá tropa em 1952. — Dizia o pastor.

— Então conheceu o cabo Santos? E o furriel Calvão?

Antão não conheci! O cabo Santos era muito meu amigo, matou-me a fome muitas vezes e o furriel Calvão enxinou-me a ler!

— Então diga-me lá quem é, para ver se o meu pai ou o meu sogro se lembram de si.

— Eu era conhecido pelo 101 de Fafião!...

Caí das nuvens!...

Então não acabava de conhecer o herói de tantas estórias?!

A vida sempre nos reserva cada uma!

 

Estória de Gil Santos

 

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Tal como atrás tinha dito, esta estória foi contada numa rádio nacional (RFM), no final do post há um vídeo com a gravação da estória. Mesmo que a tivesse lido, não deixe de a ouvir, pois faço-a acompanhar de todas as imagens que hoje vos deixo aqui. Está no final deste post.

 

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Dos pontos de interesse assinalados no mapa turístico do concelho de Montalegre, apenas visitámos o Rio Toco, junto à ponte que liga o Distrito de Vila Real ao Distrito de Braga e o posto do Ecomuseu, Não houve tempo para explorar o rio Toco, as cascatas, as piscinas naturais nem o fojo do lobo. Primeiro demos prioridade à aldeia, o Rio, as cascatas, etc., vão ter de ficar para uma próxima visita, mas lá iremos…

 

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Mas vamos ao que se diz sobre Fafião. Por exemplo no Livro “Montalegre”

 

A primeira referência no livro leva-nos até uma das “portas” do concelho de Montalegre e acesso à Vila de Montalegre, a “porta” de Fafião:

 

“Acessos

Na vila actual podemos entrar por várias portas. Quem circula pela Nacional 103, entre Braga (a 90 km) e Chaves (a 3 km), chega às Terras de Barroso desde Salamonde- Fafião, atravessando a zona ribeirinha de Cabril, do Gerês e do Rio; desde Vilarinho dos Padrões pela Barragem da Venda Nova e terras de Covêlo do Gerês e Paradela do Rio; desde a Chã – o acesso mais comum e fácil, pelo Alto da Corujeira; desde o Barracão – a porta do Rei D. Carlos, em 1907, que nos permite entrar por nascente; desde Chaves – pela linha da fronteira galega, a deslado das terras de Ervededo, de Meixide, Vilar de Perdizes, Solveira, Gralhas e Meixedo. E, antigamente, a esmagadora maioria visitante chegava a Montalegre pelo romântico Ourigo e Carvalhais do Avelar.”

 

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Na segunda referência a Fafião, curiosamente, faz alusão ao troço final do itinerário que nós recomendamos para chegar à aldeia:

“Barroso constitui um mosaico de paisagens edénicas. Podemos dizer que em cada canto há um novo encanto. Basta percorrer as nossas estradas municipais ou vicinais através do planalto para redescobrirmos mil recantos admiráveis. A título de exemplo referimos a estrada de Fafião a Cabril e daqui aos Padrões ou a Cela e Sirvoselo;”

 

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Continuando no livro Montalegre:

“Das ermidinhas, que o estro de Junqueiro abençoa, destacamos quer pela beleza paisagística do local, quer pelo encanto do conjunto “Construção humana e Natureza envolvente”: Nossa Senhora das Neves (São Lourenço) e São Tiago (Fafião), na freguesia de Cabril;”

 

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Mais uma referência a Fafião, à boleia do Parque Nacional da Peneda Gerês no qual a aldeia está integrada;

“Uma das atracções do concelho de Montalegre é que, uma quarta parte do seu território, mais de 200 quilómetros quadrados, integram o único Parque Nacional do País, o da Peneda-Gerês. Dele fazem parte seis freguesias num total de dois mil habitantes distribuídos por vinte e seis povoados. Serve-lhe parcialmente de fronteira o rio Cávado que recebe águas de vários ribeiros do Parque e fazem, em cada recanto, a sedução dos visitantes: o Rio Mau que une as freguesias de Seselhe e Covelães; o rio Campesinho que, depois de lavar os pés ao Mosteiro de Pitões, se despenha em rumorosa cascata; o rio Cabril que desce das brenhas infernais entre as Minas dos Carris e a Garganta das Negras e nos brinda com as mais belas piscinas naturais do mundo, escavadas no granito; e, por fim, o rio Fafião ou Toco que corre abruptamente entre penedais e arvoredo e lança as águas na barragem de Caniçada.”

 

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Mais uma referência no livro Montalegre onde, a meu ver, o autor na lista que deixa de aldeias, peca por defeito, pois há muitas mais aldeias no Barroso que bem poderia integrar essa lista:

“Há várias povoações com núcleos de construções tradicionais, bem conservados, muitíssimo belos e dignos de ajuda para a melhor preservação do património construído. Estão neste caso Fafião, Pincães, Salto (diversos lugares de freguesia) Currais, Vila da Ponte, Viade, Carvalhais, Cervos, Donões, Gralhas, Tourém, Pitões, Parada e Sirvoselo. Em todas elas há núcleos construídos dignos de integrar os roteiros de visita ao património que o Ecomuseu defende.”

 

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E mais uma referência no mesmo livro, que, naquilo que conhecemos, subscrevemos:

“Curva após curva, ao longo da EN 308, surgem vistas de sonho. Cabril, Santo Ane e Fafião são nomes de aldeias a não esquecer. Em Fafião visite o Fojo do Lobo, os lagares de azeite, aprecie a gastronomia de montanha (o javali), contemple os penhascos da majestática Serra do Gerês, delicie-se com a panorâmica do Vale do Cávado e repouse à sombra dos pinheirais.”

 

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E agora passemos ao topónimo Fafião, recorrendo à “Toponímia de Barroso”:

 

Fafião

Radica em Fafila, nome pessoal já documentado em:

-915 Fafila, D.C.21, pelo genitivo Fafilani < Fafiani > Fafião. Ao contrário do que por vezes se afirma não são os nomes terminados em ane, na antroponímia, que resultam em ão; chegam ao ão os que terminam em ani.

Não queria deixar de referir um casal existente na freguesia de Salto que se chama Fáfia. Creio tratar-se da mesma raiz, Fafila, com uma evolução de sentido normal. Aqui se reproduz a afirmação da tónica Fá por influência tardia de Fafes e Fafe. Não me admiraria que o nome se devesse ao fidalgo Fafila Luci (Fafes Luz) por ser ascendente de outro nobre da mesma linhagem que aí se aposentava e ao qual os saltenses chegaram fogo ao paço onde dormia, talvez por estarem cansados de p aturar e dos gastos que com ele e com a comitiva faziam. Falam desse facto as INQUIRIÇÕES:

-1258 «…dixit quod Dominus Rex est patronus (de Salto) et habet ibi palatia et arsserunt quando pausavit ibi Godinus Fafiz».

 

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Em quase todas as pesquisas que fiz, aparecem várias vezes a referência ao comunitarismo da aldeia, nomeadamente as vezeiras, o fojo do lobo, o rio Toco (lagoas, penedos e cascatas) e também os lagares de azeite. Referências também a uma associação que dá pelo nome de Vezeira – Associação de Desenvolvimento de Fafião, que na sua página na net diz o seguinte: “ É uma Associação sem fins lucrativos, reflete a vontade é o dinamismo da comunidade da aldeia de Fafião da Freguesia de Cabril. O Principal objetivos é não acabar com o comunitarismo e manter as tradições e costumes de esta aldeia do Parque Nacional da Peneda Gerês.” . Pelas preocupações da associação, poder-se-á concluir que o comunitarismo da aldeia está em perigo. Não sei se ainda existem vezeiras, os lagares de azeite comunitários, o forno do povo. Se existem e se funcionam, na minha visita à aldeia não dei por eles nem nos foi apontado com lugares a visitar (forno e lagares).

 

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É notório que Fafião é uma aldeia turisticamente muito procurada, pelo menos de verão, nas nossas duas visitas notava-se algum movimento turístico. Nota-se na aldeia, em termos de casario recuperado, ter havido alguma preocupação em manter a integridade da aldeia e que para além da aldeia há outros atrativos que chamam gente interessada neste tipo de turismo rural, como o rio Toco e suas lagoas e cascatas, as barragens, a montanha, a paisagem, trilhos que sem dúvida alguma devem ser interessantes para quem gosta de caminhar e a atração do lobo possivelmente ainda andar na serra. Tem onde se pode comer, restaurantes e onde pernoitar, isto pelo que pude ver na net e em alguns panfletos turísticos, mas também lá, pessoalmente o pude verificar. Pelo que conheço e já percorri todas as aldeias do concelho de Montalegre, sem dúvida alguma que é a aldeia mais turística do concelho, sente-se isso estando lá, já o mencionado comunitarismo e ruralidade da aldeia não é sentido.

 

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Uma das obras que consultámos foi a Etnografia Transmontana – II – O Comunitarismo de Barroso, de António Lourenço Fonte (Padre Fontes). Uma edição já com algum tempo ( de 1977), em que aborda também Cabril, nomeadamente o lagar de azeite e o comunitarismo:

 

“Faião é a última aldeia, da freguesia de Cabril, nas faldas do Gerês, da região de Barroso. Como em toda a freguesia de Cabril o comunitarismo está em patente e vivo. Moinhos, lagares de azeite, alambiques comuns, vezeira da rês, boi do povo, trabalhos do povo, fojo, este em bom estado, tudo aqui devemos visitar”

 

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E continua:

Desde tempos imemoráveis se colhe azeite. Hoje, vemos dispersas muitas oliveiras, velhinhas, descuidadas, sem dono, infrutíferas. Há dois lagares do povo: o de baixo, mais antigo e em funcionamento e o de cima, ou do Muro, em ruínas, parado há cerca de 11 anos, devido à questão das águas. Este fica junto à aldeia, perto do fojo. O de baixo, dista meia hora a pé, cinco minutos de carro, no rio Toco, no porto das ovelhas, junto à estrada que vai para a Ermida do Gerês.

 

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E continua:

Descrevo o de cima, pois o de baixo ainda se pode ver a funcionar. Contudo hoje ambos estão condenados à ruína, devido à facilidade de levar azeitona a lagares mecânicos, em Vieira di Minho (1) — { A nota (1) diz o seguinte: Em Pincães há um lagar de azeite, em Cabril outro e 2 na Peneda (Covelo do Gerês) todos parados}.

 

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E continua com a descrição do lagar de azeite, o abandonado:

“ Está situado, junto a uma série de alambiques de herdeiros, alguns também em ruínas. É movido a água de nascente. Devido a questões com água e com os herdeiros o lagar deixou de funcionar.”

(…)

 

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Mais à frente interroga:

Qual a origem destas ou outras manifestações de vivo comunitarismo?

 

Neste caso Fafião e os seus lagares e alambiques de herdeiros, apenas podemos remontar a antiguidade desta prática comunitária à cultura do azeite e do vinho, que não é das mais antigas no Barroso. Mas o que acontece com estas culturas aconteceu com todas as outras. Conforme vão surgindo no contexto económico desta região, logo o povo as enquadra no seu sistema centenário, para não adiantarmos milenário. O porquê deste enquadramento, a raiz funda deste hábito donde virá? Da nossa origem germano-celta, dirão uns, pela influência mediterrânica. Mas esta parcela do Noroeste português terá mais uma influência atlântica, que marca este substrato humano.

 

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E António Lourenço Fonte continua:

“ Jorge Dias em Rio de Onor diz ser pré-romano o comunitarismo na península. Mendes Correia, vincula-o à forte organização colectivista da cultura dolménica.

 

A cultura árabe não destruiu a maioria dos costumes agrários da vida comunitária.

 

A dificuldade da exploração da terra, a sua pobreza, a grande variabilidade climatérica, a pouca densidade e pequeno aumento de população, a emigração, as grandes extensões de baldios, a tendência para o pastoreio, a forte coesão familiar, favorecem a vida comunitária, a entreajuda, o afolhamento, a luta contra a apropriação particular ou estatal dos baldios, preferindo o bem da propriedade comum, seguindo suas leis ou posturas mais que as leis dum Governo estranho e distante.

 

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E continua com o tema:

Há pois três grandes factores que vincaram esta tradição de vida comum. A nossa história, mesmo a dos povos mais remotos, a nossa situação geográfica e todas as suas consequências telúricas, e o substracto humano que aqui vive com suas tradições que seguem de pais a filhos e chegam até nós.

 

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E remata o tema assim:

Já morreu em muitos dos seus aspectos e em muitas regiões onde o havia. Morrerá em breve “noutras. Porquê? O Individualismo, a tendência para a propriedade particular, o açambarcamento pelos mais ricos, a divisão dos baldios, em meras, borrajos, cavadas, lamas do povo vendidas, floresta pública, etc. “

 

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Estávamos em 1977 e o comunitarismo já estava então ameaçado com estas questões mais locais, mas nestes últimos 40 anos muita coisa se modificou. A taxa de natalidade diminuiu drasticamente, o despovoamento rural agravou-se, a população rural envelheceu e o nível de vida melhorou. Tudo isto levou ao abandono de muitos trabalhos rurais que por sua vez esvazia de sentido o comunitarismo, deixou de haver necessidade da sua existência. Sem gado não pode haver vezeiras, o boi do povo é coisa do passado, os fornos do povo já não cozem o pão de todos os dias…

E tal como prometemos atrás, de seguida fica a estória “ O 101 de Fafião” contada em programa da RFM e ilustrada com fotografias de Fafíão, em vídeo, as mesmas fotos que estão publicadas neste post e que nada têm a ver com a estória, a não ser o de serem imagens da terra do personagem da estória. Não deixe de ouvir a estória, tem outro sabor…

 

 

 

Só nos resta deixar aqui as referências às nossas consultas e a lista de links para anteriores abordagens a aldeias ou temas de Barroso

 

Links

 

Os links para as anteriores abordagens às aldeias e temas de Barroso passam a estar na barra lateral deste blog. Estão por ordem alfabética. Se a sua aldeia ou a aldeia que pretende ver ainda não está na listagem é porque ainda não passou por aqui, mas num próximo domingo chegará a sua vez.

 

Bibliografia

 

BAPTISTA, José Dias, (2006), Montalegre. Montalegre: Município de Montalegre.

BAPTISTA, José Dias, (2014), Toponímia de Barroso. Montalegre: Ecomuseu – Associação de Barroso.

FONTES, Lourenço, Etnografia Transmontana II - Comunitarismo do Barroso, edição do autor, Montalegre, 1974.

 

Webgrafia

 

www.cm-montalegre.pt/

 

 

 

 

[i] «Ecos do Planalto» - Estórias, de Gil Santos, Edições Ecopy – Porto – 2007.

 

 

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