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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

20
Mai18

O Barroso aqui tão perto - Medeiros


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Medeiros, Montalegre.

 

No “Barroso aqui tão perto” hoje vamos até à aldeia de Medeiros da Chã, freguesia da Chã e concelho de Montalegre, aliás é uma das aldeias da periferia da Vila de Montalegre, ficando a menos de dois quilómetros da sede do concelho.

 

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Quanto à localização de Medeiros, dado que fica mesmo ao lado da Vila de Montalegre, a referência pode ser Montalegre, mas para sermos mais exatos e ainda antes de irmos ao itinerário a partir da cidade de Chaves, ficam as coordenadas:

41º 47’ 48.46” N  

07º 46’ 59.68” O

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Quanto ao itinerário temos 3, com a mesma distância, entre Chaves e Medeiros. Em termos de apreciação, recomendo qualquer um deles, assim se já conhecer dois deles, opte pelo outro que não conhece, e assim, fica a conhecer. Mas como por aqui só deixo um, então fica o que demora menos tempo, e que é o da estrada de Braga, EN103 até S.Vicente da Chã, aí vira-se em direção a Montalegre e Medeiros fica logo a seguir a coisa de um quilómetro e tal… Os outros é via Estrada de S.Caetano em comum até Meixide, aí opta-se por ser via Vilar de Perdizes, Montalegre e o outro é via Pedrário, Sarraquinhos, Barracão, e aqui de novo a EN103. Mas fica o mapa com o itinerário mais rápido, mas apenas uns míseros minutos.

 

mapa-medeiros.jpg

 

Ainda antes de irmos ver o que dizem de Medeiros a “Toponímia de Barroso” e o livro “Montalegre” vamos às nossas pesquisas. Pois é assim, como sempre, para ilustrar com palavras as imagens que vos quero deixar, tento encontrar em livros, documentos e internet aquilo que há sobre estas aldeias do Barroso. Na internet, salvo raras exceções, para além das desgraças sensacionalistas nada mais há, mas basta parar por lá um político de Lisboa e o nome da aldeia aparece logo colado à notícia do político. Então se for Primeiro Ministro, ui, então aí são umas atrás das outras. Com Medeiros assim aconteceu, o Primeiro Ministro António Costa esteve lá há uns dias (12 de maio) numa ação de fogo controlado, integrada no programa de defesa da floresta contra incêndios. O curioso da notícia é que pouca floresta existe nas imediações de Medeiros e a que existe, autóctone constituída à base de carvalhos, não é propriamente daquela que arde e se propaga com facilidade tal como acontece com as resinosas, e além disso existem bombeiros a 2Km de distância e a outros dois uma enorme barragem onde qualquer meio aéreo de combate a incêndios se pode abastecer com facilidade.

 

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Mas já que os políticos se aproveitaram da aldeia de Medeiros para publicitarem os seus programas, eu aproveito a deixa e também quero dizer umas coisinhas sobre os incêndios, daqueles que podem acontecer a sério com consequências trágicas a todos os níveis. Aviso já que a prosa vai ser longa, por isso se quiser passar o próximo capítulo, esteja à vontade, mas gostaria que lessem…

 

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Depois da calamidade dos incêndios do ano passado, muito ruído e show-off se tem criado à volta do tema, mas apenas isso, pois quase todas as medidas anunciadas e tomadas são de quem não conhece a realidade do nosso meio rural interior. Um dos exemplos é obrigar as populações a fazer a limpeza dos terrenos. Pois, a coisa até poderia funcionar se a realidade fosse outra. Conheço na nossa região e no Barroso áreas de milhares de hectares de floresta e mato que devem ser pertença de umas centenas de pessoas e de centenas mais largas de herdeiros, no entanto nesses mesmos milhares de hectares hoje só lá vivem 4 ou cinco pessoas, idosas e já sem forças para limpar o que quer que seja e muito menos com rendimentos para pagar a quem lhes limpe os terrenos, pois o pouco que têm quase nem lhes dá para pagar os medicamentos que necessitam, e o pouco que resta é para sobreviverem. Pois parte desses hectares são baldios, ou seja, é propriedade de todos e de ninguém em especial, ou então são maioritariamente de gente que está fora e emigrada, que alguns nem sequer sabem onde têm as suas poulas. Também é voz comum de quem vive no terreno e onde até há ainda alguma gente com forças e algumas posses para limpezas, que não se pode limpar num ano aquilo que se acumulou durante dezenas de anos, além de não haver orçamento que aguente limpezas de fundo. No meu humilde entender, na ânsia de resolver o problema, criaram-se montes de problemas e Leis que são um verdadeiro atentado às populações, tentando-as responsabilizar por aqui que é responsabilidade do Estado, exigindo delas aquilo que elas não têm nem podem, porque não conseguem, dar e ter – trabalho e dinheiro. A par disso criou-se um “exército” de medidas e supostos meios de combate a incêndios, que num ano anómalo como foi o último, só pode dar em nova catástrofe, porque as condições vão continuar no terreno para que ela aconteça. Deus queira e o S.Pedro esteja connosco para que tal não aconteça, senão vai ser de novo um “ai Jesus!” e depois não me venham com a cantiga que a culpa é das povoações que não limparam os montes e matas. Para solução do problema tem de haver primeiro o interesse de quem verdadeiramente manda e que até poderia ganhar muito com isso. O nosso povo, para além das razões apontadas, não vai lá com obrigações e cumprimentos de Leis. Para já, não alinha em coisas que não entende e depois não tem meios para as cumprir. Como sempre há que dar para receber. Os mais antigos recordam que antigamente mal iniciasse um incêndio, tocavam os sinos a rebate e a população com os meios que tivessem à mão, corriam para o incêndio e em geral dominavam-no logo no seu início. Havia então gente (nova) nas aldeias e interesses individuais e comuns a defender. Gente (ativa) nas aldeias e interesses a defender são coisas do passado. Hoje vê-se iniciar um incêndio e chamam-se os bombeiros ou então nem isso, pois parte-se do princípio que já alguém os chamou ou que eles já sabem, depois espera-se que eles apareçam, e fica-se a ver o espetáculo do fogo a destruir tudo e a criticar a atuação dos bombeiros…. Voltando atrás, há que dar para receber, e cá para mim, a solução da limpeza dos terrenos e matas (que só por si não resolve o problema dos incêndios, mas pode contribuir para os minimizar), passa por pagar à população a limpeza das matas, mas não com subsídios (ou subsílios como o povo diz), Não, pois a política dos subsídios mais que um bem foi um mal que se inventou. Pagar sim, ou melhor, comprar o produto limpo, matéria combustível por excelência, pagar a peso por exemplo, e bem pago de modo a que compensasse fazer limpezas. Havíeis de ver como não faltaria gente e empresas para fazer limpezas, e se a coisa compensasse, limpavam o que é deles e até o que não é. Os mais críticos dirão que o Estado não tem dinheiro para isso, pois eu penso que seria um investimento e que seria bem menos que aquele que se gasta em estudos, concursos, helicópteros, aviões, técnicos, e conferências para dizer que aquilo que se vai fazer… ou seja, que tudo vai continuar na mesma, etc. e tal. Em suma, o dinheiro a pagar pelo produto das limpezas seria bem menos do que aquele que se gasta no combate a incêndios sem nada em troca, antes pelo contrário, pois fica tudo queimado e ainda se tem de reconstruir infraestruturas e indemnizar. Se pagassem o produto das limpezas, após a recolha para fazer contas, o mesmo poderia ser aproveitado como matéria prima para a indústria, para fabrico de diversos produtos, as indústrias já existem e se não existirem, criam-se, indústrias inovadores com jovens inovadores de preferência, e com elas criam-se postos de trabalho e se apostarem na juventude formada, licenciada em vários ramos, teríamos pela certa uma série de produtos inovadores a sair para o mercado e para a exportação. Indústrias locais de preferência para que os nossos jovens licenciados voltassem à terra. Haveria, isso sim, de acabar com toda essa cambada, corja, que se governa a bem governar a troco de proteger interesses estabelecidos, que têm provado que não são de gente de bem, séria, e que se estão a marimbar para o interesse público. Um pedido de desculpas por também me ter aproveitado da aldeia para dar a minha opinião sobre os incêndios, que vale o que vale, mas que até prova em contrário acredito nela, além de ter de desabafar…

 

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Então regressemos a Medeiros e ao que se diz da aldeia em páginas da Internet, no caso em “all about Portugal” encontrei o seguinte. Que embora mencionado noutros documentos só aqui encontrei a descrição:

O castro de Medeiros, também designado por Cabeço dos Mouros, fica localizado entre o monte da Corujeira e o de Couto Carambos e dista cerca de 3 quilómetros do centro da Vila de Montalegre. É um povoado circundado por duas linhas de muralha e um profundo fosso. A muralha exterior é visível dos lados Sul e Oeste, com cerca de 2 metros de largo, cujo interior é preenchido com terra e pedra miúda. Em alguns pontos entronca na penedia, onde ainda são visíveis alguns rasgos. Do lado Oeste verifica-se um amontoado de pedra, proveniente do derrube da muralha. Na plataforma superior do castro destacam-se os agregados de pedra e uma maior concentração de cerâmica indígena e de restos de construções. De distinguir a ampla visibilidade que se obtém deste local, desde a serra do Larouco mais a Norte, para Sul o Vale do Rabagão e a serra das Alturas do Barroso. Obtêm-se um excelente ângulo de visibilidade para com outros povoados, dos quais se destacam o castro de São Vicente da Chã, o castelo de Picoto, o castro de Morgade, o castelo de São Romão, o castro de Andelhe, o castro de Vilarinho de Negrões, o castro de Negrões, o castro de Morgade e o castro das Alturas, já no concelho de Boticas. Não menos interessante será referir o achado de machados de talão com dupla aselha, depositados no actual Museu da Faculdade de Ciências do Porto. Este achado, juntamente com a cerâmica encontrada vem mais uma vez confirmar a cronologia pré-histórica do castro.

 

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Quanto à  “Toponímia de Barroso” temos:

 

Medeiros

A situação da aldeia perto do seu castro e perto de outros castros garantia-lhes tempo para tratarem das suas searas. Penso, pois, que o topónimo proviera da raiz pré-romana MED que significa “colheita”. Da mesma raiz provavelmente MEDA (s) que é como nós chamamos aos enormes amontoados de carros de messe e de outros cereais. Medeiros andará apegado à mesma ideia. De MED + ARIU, MEDARIU no plural.

- 1258 «dixit quod de Medeirus dant singulas spatulas… excepto Dommo Michaele qui dat Domini Regi quociens cumque venerit  vel ricohomini por sobreposta unum carnarium coctum vel freama vel cabritos vel gallinas vel porcum vel vacam», INQ 1518. Há mais duas referências sobre Medeirus, assim grafadas.

- 1290 “…Rui Mendes ganhou em Medeiros (sic) duas casarias dos foreiros del rei”. Então já o topónimo estava constituído.

Como se observa Medeiros, além das normais contribuições, tinha dois casais bastante mais onerados, sobretudo o do Domno Michael  que (pela sobreposta) tinha de dar “ao Rei, sempre que por ali fosse, ou ao rico-homem — um carneiro cozido, ou porca, ou cabritos ou galinhas ou porco ou vaca. E nos dias de peixe dará trutas ou peixes ou refeição de leite… e uma boa escudela com pão.”

 

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E na “Toponímia Alegre” temos o seguinte:

 

Chã – São Vicente

Ruim sítio, ruim gente,

Coelheiros de Medeiros,

Ciganos os de Peireses,

Pretinhos de Travaços da Chã,

Cruz-veigas de Gralhós,

Viajantes de Penedones,

Carvoeiros de Castanheira,

Torgueiros de Torgueda,

De Fírvidas dão salta-pocinhos e

Arranca-torgos de Codessoso da Chã.

 

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No livro “Montalegre” também encontrámos algumas referências à aldeia ou gente de Medeiros:

“Aclamação de D. Miguel I, rei absoluto de Portugal” - ano 1846 Fez há dias 160 anos (18 de Junho de 1846) que a Ponte Medieval da vila assistiu ao espectáculo mais triste, ocorrido em Barroso, durante a Guerra Civil da Maria da Fonte que passou à história com o nome de ‘’Guerra da Patuleia’’. Desde vários anos antes que se sucediam os pronunciamentos militares, as insurreições e os motins de agitadores e criminosos. Em Barroso também germinavam bigorrilhas e morgados lorpas, amanuenses corruptos e curas estúpidos. Apareceram em Montalegre 10 homens (1/3 com armas de fogo e os restantes com gadanhas e fouces roçadouras) comandados pelo Padre António Teixeira das Quintas, o  ex alferes ‘’picador de cavalaria’’, natural das Lavradas, Manuel Joaquim Teixeira e Bento Gonçalves dos Santos Moura, natural de Medeiros. Sobem aos Paços do concelho, proclamam Rei de Portugal D. Miguel I e lavram Auto de Aclamação nomeando Nova Câmara: João Manuel, de Medeiros – Presidente José Martins, do Cortiço – Vogal António Alves, de Firvidas – Vogal José Martins, de Medeiros – Procurador do Concelho. Assinam o Auto Bento dos Santos Moura, de Medeiros, o abade João Batista Rosa, de Codessoso da Chã, o Padre António Teixeira, das Quintas, Manuel Joaquim Teixeira, das Lavradas, o Padre António Alves, de Cepeda, João Alves Dias, de Torgueda e António Monteiro, de Pinho. Logo no dia 18 uma força de cavalaria comandada pelo Major António Teixeira Sarmento marcha sobre Montalegre. Aliciados pelos acima nomeados conspiradores uns ‘’trinta ou quarenta paisanos que ali se achavam dispararam alguns tiros contra a guarda avançada e dispersaram precipitadamente’’ quando o pelotão de cavalaria entrava na Portela. Perseguidos os agressores que fugiam pelos juncais junto à ponte ‘’lograram alcançar 6’’ que pagaram com a vida o seu louco atrevimento. Pobres tolos de quem nem se sabem os nomes!”

 

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E continua o livro “Montalegre”:

Figuras

Há criaturas que pelas suas qualidades únicas servem de modelo aos comuns mortais e servem de título às diferentes páginas da História dos povos. Barroso também as tem. Dentre umas boas dezenas sobressaem os que aqui elencamos:

(…)

  1. Frei Joaquim da Boa Morte (séc. XIX) nasceu em Medeiros da Chã em 1814. Faleceu em cheiro de santidade, em Santo Emilião, Póvoa de Lanhoso. Foi cónego Regrante de Santo Agostinho. Muito velho e pobre foi assim que o conheceu o notável escritor Raul Brandão que nas suas, Memórias, vol I, edição de José Carlos S. Pereira, página 0, fala assim, com verdadeira unção evangélica de D. Joaquim da Boa Morte Álvares de Moura, formado em filosofia e matemática: “o homem a quem estas secas linhas se referem era na verdade um santo. Deixou tudo para viver… entre cavadores e a gente pobre da terra, que o adorava (…) Antes de morrer pediu que o enterrassem embrulhado na manta coçada que pertencera a sua mãe e que tinha guardado no fundo da arca. Manta essa velha manta como eu lha invejo! Era num farrapo assim, com um resto de calor e ternura, que eu queria ir aconchegado para a terra. Nem a eternidade das eternidades, nem o isolamento, nem o frio dos frios, conseguiriam jamais trespassá-la. Que descanse em Paz.” Frei Joaquim da Boa Morte publicou o folheto “Santo Teotónio conhecido e venerado…”em 1869. Foi também um orador sagrado de grande reputação. Morreu, com 92 anos, em 1903.”

 

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Na página da Internet da Freguesia de Santo Emilião encontrei mais umas coisas sobre o Frei Boa Morte e desde já um apontamento meu, correção a ambos os textos (anterior e próximo) que diz respeito aos anos que tinha na sua morte tendo em conta as datas de nascimento e morte, pois das duas uma, ou o Frei morreu com 89 anos ou então uma das datas (nascimento/morte) estão erradas. Não é que isto tenha importância, mas é por uma questão de sermos corretos.

 

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Nasceu em Medeiros, freguesia de S. Vicente da Chã, do concelho de Montalegre, em 11-01-1814 e faleceu em Santo Emilião, concelho da Póvoa de Lanhoso, em 22-04-1903.


Foi cónego regrante da Ordem de Santo Agostinho, em Santa Cruz de Coimbra.


Em 1836, já depois de extintas as ordens religiosas, formou se em Teologia, tendo sido premiado, em três anos consecutivos do curso.


Raúl Brandão que o conheceu pessoalmente, em S. Martinho do Campo, escreveu dele o seguinte: "Na idade de 92 anos, faleceu há dias, em Santo Emilião, deste concelho, Frei Dom Joaquim da Boa Morte Álvares de Moura, natural de Barroso e vindo para o Minho na idade de quatro anos. Era bacharel, formado na Universidade de Coimbra, em Filosofia e em Matemática. Foi cónego regrante de St.' Agostinho e doutor pelo Colégio da Sapientia. Foi convidado duas vezes para reger uma cadeira na Universidade de Coimbra. E, sendo arcebispos de Braga, D. José Joaquim de Moura e D. João Crisóstomo Amorim Pessoa, ambos o convidaram para reger uma cadeira no curso superior. Várias vezes lhe foi oferecida uma mitra e todos os oferecimentos referidos recusou. Conforme a sua vontade, foi metido num esquife e envolvido numa manta tecida por sua mãe. Era um orador de talento e dotado das mais sublimes virtudes cristãs, pelo que o povo que o conhecia, o apelidava de santo".

 

joaquim da boa morte.JPG

 

E Raúl Brandão que inspirado em Frei Joaquim da Boa Morte escreveu o opúsculo O Padre (1901), disse mais o seguinte: "O homem a quem estas secas linhas se referem, era na verdade, um santo. Deixou tudo para viver perto de S. Martinho do Campo, entre cavadores e a gente pobre da terra que adorava. Vi-o muitas vezes passar na estrada, todo branco, minguado, com o burel, que nunca quis largar, no fio e os sapatos rotos. Era efectivamente formado em Filosofia e em Direito e até, por vezes, fora convidado para lente da Universidade de Coimbra. Recusou sempre, recusou tudo... Velhinho, trémulo, vivendo de esmolas, recolhido por caridade em casa de duas mulheres que o cuidavam, nunca esqueceu o convento, a cela, o dia da separação. E ao pé da árvore, onde se sedentava e recolhia (numa fonte à beira da estrada da Póvoa de Lanhoso, junto à Ermida) junto ao fio límpido da água, lhe ouvi, mais de uma vez contar o que sofrera... Com a vida, ia-se-lhe desfeito o burel, rotos os sapatos. Deixara de dizer missa mas o povo daqueles lugares, que é ingénuo e crente, consultava-o nas suas doenças e nos seus sofrimentos. É que D. Joaquim fazia milagres. Escusam de sorrir... O milagre é uma comunicação entre pessoas que têm radicada e viva esta enorme força: a fé. D. Joaquim, prossegue o testemunho de Raúl Brandão, "curava as criaturas simples, as mulheres, as crianças e os homens da serra que o iam visitar, com boas palavras. E, quando muito, com alguns cachos de uvas, que ele próprio colhia e lhes distribuía, depois de benzidos. Antes de morrer pediu que o enterrassem embrulhado na manta coçada que pertencera a sua mãe e que tinha guardada no fundo da arca. Essa velha manta como eu lha invejo! Era num farrapo, assim, como um resto de calor e de ternura, que eu queria ir aconchegado para a terra. Nem a eternidade das eternidades, nem o isolamento, nem o frio dos frios, conseguiriam jamais trespassá la. Que descanse em paz. Quem escreve estas linhas, confessa o escritor Raúl Brandão, deve-lhe uma das maiores, mais elevadas e puras impressões que tem recebido na vida. A sua grande figura só desaparece da terra, depois de ter feito muito bem e estancado muitas lágrimas".


O texto que aqui reproduzimos, de R.B. foi incluído no capítulo: Filósofo e Santo, pgs. 127/132 do livro: Um Coração e uma vontade, Memórias, organizado pela viúva de R.B., Maria Angelina Brandão, Coimbra, 1959. Também Guilherme de Castilho, biógrafo de Raúl Brandão, em A Vida e a Obra de R. Brandão (Livraria Bertrand, Lisboa, 1979) dedica nas páginas 38 e 39, oportunas considerações sobre D. Joaquim da Boa Morte Álvares de Moura, para explicar que o encontro, nos últimos anos de vida daquelas duas personalidades, em Santo Emilião, se deveu ao facto do escritor ter de abandonar Guimarães, onde era militar no Reg. N.° 20, para fugir à epidemia que grassava. Escreve Angelina Brandão: "porque a sensibilidade nervosa de R. B. não permitisse o isolamento em Guimarães, antes que o cerco se fizesse, fugiu para muito longe. Pôs se a caminho até S. Martinho do Campo, junto à Póvoa de Lanhoso. Instalámo-nos no lugar da Mota, entre soutos frondosos, carvalheiros seculares, luz, sol, céu, longe do espectáculo doloroso que o afligia. Aí, enquanto esperava que a morte passasse do largo, quis o acaso que viesse a conhecer uma das figuras que mais profundamente o impressionou: um ansião na avançada casa dos noventa, Frei Dom Joaquim da Boa Morte Álvares de Moura, sobre o qual viria a escrever em O Dia, uma pequena nota, enaltecendo as excelsas qualidades morais do ascético fradinho que, para se entregar, totalmente, à pobreza e à humildade, recusara a mitra e a cátedra coimbrã, que em homenagem às suas virtudes e cultura lhe haviam sido oferecidas".


E Guilherme de Castilho, depois de recordar aquilo que acima se transcreveu, concluiu: talvez tenha sido a pensar nesta figura fora de série que Raúl Brandão, num folheto que intitulou "O Padre", publicado na época, ao denunciar a corrupção da generalidade do clero, a quem imputa a vitória da matéria sobre o espírito, não deixa de admitir a existência de excepções exemplares que, pela humildade e pela pobreza, possam tornar se o fermento indispensável para que a Igreja volte a ser o veículo da propagação da doutrina de Cristo em toda a sua pureza primitiva". A Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, no vol. 18 menciona os dados essenciais deste Frade Transmontano. E na campa localizada no adro da Igreja Paroquial de Santo Emilião, que passou a ter o seu nome, lê-se, no granito: Aqui jaz D. Joaquim da Boa Morte Álvares de Moura, Cónego Regrante, natural de Medeiros, Montalegre. Nasceu em 11 de Janeiro de 1814 e faleceu em 22 de Abril de 1903. Orai por Ele.


Em 1979 foi editado um opúsculo de 94 páginas: Vida e Obra do Venerável D. Joaquim da Boa Morte, de Barroso da Fonte, José Cardoso Antunes (paroquiano), P.e José Joaquim Martins (pároco) e P.e Aquilino Ferreira, em que cada qual reuniu os elementos que lhe foi possível. Em 1987 a Câmara Municipal de Montalegre editou o opúsculo: Vida e Obra de Joaquim Álvares de Moura, de Barroso da Fonte, onde recolhe mais alguns elementos. O Re Silva Gonçalves (1879 1942), publicou S.NIrtes (1909), uma colectânea de poemas e na p. 80 inclui vir justus, um belíssimo soneto, que invoca: D. Joaquim da Boa Morte, no dia do seu enterro.


Foi autor de alguns livros. Possuímos dele: Santo Teotónio conhecido e venerado ou notícia compendiosa da vida, virtudes, benefiéios, milagres e culto do primeiro prior da Santa Cruz de Coimbra; obrigações e lucros da Associação Espiritual de seus devotos: Exercícios piedosos em honra de tão eficaz protector. Com aprovação de S. Ex.ª Revm. ª o sr. Vigário Capitular da Diocese do Porto. Tipografia de Sebastião José Pereira, Rua do Almada, 641, 1869.

 

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E só restam as habituais referências às nossas consultas e dizer-vos que as abordagens que já fizemos às aldeias e temas de Barroso estão agora no menu do topo do blog e nos links da barra lateral. Se a sua aldeia não está lá, em breve passará por aqui num domingo próximo, e se não tem muito tempo para verificar se o blog tem alguma coisa de interesse, basta deixar o seu mail na caixa lateral do blog onde diz “Subscrever por mail”, que a sapo encarregar-se-á de lhe mandar um mail por dia com o resumo das publicações.

 

BIBLIOGRAFIA

 

BAPTISTA, José Dias, Montalegre. Montalegre: Município de Montalegre, 2006.

BAPTISTA, José Dias, Toponímia de Barroso. Montalegre: Ecomuseu – Associação de Barroso, 2014.

 

WEBGRAFIA

 

- http://www.freguesiasantoemiliao.pt/conteudos/djoaquimdaboamorte - In I volume do Dicionário dos mais ilustres Trasmontanos  e Alto Durienses,coordenado por Barroso da Fonte, 656 páginas, Capa dura. Editora Cidade Berço, Apartado 108 4801-910 Guimarães

 

- https://www.allaboutportugal.pt/pt/montalegre/monumentos/castro-de-medeiros-cabeco-dos-mouros

 

 

 

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