O Barroso aqui tão perto - Morgade
A nossa aldeia de hoje no “Barroso aqui tão perto” é Morgade, aldeia e sede de freguesia no limite de terras da chã, do Barroso da Chã, e entenda-se esta chã por aquilo que o termo significa, ou seja, o de chão plano ou extensão plana de terra, porque de facto, as terras de Morgade assim eram até à chegada da Barragem do Alto Rabagão ou dos Pisões, que lhes invadiu com água os seus chãos mais baixos e planos, ainda hoje bem visíveis quando a cota de água desce na Barragem.
Para quem não sabe onde fica Morgade, já ficou a dica de ficar em terras da Chã, mesmo à beirinha da barragem dos Pisões, mas vamos ser mais precisos e traçar o nosso habitual itinerário a partir da cidade de Chaves.
Pois para ir até Morgade, como quase sempre, temos várias opções. Vamos ficar por duas, com a mesma distância, 37Km, e aconselhar uma. A opção que aconselhamos, por ser mais rápida e melhor estrada é a da estrada de Braga, a EN103, com partida de Chaves e depois é só seguir por ela até ao Barracão. Aqui podemos abandonar a EN103 e tomar a EM525 que nos levará até Morgade, no entanto recomendo continuar pela EN103 até à Aldeia Nova do Barroso, e aí sim, abandona-se a EN103, ficamos com a Barragem dos Pisões à vista e logo a seguir é Morgade. Fica o mapa com o itinerário.
Em opção ao anterior trajeto, temos a estrada do S. Caetano (EM507), via Soutelinho da Raia, depois Meixide e aqui, no final da aldeia a estrada bifurca, uma via Vilar de Perdizes e outra via Pedrário e Sarraquinhos. Opta-se por esta segunda via, mesmo porque a outra, atualmente está cortada por motivo de obras. Seguimos então para Pedrário e Sarraquinhos. Aqui vira-se em direção a Zebral, passa-se ao lado de Cortiço e logo a seguir temos o Barracão. A partir de aqui entramos na parte final do itinerário que aconselhamos, traçado no mapa. A distância em ambos os itinerários é de 37Km, como atrás referido, mas o primeiro, embora menos interessante, é mais rápido e com melhor estrada.
Morgade é assim uma das aldeias ribeirinhas da Barragem dos Pisões, ou quase, pois entre a aldeia de Morgade mais antiga e a Barragem, existe a Aldeia Nova de Morgade que adotou o topónimo de Criande. A placa à entrada da aldeia está pintada de branco, escondendo-lhe o nome lá inscrito, mas nota-se que é Criande o que por lá está gravado. É notório que há ali uma questão mal resolvida entre Morgade e Criande, polémica na qual não quero entrar e nem sequer tenho esse direito. Aliás Criande, além desta referência, não será hoje aqui abordada. Está reservada para um futuro post mais alargado onde irão entrar todas as aldeias novas do Barroso, fazendo-se um pouco da sua história.
Mas seja qual for o conflito existente entre Morgade e Criande, se é que existe, a verdade é que oficialmente Morgade é a sede de freguesia de 4 localidades, onde se conta a própria aldeia de Morgade, a de Carvalhais, Criande e Rebordelo.
Embora Morgade calhe com frequência no nosso itinerário de visitas ao Barroso, a verdade é que para fazemos a recolha fotográfica da aldeia, só lá parámos 2 vezes, ou vez e meia, pois na primeira abordagem (em 2014), estávamos nós no largo da igreja e alguém da aldeia nos falou da capela de S. Domingos e das vistas que desde lá se alcançavam. Não resistimos à provocação/tentação e depois de termos feito duas ou três fotos da igreja, encartámos as máquinas e bota para o alto de S. Domingos, onde confirmámos as tais vistas anunciadas.
CAPELA E ALTO DE S. DOMINGOS – IMPERDÍVEL E IMPERDOÁVEL
Desde já o Alto de S. Domingos é mesmo imperdível, ou melhor, é de visita obrigatória pois as vistas desde lá se podem lançar são mesmo imperdíveis. Vistas sobre toda a barragem, mas também sobre os mares de montanhas de onde se avistam as serras mais importantes do Barroso, como as Serras do Larouco, do Gerês, do Barroso da Mourela e outras das quais não sei o nome. No livro “Montalegre” no capítulo “Festas”, a de São Domingos é uma das que destaca, precisamente pela sua envolvência paisagística.
Nas Memórias Paroquiais de 1758 também Morgade já era referida pela Capela de S. Domingos e o 4 de agosto, onde o povo ia em romagem e no seu dia se celebra a festa com romeiros de várias partes. É aqui que entra o IMPERDOÁVEL, por dois motivos. O primeiro é por mea-culpa por ter lá estado e não ter registado em fotografia a capela. O segundo motivo do IMPERDOÁVEL tem a ver com a razão porque não fiz a tal fotografia. Geralmente nunca fotografo aquilo que não gosto, foi o que lá aconteceu, não pela capela, que embora simples e pequena, tem toda a dignidade de uma capela e a beleza da sua simplicidade, mas pelo seu enquadramento em que é impossível não vermos o mamarracho que construíram junto a ela. Sei com quase toda a certeza que aquele mamarracho foi construído com todo o amor e carinho, possivelmente a expensas do povo de Morgade e dos romeiros, provavelmente até com o suor do povo de Morgade, e que terá uma finalidade nobre ou necessária, mas tudo isso não desculpa nem perdoa o mamarracho que lá está, inestético e a roubar o brilho que capela e o alto mereciam ter.
MORGADE - POPULAÇÃO
Olhando para a evolução da população da freguesia de Morgade ao longo dos tempos, pelo menos desde que existem dados dos CENSOS, verifica-se um comportamento dentro do normal mas um pouco atípico, ou seja, demonstra o mesmo comportamento que as restantes freguesias do interior Norte de Portugal, com a população a aumentar até ao ano de 1960, e a diminuir a partir de aí. No entanto quase todas as freguesias verificam uma descida mais ou menos considerável nos CENSOS de 1920, explicada e justificada por um conjunto de fatores, como o foi a mortandade provocada pela gripe espanhola (a pneumónica) de 1918/1919 (60 mil mortos em Portugal), a I Grande Guerra com 10 mil mortos e um pequeno boom de emigração para o Brasil e Estados Unidos. Pois acontece que na freguesia de Morgade, no CENSOS de 1920 apenas perde 30 pessoas em relação ao CENSOS anterior de 1911.
Desde 1864 a 1930 a população da freguesia de Morgade variou entre os 279 e os 386 habitantes, verificando-se uma linha de tendência de subida uniforme. A diferença em relação às restantes freguesias dá-se a partir de 1930 e vai até 1960 em que a população subiu vertiginosamente, passando de 386 habitantes em 1930, para 811 em 1960. Inicialmente fui levado a pensar que este acréscimo de população se deveria à construção da Barragem dos Pisões, onde chegou a concentrar 15.000 pessoas na sua construção, no entanto descartei essa hipótese porque a barragem só começou a ser construída em 1958. Ao que se deve este fenómeno de uma subida tão vertiginosa da população? – Pois não o sei, mas mais difícil de explicar é ainda a descida de população, quase a pique, entre os anos de 1960 e 1970 em que a população desce dos 811 habitantes de 1960 para os 451 habitantes de 1970. Embora a descida de população entre 1960 e 1970 também tenha uma explicação em geral, com o primeiro boom de emigração para a europa e a guerra nas colónias, não justifica no entanto uma descida tão acentuada. Alguma coisa me escapa, pois, deve haver uma justificação. Já nos CENSOS seguintes, entre 1970 e 2011, nada a assinalar, pois verifica-se a tendência do decréscimo da população como nas restantes freguesias, com Morgade a atingir o seu mínimo de sempre (desde que há CENSOS), no ano de 2011 com apenas 228 habitantes. Saliente-se que são números da freguesia, ou seja, é toda a população de 4 localidades - Carvalhais, Criande, Morgade e Rebordelo.
Quanto às nossas impressões pessoais sobre Morgade, verificámos ser uma aldeia que se desenvolve ao longo de um arruamento principal, tendo neste, dois largos de alguma importância e ambos ligados a um “serviço” comunitário da aldeia, o primeiro largo, logo à entrada da aldeia é onde se localiza a igreja, bem interessante por sinal, seguindo a arquitetura de outras da época com torre sineira dupla separada da igreja (em frente à entrada principal.
O segundo largo da aldeia, é onde estão localizados um fontanário, tanque e bebedouro públicos, onde é notória a intervenção nova do tanque e bebedouro. Ainda neste largo existem umas alminhas que com a colocação (mais recente) de uma cruz no seu topo passou a alminhas/cruzeiro. Quanto ao casario é o típico nesta parte mais a Norte do Barroso, maioritariamente construções simples, com alguns abandonos e ruinas pelo meio.
Quanto às nossas pesquisas encontrámos na página oficial do Município de Montalegre na internet algumas informações sobre a freguesia de Morgade:
"Andou muitos anos anexada, bem como Negrões, à; freguesia da Chã; as três constituíam uma Comenda do Convento de Santa Clara de Vila do Conde. O fortalecimento das regras primitivas e da reforma contra a lassidão em que haviam caído os frades, levados a peito, ao longo do século XVI, originou um grande movimento de apoio das populações, no plano espiritual e no plano material, que as levaram a construir mosteiros e capelas. Vem daí a devoção dos morgadenses a São Domingos de Gusmão, revelada na edificação da sua capela e dos vilapontenses que lhe dão lugar de honra no altar-mor da sua Igreja. Era o comungar desta gente barrosã com os princípios da pobreza voluntária dos monges pregadores, também chamados mendicantes, os frades dominicanos (e os franciscanos) cuja glória mais significativa foi São Tomás de Aquino. E já que falamos de Santos não ficava nada mal – era até um acto de justiça – que os de Carvalhais devolvessem à sua Capela o orago primeiro que foi São Tiago, conforme muito bem expressa a nossa variante barrosã da belíssima lenda dos Sete Varões Apostólicos."
Onde tem também outras informações sobre a freguesia:
- Área: 21.2 km2
- Densidade Populacional: 10.8 hab/km2
- População Presente: 230
- Orago: São Pedro
- Pontos Turísticos: Capela de São Domingos(Morgade) e Casas (Carvalhais).
- Lugares da Freguesia(4): Carvalhais, Criande, Morgade e Rebordelo.
No livro Montalegre também há algumas referências à aldeia de Morgade e freguesia:
“Das ermidinhas, que o estro de Junqueiro abençoa, destacamos quer pela beleza paisagística do local, quer pelo encanto do conjunto “Construção humana e Natureza envolvente”: Nossa Senhora das Neves (São Lourenço) e São Tiago (Fafião), na freguesia de Cabril; Senhor do Alívio, em Salto; Senhora do Monte (Serra do Barroso); São Frutuoso (Montalegre); Santo Amaro (Donões); Santa Marinha, em Vilar de Perdizes; S. Domingos, em Morgade; Nossa Senhora de Galegos, no Cortiço (Cervos); São João da Fraga, em Pitões; São Lourenço, em Tourém, e Nossa Senhora da Vila de Abril, em São Pedro (Contim).”
E continua:
“São igualmente célebres por serem incomuns: o penedo do Esporão (S. Lourenço Cabril), a Laje dos Bois (Lapela-Cabril) o Penedo da Pala (Cela-Outeiro) o Penedo da Caçoila (Pedrário-Sarraquinhos) A Casa dos Mouros (Morgade), o Penedo Sagrado (Salto) A Mesa do Galo (Borralha-Salto),(…)”
E ainda com:
"A grande rota das barragens
Vamos propor um passeio ao longo das albufeiras que se espraiam pelos vales dos rios Cávado e Rabagão. São cenários majestosos de água e serra, bem vivos nos prazeres da pesca, da vela do flyserf, do remo, da canoagem e do esqui, ou no gosto da vitela barrosã, do cabrito, das trutas e das carpas.
Fixe como ponto de partida a vila de Montalegre. Saia em direcção à EN 103, Braga - Chaves, seguindo em direcção às aldeias da Aldeia Nova do Barroso – aldeia dos Colonos - Morgade, Negrões, Lamachã e Lavradas, já no concelho vizinho, para ter acesso ao grande miradouro do Vale do Rabagão, que são os “Cornos das Alturas”.”
E com:
“As Festas
Por falarmos em festas, algumas ocorrem cada ano por toda a região. As de mais nomeada e tradição são as festas concelhias ao Senhor da Piedade, que se realizam na capital, durante a primeira quinzena de Agosto; a de Salto, à Senhora do Pranto, em 1de Agosto; a de Vilar de Perdizes, à Senhora da Saúde, a meados de Junho; as das sete Senhoras, todas elas Nossa Senhora dos Remédios, em sete localidades diferentes de Barroso, no dia 8 de Setembro, etc. Muitas delas apresentam um programa de carácter etnográfico e recreativo e realizam-se em locais de impressionante envolvência paisagística. Entre estas destacam-se: a Senhora da Vila de Abril, na freguesia de Contim; a Senhora das Neves, na freguesia de Cabril; São João da Fraga, em Pitões; a Senhora de Galegos, na freguesia de Cervos (Cortiço); o São Domingos, em Morgade e o Santo António, em Viade.”
“Pelo termo de Codessoso passava um caminho medieval importante que servia diversos lugares da enorme paróquia da Chã, ao tempo das Inquirições de D. Afonso III: Negrões, Vilarinho, Lamachã, Morgade, Carvalhais e Rebordelo, Fírvidas e Gralhós, além das herdades ribeirinhas do Regavam (sic).”
Na Etnografia Transmontana (II – O Comunitarismo de Barroso) de António Lourenço Fonte encontrámos as seguintes referências:
“Hoje na freguesia de Cervos e os de Gralhós e Morgade juntam muito o gado vacum. A partir do mês dos Santos a fins de Fevereiro, antes de entrarem nos Outonos (lameiros) cada pastor junta o seu gado com o de todos os vizinhos e todos guardam o rebanho, recolhendo à noite ao curral, na aldeia. Por todo o Barroso as ruas da aldeia ficam assim estercadas com a passagem diária de tanta fazenda (gado). Alguns estrumam as suas testadas, são as estrumeiras, para estercar as terras.(…)”
Saliente-se que o “hoje” do início da citação anterior se refere a 1977, ano de publicação do livro, que, e ainda no mesmo, noutra referência que transcrevemos a seguir, o “este século” é o século XX:
“Verdadeiramente só no princípio deste século, mais concretamente na 1ª grande guerra, aí por 1914 é que as riquezas mineiras de Barroso começaram a ter interesse mundial.
Assim na Borralha freguesia de Salto foram os belgas, mais tarde os franceses, que vieram explorar o volfrâmio, estanho, pirite, ouro, etc. No Bessa, na zona de Morgade, Rebordelo e Carvalho tem sido explorado em maior quantidade o estanho e menos o volfrâmio. (…)
Ainda do mesmo autor (Padre Fontes) na Etnografia Transmontana, I – Crenças e Tradições do Barroso, encontrámos as seguintes referências:
NOMEADAS DAS TERRAS E GENTES
(…)
Pernas tortas de Vilar,
Tarouqueiros de Solveira,
Escorna cruzes de Solveira,
Da amarela de S. André,
Arreda que sou de Gralhas,
Largateiros de Pedrário,
Leites quentes do Antigo,
Ovelhas de Zebral,
Formigueiros de Serraquinhos,
Carvoeiros de Cepeda,
Financeiros de Fírvidas,
Fidalgos de Cervos,
Lobos de Negrões,
Largateiros de Morgade,
Troquistas de Torgueda
(Informou P. Domingos Barroso).
E continua com as alcunhas das aldeias:
Travassos, terra dos abraços
Castanheira, terra da madeira
Penedones, terra dos homes
São Vicente, terra da gente
Torgueda, terra da merda
Peireses, terra dos reses
Gralhós, terra dos avós
Medeiros, terra dos peidos,
Negrões, terra dos Ladrões,
Frades, terra dos padres,
Cambezes, terra dos homens portugueses,
Montalegre, povo cigano, que muito pede,
Morgade, roubam muito e ninguém o sabe,
Meixedo, inda que vejam a morte, não têm medo.
(Informou Bento Joaquim, A. Alves de Travassos, 68 anos)
E vamos agora espreitar o que se diz na “Toponímia de Barroso” a respeito da nossa aldeia de hoje:
"MORGADE
É o genitivo do nome pessoal germânico Mauregatus. Assim, uma “VILLA” Mauregati > Mourgade > Moorgade > Morgade, em:
- 1258 « de villa de Morgadi est» INQ 1518 donde se vê que no século XIII já só faltava “abrandar” o i em e — o que acontecia já na pronúncia."
Na “Toponímia Alegre” mais duas achegas:
“Quem andou sempre topou:
Um cão de caça na Vila da Ponte,
Um ladrão em Morgade,
Uma lebre em Covelo do Monte
E uma puta em Viade.
Toda a vida se ouviu dizer
Quem sempre terá de haver:
Um cão de caça nas Alturas,
Uma lebre em Morgade,
Um puta em Parafita
E um ladrão em Viade."
E ficamos por aqui, mas antes ainda deixamos como sempre as referências às nossas consultas. Quanto aos links para as anteriores abordagens às aldeias e temas de Barroso, passaram a estar na barra lateral deste blog. Se a sua aldeia ou a aldeia que procura não está na listagem, é porque ainda não passou por aqui, mas em breve passará.
BIBLIOGRAFIA
BAPTISTA, José Dias, (2006), Montalegre. Montalegre: Município de Montalegre.
BAPTISTA, José Dias, (2014), Toponímia de Barroso. Montalegre: Ecomuseu – Associação de Barroso.
FONTES, António Lourenço, (1974), Etnografia Transmontana, I — Crenças e Tradições de Barroso. Coimbra: Edição do Autor.
FONTES, António Lourenço, (1977), Etnografia Transmontana, II — O Comunitarismo de Barroso. Minerva Transmontana – Vila Real: Edição de Autor.
WEBGRAFIA
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