O Barroso aqui tão perto - Vilarinho Seco
Aldeias do Barroso do Concelho de Boticas
Vilarinho Seco
Hoje é a vez de Vilarinho Seco vir a este blog, e para nós, com uma responsabilidade acrescida, isto porque Vilarinho Seco é uma das aldeias de visita obrigatória no Barroso, e a nossa responsabilidade é aqui acrescida porque temos de estar à altura de mostrar o porquê de ser de visita obrigatória.
Ora poderia apresentar várias razões para a obrigatoriedade de uma visita a esta aldeia, poderia dizer como Miguel Torga ao respeito do Reino Maravilhoso “Começa logo porque fica no cimo de Portugal, como os ninhos ficam no cimo das árvores para que a distância os torne mais impossíveis e apetecíveis”, mas não vamos por aí, mesmo porque estas palavras de Torga se aplicam a todas as aldeias de Barroso e ao Reino Maravilhoso de Trás-os-Montes.
Vilarinho Seco é de visita obrigatória pelas suas singularidades, pelos seus pormenores, pela sua vida e tradições, pela gastronomia, pela diferença e pela sua localização, mesmo no meio do Barroso e relativamente distante dos itinerários das estradas principais. É uma daquelas aldeias que se pode apresentar como uma aldeia típica do Barroso. Pois foi assim, que aos poucos, me foram descrevendo Vilarinho Seco ao longo dos tempos, o que ia aumentando a ansiedade de a conhecer.
Irmos para uma terra desconhecida, rotulada com os melhores predicados, tem o seu risco, pois no nosso imaginário costumamos aumentar as expectativas para aquilo que nos espera, e muitas vezes ficamos desiludidos com o que encontramos no destino. É um bocado como quando marcamos férias para terras distantes, em que as fotografias do hotel e da envolvência são paradisíacas e quando lá chegamos vemos como as fotografias são enganosas, como transformam um deserto num oásis e sentimo-nos aldrabados…
Pois eu por aqui não quero aldrabar ninguém, mas uma coisa vos digo, depois de todas as expectativas dilatadas pelo meu imaginário, quando fui pela primeira vez a Vilarinho Seco, fiquei surpreendido, pela positiva, pois o meu imaginário e espectativas tinham ficado aquém da realidade, mas atenção, e recorro novamente às palavras de Miguel Torga para esta chamada de atenção: “Embora muitas pessoas digam que não, sempre houve e haverá reinos maravilhosos neste mundo. O que é preciso, para os ver, é que os olhos não percam a virgindade original diante da realidade e o coração”.
Claro que se é dos que detesta o interior, as aldeias e o mundo rural, então não vá a Vilarinho Seco, vai detestar ver o gado na rua, enojar-se ao ver que fazem as necessidades em cima da calçada, ruas de casas antigas e velhas todas de pedra e à vista escurecida pelo tempo, e as pessoas que, principalmente em dias escuros e cinzentos de inverno, muito frios que até fazem congelar os tin-tins, com ou neve, saem à rua cobertas com capas esquisitas, todas iguais, de uma lã castanha escura prensada, tosca e áspera que até faz arrepiar, pastagens por todo o lado, e se lançar o olhar para o horizonte, só vê montanhas e mais montanhas, adornadas em primeiro plano por giestas que dá uma flor que cheira mal e pedregulhos, que aqui pela sua dimensão são autênticos penedos… tudo um horror, que dá para qualquer um ficar deprimido p´raí um ano inteiro ou mais… Pois se é desses, é melhor ficar em casa sentado no sofá ou ir dar uma volta pelo centro comercial mais próximo, que esses são sempre interessantes, cheios de luz e cor, com gente perfumada que veste bem…
Ainda para os que detestam aldeias e o mundo rural, fica ainda outro aviso, se enganados caírem no Barroso, nunca caiam na asneira de comer num restaurante, tal como o que existe em Vilarinho Seco, por exemplo, pois esta gente a comer são mesmo alarves, principalmente nos cozidos à barrosã. Esta gente como o reco todo, ou quase, só deita fora as unhas, o pelo e os olhos, o resto vai tudo para o pote, incluindo as tripas do reco, que depois de lavadas as enchem com bocados de carne crua e uns temperos que só eles sabem, poem-nas a secar à lareira com muito fumo, daquele que se entranha na roupa e que nem os melhores perfumes das melhores perfumarias de Paris lhe conseguem retirar ou disfarçar o odor, mas voltando à tripa com carne crua dentro, que depois de passar 15 dias ou um mês ao fumo, a cortam aos pedaços e a comem assim mesmo – crua com um bocado de pão. Um horror. Mas nos cozidos vem de tudo o que o reco tem, as patas, o rabo, as orelhas, o focinho as tripas com carne dentro e a acompanhar, batatas e couves das terras à volta da aldeia, que antes de as plantarem ou semearem, enchem as terras de estrume , para dar outro sabor à batata e à couve.
Enfim! Mas se não é desses esquisitos da cidade ou que, embora não sendo da cidade foram lá parar e já nem sabem o que é um reco (estes pseudo-citadinos são os piores, fazem figura nos restaurante de comida gourmet e ao chegarem a casa, para matar a fome que não saciaram no restaurante, atiram-se a um pedaço de chouriça com pão da encomenda que lhe enviaram da aldeia). Mas ia dizendo, se não é desses esquisitos citadinos, se é dos bôs, então, não deixe de ir a Vilarinho Seco, pois é de visita obrigatória da qual não se arrependerá, e depois, nunca ficará a conhecer o Barroso em todo o seu ser, se não conhecer estas aldeias de referência barrosão, e Vilarinho Seco é uma delas. Ah!, e se for por lá no inverno, não deixe de comer um dos cozidos que descrevi atrás, em que comem o reco todo. Os de Vilarinho Seco dizem ser dos melhores, e se forem lá, não perguntem ou procurem pelo restaurante de Vilarinho Seco, perguntem antes pela casa do Pedro, pois é na casa dele que se come um bom cozido, isto segundo me dizem, pois nunca lá comi, mas acredito que sim, pois no mínimo será igual ou parecido a outros cozidos à barrosã que eu tenho comido por lá, e o melhor, não paga nada por entrar, só paga à saída depois de comer… Se está mesmo a pensar ir lá comer um cozido, na sua época, durante o inverno, convém marcar antes, pois pelo Barroso, nestas casas conhecidas pela sua gastronomia, só marcando com alguma antecedência é que consegue um lugar à mesa, neste caso, à mesa do Pedro.
E quase poderia acabar aqui o post, deixando o resto para as descobertas de quem quiser descobrir Vilarinho Seco, mas vou continuar, pois ainda há mais algumas imagens para mostrar, das centenas de imagens possíveis, pois apenas fica uma seleção abordando um pouco de toda a aldeia, mas também da sua história, usos e tradições. Continuemos então!
Passemos à localização de Vilarinho Seco e como ir até lá, com partida como sempre da cidade de Chaves. Como poderão ver nos mapas que deixo a seguir, Vilarinho Seco fica a 45 quilómetros de Chaves. Tal como acontece com a maioria das aldeias do concelho de Boticas, o nosso melhor itinerário é via estrada nacional 103 (estrada de Braga) até Sapiãos, aí abandonamos a EN103 e rumamos até Boticas. Estando em Boticas, basta seguir as placas indicativas com a saída para Cabeceiras, Ribeira de Pena ou Salto, aliás Boticas só tem três saídas, uma para Chaves e Braga (via EN103, pela qual vamos, mas em sentido contrário), outra também para Chaves, via Vidago, pela N311, e pela mesma N311, em sentido contrário, temos a saída para Cabeceiras, Ribeira de Pena, Salto e também Braga. É por esta que devemos ir, mais acima, lá no alto, atravessamos a Carreira da lebre e continuamos em direção a Salto e Braga. A seguir, sem sair da 311, e pela ordem que vou deixar, vai andando e vendo saídas para Carvalhelhos, Vilar, Campos, Viveiro, Bostofrio, Covas do Barroso e Agrelos, a seguir a esta última aldeia que fica próxima da estrada (Agrelos) a apenas 2,3 km terá uma espécie de cruzamento com saída à esquerda para Espertina e Antigo e à direita para as Alturas do Barroso, é pela saída das Alturas que deve sair, numa segunda placa, mesmo em cima da saída, também aparece Vilarinho Seco e Coimbró.
Ainda antes de vermos o que dizem os documentos que temos sobre Vilarinho Seco, recomendamos como pontos de interesse para visitar em Vilarinho Seco, logo na entrada (seguindo o nosso itinerário) onde a estrada alarga, tem um moinho, bem interessante porque é diferente de todos os que conhecemos. Mais à frente, terá de se decidir por virar à esquerda ou à direita. Vire à direita e logo a seguir verá um passadiço em arco por cima da rua, logo após o qual terá um grande tanque/bebedouro com chafariz e um cruzeiro. Este conjunto está precisamente no centro da aldeia, e que conjunto, digno de se lhe tirar o chapéu. Pare por lá o tempo necessário para apreciar como deve de ser. Depois pode ir até ao fundo da rua principal e apreciar o casario típico de “arquitetura vernacular”, não gosto do termo mas parece que é assim que se diz.
Depois de vista esta parte da aldeia, regresse à casa de partida, quando teve de decidir virar à esquerda ou direita. Mas agora vindo do lado direito siga em frente e esta na casa do Pedro que ocupa todo o lado direito da rua, até ao largo da capela. Em frente à casa do Pedro, existe uma eira com bar, que suponho ser também do Pedro. Aqui é também ponto de paragem obrigatória nem que seja e só para repor forças, isto se estiver aberto, pois pode-se dar o caso de não estar. Como nós passamos por lá sempre no dia 20 de janeiro, nesse dia, quase de certeza que está aberto.
Geralmente é neste último largo, já na saída para as Alturas do Barroso, que se estaciona o popó. Aí podemos ver então a Capela, também interessante, uns espigueiros e as Casas do Pedro, a tal onde se comem os cozidos e outras coisas, pois convém não esquecer que estamos no Barroso os a vitela barrosã também é recomendada. Do outro lado da rua, o tal bar com eira, também é um lugar a visitar e simpático. Mesmo se não comer na cas do Pedro, peça para dar uma vista de olhos à casa, que eles deixam e mostram.
Vamos então às nossas pesquisas, pelo que encontrámos na monografia de Boticas – Preservação dos Hábitos Comunitários nas Aldeias do Concelho de Boticas:
Castro de Vilarinho Seco
Designação: Castro de Vilarinho Seco / Mena / Couto ou Côto dos Mouros
Localização: Vilarinho Seco (Alturas do Barroso)
Descrição: O castro de Vilarinho Seco, também conhecido como Couto dos Mouros, localiza-se a cerca de 1 km da aldeia de Vilarinho Seco, freguesia de Alturas do Barroso.
Quase na base da encosta do Castro, voltada a Poente, encontra-se a habitual fiada de pedras caóticas a assinalarem o alinhamento da muralha, totalmente derruída. Esta primeira linha de defesa começa num grande penedo, no lado Norte, segue para Sul e vai entestar noutro grande penedo. Apenas 2 m de muralha ligam este grande penedo a outro semelhante. Seguem-se 17 metros de ruínas de muralhas que entestam noutro penedo. Entre 20 a 30 metros acima da primeira muralha encontra-se a segunda, também derruída, que segue a crista do monte quase no alinhamento N/S, poucos metros adiante esbarra, no alto, num grande penedo. Nele se vê uma cruz gravada em sulcos pouco fundos. Esta segunda muralha esbarra em dois grandes penedos, sobranceiros a um despenhadeiro quase abrupto da vertente do lado Leste, encosta que é toda penedia contínua, com alguns penedos grandes, com 6 ou 7 metros de altura, encostados uns aos outros.
Continua a monografia com as:
Festas e Romarias
Santa Cruz, 03 de Maio, Vilarinho Seco
- Paio,* 26 de Junho, Vilarinho Seco
Património Edificado
Capela de Sampaio, forno do povo, casas e relógio de sol.
Ainda na monografia, os:
Fornos do Povo
Noutros tempos, quando quase todas as casas das aldeias coziam no forno do povo, foram estabelecidas regras de forma a organizar a sua utilização. Em quase todas as aldeias do concelho, onde este bem comunitário existia, havia a obrigação de quentar o forno, que andava à roda pelas casas dos lavradores da aldeia, que eram quem dispunha de meios para ir buscar lenha. Como, por exemplo, acontecia em Alturas do Barroso, “Todo aquele que tivesse uma junta de vacas para fazer o transporte da lenha, para aquecer o forno, era obrigado pelo uso e costume a aquecer o forno.” Era o chamado quentador, forno de quenta, ou cantador pois ele era, também, o responsável pela marcação da vez das pessoas que coziam a seguir a ele.
Assim, quem quisesse cozer, dirigia-se ao quentador, pedia-lhe a vez, para saber atrás de quem iria cozer, e colocava um sinal a marcar a sua vez. O sinal podia ser lenha, mato, etc. e à medida que iam cozendo, cada um tirava o seu sinal de marcação, para as pessoas saberem quem ia cozer a seguir e assim prepararem a massa.
E continua:
Na maior parte das aldeias este uso acabou por desaparecer, são cada vez menos as pessoas que ainda utilizam estes espaços, muitas preferem comprar o pão já feito, a um dos inúmeros padeiros que diariamente percorrem as aldeias do concelho, do que terem que andar com trabalho para fazer a massa e cozer o pão. Assim, quem quer cozer aquece o forno e coze. Em Sapiãos, as pessoas ainda têm o hábito de colocar um lareiro junto à fornalha do forno, sinal que indica que alguém vai aquecer o forno e cozer. Normalmente quando do alguém coze, as outras pessoas aproveitam a quentura do forno e cozem a seguir, pois desta forma já não gastam tanta lenha. Em Valdegas (Pinho) apesar de já não existir a obrigação de quentar o forno, quem o acender é obrigado, pelo costume, a dar a vez aos que quiserem cozer a seguir a ele, durante essa semana.
Todavia, em Vilarinho Seco (Alturas do Barroso) este uso ainda vigora[i]. De quinze em quinze dias, um lavrador, ou seja, quem tem vacas ou tractor, aquece o forno, num sistema de rotatividade pelas casas da aldeia. Antigamente esta obrigação demorava cerca de um ano a dar a volta à aldeia, actualmente demora aproximadamente oito meses, pois apesar de existirem cerca de 30 casas habitadas na aldeia, apenas 15 é que aquecem o forno. O forno tem que ser aquecido entre segunda e quarta-feira, depois quem quer cozer vai pedir a vez a quem o aqueceu.
Fazem broas, bôlas, bôlas de carne e bicas de cereais estremos, apenas milho ou apenas centeio, mistura centeio/milho ou centeio/trigo, a que em algumas aldeias chamam o pão casado, depende dos gostos e do cereal que predomina nas diferentes aldeias. Por altura da Páscoa costumam fazer os folares com carne ou sem carne.
(…)
Em Vilarinho Seco, sempre que o forno coze os vizinhos ainda se juntam lá para conversar.
E continua a monografia com as tradições:
Mas em muitas outras aldeias existia a tradição dos motes do galo[ii], como por exemplo em Vilarinho Seco, cujo testamento do galo transcrevemos a seguir:
Testamento do Galo
Eis aqui o testamento
Que fez elegante galo
Quando tinha no pescoço
Aguda faca para matá-lo
Não haverá quem me console
Venham todos venham ver
O que fez um pobre galo
Quando estava para morrer
Já que estou em meu juízo
Testamento quero fazer
Para meus bens eu deixar
A quem melhor me parecer
Porém antes que se escrevam
As .......... derradeiras
Quero também despedir-me
Das amadas companheiras
Galinhas minhas amigas
Com quem sempre acompanhei
Vinde ver e compreendereis
O estado a que eu cheguei
Estou tão atribulado
Nesta nossa despedida
Que deixar-vos nesta hora
Decerto me custa a vida
Um conselho quero dar-vos
E vos falo bem sisudo
Que fujas quanto puderes
Dessas festas do Entrudo
E se acaso vos chamarem
Pila pila vos disserem
Não vades lá que é engano
Que apilar vos querem
Erguei-vos de madrugada
E a casa não torneis
Ficai estes dias fora
Para a Quaresma vireis
E se vires que há doença
Vede bem como andais
Que também vos pilarão
Quando menos vós cuidais
Daqui a sete semanas
Quando entrar o mês de Abril
Eu já estou a adivinhar
Que morrereis mais de mil
E aquelas que escaparem
Alegres passais os dias
Retirai-vos quanto puderes
Das funções de tais folias
Afirmaivos vede bem
Esta cor da minha crista
Nesta tão triste sorte
Esta noite se escreveu
A minha sentença de morte
Em nome da benta hora
Talvez seja a última vez
Que vós lhe poreis a vista
De mim pena não tenhas
Aos mais galos dai ouvidos
Que assim fazem as mulheres
Quando lhe morrem os maridos
Em tudo quanto vos disser
Tomai sentido e atento
Que eu principio agora
A fazer meu testamento
Deixo a voz da garganta
Aos galos meus companheiros
Para que cantem de noite
Em cima dos seus poleiros
Deixo mais a minha crista
Vermelhinha e tão bela
Ao galo mais lambareiro
Que puder ficar com ela
Deixo as penas do pescoço
De várias cores pintadas
Às meninas desta terra
Para andarem enfeitadas
Deixo as penas do corpo
Que são todas as mais honestas
Para as biatinhas da moda
Se enfeitarem pelas festas
Deixo as penas do rabo
Por serem as mais brilhantes
Para as meninas solteiras
Darem aos seus amantes
Deixo as unhas dos pés
Para as mulheres viúvas
Se arranharem à noite
Quando lhes morderem as pulgas
Deixo as pernas
Por serem cor amarela
Para todos os cães tomarem
Uma grande atacadela
O bico que me ia esquecendo
Deixo ao galo mais fraco
Para quando travar bulha
Fazer mais um bom buraco
O fígado e a moela
E a minha vontade inteira
Que as coma logo assadas
Quem for minha cozinheira
O papo que toda a vida
Me serviu de bom celeiro
Deixo ao homem mais honrado
Para a bolsa do dinheiro
Deixo o miolo das tripas
E toda a mais demasia
À mulher mais rabugenta
Que houver na freguesia
Ainda agora me lembrou
Já me ia esquecendo
Que das barbas não disponho
Mas deixá-las pretendo
E as deixo de boa vontade
Vermelhinha e tão belas
Àqueles mais desbarbados
Que quiserem servir-se delas
E os móveis da casa
Deixo ao meu testamenteiro
Que no meu falecimento
Fique dono do poleiro
Deixo por uma só vez
Que este meu corpo defunto
Não esqueçais de lhe juntar
Boa porção de presunto
Deixo por advertência
Aos mais galos machacázes
Se desviem ser vizinhos
Da escola dos rapazes
E se por acaso desprezarem
O conselho que vos dou
Daqui a vinte anos se verão
No estado em que agora estou
Deixo mais que o meu enterro
Seja feito com carinho
O que hão-de gastar em esmolas
O gastem antes em vinho
Deixo que todo o estudante
Que andar nesta lição
Dê um galo como eu
Que morra nesta função
E se um galo não derem
Dêem um bom coelho
E nenhum seja tão néscio
Que despreze o meu conselho
Agora torno a lembrar-me
E já me ia sendo erro
No nome da sepultura
No lugar do meu enterro
Deixo é minha vontade
Seja minha sepultura
Dentro dos corpos humanos
Que é melhor que na terra dura
Dos mais galos que morreram
Peço a todos em geral
Que não façam testamento
Que este p’ra todos vale
E vós meus estudantinhos
Já que assim o quereis
Degolai-me bem depressa
Que é favor que me fazeis
Todo o pai que tiver filhas
E dote para lhes dar
Meta-as todas num convento
Eu trato de as casar
Agora por nossos pecados
Estamos vendo em cada canto
Que todo o pai que tiver filhas
Logo se lhe faz o cabelo branco
E estamos a chegar ao fim deste post dedicado a Vilarinho Seco. Muito mais haveria para dizer, mas ficará para uma próxima oportunidade, tanto mais que Vilarinho Seco continuará a fazer parte dos nossos itinerários do Barroso, com paragem obrigatória, nem que seja, e só, por alturas das celebrações do São Sebastião, nos dias 20 de janeiro. Esperemos que no próximo 20 de janeiro a pandemia do corona vírus já seja coisa do passado e permita continuar esta tradição que tanto enriquece o Barroso.
E damos por terminado este post, que como de costume termina com um vídeo com todas as fotografias de Vilarinho Seco publicadas até hoje neste blog, mas também com excertos de alguns vídeos das nossas passagens pela aldeia.
Aqui fica, espero que gostem:
E quanto a aldeias do Barroso de Boticas, Chaves, despedimo-nos até ao próximo domingo com a aldeia de Virtelo, mas entretanto, sexta-feira, teremos aqui mais um vídeo da aldeia de Lodeiro D’ Arque, esta do concelho de Montalegre.
BIBLIOGRAFIA
CÂMARA MUNICIPAL DE BOTICAS, Preservação dos Hábitos Comunitários nas Aldeias do Concelho de Boticas - Câmara Municipal de Boticas, Boticas, 2006
TORGA, Miguel, O Reino Maravilhoso – “Portugal”, 1950 .
WEBGRAFIA
[i] Nota do blog Chaves – Não apurámos se este uso ainda se mantém na atualidade, pois o documento de onde transcrevemos esta informação é de 2006, e nestes últimos anos, em termos de tradições, muita coisa se perdeu.
[ii] A tradição dos motes do galo e carro do galo, é uma das brincadeiras de entrudo e consiste em juntam-se três rapazes no principal largo da aldeia, um coloca-se no forno do povo, outro no cruzeiro, seguram uma corda com o galo preso no meio e tentam acertar com ele ao que está a ler os motes de forma a atirarem-lhe com o chapéu ao chão. Este, enquanto lê os motes, com uma espada tenta afastar o galo da sua cabeça. No final oferecem o galo e o restante conteúdo do carro do galo. Carro este, um carrito de mão, que é enfeitado com flores levando as suas ofertas que, como manda a tradição, são compostas por um coelho, uma galinha, vinho do porto, doces e um galo. Depois fazem um cortejo com o carro pelas ruas da aldeia. Esta tradição era dedicada ao professor da aldeia pelos alunos da escola primária. Tradição esta que com o encerramento das escolas primárias e ausência de professor, penso que também já não se realiza.