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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

20
Jun20

Pedra de Toque


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A minha tia Fina…

 

                        O nome dela era Josefina, mas nos primeiros tempos escrevia Josephina e, jugo, ter sido batizada com este nome. Depois virou Josefina e era tratada e conhecida por todos como Fina.

 

                        Era minha tia, vivia com a mãe, minha avó, na Rua de Santo António, por cima do talho do Sr. Maneca, hoje o talho Brasileiro.

 

                        Eu até aos 10, 11 anos vivi com elas, apesar de visitar meus pais e meus irmãos quase diariamente na pensão Império, onde eles trabalhavam.

 

                        A minha tia Fina, quando criança, teve uma grave meningite que curou, mas que lhe deixou sequelas, algumas profundas, para toda a vida.

 

                        Desde logo, uma terrível bronquite que a acompanhou até ao fim.

 

                        Passava noites inteiras a tossir e só conseguia dormir sentada na cama.

 

                        Com alguma frequência emonava-se com a família e com a Albina, uma empregada doméstica que viveu muitos anos connosco.

 

Durava poucos dias o mono.

 

                        Da janela do seu quarto via a rua que lhe causava saudades.

 

                        Terminava o mono e aos poucos voltava a falar com as pessoas.

 

                        Então ajudava a mãe caseando as camisas que esta fazia com perfeição.

 

                        Por vezes saía para fazer nas redondezas uns recadinhos à mãe.

 

                        Os vizinhos estimavam-na.

 

                        No domingo saía sempre para ir à missa do meio-dia.

 

                        Maquilhava-se e aperaltava-se.

 

                        A mãe ficava a vê-la sair e atravessar as escadinhas em frente ao Sr. Freire e acenava-lhe para que a mãe se pronunciasse quanto à forma como ia vestida. A mãe respondia dando aprovação e lá seguia ela pela Rua Direita acima até à Matriz.

 

                        Como tinha também problemas de audição, quando se ia confessar, a conselho da mãe, pedia ao Sr. Padre para lhe falar um pouco mais alto.

 

                        Um dia aconteceu que, quando lhe formulou tal pedido, o sacerdote mal encarado respondeu-lhe: “Não aturo moucas” e deixou-a só no confessionário.

 

                        Ela levantou-se e chorosa veio a caminho de casa onde contou à avó o sucedido. Esta acalmou-a e conseguiu convencê-la a não contar ao pai, homem ríspido, o sucedido.

 

                        Desde que entrei na faculdade, insistentemente manifestou vontade de ir à minha Queima quando ela acontecesse.

 

                        Quando a Queima chegou, satisfiz-lhe o desejo e lá foi ela felicíssima até Coimbra na companhia dos meus pais e dos meus irmãos.

 

                        Nunca a vi tão bem disposta e tão contente, dando-me o braço sempre que tinha oportunidade.

 

                        No regresso, passado pouco tempo, alguém a convenceu a deslocar-se ao Porto a fim de tomar uma vacina nova que lhe resolveria o problema da bronquite e da consequente tosse que lhe provocava enorme sofrimento.

 

                        E na verdade, quando chegou do Porto, já não tossia nem expetorava.

 

                        A sua doença começou a agravar-se, até ter deixado de respirar, definitivamente.

 

                        Faleceu em 1970 com 52 anos.

 

                        Apagou-se.

 

                        Ainda a vi no seu leito (a cama que fora de seus pais), serena, muito bonita.

 

                        Parecia uma adolescente, uma criança, como foi durante a vida.

 

                        Ajudou-me a crescer e dedicou-me muito amor.

 

                        Ainda tenho hoje imensas saudades dela.

 

                        Todos tivemos uma tia que nos marcou.

 

                        Eu tive a minha tia Fina!...

 

António Roque

 

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