Pergaminho dobrado em dois
O fascismo e um bispo da Iurd entram num bar.
Estava aqui a pensar sobre o tema no qual me deva debruçar sabendo que posso cometer uma injusta desfaçatez em não nomear outros temas tão ou mais importantes. Cheguei à conclusão de que devo confessar-vos uma coisa: nos momentos antes de saber quem seria o presidente do Brasil, adormeci algures entre a televisão e o sofá, estando a ter um terrível pesadelo, que mais tarde viria a saber que não estava a sonhar. Acordei sobressaltado, todo expelido de urina, com a leve sensação de que Bolsonaro tivesse ganho as eleições. Fui rapidamente limpar-me com petróleo, e corri para o televisor: infelizmente tinha ganho a apologia do ódio e da discriminação, tinha ganho a violência, o fascismo, a homofobia, o racismo. Incrivelmente, desatei a chorar. Depois, fui ver um filme do Frota, que tem grandes chances de vir a ser o novo ministro da cultura, só para começar a familiarizar-me com o novo Brasil.
Desculpem-me, mas isto foi uma piada grotesca do melhor amigo de Bolsonaro – Deus. Só ele para pregar assim umas partidas. Aliás, é um amigo para se desconfiar. Quem quer um amigo que, por brincadeira, faz um Hitler e mata uns milhões de Judeus ou só porque não tem mais nada para fazer mata crianças com cancro. Gosto mais daqueles amigos, tipo os do Sócrates.
Adiante, como é possível um candidato que fora expulso da escola de oficias por suposto planeamento terrorista, ou que permite, a cada brasileiro, fazer-se acompanhar de uma arma de fogo – mais tarde, admitirá a posse de um espadachim e de um punhal construído pelos próprios –, ou que autoriza o beneficio do “excludente de ilicitude” relativo aos agentes da autoridade. Isto está a tornar-se tão surreal que parece que estamos a assistir a um passo de dança de ballet de um fascista e de um bispo da Iurd.
Bolsonaro afirma, no seu discurso de posse, que o governo será um defensor da democracia e da liberdade. A democracia está para o Bolsonaro como um anão está para a bomba hidráulica. Quanto à liberdade, ele ainda não sabe exatamente o que é uma vez que ficou parado nos anos 70 do Brasil.
Estava a ver os festejos pelas ruas de São Paulo e parecia que estava a ver o 25 de Abril ao contrário, com os militares a fazer um festim ao regresso do fascismo. Parece que já cheira à ditadura e a penela ainda vai a meio.
O que mais me atraiu no seu discurso foi aquela senhora que traduzia tudo o que o Bolsanro dizia em língua gestual. Uma forma sintética de transmitir e fazer chegar às pessoas que ele ainda é a favor de algumas minorias.
De acordo com A Folha, o jornal mais importante do Brasil, 98% dos eleitores do presidente eleito foram expostos a uma ou mais noticias falsas durante a eleição, e 90% acreditaram que os fatos eram verdade. Isto é o que dá quando andamos só em cuecas e a coçar os genitais pelo hall de casa só a consultar notícias via Facebook e WhatsApp.
A democracia brasileira está a afogar-se nas Fake News. As Fake News são um novo estilo trendy que, no seu apogeu, conseguem exercer um tipo de influência a quem tem uma participação ativa na sociedade, nos votos dos eleitorados e nos adereços de Catarina Martins. Desculpem-me, mas alguém acreditaria que o relógio da Catarina Martins tivesse um valor de 21 milhões? As pessoas que acreditaram nisso foram as mesmas que continuam a crer que o desaparecimento do avô no jantar de natal é apenas uma coincidência e que o Pai Natal existe mesmo.
Ainda bem que por cá ainda há aquela coisa que se chama liberdade. Caso contrário, a crónica de hoje debruçava-se sobre importância de Péricles no século V a.C .
Herman JC