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Finalmente chego também às Avelelas com um post alargado.
Avelelas é uma das aldeias que fazem parte do meu imaginário de criança, do tempo em que se vivia na cidade mas cada família tinha quase sempre duas aldeias à que estava ligada por laços familiares de descendência ou nascença. Por exemplo eu, flaviense de nascença, no entanto o único flaviense na minha família, de pais, irmãos, avós, tios e primos, pois para além da minha cidade de Chaves, eu também sou pertença de Parada do Corgo (em Vila Pouca de Aguiar) e de Montalegre.
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No condomínio fechado onde nasci, nome pomposo que hoje se dá para várias famílias que entram pela mesma entrada, mas que no meu tempo até era uma quinta no bairro da Casa Azul (Madalena) a confrontar com uma rua que eu estou certo que foi calçada romana e que mais tarde vieram a baptizar por Rua Cabeça da Galinha (vá lá saber-se porquê), viviam 5 famílias e, embora os filhos dessas famílias fossem todos flavienses de nascença (á excepção dos meus irmãos barrosões) os pais dessas mesmas famílias tinham origens em aldeias ou vilas. Vilarandelo, Carrazedo de Montenegro, Nantes, Ribeira das Avelãs, Moure e Avelelas eram aldeias de origem do “condomínio fechado”. Aldeias que arrastavam com elas apelidos e aos quais esses apelidos estão ligados. Os Milheiros e Abelhas e Vilarandelo, os Pintos de Carrazedo ou os Baías das Avelelas, eram também apelidos conhecidos na quinta do Tio Domingos americano, o nosso condomínio fechado.
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Conheço assim as Avelelas do tempo em que aprendia o B-A-B ou o 1+1, tudo pelo vizinho do “condomínio” que tinha lá nascido e que tantas vezes falava da terra.
Na altura as Avelelas ainda ficavam longe e caras, talvez por isso não fosse frequente os seus filhos visitarem-na amiúde como desejavam, e então matavam saudades ou desabafavam falando dela, como era o caso do Sr. António.
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O Sr. António era e ainda é, um avelaleiro (será que é assim que se diz!?) que veio, ainda em puto, para a cidade como empregado do comércio, para uma das casas bem conhecidas da altura. Esteve dois anos a trabalhar à experiência em troca de dormida e comida. Após dois anos passou a empregado, com a condição de ser obrigatório usar gravata e com o vencimento de 100 escudos anuais, aos quais nunca viu a cor, pois as despesas de alimentação, estadia, vestimenta e alguns adiantamentos inevitáveis de envios de dinheiro para os pais, eram descontados ao suposto ordenado e, quando chegava à altura de receber os 100 escudos, às vezes estava com saldo negativo ou então estava ela-por-ela. Vir da aldeia para trabalhar na cidade, tinha os seus custos, e ser empregado de balcão, era um curso caro. Claro que com o tempo e a velhice, o Sr. António foi subindo de posto, sempre no comércio e hoje já está reformado. Nunca fui com ele às Avelelas, mas numa das últimas vezes que lá estive, foi com o Sr. António e com uma das irmãs, que tive o grato prazer de conviver, em dia de festa na aldeia. Quanto à irmã, mais à frente falaremos.
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Tudo isto que disse não é romanceado, é verdadeiro e sincero e a história do Sr. António, é uma história repetida em muitos Antónios daqueles que das aldeias se aventuravam na cidade e caíam na escravatura dos comerciantes da cidade. Escravo, mas com gravata. Graças a Deus que os tempos de hoje são outros e a escravatura da cidade, anos mais tarde, foi trocada por outra (em trabalho), chamada emigração, mas bem mais rentável e digna, embora também difícil, que a do “comércio” dos espertos da cidade. O que mais surpreende, é que antónios como o Sr. António, ainda estão agradecidos pela oportunidade que tiveram na cidade.
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Vamos então até às Avelelas que hoje tem muitos Antónios na cidade e que regressam à aldeia (hoje que está mais perto) sempre que podem. Talvez por isso a aldeia tenha sempre gente e seja uma aldeia com vida, com muita vida até, principalmente se a visitarmos num fim-de-semana e se a visita for em dia de festa, bem, aí então retomam-se os dias de antigamente das aldeias do concelho, que as Avelelas ainda matem, com conjunto, banda e foguetes no ar, onde até nem faltam as rifas para os jogos tradicionais e populares que a irmã do Sr. António, a Maria Baía, reinventou para o 15 de Agosto na aldeia. Prometo que no próximo ano vou lá.
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Avelelas ficam a 15 quilómetros de Chaves, para onde se vai (mais uma vez) pela Nacional 103, até às Assureiras do Meio. Aí vira-se à direita, sobe-se em curva-contra-curva, um olho no Castelo de Monforte outro na estrada e logo a seguir ao desvio para Sobreira, temos as Avelelas, com o seu casario novo à beira da estrada e o campo de futebol. Foi este tipo de paisagem de entrada que sempre me fez adiar a reportagem fotográfica para depois, enquanto me fui entretendo com Oucidres, Vilar de Izeu, com o Castelo de Monforte e Vila Nova, pois para o meu gosto do tradicional das aldeias do granito ou até do xisto, o que se vê da estrada não é muito agradável, embora louvável. Claro que há excepções, e uma delas é uma recuperação que está em curso junto à igreja, que embora ainda no tosco, demonstra gosto e sensibilidade para o que devem ser as recuperações do casario nas nossas aldeias. Já o mesmo não digo da recuperação que se está a fazer na periferia da aldeia e que é apontado por todos como a coqueluche das recuperações, embora louve também o investimento na aldeia.
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Avelelas pertence à freguesia de Águas Frias e em termos de população residente e segundo os dados dos censos 2001, a aldeia tinha 183 habitantes residentes, dos quais 16 tinham menos de 10 anos e 36 menos de 20, embora 57 com mais de 65 anos. Como costumo dizer, os números dizem tudo e neste caso são excepção à regra do despovoamento, pelo menos do mais agressivo. Aliás é bem visível na aldeia a vida que ainda tem, sempre com gente e também com crianças, ou seja, ainda é uma aldeia com saúde e à qual os seus filhos se sentem fortemente ligados e onde é habitual ver muitas caras conhecidas da cidade. Aldeia com crianças, algumas em idade escolar, mas também com escola fechada. Novas políticas da modernidade que também estão a contribuir para a morte de muitas aldeias.
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Quanto à história da aldeia e à origem do seu topónimo não encontrei escritos que me pudessem ajudar na feitura deste post. Conheço-lhe em termos religiosos e tradicionais a forte devoção a Santa Bárbara, que até tem capela na aldeia e que segundo me disseram os populares, em dias de trovoada abre a porta da capela e põem a santa à porta e assim afastam as trovoadas.
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Suponho que a história da aldeia também estará ligada fortemente ao Castelo de Monforte, não só pela proximidade mas também por ser aldeia que ficava no trajecto para o mesmo e para as suas importantes e famosas feiras, que em termos cronológicos da história, ainda há tão pouco tempo se deixaram de realizar.
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E sobre as Avelelas vai sendo tudo. À festa já fizemos uma passagem, embora breve, neste ano. Aos jogos populares que a Maria Baía com a ajuda de gente interessada da aldeia vai realizando nas suas férias de emigrante, já prometi que numa próxima edição estarei por lá para fazer a devida “reportagem”, bem merecedora, não só pela iniciativa mas também por manter viva uma das tradições das aldeias com os seus jogos populares que sempre animavam Domingos, feriados e dias de festa. Uma iniciativa que deveria, tanto quanto sei, ser mais acarinhada, não só por toda a população, mas também por entidades que possam ter interesse neste tipo de acontecimentos – se é que os há!
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O por hoje é tudo, sem contudo deixar por aqui o elogio que a aldeia das Avelelas também faz ao fio azul – o melhor, e ainda com muito poucos infiltrados laranjas.
Amanhã estamos de regresso à cidade com mais um ilustre flaviense.
Até amanhã!