.
Hoje vamos até à Bolideira.
Quando se fala da Bolideira temos que falar da Pedra da Bolideira que, por terras flavienses, é tão famosa como o Papa no Vaticano. E tal como o Papa, também por aqui toda a gente ouve falar dela, mas nem toda a gente a conhece pessoalmente. Então, hoje, para quem não conhece, vou apresentar-vos a pedra da Bolideira além da própria aldeia da Bolideira.
Comecemos pelo termo Bolideira.
Cá pelas nossas terras, como aliás por todo o Norte e um bocadinho por todo o nosso Portugal interior, trocamos os vês pelos bês. Começamos logo em bebés por ouvir essas trocas quando se começa a tomar o leite da “Baquinha”. Toda a nossa aprendizagem de criança foi feita à base da observação com um “Bê” isto e “Bê” aquilo, com um “bem” cá, ou aqui, enquanto nas nossas dietas alimentares a “bitela” nunca se desprezava e de adultos, sempre acompanhadas por um bom copo de “binho”. Enfim, o Bê faz parte da nossa linguagem como o ar faz parte da nossa respiração e, sinceramente, não vejo nenhum mal cultural nisso, antes pelo contrário, pois o bê faz parte da nossa identidade de “bimbos” como os “mouros” nos chamam, os mesmos que depois de sair das suas terrinhas, facilmente esquecem o que é um engaço.
.
.
Com a Bolideira, penso eu, que se passou o mesmo que com a troca dos vês pelos bês, pois a bem dizer, Bolideira deveria ser Bulideira, pois tudo indica que o termo da aldeia virá da sua famosa pedra que é conhecida por bulir. Mas tal como o “binho” não me incomoda desde que seja do bô, também a Bolideira não me incomodada desde que a pedra bula, e até hoje continua a bulir.
Tive o prazer de conhecer esta pedra da Bolideira desde muito cedo. A partir de aí, sempre que passo por lá, a paragem é obrigatória, quer vá sozinho ou acompanhado, para não falar das inúmeras vezes que levei lá alguém para a conhecer e conhecer o fenómeno de um simples mortal conseguir bulir uma pedra, que segundo os cálculos, rondará as trinta toneladas. Fotograficamente falando, também cada uma das vezes que por lá passo, a vou fotografando, aliás são bem notórias as diferentes estações do ano em que as fotografei no presente post. Mas ia eu dizendo, que paro sempre por lá. Gosto do vento nas faces durante o Inverno e até de aproveitar as sobras da pedra bolideira que bule durante os infernos de verão. É sempre um lugar calmo, onde a natureza se ouve na sua plenitude, com o chilrear da passarada, o ladrar distante de um cão, ou até a presença de uma cabra solitária, como no caso de ontem.
.
.
Gosto de parar por lá e tomar um pouco calmaria, sozinho ou acompanhado, tanto faz, o que interessa mesmo é ir por lá de vez em quando, já outros, melhor seria que por lá nunca tivessem indo, pois se alguém houve que teve a ideia de por lá fazer um parque de lazer ou descanso, com mesas e pedras de granito, também não faltou (infelizmente como sempre) mão criminal que as destruísse. Enfim, infelizmente também já vamos estando habituados a este tipo de atitudes e estupidez.
Bolideira ou bulideira da pedra que bule!, mas afinal onde é que a podemos encontrar!? E a aldeia!? Será que por lá só há pedra e nada mais!?
.
.
Pois quanto ao haver por lá alguma coisa, há sim senhor, meia dúzia de barracões, penso que uma oficina, e duas a três casas. Gente que a habite, penso que já não há, mas até nem é um caso de desertificação, pois penso que nos melhores dias da aldeia da Bolideira nunca foi habitada para além de uma ou duas famílias, mas sempre teve a sua importância, pois era terra de passagem obrigatória de muita gente e de todas as aldeias de montanha da Castanheira e do planalto das freguesias de Travancas, S.Vicente, Roriz, Cimo de Vila, Sanfins, Tronco e Bobadela, para não falar do pessoal de Lebução e restantes terras de Valpaços e Vinhais. A Bolideira funcionava como um entreposto da boa batata que se produzia em toda esta região que era obrigada a passar pela aldeia. Mas também isto, são rosários de um terço do passado.
.
.
Hoje a Bolideira, para além da presença física dos armazéns e das casas abandonadas (excepção para a oficina) é apenas um cruzamento na estrada cheia de placas indicativas e uma aldeia de passagem, mas, pode-se orgulhar sempre da sua pedra que para além de bulir, inspira muitas mentes pensantes da cidade, intelectuais e políticas. Afinal pedregulhos há-os por todos os lados e nem sequer é preciso ir à Bolideira. Mas mesmo assim, vale a pena ir por lá para conhecer a verdadeira e genuína pedra de bulir.
Agora a lenda:
- Conta que o fenómeno do bulimento da pedra foi descoberto um dia (em data imprecisa) quando um pastor apascentava os seus animais e reparou que um carneiro ao coçar os chifres na pedra a fazia mexer. Para confirmar o que seus olhos viam, o pastor resolveu colocar uma pequena vara de giesta entre o penedo movediço e um outro que estava fixo na base. Confirmou então que essa vara arqueava quando empurrava o penedo.
Lenda é lenda, o facto é que a tal vara está sempre lá para que um fenómeno físico de equilíbrio se verifique e nos faça pasmar como crianças.
.
.
A aldeia, ou lugar, ou cruzamento, ou entreposto, ou a pedra que bule, pertence à freguesia de Bobadela e fica a 18 quilómetros de Chaves, na E.N. 103, entre Chaves e Bragança, ou Vinhais, ou Lebução, tanto faz, pois a 103, desde Braga até Bragança, passa por estas e muitas mais terras, para além de ser um das principais vias de ligação de muitas aldeias à cidade de Chaves e para a Europa, pois é a mesma 103 (mas barra ou traço cinco) que nos leva até à fronteira.
.
.
E por hoje é tudo, no próximo fim-de-semana teremos por aqui mais duas aldeias. Até lá, vamos passando pela cidade de Chaves, os olhares, os discursos e até alguns desabafos sobre ela, a minha e nossa mui nobre cidade que tantos amam e alguns desprezam ou maltratam e exploram.