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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

05
Jun22

O Barroso Aqui Tão Perto - Freguesia de Dornelas - 2ª Parte

Boticas - Barroso


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O Barroso aqui tão perto - Freguesia de Dornelas - 2ª Parte

 

UM DOCUMENTO DE 1758

No ano de 1758 o Rei D. José, através do seu ministro Marquês de Pombal, desenvolveu um inquérito a todas as paróquias do Reino de Portugal continental que hoje se encontram no IAN/TT.

 

Este inquérito, que foi respondido pelos párocos das freguesias era composto de três partes. A primeira parte, respeitante á paróquia onde se tratava de saber da sua história, produções agrícolas, população, instituições locais, igreja e capelas com suas devoções e romagens, a segunda tratava dos rios e ribeiros que nela existissem, assim como das levadas e represas, moinhos e pisões, e a terceira perguntava pela serra e por todas as suas caracteristicas, se tinha lagoas e nascentes, monumentos, capelas, caça e árvores.

 

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Gestosa

É graças a este inquérito que se pode obter uma visão mais ou menos completa de como era a freguesia e o Couto de Dornelas, nos meados do século XVIII como abaixo se vê. Esta memória paroquial é particularmente importante na informação que dá sobre o funcionamento do couto e da sua economia que mais tarde viria a ser complementada pelo levantamento feito por Columbano Pinto de Castro no ano de 1796 do qual se extraiu a informação que permitiu a construção do quadro atrás analisado.

 

Breve cópia de relação e fundação deste Couto de Dornelas da comarca de Chaves, do Arcebispado de Braga Primaz das Hespanhas.

interrogatório

Fica este Couto na Província de Trás-os-Montes, confronta pela parte do Sul e a Poente com a província do Minho. No espiritual pertence a comarca de Chaves e ao Arcebispado de Braga Primaz. O seu termo compreende somente uma freguesia que tem por orago o Apóstolo São Pedro.

 

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Gestosa

É esta freguesia Couto dos senhores arcebispos de Braga, por doação e mercê que dela lhe fez o Senhor Dom Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal. O motivo que para isso houve foi o seguinte: no tempo em que Senhor Conde Dom Henrique da Litoringia, com o seu célebre esforço andava na expulsão dos Sarracenos, que nesse tempo ocupavam estas terras, ao chegar a esta terra os encontrou tao fortificados que combatendo-os em vários combates não conseguiu destruir a praça ou muralha em que se achavam fortificados no que chamavam a cidade de Genestota, vocábulo que se transformou em Genestoza. Vendo-se o Senhor Conde D. Henrique neste conflito recorreu a Deus prometendo esta terra a Virgem Santíssima Nossa Senhora Santa Maria do Hospital. E assim que fez a promessa os tomou a combater e logo os venceu, assolou e destruiu. E não podendo por em execução, a promessa que linha feito, até as portas da sua morte, encontrando-se na cidade de Astorga no reino da Galiza, ali mandou chamar seu filho o Senhor Afonso Dom Henriques, lhe disse e pediu que lhe cumprisse aquela promessa a Nossa Senhora, dando-lhe aquela terra. Como lhe tinha prometido, o Santo Príncipe executou-a quando lhe foi possível, a ela veio ele próprio na companhia do senhor Dom Plázio Arcebispo de Braga e a deu e doou a Nossa Senhora na forma seguinte: Em nome do Pai e do Filho e do Espirito Santo. Eu servo de Deus o infante Dom Afonso Henriques faço, dou a Santa Maria e àquele hospital de Dornelas para remédio da minha alma ou dos meus parentes e é aquele couto terminado em primeiro lugar a Lucenciam e depois (vai) à Portela Figueiras que depois (vai) ao Penedo (Pena Boa) depois à carvalhosa depois a Mossa de Subverso depois à Fraga da Graça (Graçalios) depois a Pena Petrovili depois Arco (Arcem) de Lagena, depois ao Couto de Cividade de Genestosa a Lucencia onde iniciamos; tudo o que dentro deste couto pertence ao império real tudo isso pagamos, disto foi feito por mão do Senhor Paio (Mendes) Arcebispo da Sé de Braga. E se algum homem vier ou virmos que este (instrumento) feito nosso tentar infringir primeiramente seja excomungado e mal pague uma libra de ouro e este nosso instrumento feito nosso permaneça firme. Eu Infante Dom Afonso confirmo pela minha mão este Couto a que foram presentes Paio testemunha, Pedro testemunha, João testemunha, Gongaio testemunha, Rodrigo testemunha, Egas Moniz confirmo Ermigio Moniz confirmo Gomezio Mendes confirmo Gueda Mendes confirmo... Couto que fez o Infante Dom Afonso a Santa Maria e ao Hospital de Dornelas. Em nome do Pai e do Filho e do Espirito Santo eu servo de Deus, Infante Dom Afonso, faço couto dou a Santa Maria e aquele Hospital de Dornelas para remédio da minha alma ou dos meus parentes e é aquele couto terminado (limitado) por todos os seus vizos que são no circuito tudo o que dentro desse couto e pertence ao império real tudo isso é pago e isto foi feito por mão do Senhor Paio Arcebispo da Sé Bracarense que se algum homem vier que este couto tentar infringir primeiramente seja excomungado e pague uma libra de ouro é este nosso instrumento permaneça firme. Eu Infante Dom Afonso neste couto com a minha mão roboro (confirmo) Paio testemunha, Pedro testemunha, João testemunha, Gonçalo testemunha, Rogus (sic) testemunha, Egas Moniz confirmo Ermigio Moniz confirmo Mendes Moniz confirmo, Mendes Moniz confirmo, Gomes Mendes confirmo, Geda Mendes confirmo, Mendo presbítero escreveu...

 

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As quais doações aqui copiei de uma certidão autêntica que em meu poder tenho e foi tirada autênticamente do arquivo da Sé Primaz de um livro que nele se acha intitulado Tomus tertius Rerum Memorabilium as folhas cento e oitenta e três até ao cento oitenta e cinco, como da mesma certidão mais largamente consta Este couto não paga dízimos nem promissa de frutos alguns que colha. Mas, em seu lugar paga quinze arrobas de cera amarela, todos os anos, à Mitra Primaz de Braga para o que houve Bula Pontifica por contrato e ajuste que fizeram os moradores dele com o Senhor Arcebispo, que a tradição foi o Senhor D. Frei Bartolomeu dos Mártires.

 

Não pagam siza de compras nem vendas dos bens no dito Couto, mas por ser muito pequeno o seu termo e não poderem os moradores dentro criar os seus gados, para os pastarem fora pagam trinta mil réis em cada ano ao cabeção da siza da vila de Montalegre, vão-na entregar a Vila Real e lá tiram paga dela.

 

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Lousas

4°. Tem este Couto e freguesia cento e sete fogos e quatrocentas é nove pessoas. Destas acham-se absentas quarenta e sete.

 

interrogatório - Está este Couto situado entre montes a toda a volta pelas suas divisões. Dele para fora não se avistam povoações para parte alguma por ficar baixo, razão porque é muito doentio e sujeitos os frutos a tolherem-se com a geada.

 

interrogatório — Consta esta freguesia de seis lugares, a saber: Vila Grande que é a cabeça do concelho e freguesia, Antigo, Vila Pequena, Gestosa, Lousas e Casal de Guimbroa. Que todos são do termo e distrito do Couto mesmo que assim o não queiram conceder os Abades da igreja de Santa Maria de Covas do Barroso, pois movendo estes demandas a alguns moradores do Antigo e outros de Gestosa pedindo-lhe dízimos dos seus campos. Por conclusão, o Couto foi demarcado no ano de mil setecentos e três na presença do Doutor Ouvidor e Procurador Geral da Mitra, justiça e Câmara do Couto, justiça e Câmara de Cabeceiras de Basto, justiça e Câmara da Vila de Montalegre e todos os povos circunvizinhos.

 

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Lousas

Concluindo o acto de demarcação, tomou, o que então era abade de Covas, a meter-se com palavras fribulas e sophislicas com os moradores de Gestosa e se tornou a meter de posse de alguns bens do dito lugar, entrando a obrigar os pobres moradores pelos dízimos em que os trouxe muitos anos debaixo de censuras, pondo-os na mais consternação que considerar se pode e os compelio, pela posse que intrusamente tomou, a pagarem dízimos do que nunca se pagou pois até aquele tempo se nado pagava no dito lugar de Gestosa sanjoaneira e agora a pagam mas contra a razão pois avista das doações acima foi este povo a causa de se fazer este Couto.

 

Está tão próxima a fortaleza em que os mouros se fortificaram e resistiram ao Conde o Senhor Dom Henrique, que do alto dela se chega com uma pedra de funda às casas do mesmo povo. Este conservando ainda o nome da antiga cidade Genestoza, ainda vendo-se pelas casas antigas do mesmo povo e paredes dos campos feitas e lavradas que bem mostram ser de antigas habitações. E sobretudo da doação se vê claramente o que o Senhor Dom Afonso deu a Nossa Senhora pois diz a primeira doação nesta parte falando usque ad cautum civitatis Genestosa (até ao da cidade de Genestosa); e porque algum dia poderia haver dúvidas como há, declarou a sua vontade e atenção na segunda doação, que logo fez, onde diz: per suos vizus qui sunte in circuitu (por seus vizinhos que estado ao redor) donde claramente se vê pois ficam em roda deste Povo e seus campos para a parte do norte e entre norte e nascente este monte que é ramo da serra das Alturas. Pela parte do norte se chama o Mourisco e decaindo para o nascente se chama ainda hoje a Luzenga que é até onde aquele sempre memorável Príncipe doou a Nossa Senhora e aos Senhores Arcebispos de Braga. E assim se devem entender as doações acima sobreditas, eu assim o entendo e afirmo pelas ordens que professo.

 

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Lousas

interrogatório - A igreja matiz deste Couto acha-se situada no lugar de Vila Grande, dentro do corpo do lugar, mais pendente para a parte do Nascente, entre as casas dos moradores e tem a residência do pároco dentro do adro dela.

 

Interrogatório - Tem por orago e padroeiro o Apóstolo São Pedro, esta colocado no altar-mor da mesma igreja. Tem mais no mesmo altar, na parte da Epístola Santo António e São Libório, ambos em vulto e da parte do Evangelho o padroeiro São Pedro e o da Senhora do Pilar, todos em vulto.

 

Tem mais três altares colaterais, dois encostados ao arco da capela-mor e um metido de acostam da parte do sul. No da parte do Evangelho é padroeira nele Nossa Senhora da Conceição. Tem mais a parte da Epístola São José e a do Evangelho Santa Ana, todos em vulto. O altar da parte da Epístola é intitulada de São Sebastião tem o mesmo Santo em vulto e o menino Deus da mesma sorte; o que esta na costam da igreja intitula-se o altar das Almas.

 

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Lousas

Estão neles pintadas e retratadas, em penas no meio do altar está um Senhor pregado numa cruz de bastante grandeza. Todos estes Santos são festejados no seu dia com uma missa cantada organizada por mordomos.

 

Há nesta igreja o sacrário do Santíssimo Sacramento colocada no meio do Altar-mor. Tem renda para sua subsistência e fabrica, que não sei ao certo o que pouco mais ou menos será quinhentos mil réis. Tem uma irmandade das Almas debaixo da proteção do Santíssimo Sacramento. Terá até duzentos irmãos e de casco até seiscentos mil réis pouco mais ou menos. O Santíssimo Sacramento venera-se no dia do Corpo de Cristo com exposição, missa cantada e sermão. Não tem esta igreja naves.

 

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interrogatório - O pároco desta freguesia tem o título de Vigário, é colado, o seu padroeiro e o Senhor Arcebispo. Esta igreja é uma das da sua Camara da Mitra Primaz, tem de estipéndio seis mil e quinhentos réis. Rendera de um ano para outro setenta mil réis pouco mais ou menos.

 

9 Interrogatório — Não há que responder. Nem também ao décimo, décimo primeiro e décimo segundo pois não há nada do que nestes quatro se pergunta.

 

13 Interrogatório - Tem esta freguesia cinco capelas. Uma de São Caetano na lugar do Antigo, junto ao povo, colocada ao pé da estrada que vai da Vila Grande, Cabeça desta freguesia, para a vila de Chaves. Os seus moradores o festejam no seu dia com missa cantada sempre e sermão alguns anos. Tem a mesma capela uma imagem em vulto de Nossa Senhora da Guia que também se festeja muitos os anos, aos 15 de Agosto, com missa cantada e sermão. Não tem fábrica nem rendimentos alguns. Tem mais outra capela no lugar de Vila Pequena com o título de Nossa Senhora das Neves, é Senhora milagrosa, a ela concorrem no seu dia alguns romeiros dos povos circunvizinhos. Seus moradores fabricam a capela e festejam a Senhora com missa cantada e sermão todos os anos.

 

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Vila Grande

Tem os moradores do lugar da Gestoza outra capela com o orago de Nossa Senhora do Bom Despacho e o São Bento, ambos em vulto. Fabricam os seus moradores a tal capela e veneram o Santo com missa cantada todos os anos e em alguns também há sermão.

 

Os moradores do lugar de Lousas tem também capela com o orago de São Marcos, veneram-no no seu dia com missa rezada, porém em alguns anos é cantada. Tem outra capela, no monte de {Terreiro} junto a estrada que vem de Chaves para o Couto, com o título de Santo Antão. E muito antiga e conta a tradição que foi igreja matriz ainda no tempo dos mouros. O que parecia ser provável antes de se reconstruir porque tinha a forma de corpo de igreja e capela-mor, tudo muito pequenino e com o seu adro à volta tapado. Hoje reconstruiu-se de novo a fundamentis com esmolas de algumas benfeitorias e outras que os seus devotos lhe oferecem. E um Santo milagroso para os animais. Como já disse, esta capela fica no monte de Terreiro, defronte a igreja matriz deste Couto, no seu termo e a ela pertencente como todas as que tenho feito menção neste interrogatório.

 

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Vila Grande

Interrogatório — Colhe-se nesta terra centeio, milhão, milho-alvo e painço, vinho e castanha, mas o que mais é abundante é o centeio e a castanha. Mas nem por isso deixam os moradores de comprar pão, quase todos, por se lhe tolher muito com a geada e ser muito apertada a terra que se fabrica.

 

interrogatório — É este Couto de Dornelas da Mitra Primaz, como tenho dito, e todas as suas justiças são postas por ela. Tem juiz ordinário e dos órfãos, vereador e procurador que são eleitos pelo Doutor Ouvidor de Braga. Tem a sua carta de ouvir, estes elegem a Câmara para o que têm o seu escrivão que serve todos os ofícios do publico, judicial, notas, órfãos e câmara. Também estes ofícios são dados pelos senhores Arcebispos de Braga, a quem pertence tudo no espiritual e temporal! dentro deste Couto.

 

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Vila Grande

Interrogatório - Já respondi.

 

interrogatório — Não tenho que dizer.

 

interrogatório — Não tenho que responder.

 

 interrogatório — Não tenho que dizer, só que não há correio e se servem, os moradores deste Couto, de muitos conforme o negócio para onde escrevem. O mais comum é pelo de Cabeceiras de Basto, que fica onde chamam a Rapozeira. Dista quatro léguas deste Couto, nado sei ao certo o dia que parte nem até onde chega.

 

interrogatório - Dista este Couto da cidade de Braga, capital do Arcebispado, dez léguas, e de Lisboa sessenta e seis, oiço dizer, mas nunca aí passei, nem sei ao certo.

 

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Vila Grande

interrogatório - Já no princípio desta breve relação dei conta e copiei as doações deste Couto, agora só me resta dizer que os moradores dele têm obrigação não só de fabricar o corpo da igreja matriz, mas também a capela mo re ornamentá-la com todo o necessário, dar a paga ao pároco, camo disse no ponto 8 e fazer aposentadoria ao Reverendo Visitador quando vem visitar esta igreja. E não tem para ela mais do que três mil réis e isto esta disposto por decreto do senhor Arcebispo inquisidor Geral passado no ano de mil seiscentos e setenta e seis e depois confirmado por outros prelados. E se o Reverendo Visitador gastar mais o repõe ou perde o juiz da freguesia que é o que esta obrigado a fazer aposentadoria.

 

Antigamente tinha a justiça e Câmara deste Couto a regalia e prerrogativa de nomear o pároco para esta igreja, era cura de São João a São João. Os senhores Arcebispos de Braga, por distúrbios que nisto havia, lhe tiraram esta liberdade e puseram encomendados na igreja cinquenta anos. E depois, a deram colada, haverá trinta e oito anos que segue a natureza de colada e se tem dado a três párocos. Não tenho mais coisa alguma que responda e este interrogatório nem aos mais que se seguem até ao número 27.

 

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Tratado segundo das serras e montes que se encontram a volta do Couto e na sua jurisdição, reduzido tudo a um.

 

Principiando pela parte do Norte a esta parte fica a Serra das Alturas. Desta descem dois ramos, um que desce entre Vilarinho Seco, que é lugar da freguesia das Alturas, e a Ribeira de Gestosa pela parte do Nascente e chega até direito do lugar de Agrelos que é povo da freguesia de Santa Maria de Covas de Barroso. Terá esta serra meia légua de comprimento. E infrutífera, não produz mais do que urzes. Tem muita pedra que fora da terra se estão vendo e são de má qualidade, pois são de sua natureza bravas, duras e ásperas, mas da gram branca. Esta serra é por natureza seca e não produz ervas medicinais conhecidas. A esta serra chama-se Luzença, outros chamam-lhe a Costa por ficar muito ao cimo para quem vai da Giestosa para o supracitado lugar de Vilarinho.

 

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Vila Pequena

E a outro braço da serra das Alturas vem pela parte do norte discorrendo para o poente, chama-se o Mourisco e outros chamam-lhe a serra da Carvalha. Vem esta serra dividindo o Couto, e o seu termo, do de Montalegre e acaba onde lhe chama a Ganidoura, ou ponte das Barjas. É de sua natureza seca e muito fria e no Inverno acha-se muito tempo coberta de neve. Não produz árvores nem ervas medicinais, mas sim muitos lobos que nela se criam pela sua aspreza. Tem matos, urzes e pedras, tem e aí cria alguns coelhos e perdizes. Não produz senão centeio em algumas partes mais abrigadas.

 

Defronte a este monte da Ganidoura, olhando em volta se vê e segue-se o monte do Mugadouro que fica ao Poente aos moradores do Couto. Deste nasce um braço que vem pelo Couto abaixo pela parte do Sul.

 

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Vila Pequena

Esta serra no seu inicio chama-se a Pedradeira, por onde vem a estrada de Basto e Salto para o Couto. Finda esta serra dentro do mesmo Couto onde chamam a Figueira da Cabra. Tem de cumprido uma légua. Esta serra produz muita colmeia, tem muita castanha e vária caça como javalis, corgas, coelhos, lebres, perdizes e também lobos; dizem-me que nela se tem visto algumas vezes gamos e veados.

 

 Em conferência desta serra sobredita corre igualmente outra que se chama a Lomba de Melcas, que faz a divisão do termo do Couto do concelho de Cabeceiras de Basto, cujo termo vai pelo cume, ou serro da serra abaixo e vai findar o termo com a serra onde chamam o Mosteiro que é um porto onde se passa deste Couto para o lugar do Penedo, da freguesia de Gondiães do concelho de Cabeceiras de Basto. Esta serra tem a mesma natureza, comprimento e caça que a de cima e ambas correm de Poente para Sul, iguais na altura e no comprimento.

 

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Vila Pequena

Este Couto tem mais um monte da parte do Nascente que fica defronte aos lugares dele e encobre a vista a todos os lugares e terras circunvizinhas. Este defronte ao lugar do Antigo, chama-se Terreiro é onde esta a Capela de Santo Antão a que já fiz menção.

 

Em seu lugar, e subindo mais ao alto do monte se chama Pinheiro o  qual é por uma e outra parte do termo do Couto. Fica entre Nascente e Sul aos moradores do lugar de Giestosa. Tem este ao pé de si outro monte chamado o Crasto que foi onde os mouros se fortificaram para resistirem aos seus adversários. É este monte redondo, pequeno e descortinado da parte do Poente, Norte e do Nascente lhe fica o monte Pinheiro que o cobre e defende.

 

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Vila Pequena

 

Esta fortaleza, ou monte Castro, foi murada com três ordens de muralhas: a primeira cerca-o pelo meio em roda, a segunda mais acima coisa de quarenta passos, e a terceira em todo acima em toda a roda e terá de comprimento de Norte a Sul cem passos e de Nascente a Poente cinquenta. Hoje se acham os seus muros quase que todos arruinados, mas ainda se vêem os seus fundamentos e em algumas partes se acha ainda parte dos mesmos muros. No cimo desta muralha para a parte sul descobre-se uma porta, que oiço dizer por tradição, que é uma estrada falsa que eles tinham feito para ir buscar água a um ribeiro que passa a beira da fortaleza, mas to fundo que são mais de seiscentos passos de onde se divisa a porta abaixo ao ribeiro.

 

Este monte é todo fragoso. Esta ainda cheio de pedras virgens que nunca foram movidas nem quebradas. [Não há] em todo este monte, nem dentro da fortaleza, vestígios de ter existido casa alguma, Está todo coberto de urzes e matos, não tem arvores em si e só o redor está povoado de castanheiros, dos moradores daquele lugar. Que eu saiba, nenhum dos montes acima tem minhas, nem ervas medicinais, nem águas com virtudes especiais de que se possa fazer menção.

 

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Festa do S. Sebastião

 

Terceiro tratado, dos rios e suas propriedades.

 

Tem este Couto três regatos. Um nasce e começa onde chamam Rebordelos, do distrito e termo do lugar de Vilarinho Seco das Alturas. Nasce muito pequeno e assim vem descendo pela ribeira do lugar da Gestosa. Os moradores dos dois lugares de suas águas livremente para cultura dos seus campos, para regar os frutos e as suas ervas. Este regato corre de Norte para Sul, tudo por terras do Couto e seu termo, vai passando à beira de Vila Pequena onde os moradores também se serve dele usando as suas águas para limar os prados e regar os frutos dos seus campos; depois vai-se meter e incorporar o que vem de Cerdedo entre o lugar do Antigo e a Vila Grande. Tem este regato uma ponte de pau onde chamam o Troviscal, que fica no caminho que vai da Gestosa para Vilarinho Seco do termo e concelho de Montalegre; tem outra ponte de pau onde chamam o Sabugueiro, abaixo da Giestosa na estrada que vai para Vila Pequena; tem outra mais abaixo onde chamam a Telhada entre vila Pequena e um monte chamado a Gramela; Tem outra entre Vila Pequena e o Antigo no sitio a que chamam Candelas; tem outra entre Vila Grande e Antigo no sítio chamado Porto Carreiro, todas de pau e todas nas estradas que vão de uns lugares para os outros. Tem este ribeiro seis moinhos negreiros que só no inverno moem, por falta de águas, no Estio descansam.

 

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Festa do S. Sebastião

 

O ribeiro que de Cerdedo desce entra neste Couto no sítio onde chamam as Varges e desce por montes bravos até onde chamam a Codeçosa e assentando aí o seu curso vai brandamente correndo regando os prados dos moradores de Vila Grande que usam também [as suas águas] para regarem os frutos dos campos. Vai correndo em roda e cercando os campos do dito lugar até vir incorporar com o que vai da Gestosa, onde chamam o Espinhagal e juntos ambos seguem o seu curso até se juntarem com outro que vem do lugar de Agrelos, a que chamam Rumião. Juntos vão correndo, fazendo a divisão entre o Couto e o termo de Montalegre até onde chamam o Mestras, que juntos ai com o rio chamado Beça vão as suas águas parar ao rio Tâmega no sítio chamado Ponte de Cabes (sic, por Cavez).

 

Tem este rio que vem de Cerdedo uma ponte de pau onde chamam a Fraga, outra onde chamam Tijosa, outra no sítio chamado Água Longa e outra desde que ambos se juntam, a que chama a Ponte do Antigo por ficar próxima daquele lugar. Este rio teve, noutro tempo, outra num sítio chamado Piagro Negro, num atalho que ia deste Couto para o lugar de Covas. Este rio tem alguns moinhos negreiros que moem todo o ano.

 

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Festa do S. Sebastião

 

Todos estes regatos trazem as suas trutas e bogas, nele não há pesqueiras nem poços de senhorio, geralmente [a pescaj é livre excepto nos meses de defeso.

 

Tem este Couto outro regato que nasce acima do Casal de Guimbroa e vem descendo a beira dos campos deste povo, correndo entre Poente e Norte, vem descendo pelos campos do lugar de Lousas, de que toma o rio o nome nome, chama-se rio de Lousas, e vai desaguar nos outros, que também nascem no Couto, no sítio onde chamam o Mosteiro. Este rio tem alguns moinhos negreiros. Traz e cria seus peixes como são: trutas, bogas e escalos. Os seus moradores usam livremente as suas águas para limar e regar os seus campos. Não sei que as suas águas tenham alguma propriedade rara de que se faça menção nem que em suas áreas se achem [faíscas] de ouro.

 

Isto é tudo quanto se me oferece a responder aos interrogatórios, que tudo é e vai na verdade e se necessário eu afirmo I juro in verbo sacerdotis.

 

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Festa do S. Sebastião

 

Couto de Dornelas, 18 de Março de 1758, o pároco desta igreja o padre José Pinto da Silva. Vai também assinada pelo revendo Abade de Cerdedo e pelo Reverendo Vigário de Gondiães, de cada um os seus nomes.

Abade de Cerdedo Vicente Ferreira de Alcantara

O Vigário Domingos Ferreira Alves

 

Referências documentais:

IAN/TT, Memórias Paroquiais, vol. 13, memória 27, fl. 157.

ADVR, Registo de Óbitos: 1871-1882. Total de Livros: 1.

I.I.P.: Castro de Giestosa/Castro do Souto da Lama; Pelourinho de Dornelas.

 

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Festa do S. Sebastião

 

TRADICÕES E FESTIVIDADES

Ao longo dos tempos, muitas das festividades que outrora animavam estas comunidades foram-se perdendo. Todavia, algumas resistiram a erosão dos tempos e continuam a realizar-se.

 

Ainda cantam os Reis. A Banda Musical de Dornelas dá a volta pelas aldeias a cantar os Reis. O que as pessoas oferecem é para a banda pagar o ordenado mensal ao seu mestre. Antigamente as pessoas juntavam-se em grupos a cantar os Reis.

 

“Abram-se essas portas

Que ainda não estão bem abertas

Que aqui vem os do presépio

Vem lhe dar as boas festas.”

 

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Festa do S. Sebastião

As pessoas costumavam dar ovos, chouriças, dinheiro. Com o dinheiro, mandavam rezar uma missa. O resto era utilizado, uns dias depois, para fazer uma função.

 

Todos os anos, no dia 20 de Janeiro, realiza-se aquela que é uma das mais importantes festas de cariz comunitário: a Mezinha de S. Sebastião ou Festa das Papas, como era inicialmente conhecida. As origens desta festa perdem-se nos tempos. Diz a memória popular que, aquando da segunda invasão francesa, em 1809, comandada pelo general Soult, o povo de Vila Grande avistou os soldados a passar numa estrada, a estrada velha, perto das aldeias do Couto de Dornelas e sabendo que por onde passavam, saqueavam tudo, imploraram a protecção divina.

 

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Festa do S. Sebastião

Pegaram na imagem de S. Sebastião, saíram com ele à rua, levaram-no até à torre da igreja e prometeram ao Santo que todos os anos realizariam uma festa em sua honra se as tropas não descessem até às aldeias. Eis que o milagre se deu, caiu uma grande nevada e as tropas passaram ao largo das aldeias e o povo, agradecido, cumpriu a promessa.

 

Existe também outra lenda de que esta festa se começou a fazer depois de uma grande peste que matou muitos animais na freguesia. Desesperadas, as pessoas pediram protecção ao Santo, prometeram-lhe que todos os anos fariam a festa em sua honra se os livrasse de tão terrível maleita. Feito o milagre, o povo cumpriu a sua promessa.

 

Certo ano faltaram ao prometido e não celebraram a festa, contam que por causa disso deu uma moléstia nas patas dos animais e, nesse ano, não os puderam utilizar para os trabalhos agrícolas. Em desespero de causa, arrependidos pelo incumprimento da promessa, imploraram novamente a protecção ao Santo e desde então para cá a festa tem-se realizado no dia 20 de Janeiro de cada ano.

 

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Festa do S. Sebastião

A organização desta festa, refeição comunitária, está a cargo dos mordomos, inicialmente os 9 maiores lavradores da aldeia de Vila Grande, os que tinham mais posses, num sistema de rotatividade entre eles.

 

São os mordomos, com a ajuda de familiares e amigos, que arranjam e preparam a comida servida na refeição comunitária (pão, carne e arroz). Dada a dimensão desta festa, tudo tem que ser preparado com muita antecedência. Por altura do Natal, andam pelas casas das aldeias da freguesia a recolher os cereais (centeio e milho) para fazer as broas. Em Janeiro, recolhem os restantes donativos: carne de porco (essencialmente peito e queixadas) e dinheiro para comprar o arroz.

 

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Festa do S. Sebastião

Além de procederem à recolha destes produtos, arranjam lenha para cozerem as broas e para cozerem os alimentos; e procedem à moagem dos cereais em dois moinhos locais.

 

A comida é confeccionada na “Casa do Santo”. Esta casa, construída para o efeito com o apoio da Câmara Municipal, tem uma cozinha com uma lareira, um forno grande, uma amassadeira eléctrica e uma sala para armazenar as broas.

 

Durante cerca de cinco dias e cinco noites cozem as centenas de broas que vão ser distribuídas ou vendidas no decorrer da festa. No dia 19, à meianoite, acendem o lume na lareira da “Casa do Santo”, à volta do qual dispõem mais de 20 potes de ferro com a carne partida aos bocados, a cozer. No dia 20, assim que toca o sino para a missa, colocam-se os potes com o arroz a cozer.

 

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Festa do S. Sebastião

Finda a missa, seguem em procissão com o Santo até à “Casa do Santo”, onde o padre procede à bênção do pão, da carne e do arroz.

 

Pode então iniciar-se a distribuição da comida. Na principal rua da aldeia, ao longo de centenas de metros, estão colocados os bancos de madeira, cobertos com alvas toalhas de linho – a mesa – onde, de vara em vara, será colocada a comida: broa e dois pratos de madeira, um com carne outro com arroz.

Esta refeição é para todas as pessoas que a ela acorram. Pratos e talheres cada um leva os seus, assim como a bebida para acompanhar tão salutares alimentos. Entretanto, o mordomo percorre a mesa dando o S. Sebastião a beijar e recolhendo as dádivas que cada romeiro queira oferecer ao Santo.

 

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Festa do S. Sebastião

Dizem que, por ser benzida, esta comida tem propriedades curativas; de tal forma que as broas podem-se guardar muito tempo que não criam bolor. Tais são os benefícios que lhe são atribuídos, que muitos são os que levam pedaços, senão mesmo broas inteiras, para casa, para comer ou dar aos animais para que não padeçam de maleita nenhuma.

 

São Brás, 3 de Fevereiro, Espertina. Este Santo é o padroeiro desta aldeia, assinalando-se este dia com uma missa.

 

O Entrudo, trazia muita alegria e folia como saudosamente recordam os informantes. Encaretavam-se e andavam pelas aldeias da freguesia, enfarinhavam-se e atiravam farinha a quem encontrassem pelo caminho. Hoje são poucos, essencialmente crianças e jovens, os que se vestem de caretos.

 

No dia de Entrudo as refeições são à base de carne de porco (orelheira, pés) e um petisco especial a que chamam o “Bucho do Entrudo”, enche-se o bucho de um porco com farinha (centeio, trigo ou milho) misturada com ovos, açúcar e há quem lhe misture também chouriço. Coloca-se num pote e coze-se. Depois serve-se cortado as fatias.

 

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Festa do S. Sebastião

 

Na Páscoa costuma realizar-se a visita pascal. Antigamente, nesse dia costumavam jogar os panêlos. Os jovens juntavam-se num grupo numa rua ou largo da aldeia, faziam uma roda e atiravam um panêlo uns aos outros. Perdia quem o deixasse cair.

 

São Marcos, 25 de Abril, Lousas. Assinalam o dia deste Santo, padroeiro da aldeia, com uma missa.

 

No S. João (24 de Junho) e no S. Pedro (29 de Junho) — Padroeiro da freguesia — faziam as tranquilhas das ruas com carros dos bois, paus e cancelas. Esta tradição acabou por desaparecer.

 

São Bento, 11 de Julho, Gestosa. Assinalam o dia deste Santo, padroeiro desta aldeia, com uma missa.

 

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Festa do S. Sebastião

Nossa Senhora das Neves, 5 de Agosto, Vila Pequena. Assinalam o dia dedicado a esta Santa, padroeira desta aldeia, com uma missa e procissão de andores, acompanhada com uma banda musical, pelas principais ruas da aldeia. à noite, a festa prossegue num animado arraial popular.

 

São Caetano, 7 de Agosto, Antigo de Dornelas. Assinalam o dia dedicado a este Santo, padroeiro desta aldeia, com missa.

 

Nossa Senhora dos Remédios, 17 de Agosto, Vila Grande. Assinalam esse dia com missa e procissão de andores, acompanhada com uma banda de música, pelas principais ruas da aldeia. A noite a festa prossegue com um conjunto que anima o arraial popular.

 

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Festa do S. Sebastião

 

Por altura das festas do final do ano (Natal e Ano Novo) costumam fazer as Fogueiras de Natal, reacendidas por altura da passagem de ano, a volta das quais as pessoas se reúnem e num ambiente de partilha e comunidade celebram o final de um ano de labutas e recebem o novo ano, mais um em que o ciclo se renova e a tradição perpetua.

 

Conclusão

 

Para concluir, apenas vamos deixar o nosso habitual vídeo, não com a totalidade das imagens que já aqui publicámos, de cada uma das aldeias da freguesia, pois cada aldeia teve o seu vídeo, mas um vídeo da freguesia com as imagens do post de hoje. Para rever os vídeos de cada uma das aldeias, a seguir ao vídeo de hoje fica um link para o post de cada aldeia da freguesia.

 

 

 

Agora os nossos vídeos também podem ser vistos no MEO KANAL nº 895607

 

Link para os posts das aldeias:

Antigo

Casal

Espertina

Gestosa

Lousas

Vila Grande

Vila Pequena

 

*********************

 

[i] COSTA, Avelino Jesus, 1997 (2° Edição), O Bispo D. Pedro e a organização da Arquidiocese de Braga, vol. I, Braga, Ed da irmandade de S. Bento da Porta Aberta, p. 416

[ii] definição do tempo de D. Dinis citado por António Caetano do Amaral in, COSTA, J.Avelino, 1959, O Bispo D.Pedro II e a Organização da Diocese de Braga, Coimbra.

[iii] MENDES, J.M.A., 1981, Trás-os-Montes nos fins do séc. XVIII, Coimbra, INIC, pp. 376

[iv] MENDES, J.M.A., ob-cit., pp.377

[v] Alexandre Herculano considera que um dos factores da formação de alguns concelhos assentou na organização dos homens que se agruparam em comunidades concelhias com vista à sua liberdade pondo fim a servidão.

[vi] BORRALHEIRO, Rogério, 2005, Montalegre, Memorias e História, Ed. Câmara Municipal de Montalegre.

[vii] Os concelhos quase sempre preferiam depender directamente do Rei. Columbano Pinto Ribeiro de Castro, juiz demarcante da província de Trás-os-Montes conforme a lei de 1730, em 1796 propôs a extinção do Couto de Dornelas e a sua integração no Concelho de Montalegre porque a administração eclesiástica se tornara muito prejudicial a tranquilidade pública evitando-se as desordens que se praticão em semelhantes coutos.

[viii] FREIRE, Anselmo Braancamp, 1909, A Povoação de Trás-os-Montes no séc. XVI, Arquivo Histórico Português, Lisboa, pp272.

 

 

22
Mar22

Chaves de Ontem

Século XX, o Século das motorizadas


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Eis uma fotografia documento, não pelo que mostra de casario que, hoje em dia, ainda se mantém quase igual, mas por um elemento que aparece em abundância nesta imagem – a motorizada, que na época da foto, 1972, inundava as estradas de Portugal.

 

Motorizada portuguesa e em Portugal cuja história se pode resumir ao século XX, embora ainda neste século haja algumas resistentes a circular nas nossas estradas, cada vez menos, é certo, mas ainda com a funcionalidade para que foi criada, sem contar com a moda das recuperações e restauros, mais para colecionistas e amantes das duas rodas do que para desempenharem as suas verdadeiras funções para que foram fabricadas, a de satisfazer a mobilidade das classes mais baixas de baixos salários, isto quando a motorizada atingiu o seu apogeu  em número a circular nas estradas portugueses, nomeadamente nos anos 60 a 80, com a motorizada de 50 cc , na grande maioria com marcas de fabrico nacional onde se destacou a marca CASAL.

 

Assim a história da motorizada em Portugal pode-se resumir em três momentos. O inicial desde inícios do século XX até aos anos 60, imediatamente antes de o automóvel começar a surgir em força nas estradas portugueses, momento esse em que a motorizada ainda não era acessível à maioria das bolsas dos portugueses. O segundo momento é o da democratização da motorizada, entre os anos 60 e 80, de fabrico nacional, com 50 cc de cilindrada e custos compatíveis com baixos salários, a maioria dos salários dos portugueses, que fez com que as motorizadas passassem a marcar presença em quase todos os lares e que chegavam mesmo a transportar famílias inteiras. O terceiro momento verifica-se entre os anos 80 e o final do século em que a democratização do automóvel e o seu mercado de usados, acessível às bolsas mais baixas, fez com que a motorizada ficasse encostada a um canto lá de casa, não havendo procura de novas motorizadas, o que levou à falência das fábricas portuguesas de motorizadas. A CASAL que durante 40 anos produziu e comercializou perto de 80  modelos de motociclos, acabou por fechar definitivamente as suas portas no ano de 2004, terminando assim a maior unidade fabril do setor em Portugal.

 

12
Set21

O Barroso aqui tão perto - Casal

Aldeias do Barroso - Concelho de Boticas


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CASAL - BOTICAS

 

20 de janeiro de 2018, a promessa que temos com o S. Sebastião,  leva-nos até às Vila Grade, logo pela manhã, bem cedo, na hora de a(s) rua(s) da aldeia receber(em) os primeiros visitantes, peregrinos, forasteiros, fotógrafos, televisões, curiosos e acompanhantes. Nós gostamos de ir sempre pela manhazinha para fazer algumas fotos da mesinha do S. Sebastião ainda vazia, mas também para chegarmos a tempo do caldo do pote. A partir de aí, quando rondam as 8H30 a 9H00, começa aos poucos a encher-se a aldeia de gente, principalmente junto à mesinha disposta ao longo da rua que nos leva à igreja, para marcar lugar,  numa extensão de 500m, que até ao meio dia ficará repleta de gente, com uns milhares de pessoas.

 

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No entretanto que vai das 9H00 até por volta do meio-dia, hora em que termina a missa, há uma espécie de vazio no que toca às celebrações do São Sebastião, apenas a cozinha mantém a sua azáfama (que já vem do dia anterior), nos cozinhados das carnes e do arroz que nos 25 grandes potes à volta de um grande braseiro se confeciona para alimentar todos os forasteiros. Neste entretanto, no 20 de janeiro de 2018, aproveitámos e fomos até duas aldeias da freguesia que já tínhamos debaixo de olho para a recolha fotográfica, a fim de a podermos trazer aqui o seu post, em mais uma aldeia do Barroso. Eram elas as aldeias de Casal e Lousas.

 

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Lá rumámos então até a aldeia de Casal, a que deixamos aqui hoje e que foi a primeira a ser visitada nesse dia. Mal saímos da Vila Grande, entrámos num caminho municipal pavimentado (CM1045), com a largura para pouco mais de um popó e com vistas para um mar de montanhas, com grandes ondas, num degradê cromático que vai de um verde forte das montanhas mais próximas até um azul ténue, que se confunde com o azul do céu nas montanhas mais distantes que se perdem no horizonte.

 

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A paisagem começa a mudar quando entrámos por um longo corredor entre duas montanhas a descair para uma linha de água. São cerca de 5km que seriam selvagens se não fosse existir a estrada por onde rolávamos e os postes de madeira com o cabo de energia elétrica, que são sempre um sinal, e também um guia, até um lugar com vida humana, que no caso era a aldeia de Casal.

 

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E já quando se avistam terras que não descem mais, num pequeno vale onde se juntam duas linhas de água, num pequeno anfiteatro bem inclinado, está implantada a aldeia de Casal. Mas antes de lá chegar, tem de se atravessar uma linha de água após a qual nos espera uma íngreme subida de cerca de 200m, mas mesmo íngreme, que com o piso húmido, quiçá gelado, chegámos a ter dúvidas se o nosso popó conseguiria subir, mas bem a custo, subiu.

 

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Lá na croa da íngreme subida, um pequeno largo onde, quase, apenas dava para fazer a manobra para o nosso popó virar, e a partir de aí, uma, igualmente íngreme descida até ao pequeno vale, onde, de uma lado e outro da rua se iam implantado as casas da aldeia, de entre as quais, de uma delas, saia fumo da sua chaminé, e já sabemos que não há fumo sem fogo, nem fogo sem gente que o acenda e mantenha, mas logo chegaram até à nossa proximidade 5 testemunhas, cães que nos iam ladrando num misto de dar as boas-vindas, de dizerem que aquilo era terra de alguém e de aviso a quem os cuida e sustenta, e avisaram, pois logo de seguida, no fundo da rua começa a desenhar-se uma figura humana, que numa subida lenta que a própria subida recomendava, se ia aproximando de nós.

 

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Os habituais cumprimentos de quem chega e quem recebe, o porquê da nossa visita, que nesse dia além dos habituais descobridores do Barroso que habitualmente me vão acompanhando nesta descoberta, juntaram-se a nós mais dois fotógrafos amigos, do Porto. Pois perante nós apresentava-se o Sr. Manuel Fortuna com o qual fomos conversando enquanto íamos fazendo uns registos e descendo a rua da aldeia, com os cuidados que a descida exigia.

 

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Perguntámos-lhe pelo resto do pessoal da aldeia e o Sr. Manuel foi-nos dizendo que era só ele, a sua senhora e os cães, que não havia mais ninguém. Que a sua senhora estava em casa, pois já tinha alguma dificuldade em andar, tudo após um avc que a sua senhora teve enquanto esperava pelo padeiro. E teve sorte, pois o padeiro só vai a Casal de 15 em 15 dias… perguntei-lhe como foi socorrida e respondeu-me que foi lá o 112 buscá-la, mas que foram muito rápidos, não chegou a 1 hora e eles (112) já lá estavam… E sim, pode parecer muito para um pronto socorro que este tipo de acidente exige, mas conhecendo a realidade que temos à disposição, o socorro até nem foi tardio, mas o problema agrava-se porque o hospital mais próximo, o de Chaves, fica a 50 km, por estradas que podem até ser interessantes para passeios ou ralis, mas pouco próprias para socorros rápidos, e o problema agrava-se ainda mais, porque o hospital de Chaves não está preparado para socorros a AVC’s, estes têm de ir para o hospital de Vila Real, que fica a 94 km da aldeia de Casal. É por estas e por outras idênticas que estas aldeias caminham para o despovoamento total e a aldeia de Casal só tem um casal, já idosos, mas só até um dia…

 

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Apenas um casal vive em Casal, (esperamos que assim ainda seja, pois nós hoje, aqui, estamos a tornar presente e a relatar uma visita que aconteceu há três anos) e já lá vão 18 anos em que é apenas este casal que lá vive. Padeiro e Carteiro, vão lá de 15 em 15 dias e o casal desloca-se “às Boticas” uma vez por mês para comprar o que é necessário, alimentação, medicamentos, etc., mas de vez em quando recebe um ou outro amigo da freguesia, “conversamos um bocado, bebemos um copito e depois eles lá vão e eu cá fico” e a sua maneira, são felizes neste isolamento, mais o Sr. Manuel que a esposa, pois por ela talvez já estivesse a viver com uma das filhas, que estão ainda por cá, em Portugal, pois dos 6 filhos, 4 são emigrantes.

 

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O curioso nesta estória é que este amor que o Sr. Manuel tem a Casal, não é de amor ao berço que o viu nascer e crescer, pois tanto ele como a mulher nasceram em Cabeceiras de Basto e só depois de casados é que vieram para a aldeia de Casal, que na altura tinha à volta de 70 habitantes, mas não deixa de ser uma estória de amor à terra e de amor do casal que os mantém juntos há mais de 60 anos, depois de se terem conhecido numa festa do Santo Aleixo, em Ribeira de Pena, namorarem e terem casado, e o Sr. Manuel gosta de viver em casal e segundo o mesmo,  a sua esposa Rosalina Ramos – “ela também gosta de aqui estar, pois nem ela nem eu éramos daqui e já aqui está há tantos anos como eu” já a Dona Rosalina dizia que “ goste que não goste, tem de ser”

 

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Em Casal, tal como ia dizendo o Sr. Manuel – “ os velhos morreram, foram indo embora e o resto passou-se para a França”. Restam o Sr. Manuel Fortuna e a Dona Rosalina Ramos, um casal em Casal, com toda uma aldeia por sua conta, isto até ao dia em que, tal como os outros velhos, também vão ter que ir embora…e Casal será mais uma aldeia do Barroso completamente despovoada.

 

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Ainda antes de finalizarmos e passarmos ao vídeo resumo, fica aqui o nosso mapa com a a localização da aldeia e com o melhor itinerário para lá chegar. Entretanto fica também uma recomendação nossa, não deixe de ver uma pequena reportagem sobre a aldeia de Casal, realizada pela Sinal TV, que foi também transmitida no Porto Canal, em que conversam também um pouco com o Sr. Manuel e a Dona Rosalina. Fica link no final para essa reportagem. Para já, ficam os mapas com a localização e o itinerário até Casal, como sempre a partir da cidade de Chaves:

 

mapa de casal-1.jpg

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Para finalizar fica o nosso habitual vídeo com o resumo de todas as fotografias de Casal publicadas neste post. Espero que gostem.

 

Aqui fica:

 

 

Agora também pode ver este e outros vídeos no MEO KANAL Nº 895 607

 

Reportagem da Sinal TV sobre Casal:

 

 

 

E quanto a aldeias da freguesia de Dornelas, Boticas, despedimo-nos até ao próximo domingo em que teremos aqui a aldeia de ESPERTINA .

 

 

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