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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

06
Jun12

Palavras colhidas do vento... por Mário Esteves


 

Frequentámos a mesma escola, a Escola da Estação, a escola dos “soqueiros”, assim chamada depreciativamente pela maior proveniência dos alunos do Bairro Operário ou Bairro Marechal Carmona, que, naqueles tempos, se alguns calçariam socos, outros já usariam outro calçado.

 

Grande parte seriam filhos de gente humilde, mas por lá andaram filhos de doutores e outros de classe média, que têm muito orgulho de lá terem frequentado a escola régia, como então se dizia, apesar da república já implantada e a viverem-se tempos do Estado Novo, não se furtando à convivência dos menos favorecidos pela fortuna, salvo nos jogos de futebol, por motivos à vista - já imaginaram uma canelada com socos ou botas de atanado com reforço de “testeiras” metálicas na biqueira ?...-,  no recreio, no logradouro em frente ao armazém da recolha dos cereais - é verdade, no concelho colhia-se trigo e centeio… -, ou num lameiro ao lado da Estação da CP, onde, frequentes vezes corriam, esbaforidos, sacola de serapilheira a tiracolo, a lata dos lápis (marca Viarco), o ponteiro e a caneta (pena) de aparo a chocalhar com a lousa, afugentados pelo irado dono, de varapau a descrever círculos ameaçadores no ar, que se queixava de lhe espantarem as crias e arrasarem aquele pedaço da pastagem, pequeno estádio onde as balizas eram duas pedras e já eram visíveis as peladas…

 

Escola da Estação que hoje mais parece um ovo estrelado na paisagem urbana, apesar do mérito das actividades que no seu interior se desenvolvem… dá ideia de ao pintar, alguém ter derramado acidentalmente um balde de tinta amarela e achando por bem o efeito garrido causado e para não despender mais energias, poupou-se ao bom senso estético e trabalho, fazendo alastrar a mancha por toda a superfície das paredes exteriores do edifício.

 

O vetusto imóvel não merecia tal desplante, agora, que se encontra a viver uma recatada e discreta reforma, enfronhado na memória das gerações de alunos, contínuos e professores que por lá passaram.

 

Perdoem a divagação…

 

 

 

 

Encontramo-nos agora algumas vezes à mesa do mesmo restaurante.

 

E à volta, poucos sabem que é um herói, e para variar, reconhecido.

 

Mereceu honras de ser destacado na imprensa regional e nacional, no entanto, disso não faz ostentação, nem o repete até à saciedade, como alguns fariam, por bem menos.

 

Num longínquo dia de Abril, do ano de 1966, a Senhora Isaura da Conceição, moradora no Bairro do Cruzeiro do Telhado, como assinala o Notícias de Chaves *, escutou o silvo próximo do comboio e saiu de sua casa.

 

Estarrecida - e seguimos de perto a descrição do mesmo jornal -, observou “uma criança de tenra idade se quedava tranquilamente entre os carris”, alheia ao perigo mortal, eminente.

 

Tentou retirar a criança, mas as forças e a distância não lhe permitiam acudir a tempo de salvá-la do avanço da locomotiva, pelo que gritou, desesperada, pedindo ajuda a um grupo de rapazes que brincava perto da via-férrea.

 

Daquele grupo, um dos rapazes, deparando-se com aquela tragédia prestes a ocorrer, correu à linha, ainda chegou a tropeçar, mas levantou-se e num salto, agarrou como pode a criança, indo cair do outro lado do carril, com ela abraçado.

 

O autor do artigo do jornal que temos vindo a citar, conclui a narrativa deste acto do seguinte modo:

 

-“Os dois rolaram pelo chão, talvez magoados, mas livres de perigo. Nesse mesmo instante, por assim dizer, o comboio passava, trepidante, pesado, monstruoso e veloz.”

 

Na altura, existia uma iniciativa conjunta da Sociedade Espanhola de Radiodifusão e da Ibéria, com representação em Portugal, do Rádio Clube Português, designada por: “Operação Plus Ultra”, que premiava anualmente crianças que se tinham destacado por actos de heroísmo.

 

O júri nacional, na sua segunda reunião, decidiu escolher o jovem flaviense, como merecedor do prémio.

 

Tinha onze anos, acabara com sucesso o exame da então “quarta classe da instrução primária”, em Julho daquele ano, e o seu nome era e é: David Teixeira da Silva; morava no Bairro Marechal Carmona e trabalhava com o seu pai, como aprendiz de pintor da construção civil.

 

 


 

Como disse, coincido algumas vezes com o David nos intervalos para o almoço, e numa dessas vezes perguntei-lhe se não teria algumas recordações do prémio que recebera.

 

Respondeu-me sem qualquer presunção que tinha algumas “coisas”.

 

As “coisas” que tinha são as imagens que a seguir divulgamos:

 

 

Chegada ao aeroporto de Barajas, Madrid

 

A receber o prémio

 

Reportagem da revista “Flama” das quais retiramos as ilustrações que seguem, sem quaisquer comentários e com as legendas originais:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Na crónica anterior falámos de campeões, nesta falamos de heróis… e de Chaves!

 

Mário Esteves

 


* Não citamos o autor, por que o recorte do jornal cedido pelo amigo David é um artigo distribuído por páginas, do qual apenas tem a parte mais relevante, excluindo o final que certamente seria assinado.

 

 

- As fotografias e ilustrações foram gentilmente cedidas por David Teixeira da Silva e a ele pertencem em exclusiva e plena propriedade. 

 

 

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