Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

02
Ago20

O Barroso aqui tão perto - Côvelo do Monte (totalmente despovoada)

Aldeia do Barroso - Concelho de Boticas


1600-covelo-Monte (67)

1600-cabecalho-boticas

 

Sempre que partimos para o Barroso desconhecido, fazemos previamente o trabalho de casa, principalmente estudamos bem o nosso itinerário, tomamos anotações de pontos de referência e de passagem obrigatória, anotamos possíveis atalhos e fazemos contas ao tempo que necessitamos para percorrer distâncias e paragens nos locais.

 

1600-covelo-Monte (40)

 

Mas como sempre uma coisa são os mapas e outra é a realidade,  e se para alguns locais partimos mais despreocupados, pois há sempre uma aldeia por perto e pessoas a quem perguntar no caso de estarmos enrascados com a orientação, para outros destinos mais ermos, temos mesmo de estudar bem a lição antes de sairmos de casa,  que foi o caso de Côvelo do Monte.

 

1600-covelo-Monte (63)

 

 Na partida para Côvelo do Monte, tínhamos como referência a central do parque eólico de Casas da Serra. Sabíamos que no entroncamento onde se encontra a central, no encontro de estradas, uma delas nos levava até Alturas do Barroso e na direção contrária para Coimbró e a terceira estrada, perpendicular à primeira, nos levava até Cerdedo. Seria nesta última que bem próximo do entroncamento, deveria existir um caminho em terra batida, e ele lá estava. Fácil, bastava seguir o caminho e Côvelo do Monte lá haveria de aparecer. Fica o nosso mapa que também serve para melhor localizar a aldeia

 

mapa covelo

mapa covelo-1

 

Mas o que parecia fácil depressa se complicou, pois percorridos poucos metros o caminho bifurca e passamos a ter dois caminhos. Nos nossos apontamentos apenas tínhamos um caminho, mas a escolha foi fácil, tomámos o que estava em melhores condições, pois só poderia ser esse, e lá fomos, montanha adentro, quase sempre a subir, passámos por uma eólica, depois outra, mais uma, outra ainda e finalmente a última, pois o caminho terminava aí, bem lá no alto, mas olhando em redor, nada de aparecer Côvelo do Monte, mas sabíamos que não deveria estar longe.

 

1600-covelo-Monte (64)

 

Desde essa última eólica, 100 metros abaixo em direção a poente, passava o outro caminho pelo qual não tínhamos optado. Embora bem próximo de nós, era impossível passar para ele, pois esses 100 metros eram de uma ribanceira bem acentuada e pejada de rochas, mas agora visto dali, não havia dúvidas que seria esse o caminho para Côvelo do Monte. Seguimos-lhe visualmente o traçado até o perder de vista, mas nada de Côvelo, com ajuda da teleobjetiva da câmara fotográfica, que também nos vais servindo de monóculo, tentamos perceber o que era uma pequena mancha, de cor ligeiramente diferente que havia ao fundo no encontro das duas montanhas, et voilá, eram telhados, os telhados das casas de Côvelo do Monte. Tal como no jogo do monopólio, depois de termos caído na casa da última eólica, tivemos de voltar à casa de partida percorrer todo o outro caminho que inicialmente tínhamos desprezado.

 

1600-covelo-Monte (21)

1600-covelo-Monte (22)

 

Mas felizes e contentes por finalmente termos descoberto a aldeia, e lá fomos andando e indo, devagar, devagarinho, pois o piso do caminho a isso recomendava e umas cambalhotas pela encosta da montanha abaixo, pela certa que não seriam muito agradáveis, e num de repente, o mundo caiu-nos aos pés, a nossa felicidade terminou ali, já avistávamos a aldeia quando o caminho nos foi interrompido por uma cancela fechada.

 

1600-covelo-Monte (23)

1600-covelo-Monte (24)

 

Sabíamos que a aldeia estava abandonada e que casa a casa e prédio a prédio, alguém a tinha comprado para fazer dela um empreendimento turístico, que com o tempo, talvez pelos custos, ou falta de “subsílios” acabou por abandonar, e era mesmo este o verbo que ali, pasmados a olhar para a cancela, íamos conjugando. Aldeia abandonada, projeto abandonado e nós também abandonados ao destino da nossa má sorte do dia. Ainda pusemos a hipótese de saltar a vedação e fazer o que restava do trajeto a pé, mas eram 13H00, daquele dia 6 de outubro de 2017, num dia ainda quente, mesmo estando na croa da montanha e as nossas barriguinhas já pediam assistência e com uns bons quilómetros para fazer até ao restaurante mais próximo, desistimos…

 

1600-covelo-Monte (26)

1600-covelo-Monte (250)

 

A paisagem por ali é do mais agreste que há, aquele agreste que eu conhecia do Barroso desde criança, muito antes de conhecer o Barroso verde genericamente conhecido no Baixo Barroso, mas lá de cima, dava para notar que lá no fundo, onde estava o que restava de Côvelo do Monte, existia uma pequeníssima veiga, verde, com algumas árvores igualmente verdes, mas em tons mais escuros. Mas a descoberta teria que ficar para mais tarde, nem que fosse a última aldeia a ir e mesmo que tivéssemos de fazer o percurso todo a pé, era aldeia à qual tínhamos de ir, era obrigatório, pois era a primeira aldeia da era atual a estar completamente abandonada, mas teria de ser noutro dia.

 

1600-covelo-Monte (321)

1600-covelo-Monte (254)

 

E não demorou muito tempo a fazermos a segunda tentativa, sete meses depois, em 24 de abril de 2018, aí já com uma viatura de todo o terreno, por volta das 11h30 lá estávamos nós em frente à cancela do caminho. Desta vez acertámos no caminho à primeira tentativa e a cancela embora ainda lá estivesse, estava aberta, e desta vez é que foi… fomos até à aldeia

 

1600-covelo-Monte (247)

1600-covelo-Monte (142)

 

Desde a cancela até a aldeia são cerca de 800 metros, sempre a descer na mesma terra agreste, isto,  até chegarmos a uma pequena linha de água que dava origem a uma pequena veiga, a grosso modo aí com uns 700 metros de comprimento por 100 metros de largura, e no limite, por um lado ao longo da linha de água e do outro ao longo do caminho que atravessa a aldeia, algum arvoredo que transformam o local num pequeno, lindíssimo e apetecível oásis, só que em vez de ser no meio da areia do deserto, está no meio da aridez das encostas da montanha e quase a 1000 metros de altitude.

 

1600-covelo-Monte (314)

1600-covelo-Monte (297)

 

Mas de pouco vale esse oásis, pois a aldeia está totalmente despovoada, abandonada e com metade do seu casario metade em ruínas e o restante para lá caminha, mas não nos surpreendeu, pois previamente já sabíamos que a aldeia estava assim. Não fomos surpreendidos, mas começou aí aquela mescla de sentimentos que sentimos quando vemos assim as aldeias, mas até essa altura, apenas aldeias que caminham para o despovoamento total, como a aldeia vizinha de Casas da Serra, mas esta era a primeira que víamos completamente abandonada, sem vida, apenas com o casario da antiga aldeia.

 

1600-covelo-Monte (289)

1600-covelo-Monte (286)

 

E lá fomos entrando na aldeia, com o tal misto de sentimentos a invadirmos, às vezes mesmo contraditórios, como o de não compreendermos como a aldeia chegou ao despovoamento total, mas por outro lado a compreender perfeitamente que tal tivesse acontecido, pois é uma aldeia quase no meio do nada, apenas com a sua pequena veiga, que quando muito poderia dar para subsistir, como deu quando tinha pessoas para habitar as casas.

 

1600-covelo-Monte (219)

1600-covelo-Monte (198)-1

 

Os tempos hoje são outros, e também muito mais exigentes, em que só a terra, já não chega para viver, e depois, viver a 1000 metros de altitude, isolados, sem estrada e distantes do que hoje se quer por perto, como a saúde e a educação, e já deixo de parte o tempo de lazer e a cultura, ao qual todos temos direito, mas que só é para uns tantos…

 

1600-covelo-Monte (191)

1600-covelo-Monte (168)

 

Contudo Côvelo do Monte é uma aldeia, que pelas suas características, localização, isolamento e ambiente natural que a rodeia, também poderia ser bem interessante, desde que fosse para viver lá por opção, sem ser obrigado a. Bem poderia ser um pequeno paraíso e desfrutar do seu pequeno oásis. Aliás é uma aldeia interessante, mesmo em ruinas e despovoada, continua a mostrar o seu encanto, e bastaria ter um bom acesso à R311, com 2 km de boa estrada, e a música seria outra.

 

1600-covelo-Monte (148)

1600-covelo-Monte (89)

 

Quanto às nossas pesquisas sobre a aldeia, vai aparecendo no mapa, e pouco mais, apenas vimos uma referência à capela, que diz estar fora de culto, mas ter sido de devoção a Santa Bárbara. Já é alguma coisa, pois quanto à capela, dela, hoje só existem as 4 paredes, e uma delas também ameaça ruir.

 

1600-covelo-Monte (80)

1600-covelo-Monte (74)

 

As outras referência que encontrámos, até como notícia de TV nacional, é a de que a aldeia está à venda, toda ela, pois hoje é de um único proprietário. Segundo a notícia, está à venda por 4 milhões de euros, que feitas bem as contas, e somando o investimento necessário para fazer da aldeia alguma coisa, dá para perceber que a aldeia vai continuar abandonada, e temos pena…

 

1600-covelo-Monte (55)

1600-covelo-Monte (49)

 

Assim, sem mais para contar sobre a aldeia, está na altura de nos despedirmos e de deixar aqui o vídeo com todas as fotografias do post. Espero que gostem.

 

1600-covelo-Monte (37)

1600-covelo-Monte (4)-granjo-6

 

Mas antes do vídeo, apenas uma nota quanto à forma como grafei a aldeia, como Côvelo. Vá-se lá saber porquê, pois as referências que há à aldeia, em mapas e outros documentos em que diz que a aldeia pertence à freguesia de Cerdedo, aparece grafada de 3 maneiras, como Covelo, sem qualquer acento, Covêlo com acento no “e” e Côvelo com acento no “o”. Eu optei pelo último, e está a justificação dada para que achar estranho vê-la assim.

 

E agora sim, o vídeo:

 

 

Quanto a aldeias do Barroso, teremos aqui na próxima sexta-feira mais uma Barroso de Montalegre. A próxima aldeia de Boticas, virá por aqui no próximo domingo.

 

 

 

 

27
Mar19

Coisas do meu baú... uma manif


1600-manif 131

1024 meu bau

 

Não, esta imagem que fica não é para descobrirem o Wally ou verem onde está o Zelig Woody Allen. Nada disso, é mais uma das coisas do meu baú e trata-se de uma coisa bem séria, uma manifestação popular em reivindicação de um interesse comum, que mesmo sendo garantido pela nossa constituição, há que reivindicá-lo de vez em quando.

 

1600-manif 146

 

Decorria o dia 21 de fevereiro de 2007 e aqui não se cantava  “a paz, o pão, habitação, saúde”, apenas se reivindicava por saúde e pela manutenção das urgências do Hospital de Chaves. Uma manifestação que sendo de interesse comum de todos os flavienses, mas também da região, reuniu milhares de pessoas a lutar pela mesma causa. Havendo consenso e partidarismos à parte, o sucesso era garantido, o da manifestação, claro está, quanto ao resto, basta olhar para o hospital que hoje temos, ou seja, e tal como diz o povo “A montanha pariu um rato”.

 

1600-manif 072-1

 

Certo que ficámos com as urgências, mas só para algumas, as mais ligeiras, pois nas mais graves, lá vamos a toque de caixa para a Vila ou para o Porto e depois, agora, politicamente falando, começa a estar na moda dizer (os mesmos de sempre de Lisboa) que temos de dar mais atenção ao interior, ao despovoamento, coisa e tal. Aqui volto à canção do inicio desta conversa, pois sem “a paz, o pão, habitação, saúde”  e a canção ficou curta, pois também deveria ter na sua letra a educação, sem isto tudo junto, não há quem se demore muito por cá. E no entanto tudo seria tão fácil, pois vendo bem as coisas, para termos tudo, só nos falta metade. Paz temos, habitação também, se calha até de sobra, educação falta-nos o ensino superior, agora estamos deficientes é em pão e saúde, ou melhor, em como ganhar “ouros” para o primeiro e onde tratar da nossa saúde sem ter de ir à Vila ou ao Porto.

 

1600-manif 084

 

E no meio disto tudo lá vamos caindo como patinhos, por exemplo nesta do hospital, a de ficarmos sem as urgências e a maioria das suas valências, prometerem-nos um hospital todo xpto na Vila que com as scuts (de borla) nos ficaria a meia hora de distância. Duas promessas duas mentiras, nem o hospital da Vila é xpto e as scuts bem cedo deixaram de ser de borla, e o problema é que, se queremos saúde a sério, no mínimo temos que ir aos hospitais privados do Porto. Pois é, os de Lisboa, se querem começar a olhar para o problema do despovoamento do interior a sério, que mostrem a sua boa vontade e que comecem por devolver-nos as scuts de borla e as valências do nosso hospital, isto com urgência, depois o resto, o pão…   

 

1600-manif 003

 

 Ah!, querem saber como terminou a manifestação!? Pois pela certa que a maioria que participou ainda se lembra, mas tal como numa boa festa de aldeia que só é (era) grande se houver porrada, por aqui, manifestação que se preze tem de terminar com o corte da estrada na fronteira, tal como a de 21 de fevereiro de 2007 aconteceu, mas, como era dia de feira, terminou ainda a tempo de se almoçar uma boa feijoada num dos restaurantes da cidade. Quanto ao hospital, atualmente, bem lhe poderiam chamar um central de espera e encaminhamento, isto quando não é de embalamento… e leia-se este embalamento como sendo de uma embalagem e não o de embalar recém nascidos, pois a esses, o embalamento também ter de ser feito na Vila.

 

Se quiserem descobrir o Wally ou, se estiveram lá, saber onde estavam, cliquem na primeira imagem que ela amplia um pouco. Depois de abrir mais ampliada no flickr, se carregarem na tecla Z, ela ainda amplia mais um pouco.

 

 

10
Dez16

Ocasionais - Abandono


1600-arcos (179)

ocasionais

 

Abandono

 

O autor do Post(al), de Domingo, 4 de Dezembro de 2016, *O Barroso aqui tão perto – Fírvidas*, escreve: “….maleitas que afetam as aldeias do interior, principalmente o  transmontano. Refiro-me, claro, ao despovoamento e envelhecimento da população. Cada vez mais estas aldeias fazem parte de um mundo que se acaba no qual apenas os últimos resistentes resistem”.

 

No Post(al) de três de Maio de 2015, *As nossas aldeias* (Stª Ovaia),  o autor escrevia  - Dá pena, chega mesmo a doer ver as nossas aldeias a morrer lentamente, tal como vão morrendo os seus resistentes, os mais idosos que não abandonam o seu torrão, até ao último para se poder fechar definitivamente as suas portas de entrada para receberem o letreiro de FECHADA   -    e, outrossim, no de  sete de Maio de 2016, *Santiago do Monte e companhia*: “As aldeias vivem agora rodeadas da palavra abandono”.

 

1600-sta-ovaia (109)

 

As aldeias vivem agora rodeadas da palavra Abandono”!

 

A tristeza e a mágoa com que alguns de nós lêem, dizem e gritam estas palavras até nos faz crer que a vida mudou de sentido e passou a ter outro significado.

 

As ALDEIAS foram as geradoras das vilas e das cidades.

 

Os vilãos abandonaram-nas.

 

Os cidadãos-citadinos esqueceram-nas.

 

Não há burguês que se preze que não fique derretido de importância, ridícula e balofa, na verdade, por viver numa «vila» ou «cidade».

 

Na mais importante praça da República, os deputados andaram à porra e à massa para ver qual aquele que conseguia a mais rápida promoção de uma terreola com significativo peso eleitoral a «vila» ou a «cidade».

 

E as ALDEIAS passaram a ser refúgios envergonhados.

 

Os aldeãos cultivavam a terra e o espírito.

 

Falavam e conviviam com a Natureza.

 

1600-montalegre (1254)

 

A Vila e a Cidade eram lugares onde se ia pagar a «décima»; fazer queixa à Guarda ou ser julgado no Tribunal; onde se ia ao Civil «iniciar o processo de casamento», o qual só depois de «lidos os banhos» é que a Igreja tornava «válido»; ao «sr. doutor» e à Famácia»; encomendar o adubo e o «sulfate»; tirar a «licença de isqueiro» ou a do carro de bois; aos Correios «meter uma carta» ou mandar um telegrama, ou à Feira d’Ano!

 

Nas ALDEIAS praticava-se o culto da Amizade.

 

Na Adega ou à Lareira diziam-se os salmos a Deméter e tombava-se o cálice de Dionisos.

 

1600-frades (53)

 

A palavra era de honra.

 

Ser compadre ou comadre, uma distinção.

 

O amor tinha a bênção do arco-íris e do luar.

 

Na ida ou na vinda da missa; na hora das Avé-Marias ou no Toque das Trindades; nas segadas ou nas vindimas; na hora do nascimento e na hora da morte, os ALDEÃOS comungavam da mesma alegria ou da mesma dor.

 

Nas Vilas e nas Cidades ajuntam-se mais pessoas para ver uma casa a arder do que para admirar uma casa a construir!

 

E, das ALDEIAS, delas se faz a “eleição dos montes” para passar neles os anos que (a tantos de vós, de nós e de mim) ficam da vida, qual magnífico “acerto de quem colhe esse fruto maduro entre desenganos.

 

M., sete de Dezembro de 2016

Luís Henrique Fernandes

 

 

16
Jul16

As nossas aldeias - uma nova realidade


1600-amoinha (140)

 

Este blog já vai a caminho dos seus doze anos de existência e desde início que as nossas aldeias do concelho têm marcado aqui presença. Até há bem pouco tempo atrás com presenças aos sábados  e domingos e ultimamente só aos sábados. Reduzimos um dia por duas razões, a primeira porque todas as aldeias já marcaram aqui presença várias vezes, umas mais que outras, é certo, mas o facto deve-se à dimensão das próprias aldeias e aos motivos de interesse que oferecem. A segunda razão é a de darmos oportunidade a outras aldeias da região marcarem também aqui presença, daí, ultimamente, dedicarmos os domingos às aldeias de aqui ao lado, do Barroso aqui tão perto, não só pelo interesse dessas aldeias mas também para despertar o apetite à sua descoberta.

 

1600-amoinha (151)

 

Ao longo da existência do blog fui dizendo tudo que havia a dizer sobre cada aldeia e, insistentemente, fui batendo na tecla do despovoamento e do envelhecimento da população rural. Um facto e uma realidade que nos leva a outras realidades daí resultantes e que, ao longo destes últimos anos (duas a três dezenas de anos) foi também transformando a arquitetura das aldeias.

 

1600-amoinha (155)

 

Primeiro as reconstruções e o aparecimento de novas construções nas periferias das aldeias. Isto era no tempo em que os nossos emigrantes ainda apostavam num regresso às suas aldeias e o ser possível fazer aí o resto das suas vidas. E se os primeiros emigrantes, que é parte da população envelhecida de hoje, foram ficando, os mais novos, deram volta atrás, partiram para a cidade ou regressaram de novo à condição de emigrante. Com a ausência de população jovem e o aumento da população envelhecida, as necessidades das aldeias passaram a ser outras. Fecharam-se as escolas, entrando algumas em abandono e outras vendidas a particulares ou cedidas para associações e centros de dia. Ampliaram-se os cemitérios e em várias aldeias foram construídos lares para a terceira idade. Entretanto as casas abandonadas começaram a cair com o peso do seu abandono e as ruas foram ficando desertas de gente e animais, as fontes secaram e os tanques, na maioria vazios, ou mesmo cheios, não passam de depósitos de lixo, deles restando apenas a memória dos lavadouros , ficando para exercício da imaginação a vida e alegria que outrora existia em seu redor.

 

1600-amoinha (159)

 

Embora na maioria das aldeias os resistente se tenham demitido da vida comunitária, mesmo porque sem comunidade é impossível a sua prática, existe também um desleixo e desinteresse pela coisa pública ou comum, em parte porque os novos tempos, erradamente, atribuem essas responsabilidades às Juntas de Freguesia ou à Câmara Municipal onde o poder do povo ou da comunidade na gestão da coisa comum deixo de existir, o mesmo que outrora  era geralmente regulado pelo bom senso da maioria no interesse da aldeia. Esse “poder” foi cedido ou exigido pelas junta de freguesia onde, em vez dos interesses da população se passou a olhar mais pelos interesses dos fregueses, principalmente dos fregueses seus eleitores, gerando-se nas aldeias e freguesias dois grupos de população, os da situação e os do contra a situação. No entanto, ao menos isso, há uma coisa que nunca deixou de ser do interesse de toda a população , onde em seu redor pode estar tudo a cair ou em ruínas, ou cheio de lixo, ou silvas, ou mato – em suma – abandonado e desprezado, mas essa coisa tem sempre os mimos da população. Falo-vos das capelas e igrejas, e não é só por uma questão religiosa, mas por ser uma das poucas coisas que fica fora da gestão do poder político e das politiquices e que, na realidade é verdadeiramente comunitária, de todo o povo, tal como as ruas e os largos, os tanques, as fontes, os fornos comunitários e etc. deveriam ser.   

 

As imagens de hoje poderiam ser de uma qualquer adeia, mas são da Amoínha Velha.

 

 

14
Mai16

Chaves rural, era uma vez...


1600-reco-abob-15 (4)

 

Hoje comi favas, é tempo delas, de chegarem à mesa para serem mais uma das nossas iguarias. Uma sopinha de favas ou uma fabada, não há melhor. Ontem quando as vi em cru cresceu-me água na boca, mas hoje quando as comi, fiquei desconsolado… pois ainda me lembro das favadas que a minha avó e a minha mãe faziam quando eu ainda era miúdo, feitas com alguma arte, é certo, mas com outros acrescentos que a(o)s cozinheira(o)s de hoje já não têm, e daí, o discurso de hoje sobre o nosso mundo rural, mais que de saudade é de desilusão.

 

Este discurso de fins-de-samana sobre o nosso mundo rural tende cada vez mais a ser pessimista, a cada vez mais ser deprimente. Todos os sábados farto-me de aldrabar por aqui com imagens e estórias de um mundo que já acabou, que já não existe mais, que não será possível recuperar. Aqui e ali vão restando uns resquícios da cultura do povo transmontano, apenas isso em dois ou três resistentes já meios tolhidos pela idade,  um povo por excelência que se apoiava na sua terra, na sua singularidade e genuinidade, nos seus saberes e no comunitarismo, pois a vida difícil de viver atrás dos montes numa terra ingrata,  a isso obrigava.

 

1600-dorna (106)

 

Na distância e ausência da coisa fácil das cidades que a troco de dinheiro se compra(vam) sabores, saúde, educação, diversão, sensações e até a própria vida, o mundo rural trabalhava os pequenos vales e montes para deles tirar o sustento da sua sobrevivência e vivia em comunhão com gente, porcos, vacas, ovelhas, cabras, burros, gatos, galinhas, cães, cavalos, patos, perus e demais animais que um dia também eles pudessem ir à mesa das refeições ou pudessem ajudar no árduo trabalho de revirar a terra para todos os anos, por volta do mesmo dia, semearem e colherem os seus frutos.

 

E assim a gente lá ia andando na sua roda viva dos afazeres diários, que eram mesmo diários sem semana à inglesa, pois a bicheza assim o exigia, e todos, os animais, pessoas adultas, crianças e idosos, tolhidos dos membros, maleitas ou até da cabeça, sem exceção, contribuíam para a mesa lá de casa e quando nas colheitas eram necessárias muitas mais mãos e corpos para o trabalho, os vizinhos apareciam sempre para dar uma ajuda. Entretanto os porcos na corte faziam estrume para as terras enquanto engordavam para no inverno irem ao banco, as vacas e bois, quando não tinham de fazer parelha para puxar os carros de trabalho, ou individualmente puxarem ao arado, eram tocadas para os lameiros, a ovelhas e cabras iam para o monte, os cães faziam de companhia, davam alarmes,  marcavam e  guardavam o seu território e os do seu dono, guardavam e protegiam o gado do ataque dos lobos,   galinhas, patos e perus além de um dia servirem de manjar, punham ovos e comiam os restos das refeições, cascas, sementes e fruta rejeitada, os gatos lordes que são, dormiam ao sol mas de olho na casa e nos baixos que mantinham livres da bicheza pequena dos roedores, cavalos e burros serviam para o transporte de mercadorias e pessoas.

 

1600-casteloes (558)

 

Tudo isto era suficiente para se viver e se mais terras houvessem, mais se cultivavam, e mais filhos se faziam para as trabalhar. Vida dura e difícil, feita de sol a sol, onde só as noites, os dias de chuva intensa ou os grandes nevões davam algum descanso, no entanto, à sua maneira, viviam felizes, e com a fé que todos tinham, rezavam e agradeciam o pão que sempre chegava à mesa e que Deus e a natureza os livrasse, a eles, às suas culturas e à bicheza lá da terra das pragas e doenças, preces que ouvidas ou não, eram sempre agradecidos ao santo de devoção ou padroeira da aldeia, acrescidos de festa rija, com missa e procissão, foguete no ar, banda no coreto, cabrito e outros pormenores à mesa.

 

1600-bustelo (178)

 

Mas o que mais surpreendia era a criatividade que este povo, cultura, rural tinha. Nos tempos menos abastados ou de escassez do que a terra dava,  inventava sabores para não ter à mesa, todos os dias, apenas, o pão que o diabo amassou. Do porco, animal sagrado sem direito a devoção, aproveitava-se tudo, sem exceção, e, pelo menos, desde o Natal até à Páscoa garantia ricas iguarias á mesa, qual delas a melhor. Cabritos, cordeiros e leitões, para os dias de festa, embora os últimos dessem sempre algum dinheiro que dava sempre algum jeito e depois havia que guardar alguns para engordar. Frangos e coelhos enquanto os havia, para o dia a dia, as galinhas poedeiras escapavam ao repasto e apenas depois de velhas davam boas canjas,  galo para dias especiais, o peru para o natal e por aí fora… Isto quando havia bicheza para ir à mesa. As invenções aconteciam quando como quase do nada faziam verdadeiras iguarias, que hoje, algumas, são imitadas com mais sustento. Os milhos, fabadas, palhadas, omeletes, tomatadas, castanhas, tortulhos, batatas à espanhola e as punhetas de bacalhau, sopas e caldos, para além daquilo restava na salgadeira ou dos fumados de porco que durante todo o ano, regados ou cozinhados com o azeite, cebola e alhos da colheita iam dando sabor a autênticas iguarias feitas de quase nada, onde até a carne gorda podia ser um petisco, sem esquecer a magia das ervas aromáticas que tinham sempre à mão.   

 

1600-fernandinho (105)

 

O engraçado disto tudo é que estes pratos considerados pobres e de pobres, hoje são servidos em bons e finos restaurantes como entradas, ou mesmo como prato principal, que embora não sejam maus, estão a anos luz do sabor e mestria com que eram confecionados com os produtos genuínos que a gente genuína do mundo rural tinha e que saiam das suas hortas e cortes, ao contrário dos de hoje, de estufas, aviários e outros que tais.

 

1600-gondar (176)

 

Engraçado também, com graça deprimente, é que esses pratos pobres, poulas, hortas, cortes e muito suor deste povo do mundo rural deram de comer e pagaram muitos estudos a doutores e engenheiros que, hoje chegados ou estando no poder (politico ou outro) depressa se esqueceram de como eram bons os milhos comidos à luz da candeia e deixam morrer o mundo rural que lhes permitiu hoje, engravatados,  estarem onde estão.    

 

1600-escariz (134)

 

De vez em quando, lá de Lisboa e de outros locais onde os poderosos se apoleiram, dizem ser urgente agir contra o despovoamento do interior e do mundo rural. Palavras ditas sem sentir e sem sentido, pois o que lhes vai na mente são outras ambições. Àquilo a que poderíamos e deveríamos apelar, já é muito tarde para o fazer. Já se perdeu, quase toda,  a genuinidade da cultura do povo rural, Já lhes começa faltar-lhe tudo e os pouco resistentes que resistem já não têm tempo ou estão tolhidos para salvar o que resta dessa cultura. Aquilo que supostamente hoje se possa fazer pela cultura deste povo interior, é o que se poderá fazer e oferecer em qualquer parte do mundo, de forma igual, globalizada, cómoda, muito cómoda porque onde quer que formos teremos mais do mesmo, o mesmo sabor, o mesmo saber, sem a singularidade e genuinidade das terras, dos produtos, do modo de fazer e outras singularidades que fazia os seus sabores diferentes, feitos com diferentes saberes e uma cultura, não uma coisa desinteressante, globalizada,  chata  e que se repete em todas as esquinas, sempre desenxabidas e artificiais.

 

1600-folares-16 (324)

 

Também por cá, na terrinha, de vez em quando, se vem com a treta de se ter de olhar para o mundo rural, para o presunto de Chaves, para a couve penca, o grelo da veiga e a batata da montanha, para o  pastel de Chaves, o melhor fumeiro e folar de Portugal e arredores, o mesmo que outras terras desse nosso Portugal dizem, mas a realidade é que quando queremos comprar um desses afamados produtos regionais,  o presunto de Chaves nem vê-lo nem cheirá-lo, as couves são da mesma estufa que fornecem Lisboa e o Algarve, as batatas vêm de Espanha, os grelos de genuínos só tem o fio azul com que fazem os molhos, folar já começa a ser igual em qualquer terrinha a que se vá. Quanto ao fumeiro, com as exigências da lei e as preocupações que se tem com o pessoal que o faz e onde se faz, com cozinhas xpto, gorro na cabeça, luvas nas mãos, qualquer dia, em vez do reco do matadouro,  já se faz sem reco e sem fumo, e quer seja aqui ou no Barroso, em Vinhais, nas Beiras ou no Alentejo, o fumeiro certificado começa a ser todo igual e bem longe das chouricinhas e alheiras que a minha avó fazia com o reco da corte, sem luvas e touca na cabeça e fumado com a boa lenha do monte, em lareiros colocados por cima dos escanos a pingar gordura sobre as cabeças de quem o fazia.

 

1600-folares-16 (376).jpg

 

Restam os famosos pastéis de Chaves que sobre eles dava para escrever meia dúzia de romances e muitos mais livros de ficção. Pena que a origem dos pastéis de Chaves não fosse um tema obrigatório para os contos que os escritores galegos e outros deste Portugal,  foram convidados há dias pelo Altino para  às custas do município passarem uns dias em Chaves. Seria um bom desafio. Seja como for o pastel está certificado e como diz o nosso amigo do Celeiro que tem lá quatro pastéis dentro duma gaiola – “Não cantam mas são uma delícia” (penso que é isto que diz, se não for é parecido). Pois quanto à sua genuinidade, a acreditar pelo que dizem as dezenas de casas que o fazem em Chaves e não só, cada uma delas diz fazer o verdadeiro pastel de Chaves, quer isto dizer que deve haver por aí muito pastel falso e que os outros que fazem nas outras casas não é o verdadeiro, é parecido, bom, mas não é verdadeiro. Pois eu vou mais longe, e tal como o resto (fumeiro, presunto, etc), todos são pastéis de Chaves e embora, repito,  sejam bons, nenhum é genuíno pela simples razão de os ingredientes não o serem. E fico-me por aqui.

 

1600-folares-16 (98)

 

Quanto às imagens de hoje, é um pouco ao calhas, uma foto daqui, outra dali, mas todas de cá,  do nosso mundo rural flaviense, esta sim, genuínas, tal como os nossos resistente e o despovoamento também bem verdadeiro.

 

Resto de um bom fim de semana, hoje com muita festa cá por Chaves e em várias frentes, mas a maior, claro, é a do regresso de Chaves à I Divisão, com reco no espeto, foguete no ar e música nos palcos.  

 

 

 

28
Nov15

Santiago do Monte, ou, de encontro à realidade


1600-santiago (132)

 

Hoje vamos até Santiago do Monte que é a mesma coisa que ir ao encontro da nossa realidade do interior rural de montanha. Esta aldeia bem lá na croa da Serra do Brunheiro, onde o planalto do mesmo nome tem o seu início e onde estão implantadas as onze aldeias do da freguesia de Nogueira da Montanha, talvez uma das freguesias mais despovoada do nosso concelho.

 

1600-santiago (162)

 

Costumo por aqui culpar os senhores de Lisboa desta nossa realidade, mas claro que eles não são os únicos culpados. Embora os senhores de Lisboa agora sejam outros, nos quais eu até acredito que irão fazer umas coisinhas por nós, no geral, pois no que toca a esta nossa realidade do despovoamento rural, não me parece estar nas suas prioridades ou sequer nos seus planos.

 

1600-santiago (166)

 

E atenção que isto do despovoamento rural não diz apenas respeito às nossas aldeias, mas a todo o concelho, incluindo a cidade, pois se não for contrariada a atual tendência de Chaves perder o que tinha de mais valioso para que os nossos jovens se mantenham cá e os formados possam regressar à terra, para não falar dos emigrantes que cada vez regressam menos, a cidade seguirá o caminho das nossas aldeias, pelo menos no envelhecimento da sua população.

 

1600-santiago (234)

 

Claro que aqui terá de ser o poder local a arranjar soluções sustentáveis a lançar já, pois sejam quais forem essas soluções não terão um efeito imediato e terão de ter a coragem de ser projetadas a médio e longo prazo, sustentáveis. O importante agora, mais urgente, é Chaves deixar de perder o que quer que seja e recuperar algumas das mais valias que tinha para de novo Chaves se poder afirmar como o centro de uma região e não o centro de um concelho.

 

1600-santiago (224)

 

Claro que para que qualquer coisa possa acontecer por cá, serão necessários alguns ingredientes que juntos costumam dar bons resultados, como competência, responsabilidade, altruísmo e amor q.b. pelo que é nosso.

 

 

 

20
Jun15

Orjais e um adeus ao mundo rural


1600-orjais (570)

 

Hoje em dia se há palavra que está na moda é a palavra CRISE. Todos conhecem o seu significado, incluindo os putos ao nível do infantário e, a razão deste conhecimento é muito simples, pois não é preciso qualquer definição quando todos a sentem na vivência do dia-a-dia, mas o que mais irrita nesta crise é quererem fazer da maioria dos portugueses lorpas fazendo-os pagar com língua de palmo uma crise na qual não têm culpa, pois esta, é só de alguns poucos, chicos espertos, que têm conduzido as políticas de Portugal debaixo da subserviência de quem sempre mandou – os donos disto tudo – que nos levam ao “honroso” posto de 5º lugar entre os 38 países mais corruptos.

1600-orjais (10)

Estas minhas primeiras palavras é para ir de encontro ao despovoamento rural, cuja culpa é dos mesmos que provocaram a crise, os mesmos que convenientemente decretaram (sem decreto) o abandono do mundo rural, com atuação em todas as frentes como de um complô se tratasse, quando em vez de se apostar na modernização dos caminhos de ferro se optou pelo seu encerramento para que pudessem florescer o negócio das autoestradas, quando venderam a nossa agricultura e pescas à União Europeia, quando apostaram no negócio do betão nas cidades sem qualquer controlo ou planos diretores municipais, quando concentram hospitais públicos nas grandes cidades deixando que os de proximidade definhem as suas valências, quando a pretexto de uma melhor educação concentram centros escolares nas cidades fechando as escolas rurais, quando deixam florescer a torto e direito grandes superfícies comerciais em detrimento do comercio tradicional de proximidade e do pequeno comércio no mundo rural, quando o negócio Portugal está primeiro e só depois estão os portugueses.

1600-orjais (16)

Quero com isto dizer que não admira que a maioria das nossas aldeias estejam à beira do despovoamento total, pois já não é uma questão de não querer mas antes de não se poder viver numa aldeia onde não há escolas, não há saúde, nem meios para poder subsistir que seja, com todos os saberes, sabores, trabalho e tradições são proibidas e penalizadas por uma autêntica PIDE que quer acabar de vez com a pequena economia que prendia a população no mundo rural. Agora só em grande, plastificado e sem sabor. Assim, quem é que poder viver numa aldeia? – Mas se tudo a continuar assim, num futuro próximo, quem é que poderá viver nas vilas ou cidades de província, do interior ? - Oh Portugal, Portugal, não despertes e vais ver onde vais parar! Ou a quem vais parar! Só espero que a Grécia não amouxe , que defenda a sua gente e a sua cultura para dar um pontapé no cu a esta merda toda. Desculpem o palavreado, mas não há uma forma mais direta de o dizer.

1600-orjais (3)

As fotografias de hoje são de Orjais, de 2008, uma aldeia também despovoada e envelhecida onde não faltam novas construções fechadas, muitas antigas em ruinas, e as hortas onde há de tudo com sabor (batatas, cebolas, alhos, alface, feijões, tomates, nabos, grelos, couves de todas as variedades e tudo que se queira comer) são cada vez mais raras, onde os capoeiros já não dão frangos, galinhas, galos nem ovos, onde o forno do povo já não coze pão e a corte já não tem, com vossa licença, o reco, nem a despensa chouriças, presuntos e tudo que o requinho dava, e se o há, é ilegal, dizem que por falta de higiene e outras mentiras do género, a mesma que criou e pagou estudos a tantos doutores e engenheiros que quando assentaram o cu em Lisboa depressa esqueceram as berças.

 

orjais (11).jpg

 

Há dias assim, ou assim fico de cada vez que tenho de trazer aqui uma das nossas aldeias. Revolta e chega a doer, principalmente para quem as conheceu cheias de vida, com gente pobre, é certo, mas feliz. Hoje só povoadas por olhares tristes e velhos .

 

 

15
Jun15

O nosso mundo rural vende-se, mas ninguém o quer...


1600-gondar (230)

 Foto 1 – Campos entre Gondar e Nogueira da Montanha

Aquilo que fazemos é o reflexo daquilo que somos, acredito nisso piamente e, se aos fins-de-semana eu trago aqui as aldeias é porque também tenho o meu lado rural embora seja um homem de cidade. Às vezes entro em momentos de introspeção e chego a muitas conclusões, uma delas é a de ter estes dois lados de homem rural e de homem da cidade que parece não combinarem lá muito bem, mas que se complementam na perfeição, principalmente porque tive a felicidade de ter nascido em Chaves onde se podem ser as duas coisas quase em simultâneo, e sem muito ruído perturbador.

1600-gondar (183)

 Foto 2 – Nogueira em Gondar

Adoro uma boa noite de copos, com música, movimento, o psicadélico das luzes ou meia-luz, boa companhia, e às vezes um pouco de cultura também dá jeito, quando a há. Por outro lado também gosto da serenidade do mundo rural, dos saberes da sua população, dos seus sabores, do lado selvagem, simples e natural das coisas, de subir à croa dos montes para sentir o ar fresco a bater-me nas faces . Enfim de viver e sentir coisas que só no mundo rural acontecem.

1600-gondar (184)

 Foto 3 – Ameixeira (carangueja) em Gondar

Mas como dizia atrás, tive a felicidade de ter nascido e viver em Chaves onde a cidade também acontece e a cinco ou dez minutos de distância temos o mundo rural quando nos apetece. É uma realidade que vou vivendo, como o contrário também poderia ser verdadeiro, ou seja ter a felicidade de nascer e viver no mundo rural e ter a cidade a cinco ou dez minutos de distância para quando necessitasse ou apetecesse.

1600-gondar (201)

 Foto 4 – Capela de Gondar

Tudo isto que disse foi sincero e serviu de introdução para entrarmos mais uma vez numa freguesia, a de Nogueira da Montanha, e mais precisamente numa aldeia, a de Gondar. E ao entrar neste mundo, ao longo destes anos, sente-se cada vez mais que o estamos a perder e agora a entrar já numa fase de não retorno, onde o dia de amanhã é sempre pior que o de hoje.

1600-gondar (41)

 Foto 5 – Casa típica rural (tomada em 2008)

Hoje nos meus momentos de introspeção vem-me sempre à cabeça o provérbio “Não há mal que sempre dure, nem bem que não acabe” e como a experiência me diz que os provérbios são sábios, e o bem ou o bom se está a acabar, vamos entra num mal ou no mau , que embora não vá durar para sempre, nos deixa a certeza de que com a morte do nosso mundo rural, morrem os sabores e saberes rurais, muitas tradições e toda uma cultura e que no futuro, seja ele qual for, vai fazer parte da história, só da história porque já não vai existir.

1600-gondar (163)

 Foto 6 – Casa típica rural (tomada há 6 dias atrás)

Para explicar melhor este palavreado vamos recorrer às imagens de hoje. Nas quatro primeiras imagens (de há 6 dias atrás) é um pouco do mundo rural que ainda existe e que dá gosto apreciar. Os campos cultivados, os frutos nas árvores, alguns que nem em todos os lados se encontram, e por último as capelas que graças a fé de poucos ainda vão mantendo a sua dignidade, mas são olhares seletivos que deixaram de fora a realidade do abandono. A quinta imagem é de uma casa tipicamente rural de Gondar e que foi tomada no ano de 2008, já então desabitada mas em razoável estado de conservação. A foto 6 e 7 são da mesma construção no seu estado atual, e este é só um exemplo da maioria do casario da aldeia, abandonado e em ruinas.

1600-gondar (168)

 Foto 7 – Vende-se

E é este o Portugal que temos. Um vendido e endividado e um outro que se vende e ninguém quer, porque não tem escolas, não tem hospitais, não tem gente nem onde o verbo subsistir se possa ou consiga conjugar, pois já não há forças nem meios para manter o “stare” de pé.

 

 

 

 

 

06
Jun15

Alanhosa - Chaves - Portugal


1600-alanhosa (62)

 

"O que mata um jardim não é o abandono. O que mata um jardim

é esse olhar de quem por ele passa indiferente. E assim é com a vida,

você mata os sonhos que finge não ver."

Mário Quintana

 

Para um bom entendedor meia palavra basta, diz o povo e o povo é sábio. Assim, Apetecia-me ficar pela citação de Mário Quintana mas quero reforçar um pouco as suas palavras, ou mesmo apenas uma palavra – a indiferença. A indiferença com que todos assistem à morte lenta das nossas aldeias, à morte lenta do nosso mundo rural, à morte lenta da nossa cultura interior e transmontana, a indiferença com que assistimos à nossa própria morte.

1600-alanhosa (73)

Gostamos muito de culpar os outros dos nossos males, mas somos tanto ou mais culpados que eles se assistirmos às suas maldades e não dissermos ou fizermos nada. Um dia quando as aldeias deixarem de existir e tudo for igual a história encarregar-se-á de nos apontar o dedo, isto se ainda houver dedos para apontar…

 

As fotos de hoje são de Alanhosa, ali do planalto do Brunheiro, pertença de um reino que está a deixar de ser maravilhoso.

 

 

 

08
Fev15

Era uma vez Nogueira da Montanha...


1600-nogueira (138)

Hoje fazemos uma breve passagem por Nogueira da Montanha, que tal como o topónimo indica fica na montanha, ou melhor no planalto, bem lá em cima por trás da Serra do Brunheiro que se avista desde a cidade (de Chaves, claro).

1600-nogueira (168)

Pois embora até seja a aldeia que dá nome à freguesia, a uma das que mais aldeias tem — onze no total, é, segundo me dizem pois não tenho confirmação, a estar completamente despovoada, pelo menos de Inverno e, se não está para lá caminha. Verdade, verdadinha, é que das últimas vezes que lá fui não vi vivalma.

1600-nogueira (174)

É, é assim a triste realidade à qual as nossas aldeias, principalmente as de montanha, estão condenadas, e NINGUÉM FAZ NADA por contrariá-la.

 

 

 

Sobre mim

foto do autor

320-meokanal 895607.jpg

Pesquisar

Sigam-me

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

 

 

20-anos(60378)

Links

As minhas páginas e blogs

  •  
  • FOTOGRAFIA

  •  
  • Flavienses Ilustres

  •  
  • Animação Sociocultural

  •  
  • Cidade de Chaves

  •  
  • De interesse

  •  
  • GALEGOS

  •  
  • Imprensa

  •  
  • Aldeias de Barroso

  •  
  • Páginas e Blogs

    A

    B

    C

    D

    E

    F

    G

    H

    I

    J

    L

    M

    N

    O

    P

    Q

    R

    S

    T

    U

    V

    X

    Z

    capa-livro-p-blog blog-logo

    Comentários recentes

    FB