Hoje também há folares
Já em tempos deixei aqui a receita do folar, mas ela não é tão rígida assim, pois pode ter algumas pequenas variantes conforme a casa em que se faça, mas o segredo para um bom folar está mesmo na qualidade dos ingredientes, principalmente na qualidade dos ovos, do azeite e das carnes, de preferência, para um folar de primeira qualidade, quanto mais caseiro melhor, pelo menos no que toca aos ovos e às carnes (presunto, linguiça, salpicão e carne gorda). Quanto ao resto é tudo uma questão de q.b., jeito de amassar, farinha 55, algum sal, fermento, tempo de levedar e forno quente no ponto e alguma paciência. No final, embora todos os folares tenham mais ou menos o mesmo aspeto, é quando se saboreia que se nota a diferença, isto para quem já comeu dos verdadeiros folares caseiros, com os tais ingredientes caseiros e a mestria de os fazer. Que hoje começa a ser coisa rara e pela certa não os encontrará nas feiras e feirinhas da especialidade, mas em muitas casas ainda os há.
Mas tudo o que disse são apreciações para os mais antigos, pois os mais recentes os mais jovens, ou têm a sorte de ter uma avó a altura de fazer um bom folar caseiro ou então nunca os avezaram ou saborearam, comem dos outros, que na ausência de melhor, também marcham. Mas isto, hoje em dia, não é só coisa dos folares. Passa-se um bocadinho com tudo que levamos à boca, principalmente nas cidades, mas o que mais me preocupa é que com o despovoamento das nossas aldeias estamos a perder também os verdadeiros sabores e saberes que fizeram a delícia gastronómica destas quadras festivas, e ontem mesmo tive a prova disso em duas aldeias do Barroso mais barrosão, onde os fornos do povo, agora, apenas servem para turista ver e fotografar.
Seja como for, agora com o folar também industrializado e outras iguarias mais comerciais a fazerem-lhe concorrência, a verdade é que por aqui o folar ainda é uma iguaria desta quadra e no Domingo de Páscoa, manda a tradição que seja o cordeiro ou o cabrito que ocupe o centro das nossas mesas, acabando também assim a presença (época) das carnes de porco e fumeiros à mesa, que desde o Natal, com o seu ponto alto na quadra do Carnaval, eram presença assídua nas mesas transmontanas. E disse bem, eram!, pois também as tradições, com origem no mesmo mal do despovoamento rural, se foram perdendo ao longo dos últimos anos (desde finais do século passado até hoje).
Lamentos mas também palavras para memória futura, para se saber que houve um tempo em que a comida que se punha à mesa era toda caseira, ou quase toda, com grande exceção para o bacalhau que nunca se deu nas hortas, galinheiros, capoeiros ou cortes.
Quanto às imagens de hoje, já não são do folar caseiro como há uns anos atrás vos deixei aqui. Ontem, nas tais aldeias do Barroso, bem fui à procura delas ontem, mas por incrível que pareça não vi um único forno a deitar fumo, e o aroma do folar cozido também não andava nas ruas. Assim, as imagens de hoje são já de um folar mais industrializado, de forno elétrico, embora confecionados com alguns ingredientes caseiros e alguma arte à moda antiga, que no final ainda faz um bom folar ao gosto atual.