Crónicas Estrambólicas
O Galo dos Galaicos
Uma lição de história escrita por um gajo que não sabe nada de história.
É sabido que a Península Ibérica foi colonizada pelos primeiros homens muito depois (dezenas de milhares de anos) de estes terem colonizado terras como a Sibéria ou a Austrália. Os primeiros homens eram tão parvos que, em vez de ficarem no quentinho e ao pé de comida fácil, iam andando à sorte e acabavam a comer neve. Por cá, um dos primeiros povos a ter noções de geografia foram os Galaicos, já sabiam reunir-se e juntar tropas das várias regiões para ir combater os romanos, etc. Não gramo os galaicos porque foram esses meus antepassados os culpados por eu ter que viver numa região pobre e fria como o Barroso, uma péssima escolha. Aposto que se naquela altura passasse por cá um galaico algarvio (sim, lá também havia galaicos) por Barroso e perguntasse aos parolos locais “Vós que estais para aqui a viver com estas geadas e com estes pedregulhos? Porque é que não vindes para o quentinho duma citânia algarvia, onde há bom peixe e boas maçãs (as laranjas só apareceram na Europa há uns cem anos)?”, levaria logo com um “Estive na tropa em Briteiros e aquele barulho de tantas carroças a passar dava-me cabo da cabeça, muito barulho, o ar era muito poluído pelos cheiros, não gostei, aqui é que se está bem. Mais a mais, no quente do Algarve não dará para a feitura do fumeiro dos porcos. Deixa lá isso.”. Outra coisa dos galaicos era nem sequer saberem escrever, quando já se escrevia por outros lados há milhares de anos. Ser filho dum povo destes dá em ser atrasado para sempre, ainda não recuperamos, ainda há pouco tempo éramos 50% de analfabetos. Aliás, há 40 anos, a viver sob um tecto de colmo e sem electricidade, ainda estávamos praticamente na idade do ferro. Como aparentemente não temos outros antepassados senão estes pastores de cabras que viviam em pobres casebres, as pessoas idolatram-nos duma maneira exagerada. Quando se fazem eventos onde se revivem os galaicos, põem-nos sempre representados como valorosos guerreiros, como se andassem sempre em guerra e não fizessem mais nada. Na verdade não saberiam fazer muitas coisas, tirando pastar cabras. No entanto, os estudiosos, quando se metem a descrever um desses normais castros galaicos com três casas (a maioria são assim), vêm sempre com coisas deste calibre: três casas fortificadas com duas linhas de muralhas, uma com 140 e outra com 250 metros de perímetro. Sempre a puxar para as guerras e batalhas e valentias. Fico confuso com estas coisas: “Três casas fortificadas?! Duas casas deviam ser para dois casais e a outra para a canalha, senão nem podiam dar a trancada. Como é que dois homens sozinhos podiam defender duas muralhas daquele comprimento?! Os arqueólogos devem estar malucos, se fossem atacados por um grupo de 10 homens não duravam meia hora! De certeza que não eram muralhas. Uma era um muro para os lobos e os ursos não atacarem as cabras e o outra era um muro para os porcos não comerem as cabras e ficar tudo separado ou talvez fosse para proteger a horta ao lado de casa que convinha não ter lá cabras, porque se calhar na altura estes papalvos nem porcos tinham”. Outra coisa muito estranha é os castros serem sempre na croa dum monte sem um regato de água ao lado ou sem terra para cultivar fosse o que fosse. De certeza que aquelas gentes passavam os dias a comer cabra assada com castanhas, se fosse Outubro, porque noutros meses nem sei que comeriam, é que as batatas apareceram por cá muito depois, há uns cem anos. Também duvido que eles já tivessem vinho e alho para fazer salpicões, pimenta não tinham de certeza. Se criassem porcos era para irem logo para o espeto. Mais lhes valia ter galinhas, que é um animal que se come no dia e não precisa de frigoríficos, porque um porco no verão enche-se de morrões em dois dias ao ar. Cá para mim, continuo a não ver grande interesse nos pobres pastores galaicos. Grande azar ser bisneto dum galaico amante da neve e dos pedregulhos, que eu estava tão bem lá para Lesvoa ou para os Algarves.
Luís de Boticas