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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

04
Out17

Outono Fotográfico em Chaves - Adega do Faustino


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Embora o Outono já tivesse iniciado a 22 de setembro, para a fotografia só se inicia em outubro, com o Outono Fotográfico, o Festival Galego de Fotografia, o decano da Península Ibérica, que atinge este ano de 2017 a sua 35ª edição e acontece nos meses de outubro, novembro e dezembro, em várias cidades galegas e portuguesas do Norte de Portugal. Em Chaves também acontece, com três exposições, a primeira neste mês, de autoria de Humberto Ferreira, na Adega do Faustino.

 

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O tema deste ano do Outono Fotográfico é Descrenza/Descrença/Disbelief,  em que Humberto Ferreira participa com a sua exposição “Acredite… são umas cabras!” e são mesmo.

 

Fica a sinopse da exposição:

 

“Quando decidimos vaguear pelos montes e vales das aldeias que nos rodeiam, assalta-nos um sentimento de descrença da sua recuperação, de vermos respeitadas as suas características mais intrínsecas, de voltar a vê-las com vida, de experimentarmos o seu pulsar e de nos sentirmos envoltos na magia da sua existência. De fora ou de dentro, quer sejamos simples visitantes ou partilhemos do seu espírito, notamos a completa ausência de estratégias que promovam a sua sustentabilidade a longo prazo. Um dos indicadores que ainda nos dá algumas esperanças no seu renascimento é a existência de animais – a criação de gado – e o cultivo dos campos a ela associada. Neste caso de gado caprino. E ainda que a descrença nos invada, acredite… são umas cabras!”

 

 

 

 

04
Abr17

Exposição de Fotografia na Adega do Faustino


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Não é em vão que se nasce em Trás-os-Montes. Não é em vão que se calcorreiam montes e vales, estradas, caminhos e se cruzam aldeias. Não é em vão que se ama a fotografia e se preza a amizade.

 

Esta exposição é a síntese de três registos diferentes, mas complementares. Podem parecer por vezes desapaixonados. Puro engano. Resultam de três olhares afligidos pelas terras que aprendemos a amar. 

 

Dói-nos este amor? Claro que sim. Dói-nos este inexorável desaparecimento? Evidentemente.

 

Por isso decidimos juntar duas das nossas grandes paixões: a fotografia e o mundo rural.

 

Fazemos aquilo que podemos. Registamos em imagens o que ainda por cá teima em existir.

 

O resultado é esta maneira de celebrarmos a nossa identidade transmontana.

 

Esperamos que gostem.

 

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A partir de hoje e prolonga-se até ao fim fo mês de abril.

 

 

08
Out16

Coisas... 9 anos de poluição e mentiras - Outeiro Seco


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O repto para este espaço “coisas” foi lançado no último fim-de-semana e já temos a primeira participação. Trata-se de um espaço aberto a todos que nele queiram participar, basta enviarem os conteúdos para blogchavesolhares@gmail.com . As regras são simples e podem ser vistas aqui .

 

Vamos então à primeira participação.

 

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9 anos de poluição e mentiras – Outeiro Seco – Chaves

 

No próximo dia 20, terão decorrido 9 anos desde que captei a primeira imagem de sinais evidentes de poluição no lugar de Vale Salgueiro em Outeiro Seco. A poluição provinha dos parques empresariais construídos naquele local e era composta, pelo menos, por esgotos domésticos e industriais, que a Câmara Municipal de Chaves lançava sem qualquer tratamento nas linhas de água, que por sua vez desaguavam no Rio Tâmega.

 

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E isto ocorreu porque a CMChaves se “esqueceu” de construir o emissário que transportaria os esgotos até à estação elevatória sita no lugar da Ribeira. Em vez disso, instalou uma pequena estação de tratamento, que como sabemos, nunca funcionou.

 

Na altura, pensava eu que a simples denúncia da situação junto da CMChaves, Junta de Freguesia e SEPNA seria suficiente para que a situação ficasse resolvida. Não podia estar mais enganado.

 

Pensei que numa primeira fase tivesse o apoio da Junta de Freguesia e da população de Outeiro Seco que não quisesse ver a sua Aldeia “mergulhada” em esgotos ou deixar esse “legado” para os seus filhos e netos. Também me enganei.

 

Ao longo destes 9 anos foram apresentadas várias dezenas de queixas, acompanhadas de centenas de fotografias que demonstram inequivocamente o grave crime ambiental e contra a saúde pública que a CMChaves teima em manter, sem qualquer acção no sentido da sua resolução ou de minimizar o seu impacto no ambiente e nas populações.

 

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Sempre que pude, procurei captar imagens para anexar às queixas, para que não restassem dúvidas sobre a veracidade e gravidade da situação denunciada. As queixas que chegam a ser semanais, são enviadas neste momento para 97 endereços de correio electrónico.

 

Os apoios que tenho recebido nesta causa, limitam-se a uma dúzia de amigos não residentes que estão indignados com esta situação e a outros tantos residentes que me fizeram chegar as suas preocupações. De resto, a ausência de comentários nas inúmeras publicações no meu blogue dizem tudo.

 

Posso dizer que a Junta de Freguesia de Outeiro Seco nunca respondeu a uma única queixa. O silêncio tem sido uma constante e, como se diz por cá e em muitos outros sítios: “Quem cala, consente”.

 

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A CMChaves nem sequer se dá ao trabalho de confirmar a recepção das queixas, que tenho o cuidado de solicitar sempre, e das poucas vezes que respondeu, limitou-se a dizer umas mentiras, como se eu ou mais ninguém tivesse estado no local. Disse que se tratava de uma situação pontual (com pontualidade diária, acrescento eu), que se tratava de uma avaria pontual da mini-ETAR (que como sabemos nunca funcionou), que a culpa era das empresas instaladas nos parques empresariais (licenciadas pela CMChaves e instaladas nos edifícios onde deveria estar o mercado abastecedor, que como sabemos só está preparado para o comércio por grosso e não para a indústria) e o ano passado chegou mesmo a dizer que era exagerado afirmar-se que a situação se arrastava há 8 anos (deve ter-se esquecido que há muitas imagens que o provam).

 

No orçamento participativo de 2015, foi apresentada uma proposta para a construção do emissário, que a CMChaves aprovou e colocou a votação. Ao fazê-lo a CMChaves confirmou e assumiu publicamente que o valor da obra era inferior a 250.000,00 euros. Será que a CMChaves não tem esse valor para resolver um problema grave de poluição? Até pode ter, mas o que demonstra é que prefere continuar a poluir do que construir o emissário e resolver a situação.

 

DSC_0126a Fotograma - Portugal em Direto - Emissã“Fotograma - Portugal em Direto - Emissão de 24 de Novembro de 2015”

 

No decorrer dos 9 anos, a Voz de Chaves escreveu 1 artigo em Abril de 2015 e, entre finais de Outubro e início de Novembro de 2015 foram feitas várias peças pelo Jornal de Notícias, SIC, RTP 1 e Antena 1, com intervenções da QUERCUS e do Partido Ecologista Os Verdes que se deslocaram ao local. Nessas peças podemos ouvir o presidente da CMChaves a afirmar que a situação ficaria resolvida no próximo ano, ou seja, em 2016. Como sabemos, também mentiu e é fácil de o comprovar, pois estamos a escassos 3 meses do fim do ano e tanto quanto saiba, os proprietários ainda não foram contactados e é pouco provável que neste tempo consigam lançar o concurso da obra, criar os direitos de superfície para passagem do emissário e construí-lo.

 

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Na passada quinta-feira, dia 6, a Sinal TV esteve no local a recolher imagens para uma reportagem que foi transmitida no mesmo dia no Porto Canal, a QUERCUS emitiu um comunicado que publicou na sua página, na página das Notícias ao Minuto, e o seu presidente deu uma entrevista que foi transmitida pela Antena 1.

 

Nas peças publicadas podemos ler que o presidente da CMChaves disse que “a autarquia quer construir um emissário” (esqueceu-se que há um ano atrás disse que este ano – 2016 – ficaria resolvido), “que o processo esbarrou nas expropriações” (muito estranho, uma vez que os proprietários não foram notificados) e que teve “dificuldade em identificar alguns proprietários” (esta última afirmação é com toda a certeza uma anedota).

 

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A não ser que o traçado tenha sido alterado os proprietários estão todos identificados, pelo menos desde 2006, data em que foram notificados por uma empresa Nível, a mando da CMChaves (e como tal os dados dos proprietários foram-lhe transmitidos por esta última), para a construção do emissário. Desde então, as alterações não devem ter sido muitas.

 

Ao que parece, contactados pela Sinal TV, tanto o presidente da CMChaves, como o presidente da Junta de Freguesia, negaram-se a pronunciar-se sobre esta situação.

 

É preocupante ver políticos a mentir descaradamente ao público nos meios de comunicação social sem que nada lhes aconteça e sem que sejam responsabilizados criminalmente. Mas não menos preocupante é a indiferença da população de Outeiro Seco e de Chaves perante este problema. Porque desengane-se quem ainda pensa que este problema diz respeito apenas aos proprietários dos terrenos por onde os esgotos passam. Todos estes esgotos infiltram-se nos lençóis de água e vão parar ao Rio Tâmega.

 

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Depois, dizer que a única instituição que se preocupou com esta situação desde o início foi o SEPNA que sempre se deslocou ao local e tomou conta das ocorrências, mas pouco mais pode fazer do que isso.

 

Também os deputados do MAI apresentaram este problema na Assembleia Municipal, mas mais ninguém da oposição o fez. Nesta última Assembleia Municipal esperava que os deputados do PS o fizessem, pois contactaram-me a dizer que o fariam, mas não se pronunciaram.

 

Falta saber que outras desculpas o presidente da CMChaves vai inventar agora para tentar justificar a sua mentira e a não construção do emissário em 2016, como prometeu publicamente perante os meios de comunicação social.

 

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Estranho é, que em pleno século XXI e num concelho que pretende ver o nome de Chaves associado à água, ainda subsistam situações tão vergonhosas como esta.

 

Entretanto a situação agrava-se de dia para dia sem que nada seja feito. Em breve poderemos falar em 10 anos de poluição contínua. Mas não se preocupem, porque o presidente da CMChaves disse na peça da Quercus, que não se trata de um atentado ambiental e que a saúde pública não está em risco.

 

Fica assim na consciência de cada flaviense a denúncia destas situações que nos prejudicam a TODOS.

 

Humberto Ferreira

http://outeiroseco-aqi.blogs.sapo.pt/tag/esgotos

 

 

29
Mar16

8 - Chaves, era uma vez um comboio…


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Texas  o comboio   kimvoio

 

Vi-o a primeira vez  ainda na penumbra dos amanheceres,  a passar no fundo do estradão, a minha mãe de futuro em riste, levava a Zé por volta das sete e tal da manhã  à estação das Pedras, para ir para o colégio de Vila Pouca estudar, grande feito à época, bem  admirado bem invejado  o andar, andar a estudar e andar de comboio.

 

Lembro-me da ternura da Sra. Albertina  que morava no figueiredo e dizia que a mãezinha, a d. Aninhas tinha ido buscar a Zeizinha ó Kimvoio… E era assim… Como se o comboio,  além das pernas rodas nos carris, tivesse também braços e desse às mães vindos de um abraço ou colo qualquer,  os filhos sempre em segurança, num devagar se vai ao longe…

 

Sempre me fascinaram as rodas nos carris, num movimento para mim espiral que quase me fazia trocar os olhos por conseguirem  ir todas ao mesmo tempo, a meu ver eram elas  a voz e o instrumento  da orquestra que geravam o som tac a tac a tac o tal pouca terra pouca terra pouca  terra, gerando nas carruagens um movimento de samba folclórico ou de risadinhas constantes por cócegas.

 

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 CP0029 – Locomotiva: Não identificada, Data: 1977, Local: Vidago, Portugal, Slide 35 mm

 

Depois das rodas, a máquina, ora altiva cheia de soberba por ir à frente e puxar as carruagens como quem traz de arrasto os filhos distraídos, ora histérica em guinchos ensurdecedores  a exigir atenção de algum incauto que saia desgarrado  e ocupe a sua linha. Fumadora compulsiva, na altura, creio, mata ratos ou definitivos,  carvão direto aos pulmões   deixando no percurso lufadas de fumo, ambulantes nuvenzinhas de sonho esvaído num implacável céu.

 

À conta da sua falta de pontualidade a Nélia a Kika e o Nelo ainda levaram uma boa reprimenda, a Nélia umas boas chineladas no rabo, por assustarem as pessoas nas madrugadas dentro de um lençol com uma pilha, além de colocarem cartazes escritos das caixas de papelão, nas portas das pessoas fazendo jus às suas alcunhas.

 

Ouvia falar dele com frequência sazonal aquando de passeios de grupos , algumas criticas à sua lassidão.

 

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 CP0005  – Locomotiva: CP E209, Data: Não datado, Local: Régua, Portugal, Slide 35 mm

 

Um dia aí para uns  35 anos , vim da régua  com ele, trouxe-me direitinha com calma que mais valia chegar tarde neste mundo, que mais cedo ao outro, cheguei  a casa meio fusca com algumas faúlhas que se escaparam para nos enfarruscarem à socapa, sabendo que só dávamos conta quando chegássemos a casa, pois não dispúnhamos de espelhinho ali à mão.O balanço foi positivo, gostei, mas naquele tempo eu não sabia ainda o seu valor acrescentado , eu só tinha pressa, ele não estava ara aí virado para as pressas.

 

Lembro-me sempre com um arrepio na espinha de um senhor desesperado que decidiu atirar-se à linha quando ele passou, além das sistemáticas ameaças de senhoras que no auge da deceção pensavam alto em matar-se com a ajuda dele do kimvoio , do texas.

 

Às vezes era o bode expiatório para justificar a presença de indigentes na cidade , dado ser  em Chaves o fim da linha, os viajantes peregrinos tinham de sair e ficar à espera ,surgindo por uns tempos como estranhos na cidade.

 

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 CP0037  – Locomotiva: CP E209, Data: 1973, Local: Não identificado, Portugal, Slide 35 mm

 

O Mestre Nadir a propósito do meu apelido Seixas contou-me que no seu tempo de estudante  de faculdade quando regressava do Porto, o revisor de nome Seixas mandava sair as pessoas nas subidas do comboio texas e pedia ajuda aos homens para empurrar, entrando  todos os passageiros novamente nas descidas. Foi sempre algo incompreendido, talvez por  deixar tempo aos passageiros para irem às frutas e  às vinhas do caminho  buscar uvas para comer, enquanto brincavam às corridinhas  com o texas que se deixava facilmente apanhar, ainda foi protagonista de excursões a Vidago levando miúdos e graúdos a ver a paisagem  numa alegria intemporal…

 

Depois com o tempo envelheceu, reformou-se e jaz nas memórias, além da carruagem atrás da antiga Estação e da máquina recuperada por algum saudosista perto da linha de Curalha.

 

E a nós deixou-nos  o  memorando  de o lembrar aos nossos filhos e netos se os tivermos…

 

Isabel  Seixas

 

In “Memórias de uma Linha – Linha do Corgo – Chaves”, Agosto de 2014

Edição Lumbudus – Associação de Fotografia e Gravura

 

Fotografias – Propriedade e direitos de autor de Humberto Ferreira (http://outeiroseco-aqi.blogs.sapo.pt)

Gentilmente cedidas para publicação neste post.

 

 

18
Mar16

7 - Chaves, era uma vez um comboio…


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As noites eram todas semelhantes…

 

Muitas vezes, acabados de deitar, éramos acordados sempre com a mesma pergunta:

 

- “Querendes ir ó contrabando?”

 

Sabíamos não ser uma pergunta, por isso, sem responder, levantávamo-nos e lá íamos nós em direcção ao ponto de recolha. Habitualmente, um curral em Vilarinho da Raia. Aí eram-nos distribuídas as nossas tarefas para essa noite de acordo com as capacidades que já tivéssemos demonstrado.

 

Sabíamos também haver sempre algum perigo inerente a estas actividades, pois nem todos os guardas-fiscais estavam a “dormir”, mas o dinheiro dava-nos jeito para as nossas pequenas coisas.

 

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 CP0107 – Locomotiva: CP E205, Data: 1973, Local: Chaves, Portugal, Slide 35 mm

 

As noites eram todas semelhantes…

 

Eram noites de Inverno e, por serem mais longas, permitiam, quando necessário, fazer mais do que uma viagem.

 

Eram noites frias, escuras, que serviam para disfarçar as nossas silhuetas e combiná-las com as sombras da vegetação que ladeava os caminhos por onde passávamos.

 

Mas, sobretudo, eram noites sem luar. O único brilho permitido era o pálido e suave tremeluzir das estrelas.

 

Para mim, as noites preferidas eram as de chuva. É certo que não tínhamos as estrelas, mas não restavam dúvidas quanto às noites serem mais frias, mais escuras e muito, mas muito mais silenciosas.

 

O som da chuva abafava os nossos passos. Também o “martelar” dos cascos dos animais e algum balido ou relinchar, que escapasse ao cansaço que se acumulava, deixavam de ecoar no vazio da noite.

 

Essencialmente, trazíamos ovelhas e cabras velhas, mas também cavalos, machos e burros, todos estes também com um longo percurso de vida ou com graves mazelas que os impedia de continuar a cumprir as suas funções.

 

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  CP0117 – Locomotiva: Não identificada, Data: Não datado, Local: Chaves, Portugal, Slide 35 mm

 

As noites eram todas semelhantes…

 

Tal como a passagem obrigatória pela nossa Aldeia – Outeiro Seco. Aqui, já os caminhos que percorríamos variavam. Ou para não utilizarmos sempre o mesmo, ou porque sabíamos que um deles estava a ser guardado, ou para dividirmos a “carga” para o caso de sermos apanhados pela Guarda Fiscal.

 

Nessa altura, os caminhos da nossa Aldeia eram transitáveis, não como hoje em dia, onde nem uma pessoa passa. Das nascentes brotavam águas límpidas, cristalinas, puras, onde qualquer Ser Humano ou animal podia saciar a sua sede sem receio, não como hoje em dia, em que tanto as nascentes, como as linhas de água estão poluídas pelos esgotos (provenientes dos parques empresariais) que correm a céu aberto e tudo infestam.

 

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  CP0165 – Locomotiva: CP E205, Data: Outubro de 2001, Local: Azpeitia, Espanha Slide 35 mm

 

As noites eram todas semelhantes…

 

Saíamos de Vilarinho da Raia com um destino muito preciso: a estação dos comboios em Chaves, onde carregaríamos o gado nos vagões com destino aos matadouros do Porto (ou pelo menos era o que se constava).

 

De Vilarinho da Raia seguíamos em direcção a Vila Meã e dali ao Cotrão. Ao chegar ao Cotrão, caso ainda não nos tivessem sido dadas indicações, deveríamos seguir um de dois itinerários ou dividir o gado pelos dois.

 

Aquele que mais utilizávamos era o que seguia pelo Alto Silveira, Almeirinho, Senhor dos Desamparados e Mina.

 

O outro vinha pelo caminho da Teixugueira, Caminho da Torre, Moucho e Mina.

 

A partir da Mina, o percurso era o mesmo: seguíamos em direção ao Papeiro, Mãe d'Água, Poços de Volfrâmio, Santa Cruz, Forte de São Neutel, Bairro Verde e, finalmente, estação dos comboios.

 

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  CP0123 – Locomotiva: CP E205, Data: 22 de Julho de 1976, Local: Vila Real, Portugal, Slide 35 mm

 

As noites eram todas semelhantes…

 

A estação estava sempre envolta em vapor, fumo e, porque não dizê-lo, mistério, que se acentuava com a escuridão da noite. Nunca vimos lá ninguém. Embora não tivéssemos interesse nenhum, presumo que o motivo fosse o de assim não poderem ser identificados. Os únicos ruídos que se distinguiam claramente eram os das caldeiras e do espezinhar do gado que, talvez por adivinhar o seu destino, se recusava a entrar nos vagões.

 

Havia rampas já colocadas para carregar as ovelhas e cabras nos vagões de bordas baixas (abertos) e outras para carregar nos vagões fechados os cavalos, machos e burros. O gado era encartado como sardinhas em lata. Diziam que o que interessava era o número de cabeças que chegava ao destino e não o estado em que estivessem.

 

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  CP0131 – Locomotiva: CP E202, Data: 1965, Local: Não identificado, Portugal, Slide 35 mm

 

As noites eram todas semelhantes…

 

Já de regresso a casa, às vezes a-modos de despedida, ouvia-se o apito estridente e o som metálico da locomotiva que assim anunciava a sua partida. A aurora já se renovava, dando início a um novo dia e, talvez, a mais uma noite semelhante a tantas outras.

 

A verdade é que nunca viajei no nosso comboio, mas sinto muito a sua falta e lamento que todas as infra-estruturas tenham sido abandonadas ou destruídas por quem dirigia ou dirige os destinos da nossa Região, amontoando num espaço exíguo meia-dúzia de objectos, destruindo com elas as memórias de uma linha.

Humberto Ferreira

 

 

In “Memórias de uma Linha – Linha do Corgo – Chaves”, Agosto de 2014

Edição Lumbudus – Associação de Fotografia e Gravura

 

Fotografias – Propriedade e direitos de autor de Humberto Ferreira (http://outeiroseco-aqi.blogs.sapo.pt)

Gentilmente cedidas para publicação neste post.

 

 

23
Fev16

5 - Chaves, era uma vez um comboio…


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Memórias

 

Em boa verdade, apenas no início da década de oitenta, altura em que completei dezoito anos e fui continuar os meus estudos para Coimbra é que, conscientemente, me apercebi da existência de comboios regionais, rápidos, foguete, intercidades, de linha férrea larga, etc., tendo então inferido que o comboio liderado pela sua máquina a vapor, e que servia a minha cidade natal, era uma autêntica relíquia.

 

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 CP0185 – Locomotiva: CP E207, Data: 1973, Local: Pedras Salgadas, Portugal, Slide 35 mm

 

1 - A primeira, e única vez, em que tive o privilégio de nele viajar, e da qual me lembro perfeitamente, tinha apenas cinco anos. Foi um dos dias da minha existência em que mais madruguei. Embora não possa precisar a hora exata, estimo-a entre as 4 e as 5 horas da madrugada.

 

Acompanhando a minha mãe, com o entusiasmo e excitação de menino pequeno que ia fazer uma longa viagem, para conhecer novas terras e novas gentes, apanhei o comboio na belíssima estação de caminhos-de-ferro de Chaves, ainda noite cerrada, rumo a Coimbra e à sua universidade, onde iria assistir à cerimónia (vulgo, rasganço) da formatura do meu pai na faculdade de direito.

 

Daquela viagem, desde Chaves até Peso da Régua (primeiro local de transbordo do comboio, sendo o segundo no Porto), recordo o cheiro a carvão, o apito estridente e o fumo lançado pela locomotiva, bem como o característico barulho que fazia de cada vez que, em qualquer estação ou apeadeiro, parava e arrancava, nalguns troços a velocidade muito lenta, e a beleza das paisagens que ia vislumbrando à medida que o dia clareava.

 

Da Régua em diante, lembro-me apenas que os comboios melhoravam gradualmente em rapidez e conforto, mas já não havia apito, cheiro a carvão, fumo, nem os lamentos de pouca-terra... pouca-terra...

 

Face à “idade dos porquês” que atravessava, comecei a disparar perguntas, tendo-me a minha mãe explicado que o comboio que partia de Chaves funcionava a carvão e a automotora que saía da Régua, e o comboio do Porto, funcionavam a eletricidade. Questão após questão, e respetivas respostas, com uma certeza fiquei: o comboio de Chaves era diferente dos outros.

 

Apreendi mais tarde, quando cheguei à idade de ver filmes de índios e cowboys no cineteatro, que o nosso comboio, por muitos apelidado de Texas, era um verdadeiro cavalo-de-ferro.

 

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 CP0032 – Locomotiva: CP E202, Data: Não datado, Local: Não identificado, Portugal, Slide 35 mm

 

2 - No ano de 1984, convidei dois condiscípulos, um natural de Coimbra e outro de Paços de Ferreira, para virem passar comigo uns dias de verão a Chaves, cidade que não conheciam. Optaram pelo comboio, meio de transporte que usavam habitualmente para se deslocarem, sem nunca suspeitarem que da Régua até Chaves iriam circular num com máquina a vapor.

 

Quando os fui esperar ao apeadeiro da Fonte Nova, perto da casa onde na altura habitava, apesar de cobertos de gotículas de suor vinham a rir-se a bandeiras despregadas. Contaram-me que tinham, inocentemente, perguntado ao revisor onde ficava o bar do comboio, e que este, julgando que estavam a mangar com ele, lhes terá respondido em tom azedo: “Bar? Deem-se por felizes se o comboio não empanar até Chaves, que ontem estivemos parados duas horas na linha devido a uma avaria”.

 

Confessaram-me que apreciaram a beleza da paisagem, que se sentiram noutro mundo ao viajarem naquele comboio e que não estavam arrependidos da opção que tomaram mas, dado o desconforto e morosidade da viagem, o regresso iria ser feito de autocarro.

 

Ainda hoje, quando esporadicamente nos encontramos, aqueles amigos relembram com saudade a viagem no comboio até Chaves que, com toda a certeza, não deixarão de contar aos seus netos.

 

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 CP0071 – Locomotiva: CP E211, Data: Não datado, Local: Não identificado, Portugal, Slide 35 mm

 

3 - Mas a lembrança que imediatamente me assalta quando se fala na extinta linha e comboio a vapor que serviram Chaves até 1990, que julgo ser a primeira recordação da qual tenho ainda uma ténue memória, e que pelo significado que tem para mim guardei deliberadamente para o fim, reporta-se ao momento em que, perto dos meus três anos de idade, conheci o meu pai.

 

Por imposição do regime fascista do Estado Novo, quase logo de seguida ao meu nascimento nesta cidade de Chaves, o meu pai, após ter aqui concluído o cumprimento do serviço militar, foi chamado, e obrigado, a partir para Moçambique, dizia-se que para defender as nossas colónias no ultramar.

 

Assim fui crescendo, aprendendo a caminhar e a falar, com a noção de que o meu pai estaria lá para um lugar chamado “tropa”.

 

Próximo dos meus três anos, recebi a notícia, dada pela minha mãe e pelos meus avós maternos, com quem vivia, que o meu pai ia, finalmente, chegar da tropa.

 

Chegou. Fomos todos esperá-lo às Pedras Salgadas.

 

Foi a primeira vez que vi o meu pai.

 

E o comboio.

 

Durante os vários anos da minha meninice, vá lá saber-se porquê, repetia a cada passo: “A tropa é má... o comboio é bom”.

Francisco Preto

 

 

In “Memórias de uma Linha – Linha do Corgo – Chaves”, Agosto de 2014

Edição Lumbudus – Associação de Fotografia e Gravura

 

Fotografias – Propriedade e direitos de autor de Humberto Ferreira (http:outeiroseco-aqi.blogs.sapo.pt)

Gentilmente cedidas para publicação neste post.

 

 

15
Jul15

Humberto Ferreira em Fotografia na Adega do Faustino


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A partir de hoje, 15 de Julho, até ao final deste mês, Humberto Ferreira estará na Adega do Faustino com uma exposição de fotografia intitulada “ O que vemos – Tons Azuis”.

 

A exposição conta com a organização da Associação de Fotografia e Gravura Lumbudus, da qual Humberto Ferreira também é associado, e com o apoio da Adega Faustino.

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Além de poder apreciar alguns trabalhos de Humberto Ferreira na Adega do Faustino, durante este mês, também pode acompanhar um pouco do que vai fazendo em fotografia no blog de que é Autor, aqui: http://outeiroseco-aqi.blogs.sapo.pt/

 

03
Out14

Humberto Ferreira, com 20 Sombras, na Adega Faustino


Hoje às 18 horas inaugura mais uma exposição promovida pela Associação de Fotografia Lumbudus. “20 Sombras” de Humberto Ferreira, fotógrafo Lumbudus e também ele blogger flaviense, com o blog http://outeiroseco-aqi.blogs.sapo.pt/ . Uma exposição diferente onde só as sombras, as silhuetas, o contraluz tem lugar, respondendo assim a um repto lançado pela Lumbudus de uma exposição em que a fotografia fosse além do simples registo de uma imagem, tal-qual os nossos olhos as veem. Uma exposição que abordasse a arte fotográfica.

Houve tempos em que se lançava a discussão de se a fotografia poderia ou não ser considerada como uma arte. Hoje em dia, com essa discussão ultrapassada e a fotografia já confirmada como uma arte, com a sua vulgarização de todos transportarem consigo uma câmara fotográfica e fazerem fotografia a todos os momentos, com a possibilidade de publicação imediata nas redes sociais da internet, a fotografia entrou numa nova era e o artista fotógrafo já não é aquele que tem uma boa câmara fotográfica toda xpto e aquele que domina a técnica da fotografia, aliás esses ingredientes nunca foram condições suficientes para se fazer arte com a fotografia, embora possam ajudar. Hoje são mais as tendências e os tratamentos fotográficos que fazem a moda e a arte fotográfica, pelo menos a arte mais popular nas camadas mais jovens que na maioria das vezes recorrem apenas às câmaras fotográficas dos telemóveis. Depois vem a fotografia feita com arte, em que na sua essência está na composição e, principalmente, na qualidade do olhar, com tratamento ou não, com bom equipamento ou não - é tipo de fotografia que faz a praia dos fotógrafos amadores, daqueles que amam e se apaixonam pela arte de fotografar, que fazem fotografias que dizem coisas, que são sensíveis aos momentos.

Há ainda os velhos fotógrafos que vêm do tempo da fotografia analógica, os mestres da fotografia, mas aqui a discussão já é mais complexa, pois há os resistentes, os puristas e aqueles que aderiram e se renderam às novas tecnologias de captação e tratamento de imagem, sem a olhar com desdém, e os que eram bons fotógrafos continuam a ser bons fotógrafos, ou melhores ainda. Por último, há o comércio e os lobby da fotografia, mas esses, prefiro deixá-los de fora da minha apreciação.

É, é assim. Uma exposição fotográfica do Humberto Ferreira tem de nos levar obrigatoriamente à discussão da fotografia e a tudo que diz respeito à fotografia, não fosse ele um amante maior desta arte, de tudo que diz respeito à fotografia, desde a sua origem/história até aos nossos dias, e a testemunhá-lo está a sua impressionante coleção de tudo que diz respeito à arte fotográfica.

 

05
Ago13

Olhares de Fotógrafos Lumbudus - Humberto Ferreira


 

 

A partir de hoje vamos iniciar a semana com os olhares de fotógrafos Lumbudus, sempre que possível com olhares de Chaves e do concelho, mas poderá haver mais olhares. A Lumbudus, para quem não conhece, é uma Associação sem fins lucrativos  de Fotografia e Gravura, com sede em Chaves. Vamos tentar trazer aqui todos os fotógrafos Lumbudus.

 

Iniciamos com Humberto Ferreira, autor do Blog outeiroseco-aqi, onde poderá acompanhar os trabalhos deste fotógrafo flaviense.


Chaves - Torre de Menagem com a Serra do Bruneiro de fundo, em dia de neve.



Outeiro Seco - Igreja Românica de N. Srª da Azinheira


Ainda para hoje mais duas publicações neste blog. Às 9H00 "Quem conta um ponto..." de João Madureira e às 19H00, a nossa reportagem sobre os Sabores de Chaves - A Feira do Pastel.



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