Percursos - Por Jorge Medeiros
Aquele Carnaval…
Já perdi a memória, de andar por ali. A última vez que me lembro, era manhã de um dia quase Verão. Tinha feito uma viagem e levei comigo a dimensão dos Deuses.
Recordei-a numa noite de Outono, encostado à porta do velho casino, enquanto caía a primeira chuva, dando ao parque o tom sinistro dos filmes de suspense.
Lá dentro, uma dúzia de atrevidos, fazia rábulas, para uma festa de beneficiência.
Retive na memória, pela música e pela mímica, “Dos humildes será o Reino dos Céus”.
Durante o percurso, houve festas e visitas.
E foi a vez de viver por inteiro, a festa do Carnaval.
Tudo foi um instante, largou meia dúzia de “bujardas”, chamou puta à vadia da cozinheira, pegou no seu melhor amigo e rumou por aí fora, à procura dos disfarces.
Os do Entrudo e os outros.
Começou pelo fim. Agora estava o princípio comprometido.
E valeu a pena.
Do velho casino, à velha avenida, desfilaram amores antigos…recordações antigas.
Meia dúzia de mulheres de idade madura, simbolizavam as solidões que ficaram e partiram da “belle-époque” termal.
Depois o baile.
De máscaras.
E aquele menino grande, que outrora berrava a céu aberto, enquanto cozinhava o arroz que a Mãe lhe ensinara antes de partir para o hospital, estava agora mascarado de palhaço. De palhaço rico. Mais outro de Pinguim. Mais outro de Arlequim, outra de polícia vinda directamente de Paris para a cerimónia. Aquele ali de bobo da corte. Lá mais abaixo, a Deusa de um clube satânico, mascarada de “Chica da Silva”, uma lenda do Carnaval Carioca.
Da confusão da noite rompiam a madrugada e as máscaras. Voltava o desassossego daquela gente, que tem levado a vida à espera que o Verão chegue.
E na avenida, ainda no ar, o tímido aroma das lantejoulas travestidas.
Já eram cinzas...
Jorge Medeiros