O Factor Humano
Os rios Impossíveis
Os rios impossíveis
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Fora daquele vale era um rio comum, com as suas águas ora lentas ora rápidas, limitado por amieiros frondosos, no Verão.
Mas entre as duas montanhas era bem diferente, só se deixava ver a espaços, oculto numa floresta de granito, e era preciso conhecer bem os caminhos, os seus recantos e os seus encantos, para a ele chegar.
Uma abertura nas rochas, por onde os mais ágeis e menos volumosos conseguiam penetrar, e depois o deslumbramento de uma grande gruta, como uma catedral gótica, coroada por um céu azul, nos dias despejados de nuvens. Um rio que corre direito ao altar, debruado de fetos, até desaparecer debaixo do sítio onde deveria estar o crucifixo, e é engolido pelo futuro.
Vários metros à frente, noutro recanto do caminho, uma nova entrada, bem oculta para quem não a conheça, dá acesso a quatro toscos degraus, por onde se desce até um varandim de pedra. Quem aí se ajoelhar, pode espreitar outra vez o rio, que agora corre numa caverna menor, fazendo lembrar uma igreja cristã primitiva. Após os olhos se adaptarem `á luminosidade diminuída, podemos ver, nos dias de sorte, uma truta imóvel, voltada para a corrente, na expectativa de que esta lhe traga algum alimento.
Mas Manuel quando visitava aquele mistério, levava apenas um pequeno gravador, e escutava, ajoelhado, o canto Gregoriano do Convento de São Domingos de Silos.
Manuel Cunha