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CHAVES

Olhares sobre o "Reino Maravilhoso"

27
Dez10

Quem conta um ponto... O mictório e a matança


 

 

 

 

O mictório e a matança



Texto de João Madureira

Blog terçOLHO

 

 

Fui para a matança com a preocupação estampada no rosto. Até o F. deu conta. “O que é que te desassossega tanto?”, perguntou ele a sorrir. Mandei-o passear, está claro. Pus-me a olhar para a máquina fotográfica como se lhe faltasse alguma peça. Mas não faltava lá nada. Era só impressão. Por vezes dá-me para estas coisas. Por exemplo, o mictório direito da casa de banho masculina do Modelo está avariado vai para uns meses. E aquilo incomoda-me. Não é que o terceiro mictório seja assim tão necessário, ou importante, na hora de aliviar a bexiga. Com os dois restantes, os cavalheiros que lá se deslocam para fazerem as suas micções conseguem despachar-se sem que se formem bichas. Mas o que me inquieta é que seja o terceiro mictório do Modelo. Se fosse o segundo mictório de um tribunal, o quarto de um centro de saúde, ou o primeiro de uma escola, vá que não. São instituições de serviço público, pagas com os nossos impostos e onde o dinheiro não abunda e a gestão financeira é rigorosa. Mas o Modelo, meu Deus, o Modelo não tem essa desculpa. O Modelo é uma referência comercial, económica e social de cariz privado com prestígio nacional e internacional, com lucros fabulosos. Será que não consegue arranjar alguém para consertar o mictório direito da sua superfície em Chaves? Eu não acredito. Estou em crer que o lucro da venda de vinte cadernetas da Popota dá e sobra para pagar o conserto do já anteriormente referenciado mictório. Por amor de Deus, consertem-no. Esse pequeno sinal de desleixo e incompetência pode deitar por terra a boa imagem que possuem na nossa comunidade. Eu sei que as casas de banho estão sempre limpas, que os produtos estão sempre bem expostos, que as prateleiras se encontram quase sempre repletas de promoções, de boas promoções, que têm descontos em cartão, que oferecem descontos sem ser em cartão, que vendem três pela importância de dois, que vendem polvo de qualidade por quinze euros o quilo, que vendem bacalhau com uma razoável relação entre a sua qualidade e o seu valor, que vendem o quilo da carne a preços difíceis de encontrar no comércio tradicional, que vendem brinquedos pelo preço de chupa-chupas e que oferecem vales de desconto aos clientes. Sei que limpam constantemente o chão do edifício, que trocam qualquer produto que esteja deteriorado, que alguns produtos quase os dão para as pessoas aí se deslocarem frequentemente, pois o que o Modelo mais aprecia e privilegia são as visitas dos seus estimados clientes, nem que seja apenas para ir tomar um café e comer uma nata, que fazem parte de uma outra promoção e que também ela pode ser acumulada em cartão. Sei que fazem feiras do vinho, do queijo, da chouriça, do presunto e do peixe onde só não compra quem for parvo ou então adepto do comércio tradicional. Sei que o pessoal é competente, simpático, trabalhador e pago a horas. Sei que os sindicalistas se queixam dos baixos salários praticados pela Sonae, mas os sindicalistas também se queixam por tudo e por nada. Sei que o parque de estacionamento é bom, que os carrinhos das compras são robustos, que os senhores da segurança dispensam muito bem a polícia. Sei que a loja book it tem bons livros com um desconto permanente de 10%, que disponibiliza gratuitamente jornais e revistas aos seus clientes mais assíduos, vizinhos ou reformados, publicações que as pessoas lêem em pé ou mesmo sentados em cadeiras confortáveis. Sei que a Modalfa faz promoções que metem as dos ciganos e as dos chineses num chinelo. Sei de tudo isto. Mas o pormenor do mictório não me sai da cabeça. Ali está ele para lembrar às pessoas que até a maior superfície comercial pode ter os seus defeitos. Dizem que a arte está nos pormenores. E que a qualidade nos detalhes. Quem persegue a perfeição não pode esquecer que um simples mictório avariado pode deitar por terra todo prestígio acumulado ao longo de anos a bem servir os consumidores portugueses. Então a Sonae consegue alimentar quase metade da população portuguesa, consegue organizar concertos e mega piqueniques com o Tony Carreira e é incapaz de consertar em tempo útil um mictório de um seu estabelecimento em Chaves? Eu sei que estamos em crise, mas não acredito que ela seja tão grave que não permita disponibilizar algumas verbas para o conserto de um mictório em terras de Aquae Flaviae. E a desculpa de que a mão-de-obra escasseia em Portugal é mais um mito a juntar ao do D. Sebastião. Dados oficiais dão conta que 550.846 é o número de desempregados em Portugal e quase 60% são do sector terciário, sobretudo das áreas das actividades imobiliárias, administrativas e serviços de apoio. Mas 18.929 foram as ofertas de emprego por preencher no final do mês de Outubro de 2010. A maioria das ofertas registadas nesse mês relaciona-se com postos de trabalho na área das actividades e serviços a retalho de hotelaria e restauração e construção civil. O problema é que anda aqui falta de informação. Há mictórios avariados, existem desempregados e há ofertas de emprego que ficam por preencher. Na opinião do senhor secretário de Estado, Valter Lemos, isto é possível devido a um desfasamento geográfico muito complicado. Pois há regiões que não têm gente suficiente para as necessidades. Ora como Portugal, mesmo não parecendo, é enorme, as pessoas não se podem deslocar. Por isso as ofertas de emprego ficam por preencher. São os custos da nossa dimensão. Os custos do desenvolvimento. Estou em crer que se o conserto do mictório do Modelo pudesse ser feito por computador e via internet, ele já lá estava a cumprir com o seu destino. Assim não. Fica mais uma vez provado que a informática e as novas tecnologias não resolvem tudo.


Agora que já desabafei posso finalmente descrever (fotografar) a matança do porco da Abobeleira. O porco ali vem, fazem-lhe uma pega. (Fotografias). Ele berra, foge, berra, foge. (Fotografias). Os homens vão atrás dele, pegam-lhe nas patas, prendem-lhe o focinho com uma corda e levam-no para o banco. (Fotografias). Ele berra, berra cada vez mais. (Fotografias). Os homens riem e deitam-no no assento. (Fotografias). A senhora do alguidar aproxima-se, o matador faz um pequeno corte experimental, aponta a faca e faz força. (Fotografias). A faca entra pela carne adentro em direcção ao coração. (Fotografias). Os homens riem, o porco berra, o sangue brota da garganta do animal com força, parece uma torneira aberta. (Fotografias).  Um pouco mais de energia na faca e o animal começa a dar sinais de fraqueza. (Fotografias).  Berra mais um pouco e o sangue continua a brotar com intensidade. (Fotografias).  O alguidar grande fica meado. Dali vai para o pote que já ferve. (Fotografias). O porco é agora chamuscado, raspado e lavado. (Fotografia). Depois de bem barbeado, é aberto, estripado e pendurado. (Fotografias). Corta-se a cabeça e os pés e ali fica até ser desmanchado. (Fotografias).  Os Lumbudus vão agora dar um passeio, passam pela barragem romana, pelo moinho, pela ribeira. Regressamos. Prepara-se o sangue, os rins e o fígado. (Fotografias). É o almoço. Come-se, bebe-se, fala-se, convive-se. Fotografa-se ainda mais. Vamos tomar café e passamos pela casa do Nel onde comemos uma sopa. (Fotografias). Passamos a tarde a falar e a fotografar. Logo mais aparece a vereação Municipal e vários presidentes de junta. (Fotografias). Come-se a feijoada e as febras assadas e bebe-se mais um pouco. (Fotografias). Posteriormente entram em cena os músicos. Mais fotografias, risos, conversa, mais fotografias, música, conversa. Está na hora de ir. Cá fora ainda nos entretemos mais um pouco a fotografar nuvens de fogo produzidas por alguém que lança no ar as brasas da fogueira que arde desde a manhã. Tudo está bem quando acaba em bem.


 

PS – Agora que aí vem 2011, compre para si ou para oferecer, isso fica à sua inteira responsabilidade, para homem, o livro “Golfe”, um cachecol Fred Perry, umas luvas Camel, um fato Ermenegildo Zegna, um colete Ermenegildo Zegna, uma gravata Ermenegildo Zegna, uma camisa Ermenegildo Zegna, o livro “Tudo Isto é Fado”, uns óculos Dolce & Gabanna e uns botões de punho Dunhill.

 

Para as senhoras aconselhamos: babydoll Ebony&Ivory, mala Louis Vuitton, óculos Funny da Alain Afflelou, vestido Deprés Nuno Baltazar, perfume Nina Ricci, lingerie Triumph Merry Sparkle e sapatos Pedro Garcia.

 

12
Dez10

A matança do reco na Abobeleira


 

 

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Já começa a ser tradição cumprir a tradição da matança do reco na Abobeleira, mas não é uma tradição qualquer, mas esta em especial, a de fazer uma matança aberta a toda a população da aldeia e da freguesia. Tem sido assim desde há seis anos para cá e tudo isto graças a um filho da aldeia que por sua conta tem promovido este evento – O Jorge Carvalho.

 

 

Pois ontem cumpriu-se mais uma matança no lugar do costume e com a aldeia a aderir também como de costume e à hora do costume, ou seja, logo pela manhã.

 

Quanto à matança em si e para não repetir o que já foi dito nos anos anteriores, deixo apenas aqui os links para dois posts onde se fala das coisas desta tradição:

 

http://chaves.blogs.sapo.pt/431958.html - Por Gil Santos

http://chaves.blogs.sapo.pt/339613.html - A matança de 2008 na Abobeleira

 

 

Hoje ficam apenas os registos fotográficos dos momentos do dia que, como convém, começam logo pela manhã bem cedo com o acender o colocar os potes do lume.

 

 

Claro, pois como mandam as regras a água já deve estar a ferver quando recebe o sangue que ira fazer as primeiras delícias da mesa.

 

 

E questões de direitos e sexos à parte, na matança do reco há trabalho para todos e se os homens se encarregam de agarrar e matar o reco, queimar-lhe o pelo, lavá-lo, pendurá-lo e desmanchá-lo às mulheres não têm menos afazeres na cozinha, com o fritar das miudezas e o preparar do sarrabulho.

 

 

À mesa, não faltarão os elogios a tão apreciadas iguarias, que podem ser servidas e confeccionadas em toda e qualquer parte do mundo, mas que junto ao reco pendurado e depois de toda a azáfama da manhã, é um manjar sem igual, sobretudo se o vinho também for bom, e era!

 

 

Depois, durante a tarde, já se sabe que algum descanso cai sempre bem para recompor forças e nem há como uma boa suecada.

 

 

Claro que todo este movimento também tem outros adeptos que tem curiosidade em saber como estas coisas se fazem e para isso voltam de novo ao recreio da escola, agora já sem escola.

 

 

Nos entretantos os rapazes dos clicks aproveitam para mais umas imagens e visitas culturais. Este ano com uma deslocação à barragem romana, também na Abobeleira, ao moinho e à ribeira de águas cristalinas.

 

 

Mas não só, pois o tempo recomenda que se aproveitem estes fins-de-semana para fazer a matança antes do Natal e a matança à qual assistimos repete-se um pouco por todas as aldeias e freguesias, assim, nem foi necessário ir muito longe para se assistir a mais tarefas da matança. Fomos à casa do Nel em Valdanta onde dois gigantes já estavam pendurados na trave.

 

 

A noite depressa chegou e de novo a mesa. Uma boa feijoada à transmontana, febras, vinho de várias colheitas.

 

 


 

 

E o momento alto é sempre à noite, já longe da matança, mas o momento em que toda a gente se senta à mesa  para um início de noite de festa de um dia que já vai longo.

 

 

Com convidados que aproveitam para pôr a conversas em dia ou definir estratégias…

 

 

E claro, as concertinas e a festa tinham de começar, e nestas coisas de música e músicos, com tanta festa, bom manjar e bons vinhos, não seria de estranhar se um músico estivesse menos afinado, mas nem se notava…

 

 

E na rua o fogo estava no seu melhor, não era de artifício, pois não, mas parecia… e sempre foi melhor que o das festas da cidade e até teve direito a muitos clicks.

 

 

Enfim, por este ano foi tudo. Para o próximo ano, se a tradição se continuar a cumprir, também nós temos uma promessa para cumprir.

 

Até amanhã!

 

 

 

17
Jan10

A matança do Reco na Abobeleira - Edição 2009/2010


A tradição na Abobeleira  continua a cumprir-se. É a tradição da matança do reco, agora do porco, que pelas mãos de um filho da terra, o Jorge, insiste em fazer da tradição uma festa e, transforma a velha matança familiar numa matança comunitária, aberta à aldeia, à freguesia, mas também a convidados, este ano, além da blogosfera flaviense, também alguns fotógrafos do flickr vindos da região do Porto se juntaram a esta festa, à qual,  também marcou presença a edilidade flaviense.

 

Sobre a matança, já no outro ano fiz aqui um resumo do seu “ritual” e, também o Gil Santos, escritor e discursante deste blog, deixou por aqui, passo-a-passo, todo esse cerimonial e tradição. Para quem quiser saber mais sobre matanças do reco, ou do porco (como preferirem) e para não nos estarmos a repetir, nem há como seguir os links que a seguir vos deixo:

 

http://chaves.blogs.sapo.pt/431958.html - Por Gil Santos

http://chaves.blogs.sapo.pt/339613.html - A matança de 2008 na Abobeleira

 

Hoje vamos a uma reportagem breve e fotográfica sobre alguns momentos do dia da matança deste ano.

 

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Logo cedo, o reco fazia a sua aparição no local das cerimónias. Quer-se sossegado, descansado, sem stress, tudo por causa do sangue poder correr mais e melhor. Sangue que fará a primeira iguaria do dia com o sarrabulho.

 

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Claro que os potes logo cedo vão ao lume, neste caso à fogueira que irá durante todo o dia aquecer o potes, cozinhar as carnes, mas também aquecer por fora o pessoal. Para o aquecimento interior, há remédios mais interessantes…

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E enquanto o sangue coze, há que aliviar um pouco do peso do reco, tirar-lhe as miudezas e deixar que todo o sangue escorra para as carnes ficarem mais limpas. É trabalho de matador e também uma aula de anatomia.

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Tudo controlado de perto pelos fotógrafos de serviço, este ano, desde o centro do país, do grande Porto e os da paróquia, ao todo, juntaram-se 12 fotógrafos do flickr que nas suas galerias vão mostrar ao mundo que por cá a tradição ainda se mantém…

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Nos tempos mortos das lides externas e enquanto as carnes cozem nos potes e os rojões e miudezas são preparados na cozinha para a segundo momento gastronómico do dia, as conversas à fogueira vão matando o tempo.

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Para o pessoal de fora, uma visita guiada pela aldeia da Abobeira, visita obrigatória ao “Santuário” da Porta do Outeiro com vistas privilegiadas para o “pecado do jogo”.

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Claro que pelo caminho o povo da Abobeleira mostra a sua simpatia e hospitalidade e faz questão que se faça uma visita às suas “capelas” privadas. Manda a boa educação que se deve aceitar aquilo que é oferecido com o coração e, nem há como ser bem educado…

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Uma visita à história e símbolos da freguesia comandada pelo “rapazes” da Granjinha. Primeiro o Outeiro Machado um símbolo máximo da arte rupestre como rupestre continuam os acessos, mas não impeditivos para chegar até lá.

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Depois a visita obrigatória às capelas da Granjinha: à Românica e à do Sr. Cruz. Notamos e lamentamos a ausência de um amigo que pela certa gostaria de ter vivido aqueles momento connosco, mas a família Cruz fez as honras da Granjinha… e todos saíram de lá com as faces rosadas (suponho que, embora não se sentisse, foi por causa do frio, pois não encontro outra explicação…)

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Regressamos ao local da matança. Os potes continuavam a fumegar enquanto no salão, o cheiro dos rojões convidavam para a entrada.

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Na prova de vinhos, o da caneca 1 passou com distinção, o da caneca 2 aceitou-se para a continuação e o da caneca de barro (um velho conhecido) ficou para apreciação.

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Na cozinha, a azáfama do costume. Comida não faltava, mas um povo inteiro aguardava pela feijoada à transmontana e, era preciso confeccioná-la. Como quem vê, só atrapalha, o melhor mesmo é deixar na sua labuta quem trabalha, mais tarde, agradeceríamos.

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Tempo para alguns devaneios fotográficos com o fogo que desde os tempos mais remotos sempre encantou. Aqui, além de encantar tinha também o nobre serviço de ir cozinhando e aquecendo os mais friorentos.

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Por último, festa que se preze, tem que ter música e animação e a matança do reco na Abobeleira já é uma festa com tradição e nem foi preciso recorrer aos "Rapazes das Venda Nova" e às suas concertinas, pois se há freguesia que tem muitos músicos e tradição musical, essa, e a de Valdanta.

 

Da nossa parte, e falo em meu nome pessoal e de todos os fotógrafos presentes, só resta agradecer ao anfitrião (Sr. Jorge Carvalho) pela festa que nos proporcionou, mas também à sua família, ao povo da Abobeleira e aos manos da Granjinha pela companhia e por mais uma vez nos darem a conhecer as terras da freguesia de Valdanta.

 

16
Out09

Discursos Sobre a Cidade - Por Gil Santos


 

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Texto de Gil Santos

 

A RAÇÃO NÃO É PARA QUEM SE TALHA…

mas para quem na come!...

 

Diz o povo que dos “Santos ao Natal é Inverno natural” e é bem verdade! A bem dezer eu não sei se ainda é ou se já era! É que hoje está tudo tão mudado que até os adágios começam a mentir!... Mas, seja lá como for, há muitos anos… não tantos que encontremos os animais a falar, os Invernos no Planalto do Brunheiro davam pelos peitos a uma mula! O mesmo é dizer que eram duros como o granito porfiróide do Alto da Cunha. Começava a gear ali por meados de Outubro e até Maio eram dias infindáveis de carambelo. Não passava um Inverno sem meia dúzia de fortes nevões. Nessas ocasiões o que valia ao povo e ao gado era o que se guardava nas adegas e nos palheiros. Os bichos comiam o feno ripado, quando o havia, o povo as baijes de palheiro regadas com um fiozito de azeite, para quem o tinha e acompanhadas de um cibo de carne da pá, rijada, ou uma malga de caldo engodado com pingue e viva o velho! E quem avezasse uma ceva para matar pelo Ano Novo era rico! Devidamente poupado o reco e os seus derivados haviam de dar até ao próximo Natal. Para curar as carnes os Invernos queriam-se frios e secos para que ficassem bem curtidas. Da ceva faziam os planálticos uma espécie de multiplicação dos pães: milagres autênticos que reproduziam, por mais de mil, as potencialidades gastronómicas do animal.

 

Para a engorda os porcos tinham de ser capados. O macho para não ficar borrão e a fêmea para não se levantar à cria. O borrão destinava-se à cobrição e normalmente por cada aldeia havia apenas um para cobrir todas as recas que carecessem de ficar ao ganho. Ao ritual da capagem assisti muitas vezes e impressionava-me sempre mais que a própria matança. O capador, especialista desta operação, andava pelas aldeias com um assobio próprio anunciando a sua chegada. Quem precisasse de capar animais contratava-o e o serviço era rápido e eficiente. O primeiro acto da operação consistia em dispor a ferramenta cirúrgica sobre uma toalha de linho estendida num qualquer carro de bois que estivesse estacionado no pátio. De seguida procedia à desinfecção do material com um líquido de um rosa choc que tingia tudo. Se o animal fosse macho o cirurgião fazia um rasgo em cada uma das bolsas dos testículos e retirava-os agilmente. Desinfectava a ferida com o mesmo líquido, dava quatro pontos na sutura e estava como novo. No final e já depois de tudo devidamente arrumado era oferecido ao cirurgião a iguaria frita e um copo de tinto. Em sendo reca, deitava-a de lado no chão, fazia uma pequena incisão no ventre e metendo dois dedos nas entranhas retirava aquilo que parecia ser uma pequena tripa. Desinfectava, cozia a ferida e o trabalho estava pronto. Os requinhos durante dois dias andavam abatidos mas logo arrebitavam para cevas.

Os animais, capados, no Verão anterior à matança alimentava-se como príncipes para que botassem devido corpo. Batata, farelo, e castanha eram as principais iguarias para a engorda. Comiam quanto o buxo levasse. O importante era que por Dezembro já quase não se levantassem por tão gordos estarem. Depois, antes do Natal ou perto do Ano Novo, conforme o tempo desse, o animal ia à faca. Era um ritual interessante actualmente com tendência a ser engolido pela fatalidade da globalização e pelas exigências estúpidas de uma instituição que dá pela sigla de ASAE. Marcava-se o dia com o matador, convidavam-se alguns vizinhos para o botar ao banco e acontecia mais ou menos assim:

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Nos pátios das casas ou noutros lugares que se achassem azados, punha-se um banco corrido, tosco, de quatro patas canejas para que tivesse mais estabilidade. O matador dava os últimos retoques no facalhão de lâmina dupla com uma pedra de afiar. Os homens arregaçavam as mangas e à sua ordem abriam a porta da loge onde estava a infeliz vitima. O requinho parece que até adivinhava o desenlace pois quando a porta se abria começava numa agitação e numa gritaria como se dum humano se tratasse. Botava-se a ceva para o pátio e quatro homens dos mais fortes cravavam-lhes as unhas nas orelhas no rabo e nas patas e estendiam-no de cangalhas sobre o banco da morte. Passavam-lhe uma corda pela queixada e prendiam-no ao banco. Bem seguro grunhia quanto podia, mas nem mesmo assim comovia os seus carrascos! Quando lhe aprouvesse o matador metia a faca na garganta do infeliz e numa estocada de mestre fazia-lha chegar a faca ao coração. A morte era rápida se o matador fosse experimentado, caso contrário o animal tinha muitos minutos de sofrimento até que a estocada certa o ferisse de morte.

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O sangue jorrava em golfadas pelo boeiro que a faca abriu e com a orientação desta caia num alguidar de barro aparado quase sempre por uma mulher, que após a colheita passava minutos infindos a batê-lo com uma cebola descascada para que não tralhásse. Depois de bem morto retirava-se do banco para uma cama de colmo limpo preparada sobre o estrume do pátio. Era a hora da chamusca. Com fachucos de palha a arder dois dos mais experimentados vizinhos queimavam a pelagem do animal sem deixar que o couro se tisnasse muito. A seguir era a hora de o lavar. Três ou quatro homens de pedras na mão fazendo de esfregão raspavam quanto podiam para por o defunto limpinho. Era a vez dos mais miúdos se tornarem úteis pois cabia-lhe bota a água sobre as mãos dos lavadores. Não era um trabalho fácil porque aqueles exigiam que o fio de água fosse constante, não muito caudaloso e caísse no sítio certo. O campeão haveria de ganhar o rojão das palhas! A esta fase punha-se termo com o ritual d a confecção do tal rojão das palhas. Um dos homens torcia um punhado de palha de colmo e introduzia-o no cu do reco para lhe limpar a parte terminal do intestino grosso que ficara sujo nas ânsias da morte. A este fachuco chamavam então o rojão das palhas e era oferecido a quem tivesse demonstrado melhor desempenho.

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Depois punha-se de novo o reco, já limpinho, em cima do banco onde morreu, mas agora de barriga para cima. Era a fase da abertura. O matador afiava agora as facas da especialidade que cortavam como lâminas e desenhava o corte com a ponta da uma delas através de um rasgo superficial. Então passava a retirar a couracha que era a parte externa da pele da barriga que havia de servir para fazer as alheiras. Depois retirava a gordura do soventre e o redanho para os rojões que eram entregues à mulheres para irem para os potes  ferver.

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Depois de horas de lume com uma escumadeira tiravam-se os rojões e com a gordura fervente enchiam-se potas de barro de Izei com  a gordura líquida, a que mais tarde tralhada se haveria de chamar pingue ou adubo e serviria, ao longo do ano, para temperar o caldo. Depois disto, passava-se uma corda pelo osso que une os ilíacos e à força de braços pendurava-se o morto numa trave da adega de focinho para baixo. Era a fase de retirar as entranhas. Com a ponta da faca aguçadinha fazia o matador um corte longitudinal e a tripalhada caia sobre um lençol branco que duas mulheres seguravam e a que se chamava panal. Dali as tripas iam para lavar. Era um trabalho árduo que cabia igualmente às mulheres. Árduo por várias razões. Primeiro porque era preciso limpar a parte mais desprezível do animal, segundo porque a água estava muito fria e terceiro porque, por vezes, era preciso calcorrear grandes distâncias à procura de água corrente que no planalto é rara. Depois de limpo das vísceras a carcaça haveria de estar três a quatro dias à espera da desfeita. No final deste trabalho o pessoal que participou era convidado para almoçar e do repasto faria parte o verde – sangue cozido - e rojões, tudo regado com um bom maduro tinto de Cova do Ladrão. De tarde os homens normalmente não faziam nada por culpa do tintol!

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Passados dias o matador era de novo chamado, agora para a desfeita. Consistia em separar a carne do porco por categorias para posterior tratamento. Descia-se o porco, agora hirto e rosado, da trave onde esteve pendurado para o colocar, de barriga para cima, na adega, numa cama de colmo centeio. Começava então por lhe cortar as patas e retirar a cabeça da qual retirava a focinheira e a orelheira. Depois colocava-o de costas e com um fio desenhava dois traços paralelos e longitudinais do lombo ao rabo marcando uma faixa a cortar a que se dava o nome de enguião. Seguidamente retirava o lombo e os lombelos assim como as costelas e a espinha. Os presuntos agarrados ainda às pás iam para a salgadeira onde, envoltos em sal, repousariam cerca de um mês. Passado esse tempo eram cortados os presuntos e os cimos das pás e eram colocados ao fumo para acabar uma cura de cerca de outro mês. Finda esta curtição colocam-se na adega para consumo.

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Cabeça, enguião costelas e espinha destinam-se ao fumeiro, A carne magra e alguma entremeada ia para a sorça, um caldo de vinho e alhos, e que dava origem aos salpicões e às linguiças. O resto era cozido e os ossos da soã descarnados para os chouriços e as alheiras. Um trabalho pesado que cabia às mulheres e que elas orgulhavam a casa quando exibiam, vaidosas, dúzias de lareiros com o fumeiro alinhado sobre a lareira.

 

Na maior parte das casas a matança do porco e os produtos daí resultantes destinavam-se ao consumo próprio durante o ano. E feliz de quem matava pelo menos uma ceva!... As casas mais fortes chegavam a matar meia dúzia delas. E havia até quem matasse para vender os presuntos e o fumeiro. Afinal a parte mais nobre do animal, resultando, muitas vezes, no único rendimento da casa.

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Ora a casa do Ti Zé Paranhos era uma destas. A Paranhas quanta chouriça pudesse fazer quanta vendia na feira de Chaves. Nos primeiros meses do ano não falhava numa feira. Madrugava, juntava-se com as parceiras de outros lugares e Brunheiro abaixo lá iam cada uma com sua jiga vender o que a terra e o produto do seu trabalho dava. Umas levavam fumeiro, outras níscaros, castanhas, coelhos, pitas, perus e sei lá o que mais. E raramente regressavam carregadas que não fosse com o produto das vendas. As coisas do Brunheiro eram bem tidas pelos flavienses, ávidos da qualidade dos produtos genuínos da terra. Compravam quase tudo. E Que mais houvesse!

 

Em Fevereiro num belo dia, como soi dizer-se, pois de belo pouco tinha, descia, noite ainda, a serra em direcção à praça do Arrabalde um rancho de mulheres carregadas daqueles belos produtos. A Paranhas levava uma giga à cabeça com linguiças e uma seira no braço com salpicões. Não chovia mas a manhã demorava a despontar por mor de um céu plúmbeo que fazia adivinhar por’i um forte nevão. Mas por graça do Senhor na ida nem nevou nem choveu. Atravessaram a Ponte de Trajano, quando os sinos da Madalena badalavam as sete horas. Chegadas ao Arrabalde pousaram sobre o lajedo do mercado expondo a mercadoria. Lá foram vendendo mas nada que se parecesse ao desempenho de outros dias. As dos coelhos e das pitas ainda se safaram mas no final do dia à Paranhas ainda restava metade daquilo que levara para venda. A tarde estava a ficar feia e as léguas que tinha de percorrer até casa ainda consumiam umas boas três horas, era tempo de dar de frosques! Arrumaram e quando se preparavam para a partida começou a cair uma folecra que fazia adivinhar o pior. Como de facto! Ainda mal tinham chegado ao Raio X e já nevava a bom nevar. Subir a serra naquelas condições ia ser tarefa muito difícil se bem que ainda havia umas quatro horas com de dia e isso sossegava-as.

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Ao Chegarem a Lagarelhos e com medo do isolamento das voltas das Cabeceiras, onde era hábito o Pita fazer das dele, deu-lhes o diabo para deixarem a estrada de Carrazedo e subirem a Nogueira da Montanha por Maços, para depois chegarem mais facilmente aos seus lugares. Contudo, às vezes o diabo tece-as! A neve já mal deixava divisar os caminhos e entre calçada e carreiro acabaram por se perder e não saberem aonde estavam. Não se via viv’alma por aqueles ermos a quem se pudesse pedir uma informação. O medo da noite escura começava a instalar-se entre aquelas infelizes criaturas, eis senão quando ouviram um tropel do galope de um cavalo, abafado pela neve do caminho. Era certamente a salvação, ou seria Belzebu em forma de alazão para as atazanar ainda mais?...

 

Um homem a cavalo, por sinal bastante gerigoto e apresentando uma montada bem arreada, estancou o fogoso perto delas perguntando:

 

- Boa tarde senhoras, antão vocemecês que fazem a estas horas e por estes caminhos da fim do mundo?

 

- Oh mou senhor estemos perdidas! Para fugir às voltas das Cabeceiras, com o medo do Pita, metemos por aqui mas a neve toldou os caminhos e não sabemos ir para a Amoinha Velha.

 

- Antão e d’onde bêm?

 

- De Chaves do mercado onde fomos vender uma coisitas.

 

- Antão e venderam tudo o que levavam?

 

- Não – respondeu a Paranhas – ou a modos qu’inda levo aqui meia jiga de linguiças.

 

- Pois atão vai pesada coitada. Deixe cá ver a jiga que eu la levo à garupa. Venham atrás de mim que les inxino o caminho.

 

E lá foram as vendedeiras enregeladas atrás daquela esperança desconhecida.

 

Chegadas a uma encruzilhada, o cavaleiro parou e indicou o caminho da direita como sendo aquele que deveriam seguir. Puxou as rédea esquerda do freio do alazão para a esquerda, espetou as esporas na barriga do bicho e galopando desapareceu pelo caminho da esquerda para nunca mais ser visto.

 

- O alma do diabo fodeu-me as chouriças. Filho de uma puta, havia de o levar o diabo.  Em nas comendo que tenha uma esfoura que o leve o catano!

 

- Do mal o menos Paranhas, ainda nos deixou os trocos da venda, vamos indo!... – disse resignada a Aida Pataloa.

 

- Bem falaides mas quem se fodeu fui eu… rais te parta, alma do diabo!...

 

Passado uns meses souberam que quem as tinha roubado tinha sido o malvado do Pita. Deram graças a Deus por não ter sido pior. À fama que tem por aquelas serranias podia ter ido o dinheiro, a roupa e sabe-se lá que mais!... A sorte é que a neve deve ter refreado a cleptomania do gatuno, que à laia do Zé do Telhado trazia o Planalto sempre em sobressalto.

 

Que se fonham as chouriças!... Arre!

 

Gil Santos

 

 

14
Dez08

Abobeleira - A Matança do Porco - Chaves - Portugal


 

Associadas às estações do ano vão-se cumprindo algumas das tradições populares centenárias, cada vez menos, é certo, mas algumas sempre vão resistindo mais que outras. Associadas ao Inverno e ao frio, temos uma das tradições mais populares e também importantes, pois dela irão depender o cumprimento de muitas outras tradições que ao longo do ano lhe estão associadas – a matança do porco, do reco ou da ceva, como preferirem.

 

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Já lá vão os anos em que cada casa de família das aldeias ou bairros limítrofes da cidade tinham pelo menos um porco para a matança. Casas mais habitadas ou ricas, chegavam a matar até 6 ou mais porcos por ano, pois deles estavam pendentes muitas das refeições a fazer durante o ano, mas também algum rendimento para a família, associados à venda dos presuntos e também algum fumeiro. Com o despovoamento das aldeias, hoje em dia, as matanças são mais escassas e deixaram de fazer parte dos afazeres comuns do dos dias frios de Inverno e de Dezembro.

 

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Há no entanto aldeias, principalmente aquelas onde o despovoamento menos se fez sentir, que a tradição ainda se mantém, e hoje além da tradição, é também um dia de festa ou de reunião da família.

 

Abobeleira é uma dessas aldeias onde a tradição ainda se mantém, mas além das matanças familiares e particulares, há uma que se vem realizando nos últimos anos, que além de se recriar toda a tradição associada à matança, se transformou também em dia de festa da aldeia.

 

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Tudo começou há 3 anos atrás quando um filho da terra e seu habitante, o Jorge Carvalho, se lembrou de matar um porco e de convidar toda a população da aldeia e amigos. Claro que nas matanças além dos trabalhos que lhe estão associados e que todos vão ajudando como podem e sabem, há que dar de comer aos convidados e vai daí, que o próprio porco que vai à faca também vai servir de refeição aos convivas, dia fora e noite adentro. Claro que aqui se perde tudo que está associado aos afazeres e tradições que chegam nos dias, semanas e até meses seguintes à matança, mas a intenção é mesmo recriar e manter a tradição do dia da matança, transformando-o num dia de festa da aldeia, de uma aldeia onde ainda há gente e se mantém o espírito de vizinhança e inter ajuda dos seus habitantes, pelo menos entre os seus habitantes de sempre, os naturais da aldeia ou os que por casamento também passaram a fazer parte dela.

 

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Este ano, além da aldeia e de alguns convidados de honra que já são habituais, o Jorge Carvalho convidou também a blogosfera flaviense para participar na festa, na qual participaram além deste blog, os blogues Cancelas do casal Milita e Domingos Pires, o Reflexos na pessoa do Dinis Ponteira e o Terçolho na pessoa do João Madureira. O Chaves Antiga também teve como representante o flaviense residente, uma vez que os outros elementos e flavienses ausentes andam ocupados nas lides da Capital. Faltou o blog Valdanta, mas motivos de saúde justificaram a sua falta. Amigos da blogosfera flaviense e valdantina esteve presente o A.Cruz, mas faltou o amigo Tupamaro. Faltou também o bom tempo que se quer nestes dias, mas festa é festa e mesmo com muita chuva, vento e frio, o reco foi ao banco, subiu à “trave”, desceu aos potes e foi à mesa dos convivas.

 

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Mas vamos então recriar um pouco do dia da matança, em particular este da Abobeleira em dia de matança-festa, que sai um pouco do tradicional dado o apressar da descida do porco ao pote, mas que mesmo assim se foram mantendo os rituais da matança do reco.

 

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Ainda o dia está a nascer, bem cedo, em manhã chuvosa mas gelada como convém e já o matador tem o seu naipe de facas afiadas e preparadas para o acto. O reco já anda pela redondezas, ainda à solta.

 

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De entre os muitos convidados aparecem dois voluntários para irem convidar o porco a dirigir-se ao banco. A teimosia do porco é conhecida por todos e não vai lá por convites, por isso há que lhe apertar o cerco, agarra-lo e levá-lo à força. No banco já o espera o matador (neste caso o anfitrião) onde uma dúzia de mãos imobilizam o reco para que a faca seja rápida e certeira. É nesta fase que os mais sensíveis se afastam para o lado assobiando para o ar e o mais curiosos se aproximam.

 

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Posto o alguidar de barro de Vilar de Nantes em posição para recolher o sangue que irá dar lugar à primeira iguaria do dia, é altura de espetar a faca. Acto que é certeiro e rápido, pois em menos de um minuto o reco está pronto para os trabalhos seguintes. Entretanto o sangue o seu destino a caminho das mulheres, que o cuidado de não o deixar coalhar, não tardará a entrar no pote que já há muito está na fogueira com a água a ferver.

 

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No banco, começa de imediato o trabalho de pelar o porco com ajuda de um maçarico (a palha já há muito que caiu em desuso) enquanto meia dúzia de mãos vão raspando a pele queimada e algum pelo que fica. Logo de seguida passa ao banho, continuando-se e apurando-se o resto de algum pelo, com a ajuda de pedras para raspar bem e de uma faca afiada para a barba teimosa.

 

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“Se queres ver o teu corpo abre um porco” é ditado popular e é também o passo seguinte para as mãos do matador. Um trabalho cuidado e feito com alguma mestria, pois trata-se de abrir o reco para lhe retirar as tripas, e todo o cuidado é pouco, não vá uma das tripas rebentar-se. Parte no banco até que chega a hora de o subir à trave, que na ausência desta, qualquer coisa que o pendure lá no alto, serve.

 

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Se a tradição fosse cumprida à risca, estava na hora de recolhidas as tripas num alguidar, as mulheres seguirem com elas para as lavarem no riacho mais próximo, pois seriam elas que iriam dar lugar aos futuros enchidos (alheiras, linguiças, salpicões, chouriços). Também aqui se fica a conhecer mais uma das funções do famoso fio azul.

 

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Esventrado o reco, deveria ficar dependurado pelo menos durante um dia e uma noite, antes de ser desmanchado, para que todo o sangue lhe saia das carnes e o frio torne as carnes mais limpas e com um pouco mais rijas, mas como por aqui o tempo era pouco, a desmancha seria feita umas horas mais tarde.

 

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Entretanto já algumas horas passaram e havia que dar algum conforto ao corpo. Uma breve passagem pela fogueira para aquecer por fora, servia, mas por dentro, o consolo chegava com o sangue já cozido, temperado com azeite e alho, algum picante, uns pedaços de pão e uns copos de tinto, começavam a acomodar a casa por dentro, mas também as iscas de fígado frito com um preciso molho e logo de seguida os rojões faziam a sua entrada triunfal, quentinhos e loirinhos eram um regalo para a vista, mas muito mais para os estômagos, que já começavam a estar satisfeitos com as primeiras iguarias do dia.

 

Passadas algumas hora chegava o trabalho de desmanchar o porco. Trabalho de mestre que já requer as mãos de quem sabe. Alfredo foi o mestre na arte de desmanchar debaixo do olhar atento de curiosos, aprendizes mas também paparazzis blogueiros que desde a manhã já tinham uma boa centena de fotos batidas onde havia ainda lugar até para um arco-íris enquanto que o reco, nas mãos do Alfredo, aos pouco se ia transformando em febras, costelinhas ou carne para o pote, que nunca saiu do lume e ia apurando carnes para a feijoada da noite.

 

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Já era quase chegada a noite quando a desmancha acabou. Havia de novo que aquecer os corpos na fogueira enquanto que a feijoada ia apurando e os grelhadores já aqueciam para as febras e costelinhas.

 

Entretanto a festa continuava e já se sabe que não há festa sem música, bombos, concertinas e cantares que iam entretendo a entrada na noite enquanto que na cozinha entre um convívio alegre a feijoada à transmontana ia ficando pronta e ficou momentos depois.

 

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Salão cheio num espaço que já foi sala de aulas e onde pela certa alguns dos presentes aprenderam as primeiras letras, num agradável espaço que foi transformado para todo o tipo de eventos que a aldeia leve a efeito, com um salão amplo, instalações sanitárias e uma cozinha bem equipada, não faltando um amplo espaço exterior, que a esta hora do campeonato já estava quase abandonado, com a fogueira sozinha e alguns voluntários nos grelhadores, é que a feijoada já fumegava nas mesas e já se sabe que é quentinha que ela entra bem.

 

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“Merenda comida, companhia desfeita” e como os convidados de honra (Presidente da Câmara, Adjunto e Vereador) pela certa que tinha outros afazeres, abandonaram a sala ao fim do primeiro assalto, faltavam ainda as febras e as costelinhas, mas para essa parte ficou como representante o Vice-Presidente, do qual ficamos a saber que não tem lá muito jeito para tocar o bombo, mas lá vai tendo para ir falando e cumprimentado as pessoas.

 

Os representantes da blogosfera flaviense ainda provaram as febras, mas como ainda tinha de fechar a edição do post de hoje, também regressaram a casa para que as suas reportagens possa estar agora aqui.

 

Ao Jorge Carvalho agradecemos a simpatia do convite, ao povo a Abobeleira a prazer do convívio e fica a promessa que passamos na freguesia pelos reis e para o ano também acietamos convite.

 

Agradecer ainda ao A.Cruz por nos ter servido de cicerone na freguesia, com visita guiada ao núcleo histórico Valdanta e ao á história do Cando. Pena só para o tempo que sem ter ajudado à festa, também não a prejudicou.

 

 

À margem da matança do porco fica link para o post dedicado por este blog à aldeia:

http://chaves.blogs.sapo.pt/278053.html

 

Até amanhã de volta à cidade.

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