![1600-cab-mcunha-pite]()
Italo Calvino escreveu " As cidades invisíveis", Quando li gostei tanto que tive de escrever "Os rios impossíveis". Nas próximas semanas saberemos como são e quantos existem. Nunca saberemos é onde.
Os rios impossíveis (1)
Aparece numa parede de pedra e cai de vários metros de altura, formando um poço profundo.
As suas águas límpidas ganham tons esverdeados quando os raios de sol as encontram, no seu caminho de poucas dezenas de metros, até se sumirem numa outra parede.
Ninguém sabe de onde vem, nem para onde vai, o seu caudal é constante e preenche por completo as grutas de entrada e de saída.
Em vão se procurou, nas terras a montante qualquer curso de água que pudesse corresponder-lhe.
Era como se nascesse num local muito distante e viesse por um misterioso canal até se despenhar da muralha de granito.
![1600-cascata (13)-pite-24]()
Ainda mais estranho era o destino das águas, sumidas na gruta a jusante e cujo rastro se perdia para sempre. Ninguém conhecia, nos campos a sul, um sítio onde emergisse um rio semelhante em caudal. As poucas linhas de água que existiam, eram pouco caudalosas e tinham tons azulados, como todas as daquela região, bem distintas do arco-íris verde do mágico rio.
Um dia, Manuel deitou ao rio uma garrafa cheia de água que logo se afundou na gruta de saída.
Em vão se procurou, num raio de muitos quilómetros para sul e durante muitos meses, a referida garrafa. Parecia ter-se sumido para sempre, talvez encalhada nalgum recanto da inacessível gruta.
Um ano depois ele viu cair na cascata uma garrafa exactamente igual. Num primeiro momento recolheu-a como que para confirmar que era a mesma que ele tinha lançado, exactamente trezentos e sessenta e cinco dias antes, no mesmo local. Depois devolveu-a cuidadosamente ao rio, seguindo desde a margem, o seu trajecto, com atenção, até ela ser engolida de novo pela gruta da parede sul.
Todos os anos, Manuel regressa ao seu segredo, esperando à beira do poço profundo o completar de mais um ciclo da sua vida.
Manuel Cunha (pité)