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ENTREVISTA COM UM VETERANO DA PRAXE
Joaquim Maria, o aluno mais antigo da Escola Superior de Tecnologia do Sabugal. Tem 46 anos. Está ligado às praxes desde os seus 18 anos.
P. - Boa tarde, Joaquim Maria. Diga-me lá: sempre foi muito ativo nas praxes?
R. - Não. Apenas desde os dezoito anos.
P. – O que foi que o levou a seguir esta atividade? Humilhar os seus parentes mais próximos? Uma vocação irresistível para ser idiota? Talvez a ânsia de ser idolatrado por meninas dos 13 aos 18 anos? Queria ser uma celebridade para a caloirada, era isso.
R. – Não. Nada disso.
P. – Já sei. Ausência de autoestima?
R.– Errado.
P.– Frustração sexual?
R. – Tenho.
P. – Mas foi isso que o levou a ser bastante ativo na praxe?
R. – Não. Vi na praxe uma solução para deixar de ter azar com o sexo feminino.
P. – Então é mais ou menos frustração sexual, Joaquim Maria. É virgem?
R. – Peixes.
P. – Fale-me então do entusiamo exacerbado dos caloiros pela praxe. Porque é que faltam às aulas para serem praxados?
R. – A universidade é praxe, sabe? Eles sabem que em primeiro lugar está a praxe e depois o resto. Sabem que se faltarem enchem cinquenta e mais três linguadões aqui ao Joaquim Maria.
P. – Está a falar a sério?
R. – Não. Enchem vinte. Não queremos roturas musculares nem caloiros descontentes.
P. – Mas os pais pagam as propinas para os filhos frequentarem as aulas, percebe?
R. – Nunca entendi isso.
P. – Qual foi o momento mais infeliz que teve na praxe?
R. – Lembro-me de uma caloira pedir-me para ser padrinho dela.
P. – Isso não é bom?
R. – Eu queria era que me pedisse em namoro.
P. – E o mais feliz?
R. – Foi quando me pediu em namoro.
P. – Afinal, chegou a pedir?
R. – Não.
P. – Diga-me: que pensa dos miúdos que entraram este ano para o ensino superior?
R. – A essa resposta vou tentar responder com o maior entusiasmo.
P. – Muito bem. E em relação à falta de inteligência destes?
R. – Está a insultá-los? Dez de braços, já!
P. – Joaquim Maria, isto é uma entrevista. Vá, componha-se.
R. – Desculpe. É o hábito. Sabe que o monge faz o hábito.
P. – O hábito faz o monge, Joaquim Maria! Avançando: acha fundamental a praxe para a integração dos novos alunos?
R. – Tenho a certeza que faz bem a nós que praxamos. A praxe, aqui só para nós, tem o intuito de nos fazer sentir um Mussolini ou um Cristian Grey do mundo académico. Aquele poderzinho militarista e falta de confiança em nós mesmos são o orgasmo de quem praxa. Já que não conseguimos ter orgasmos de outra maneira. Quanto aos caloiros... já para o chão: quinze saltos a pé coxinho enquanto grita “O doutor Júlio tem um tarolo assimétrico”.
P. – Joaquim Maria, já lhe disse que isto é uma entrevista. Vista-se lá.
R. – Desculpe.
P. – Outra pergunta: em seu entender, o que é que acontece em terra de cego?
R. – Quem tem olho é rei.
P. – Bravo. Vejo que é dotado de rara perspicácia. Agora, uma pergunta de faculdade: onde tem o seu diploma?
R. – Na faculdade.
P. – Outra coisa: o que acha da entrada de alunos ainda menores no ensino superior?
R. – Acho bem, na medida do facilitismo que temos na atividade do engate.
P. – Acha que a praxe tem pernas para andar, depois deste tumulto de notícias que surgiram?
R. – Não estou a par da situação. Acho que a praxe nunca irá acabar. Da mesma maneira que existirá sempre a falta de autoestima de quem praxa.
P. – Para terminar: acha que a coercividade de beijos de crianças aos seus avós é violência?
R. – Isso vem a propósito do professor Daniel Cardoso, não é?
P. – É.
R. – Pensei que era para falar de assuntos sérios. Sobre esse assunto, só tenho a dizer o seguinte.
P. – Muito obrigado.
Herman JC