Nogueira da Montanha - Chaves - Portugal
Esta primeira imagem é feita de pura ilusão. Real, sim senhor, é real, mas ilude e leva-nos a crer numa realidade que não existe lá no alto planalto da Serra do Brunheiro, em terras da freguesia de Nogueira da Montanha, freguesia e aldeia para onde vamos hoje, mais uma vez com o mesmo discurso, o do despovoamento rural.
Embora o planalto do Brunheiro até seja feito de terras maioritariamente cultiváveis, onde até é conhecida a excelência da qualidade dos produtos que lá se produzem, como por exemplo a batata, sempre teve todas as condições para convidar as pessoas a partir para melhor vida. Terras altas de invernos rigorosos, a terra altamente repartida, falta de uma política agrícola, falta de infraestruturas básicas, sem perspetivas para o futuro, etc. Tudo convidava à partida e o seu povo partiu, e se aguentaram por lá alguns séculos, foi porque então, se partissem e fossem para onde fossem, a realidade era a mesma, exceto nas grandes cidades, que para nós se resumiam a duas e onde gente não qualificada era mais escrava que na terra mãe.
Mas os tempos mudaram, felizmente, e desde que a educação passou a ser uma das nossas prioridades ou uma das nossas necessidades como a modernidade o exigia, os horizontes alargaram-se e passou a existir vida para além das leiras das aldeias, bem melhor, e que ia além da subsistência. A emigração passou a ser um convite sério, num ano ou dois deixava-se de andar a conduzir carros de bois carregados com quase nada para passarem a conduzir um popó todo janota, bem melhor do que aquele que os bem remediados e alguns mais abastados tinham por cá. Em meia dúzia de anos construíram casas novas, com novos materiais, cozinhas todas xpto, etc. Certo que a vida de emigrante não era fácil, mas o suor que lhes corria nas faces era cambiado por dinheiro e não por batatas, centeio, nabos que em anos maus nem davam para as despesas e em anos bons, muitas das vezes apodreciam nos armazéns…
Mas não foi só a emigração. De novo a educação teve um papel importante no abandono do mundo rural. Os mais remediados que não emigraram e não abandonaram as terra, mandaram os filhos descer ao vale para continuar os estudos além das primeiras letras e números aprendidos na escola da aldeia. Fizeram o secundário e mediante as possibilidades dos remediados, continuaram os estudos em cursos médios ou superiores, formaram-se, tudo com cursos virados para a cidade, para os grandes centros onde poderiam exercer as profissões para que estavam habilitados, e a aldeia passou a existir apenas no natal, na páscoa, às vezes no carnaval, no dia da festa da aldeia, na morte de um familiar próximo, ou numa ou outra visita ocasional de fim de semana para visitar os seus, matar algumas saudades e meter uns sacos de batatas, umas chouriças e uns garrafões de vinho e azeite na mala do carro.
Os mesmos iluminados de sempre, os de Lisboa, pensaram e bem numa educação para todos, se possível superior, mas esqueceram-se de vocacionar esses cursos e de pensar o mundo rural com políticas apropriadas para os novos formados poderem nele fazer o seu futuro se assim o desejassem, contribuindo assim para o nosso desenvolvimento e para um Portugal mais igual. Está tudo nos livros em que estudaram, senhores de Lisboa que muitos deles saíram destas aldeias, mas que a sedução de outros interesses os levou à cegueira, para com facilmente esquecerem ou ignorarem uma realidade, que muito bem conhecem, onde deixarem nela os seus resistentes, que alguns até são avós, pais, irmãos, tios, primos…
Quase todas as aldeias que em tempos foram das melhoras aldeias, com gente maioritariamente remediada com o suficiente para estudarem os filhos, hoje estão à beira da falência e do total abandono. Nogueira da Montanha é uma delas. Há coisa de um ano, quando passei por lá para mais uma recolha de algumas imagens, vi de passagem apenas uma pessoa, que até poderia nem ser de lá. Na aldeia vizinha, também com apenas meia-dúzia de pessoas, disseram-me que em Nogueira apenas resistiam três pessoas... Vai sendo esta a triste realidade das nossas aldeias.
Mas o que mais dói no meio de todo este abandono, não são as casas fechadas, degradadas ou em ruínas, nem as ruas sem gente, o tanque sem lavadeiras, os pátios sem animais. Tudo isso pode ser reposto num futuro próximo ou mais distante, o que mais dói é a cultura rural ainda com algum comunitarismo que se vivia nas aldeias, os saberes e sabores, folclore e tradições que ao longo de séculos existiram e que iam passando de geração em geração. Tudo isso se perdeu ou está em vias de se perder na maioria das nossas aldeias, e seja qual for o futuro das nossas aldeias, nunca mais voltarão a ser como eram.