Como já sabemos que os finais de outono, todo o inverno e inícios de primavera, meteorologicamente falando, o tempo não é muito certo, em geral agendamos as nossas descobertas do Barroso para quando temos garantias de haver bom tempo e mais luz. Pois então, com alguma antecedência, marcámos o dia 12 de maio de 2017 para a descoberta de mais um pouco do Barroso, na qual tínhamos também incluído no nosso itinerário a aldeia de Sanguinhedo.
Mas os dias do mês de maio também não são muito certos, é conforme lhes dá, e quando lhes dá para o torto, é mesmo para o torto o dia todo. Foi assim, bem torto, chuvoso e até com algum frio que nasceu aquele 12 de maio de 2017. Os parceiros de viagem ainda interrogaram se mantínhamos o dia para a fotografia e descoberta de mais algumas aldeias do Barroso. Claro que sim, em maio não podia chover todo o dia, algumas abertas haveríamos de ter… mas não tivemos, no entanto, já que andávamos por lá, fizemos frente à chuva, ao frio e ao vento e embora as máquinas fotográficas até nem gostem de chuva, as fotografias adoram, ficam mais brilhantes, mais misteriosas, diferentes. Cumprimos a nossa missão e isso é o que interessa.
Quanto a Sanguinhedo, já nos tinham falado da aldeia, como sendo uma das aldeias, a primeira completamente despovoada no concelho de Montalegre. Mal deixámos a EN103 para tomar a rampa de acesso à aldeia, com o temporal a cair sobre nós e as primeiras casas a surgirem no nosso horizonte, quase tivemos a sensação de não estranhar o despovoamento. Parámos o carro para descansar da subida, olhámos para trás e eis o primeiro impacto, agradável, mesmo debaixo de um céu ameaçador, a paisagem impressionava, ninguém podia ficar indiferente ao que se via. Olhando melhor para as primeiras casas, um pouco estranhas e fora do habitual no Barroso, acabavam também por fazer um conjunto simpático e igualmente interessante.
A aldeia parecia começar e terminar ali, logo após aquilo que se via. Avançámos a pé mais um pouco e deparámos com um placa pousada em cima de umas pedras, encostada às paredes de uma das casas “Horse & Move – B&C Equitação”. O Azul elétrico da placa atraía o nosso olhar e o lettering despertava-nos a curiosidade, para além disso demos conta de que a rua e a aldeia continuavam por ali acima. Os companheiros de viajem avançaram na direção que a placa indicava e eu, entrei no carro e avancei até ao final da rua que era também o final da aldeia e mal parei, fui recebido por um cão, amigável e simpático, troquei umas impressões com ele para ficarmos à-vontade, já sei que nunca me respondem, mas entendem-me sempre.
E estava eu ainda de conversa com o cão, enquanto ia tirando a máquina fotográfica do carro e o guarda-chuva, o que provoca um certo embaraço andar e manejar as duas coisas, quando surge um homem vindo de uma das casas. Claro que vi logo que não era o fantasma da aldeia abandonada, pois via-se bem que era bem real, mesmo que viesse de cabeça coberta e o rosto naquele dia escuro ficasse à sombra do carapuço. E as minhas primeiras palavras dirigidas ao aparecido, ainda antes de o cumprimentar, foram de espanto: “Pensei que já não vivia aqui ninguém!?”. Que não! Disse-me o aparecido, que vivia ele, a mulher o(s) filho(s), 10 cavalos e alguns cães, os que iam aparecendo e ficando por lá. Pela resposta deu logo para entender que o aparecido não era barrosão, embora falasse português, era um português esquisito, que deu mote para a próxima pergunta: — O senhor não é de cá, pois não!?. Pois não, não era, tinha vindo da Holanda à procura de uma propriedade para se poder dedicar aos cavalos. Era veterinário, gostava dos animais e da natureza e embora a intenção dele fosse outra região do país, calhou conhecer aquele cantinho do Barroso e apaixonar-se por ele, onde tinha tudo para aquilo que queria, e por ali ficaram.
No entretanto, os meus parceiros de viagem chegaram e ficaram tão espantados quanto eu fiquei quando viram o aparecido, que viemos depois a saber chamar-se Casper, que vivia com a mulher, Brigitte, que entretanto também apareceu, ela professora de equitação. Bem, para o levantamento fotográfico da aldeia bastariam uns 20 minutos, mas a conversa foi rendendo, os anfitriões eram simpáticos, mostraram-nos as instalações, apresentaram-nos os cavalos que estavam lá mais à mão, um deles o halibute (fixei o nome por ser curioso) e acabámos por ficar por lá cerca de duas horas, se bem recordo.
Um ano e uns meses já é muito tempo para recordar pormenores da conversa que tivemos, mas recordo ainda terem-nos falado de uma atividade com barcos de recreio na barragem da Venda Nova, que fica a penas 120m da aldeia, ou seja, entre a aldeia e a barragem, praticamente apenas temos a EN103. Recordo ainda terem falado em turismo rural, que tinham algumas das casas preparadas para este fim. Fui à net, pesquisei e lá está, pelo menos no “Booking.com” onde encontrei uma descrição sobre as instalações, que suponho ser da responsabilidade dos proprietários (holandeses), pelo menos a julgar por um pormenor do texto que deve estar relacionado com o ainda não dominarem convenientemente o português, refiro-me a este pormenor que irão ver no texto que a seguir vou transcrever: “existem estábulos para cavalos nos quartos”.
Pois aqui fica a transcrição daquilo que está no “Booking.com”
Quinta da Riba
Situada em Sanguinhedo, a Quinta da Riba é uma propriedade que providencia passeios a cavalo, com um total de 10 cavalos lusitano. Existem estábulos para cavalos nos quartos e um dos proprietários é um instrutor de equitação.
Entre as várias comodidades desta propriedade estão um jardim e um terraço. Está disponível acesso Wi-Fi gratuito. Os quartos deste alojamento de turismo rural estão equipados com um guarda-roupa. Os quartos estão completos com uma casa de banho partilhada, enquanto algumas unidades da Quinta da Riba também possuem uma área de estar.
Todas as manhãs é servido um pequeno-almoço continental na propriedade.
Uma variedade de actividades populares estão disponíveis na área em redor do alojamento, incluindo caminhadas. A propriedade também é um abrigo para cães.
Braga fica a 41 km da Quinta da Riba. O aeroporto mais próximo é o Aeroporto Francisco Sá Carneiro, a 76 km deste alojamento de turismo rural.
Esta propriedade também tem uma das localizações melhor pontuadas em Sanguinhedo! Os hóspedes estão mais satisfeitos com ela do que com outras propriedades da mesma área.
Este alojamento é recomendado pela boa relação preço/qualidade em Sanguinhedo! Os hóspedes têm mais por menos dinheiro em comparação a outros alojamentos nesta cidade.
Falamos o seu idioma!
Para saber mais sobre esta unidade, nem há como consultar os seus sítios na net:
Páginas da Horse & Move – Sanguinhedo - Portugal
Internet: http://horseandmove.123website.nl/
Facebook: https://www.facebook.com/horseandmove/
No texto que atrás foi ficando, já fica um pouco ou quase tudo a respeito da localização de Sanguinhedo. Já dissemos que fica junto à Barragem da Venda Nova, junto à EN103, a 41 Km de Braga e a 76 Km do aeroporto Sá Carneiro. Falta dizer que fica a 500 metros da Venda Nova e a 61,8 km de Chaves, mas a seguir deixamos o melhor caminho para lá chegar a partir de Chaves, logo seguido do nosso habitual mapa.
Pois embora Sanguinhedo fique junto à EN103 e bastaria tomar esta estrada em Chaves, seguir sempre por ela até à Venda Nova (Barragem) e logo a seguir quatrocentos e tal metros) virar à esquerda para a nossa aldeia de hoje, não é este o itinerário que vou recomendar, pois esse será o da N311, por ser mais curto e para mim o mais interessante, no entanto já sabem que eu recomendo sempre um caminho para ir e outro para vir, e o regresso, esse sim, recomendo a EN103. Mas que decide não sou eu e vocês tomarão aquele que entenderem. Falta só referir que a N311 é a estrada que liga Boticas a Salto, ou seja, caso seja este o itinerário escolhido, terão de tomas a EN103 em Chaves até Sapiãos, aí abandonam a EN103 e viram para Boticas, atravessam esta vila e seguem em direção a Salto, mesmo antes de chegar a Salto terão de virar à direita em direção à Venda Nova. Há sempre placas informativas, não há nada que enganar. Por este itinerário são 61.8 Km pela EN103 são 68.7 Km. Fica o nosso mapa.
Vamos agora ao que encontrámos nas nossas pesquisas, onde como sempre o livro “Montalegre” é de consulta obrigatória. Pois no referido livro só encontrei duas referências a Sanguinhedo, uma quando se refere o roteiro das barragens e outra em relação ao Padre Domingos Barroso, que transcrevemos:
Padre Domingos Barroso (séc. XIX) nasceu na quase erma povoação de Sanguinhedo, em 1889. Assinalado praticante das actividades cinegéticas, devemos-lhe o apuramento da raça canina dita “perdigueira”. Devido a tal escreveu “O Perdigueiro Português,” obra publicada em duas edições e muito elogiada. Escrevia muito bem, em estilo desempenado e limpo e colaborou em diversos órgãos de comunicação social escrita.
Achámos estranho não aparecer nenhuma referência quanto à freguesia a que pertence, que deduzimos ser a Freguesia da Venda Nova. Fomos até essa parte do livro e lá aparece a aldeia grafada como Sangunhedo (sem o i). Mais por curiosidade do que por dúvida, fomos consultar o site do Município de Montalegre, que na pesquisa nos remete para o livro “Montalegre”, ou seja, voltámos ao mesmo, mas há sempre a “Toponímia de Barroso” para tirar dúvidas, e aí esclarecemos aquilo que já sabíamos, que Sanguinhedo é mesmo Sanguinhedo, só não sabíamos é que era do Arco, ou seja, Sanguinhedo do Arco, mas vamos à “Toponímia de Barroso” ver o que por lá se diz ao respeito.
Sanguinhedo do Arco
Este topónimo tem percorrido o mesmo caminho de Sabuzedo, mas a partir do nome comum SANGUINHO + EDO – SANGUINHEDO. Apesar disso o povo pronuncia muitas vezes Sangunhedo e refere o topónimo ao nome de um santinho: São Gunhedo, o que é um acto de crença inexplicável! E a tal santinho dedicaram as alminhas do lugar que estão junto à Estrada Nacional 103.
Ora com mais esta do São Gunhedo lá tive de ir à procura das alminhas para deixar aqui e que tinha arquivadas com as da aldeia de Padrões, mas como não quero que aqui falte nada, aqui estão as referidas alminhas:
Ainda integrado na “Toponímia de Barroso” está a “Toponímia Alegre” onde aparece uma quadra dedicada a Sanguinhedo:
Adeus, adeus, Sanguinhedo
És de ladeiras ao fundo;
Quem lá vai tomar amores
Vai-se despedir do mundo.
No Dicionário do mais ilustres Transmontanos e Alto Durienses, encontrámos mais uma referência a Sanguinhedo:
MONUMENTOS, ACHADOS HISTÓRICOS E LOCAIS DE INTERESSE
De entre os monumentos destacamos: os diversos dólmenes e antas, já assinalados. Estes monumentos tumulares de pedra foram construídos, entre nós, no período que se situa nos fins do Neolítico, com prolongamento pela Idade do Bronze; os castros são povoações fortificadas, localizadas em colinas de difícil acesso e, de preferência, junto a cursos de água, onde os povos viviam em relativa tranquilidade e se poderiam defender de outras tribos. A cultura castreja teve larga difusão no Barroso, como já vimos; as estradas romanas que atravessavam a região do Barroso, fazem a ligação entre Braga e Chaves e Astorga com variantes e itinerários diferentes; os marcos miliários, monolitos que se fixavam ao longo das vias romanas, por vezes, com indicação de nomes e títulos honoríficos. assinalavam as distâncias de 1.000 em 1.000 passos. Dos muitos existentes ainda se conservam os que se encontraram em Vilarinho dos Padrões, Sanguinhedo.
E vamos iniciando as despedidas, mas antes ainda há tempo para referir que na Internet encontrei a referência a uma “Associação Recreativa e de Revitalização da Aldeia de Sanguinhedo”, mas apenas isso e ainda uma Dissertação de Mestrado de Arquitetura, data de 2013 e intitulada “Impacto da arquitetura na minimização do despovoamento local : Sanguinhedo, um caso de estudo”, ao qual só tivemos acesso ao resumo, que diz assim:
O presente trabalho de investigação aborda a implementação de um restaurante apoiado por edifícios dirigidos ao Turismo de Habitação Rural, em Sanguinhedo, lugar de Venda Nova, um lugar quase abandonado no concelho de Montalegre. Representa a última etapa do 2º Ciclo, Mestrado Integrado em Arquitetura, a apresentar na Faculdade de Arquitetura e Artes da Universidade Lusíada de Vila Nova de Famalicão. “Impacto da Arquitetura na Minimização do Despovoamento Local – Sanguinhedo: Um caso de estudo” foi o título produzido, após se analisar o estudo desenvolvido e se estabelecerem os objetivos pretendidos. A escolha deste trabalho foi motivada pelo conhecimento prévio da propriedade e região onde se pretende implementar o restaurante. Este trabalho explora o Turismo, em particular o Turismo em Espaço Rural e a forma como este pode dinamizar uma região e diminuir o seu despovoamento. A ideia surge depois do contato com a região do Barroso e suas gentes, aqui caracterizados, bem como da constatação do êxodo rural que esta região tem vivido em tempos recentes. Caracteriza-se a povoação de Venda Nova e seu enquadramento natural e geográfico fundamentando assim, a necessidade de implementação de um espaço que apoie o Turismo e sirva como âncora para não só atrair turistas, mas cativar as gerações mais novas a ficarem na sua terra natal. Cria-se, assim, um pólo dinamizador para um reinventar do espaço rural de Sanguinhedo, Venda Nova.
Pois, todas as ideias são válidas e preciosas para combater despovoamento rural, o problema é que se trata de um problema estrutural, que não depende de nós e da nossa vontade, mas sim do poder central, se é que existe, pois também ele está hipotecado a quem realmente detém, e o problema maior, é que, parece-me, já não se saber que o detém. Entretanto, vamos ficando sem hospitais públicos, sem escolas, sem comércio local, sem agricultura, sem o regresso dos nossos filhos, sem os nossos saberes, sem os nossos sabores, sem as nossas tradições, enfim, sem a nossa cultura, para por fim ficarmos sem a nossa identidade.
E ficamos por aqui. Ficam ainda as habituais referências às nossas consultas e dizer-vos que as abordagens que já fizemos às aldeias e temas de Barroso estão agora no menu do topo do blog, mas também nos links da barra lateral. Se a sua aldeia não está lá, em breve passará por aqui, num domingo próximo, e se não tem muito tempo para verificar se o blog tem alguma coisa de interesse, basta deixar o seu mail na caixa lateral do blog onde diz “Subscrever por e-mail”, que o SAPO encarregar-se-á de lhe mandar um mail por dia com o resumo das publicações, com toda a confidencialidade possível, pois nem nós teremos acesso à vossa identidade e mail.
BIBLIOGRAFIA
BAPTISTA, José Dias, Montalegre. Montalegre: Município de Montalegre, 2006.
BAPTISTA, José Dias, Toponímia de Barroso. Montalegre: Ecomuseu – Associação de Barroso, 2014.
DA FONTE, Barroso, Dicionário dos mais ilustres Trasmontanos e Alto Durienses, Guimarães.
WEBGRAFIA
https://www.booking.com/hotel/pt/quinta-da-riba.pt-pt.html, consultado às 18H50 de 11/11/2018.
http://repositorio.ulusiada.pt/handle/11067/2996, consultado às 19H30 de 11/11/2018.