Pedra de Toque - Sempre
SEMPRE
Os meus olhos deslizam sempre para as tuas mãos esguias.
Aí repousam. Aí descansam.
São o meu colo branco, sensual.
Antes passam pelos teus cabelos.
Escorrem pela tua tez morena, plantada de sardas.
Param depois na rosa pálida da tua boca que apetece.
Adivinham o teu corpo, alvo, trémulo, nervoso pela vergonha do primeiro amor.
Não descobrem pecado nos teus seios, nem pudor no teu ventre, sereno por fora.
Como brilha o teu sorriso nos dentes, quando as palavras e os gestos brincam às escondidas dos sonhos…
Quando os meus olhos sintonizam nos teus, vejo fundo.
Procuro a transparência mas a neblina adensa o mistério que corre por dentro de ti.
Queria ver com lucidez, a dignidade, a honradez, a verdade que te adivinho.
Escrevo-te, boiando em águas de mar tépido e azul, envolvido nas algas dos teus braços.
Volto-me e tua pele sedosa, toca-me a alma com arrepios divinos.
De todos os barcos, das profundezas marítimas, soltam-se correntes mornas escoltadas por peixes estranhos e de cores irreais que parecem prender-nos.
Quando lembro as voltas das nossas vidas, a ideia dói-me.
Como dizia Proust, se calhar “a felicidade serve apenas para tornar a infelicidade suportável.”
Enamorado, a exactidão deste momento perene, enche-me o peito de beleza.
António Roque